Tú no puedes comprar el viento
Tú no puedes comprar el sol
Tú no puedes comprar la lluvia
Tú no puedes comprar el calor
(Latinoamérica; Calle 13)
No Brasil, assim como em muitos outros países e lugares deste planeta, a semana de direitos humanos deveria ser um bom momento para nos alimentar de balanços e reflexões que são urgentes. Uma visão retrospectiva nos reforça a noção de que os direitos humanos são uma construção histórica. Pessoas foram e são presas, assassinadas, coagidas e torturadas apenas por lutarem por liberdade e por uma sociedade mais justa. A luta pelos direitos humanos é, assim, uma batalha permanente em favor da emancipação e da autonomia de homens e mulheres contra a opressão, as injustiças, pelo reconhecimento de suas identidades, pelo direito à vida e à liberdade.
O contexto em que vivemos hoje, de múltiplas crises – climática, econômica, institucional, política e moral – combinadas em escala global, nacional e local, nos mostra o quanto esta batalha é atual e ainda mais essencial na longa trajetória de construção do que queremos ser como humanidade. Nos mostra também a importância de estarmos atentos e sermos resistentes aos retrocessos e à desconstrução de direitos. Isto exige um esforço tremendo, não só porque são muitas as ameaças nesse sentido, mas também porque algumas são sutis.
A Constituição Brasileira de 1988 formulou muito bem o direito ao meio ambiente, como consta em seu Artigo 225:
“Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
Este direito está hoje sob ameaça explícita quando se tenta, por exemplo, aprovar uma Nova Lei de Licenciamento que flexibiliza os requisitos e regras para concessão de licenças que impactam, muitas das vezes de forma irreversível, o meio ambiente e a vida das pessoas. Ou quando se tenta fragilizar outras legislações, instituições e políticas socioambientais vigentes que garantem o domínio de povos indígenas, quilombolas e assentados, entre outros, sobre suas terras e territórios. Enfim, as ameaças explícitas são muitas e vem de muitos lados.
Mas existem ameaças que aparecem disfarçadas de solução para a preservação do meio ambiente e que são igualmente perigosas. É o caso da tentativa de inclusão das florestas em mecanismos de compensação de carbono (offsets), como parte dos esforços globais para redução de emissões de gases de efeito estufa assumidos multilateralmente no âmbito da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas. Em resumo, trata-se de colocar um preço no carbono retido por florestas e, depois, vendê-los para países e setores que não conseguirem cumprir com seus próprios compromissos de redução de emissões.
Mecanismo tão engenhoso tem sido propagado por grupos de interesse político e econômico como solução efetiva para os países que detêm amplas extensões de floresta tropical, como o Brasil, conseguirem recursos necessários para protegê-las. O argumento subjacente é o de que os Estados disponibilizam pouco orçamento para esta proteção e, em tempos de austeridade fiscal, os recursos são ainda mais escassos. Apresenta-se assim um lugar mais “vantajoso” para buscar dinheiro – o mercado – como se isto não tivesse consequências para todos nós.
Não faltam argumentos técnicos e políticos para mostrar que se trata de um grave equívoco que coloca em risco, entre outras coisas, a integridade ambiental do país e do planeta (veja mais em Por que os offsets florestais são uma falsa solução).
Diante desse cenário, na semana de direitos humanos vale reforçar como argumento contrário a esta solução financeira para proteção de florestas um valor e uma ideia muito simples que deveriam ser caros ao processo de construção da nossa humanidade: não se pode colocar preço em tudo.