Todo especialista do setor tributário sabe que o Brasil precisa urgentemente de uma reforma em seu sistema de cobrança de impostos e tributos, porque ele é um dos mais injustos do planeta. O sistema tributário brasileiro tem como base o consumo, e não a renda, punindo assim os mais pobres e aliviando os mais ricos. “Proporcionalmente pobres e a classe média pagam mais impostos do que as pessoas mais ricas e, entre elas, os super-ricos são os que menos pagam imposto no Brasil”, explica Grazielle David, assessora política do Inesc, em entrevista concedida à revista Apuro. “Quanto mais você tributa o consumo, mais penaliza os pobres porque o tributo é igual independentemente de qual seja a sua renda. Quem ganha um salário mínimo gasta praticamente tudo em consumo e está sendo fortemente tributado de forma direta.”
Grazielle tira a máscara de campanhas como a da Fiesp contra o aumento de impostos, lembrando que carga tributária não é determinada por quanto se quer pagar de impostos, mas pela necessidade da população. “As pessoas querem saúde pública, educação pública, transporte público? Então é preciso ter uma carga tributária mais alta, é a única forma de garantir isso.” O problema, afirma Grazielle, não é bem a carga tributária ser ou não alta, mas sua desproporcionalidade – ou como ela se distribui por quem tem mais ou menos recursos. E em geral, quem mais grita contra os impostos são justamente que mais sonega.
“Quem propaga o discurso de que a carga tributária é alta é justamente quem menos paga imposto no Brasil. Quem de fato está sentindo o peso da carga tributária são os pobres, mas que precisam do Estado fazendo política pública. É uma situação desesperadora porque eles não podem querer a diminuição da carga, mas aguentam o peso praticamente sozinhos. Enquanto se fica nesse discurso, estamos inviabilizando o discurso mais importante que é sobre a má distribuição da carga.”
Na entrevista, Grazielle também falou sobre campanhas cínicas como a do pato da Fiesp e a necessidade de o Brasil implementar o imposto sobre grandes fortunas e heranças, além de outras medidas para melhorar a tributação no país.
Um trecho da entrevista:
Quais mudanças no sistema tributário estão sendo discutidas hoje no Congresso Nacional?
A carga tributária é alvo de vários projetos de lei e o mais recente está naComissão Especial da Reforma Tributária. Já há um relatório escrito, mas que ainda não foi lido em plenário. Pelo que já tivemos acesso desse relatório, ele é uma cópia do discurso da Fiesp. Diz que o sistema tributário é regressivo, precisa reduzir impostos sobre consumo e para por aí. Não há proposta de redistribuição. A proposta, portanto, é reduzir a arrecadação e o Estado. Com isso, uma série de direitos serão cortados da Constituição.
Como resistir a esses ataques e propor um sistema tributário mais justo?
Há resistência no Congresso. Conseguimos segurar o processo na comissão, fizemos audiências públicas, conversamos com deputados que querem revogar a isenção de impostos sobre lucros e dividendos. Mas o grande instrumento é o voto. Não votar em quem faz o discurso de uma mera redução de impostos, que é algo danoso para o país. A questão é saber se será possível travar esse debate com uma mídia tão concentrada. Os meios de comunicação também não têm interesse no ajuste da carga tributária porque teriam que contribuir muito mais do que fazem hoje.