Por Alessandra Cardoso, assessora política do Inesc
Para tentar rebater as críticas de organizações socioambientais repercutidas pela imprensa sobre a tramitação da Medida Provisória 558 (MP 558) , o Instituto Chico Mendes (ICMbio) publicou nota intitulada “MP compensa áreas suprimidas de UCs na Amazônia”. Na visão deste instituto as alterações dos limites de sete Unidades de Conservação da Amazônia para viabilizar cinco Usinas Hidrelétricas na Amazônia trarão um “ganho líquido” de 144.404 hectares, já que serão retirados 146.629 hectares para efeitos de produção de energia, mas, serão incorporados outros 291.033 hectares em dois Parques – Parque Nacional da Amazônia e Parque Nacional dos Campos Amazônicos
Em outras palavras, o ICMBio, órgão que tem como missão proteger o patrimônio natural e promover o desenvolvimento socioambiental, nos induz a pensar que o que se perde com a redução das Áreas Protegidas será compensado com a incorporação de hectares em dois outros Parques, também afetados pela mesma MP.
Na conta apresentada por este órgão, os 56.930 hectares excluídos (correspondentes a três Florestas Nacionais e a uma Área de Proteção Ambiental com o objetivo de viabilizar as hidrelétricas de São Luiz e Jatobá, no rio Tapajós) serão compensados pela ampliação de dois outros Parques Nacionais.
O Parque Nacional dos Campos Amazônicos, em Rondônia, apesar da inclusão de novos 184.615 hectares terá outros 34.149 hectares reduzidos para viabilizar a hidrelétrica de Tabajara. E o Parque Nacional de Mapinguari, também em Rondônia, terá uma redução de 8.470 hectares para viabilizar o enchimento dos reservatórios das hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio.
Enfim, a MP 558 promove um vasto pacote de alterações de limites de Unidades de Conservação com o objetivo de viabilizar o aproveitamento hidrelétrico de 05 das 20 hidrelétricas planejadas ou em execução pelo PAC na Amazônia. O que nos leva a conclusão de que outros pacotes da mesma natureza ainda virão, resultando na diminuição de Unidades de Conservação.
Um dos grandes absurdos desta MP, ampliado pela nota matemática do ICMbio, é a ausência de discussão séria, subsidiada por estudos e informações relevantes sobre o significado ambiental e social destas reduções e mesmo das ampliações. Simplesmente, não existem ou não estão apresentadas informações sobre os impactos deste “tira e põe” de hectares.
O que se perde com a redução de 56.930 hectares nas Florestas Nacionais de Itaituba I, II, Crepori e Área de Proteção Ambiental do Tapajós? Esta perda se somará a outras advindas das pressões sociais e econômicas trazidas pela construção das hidrelétricas do Tapajós? Que impactos em Unidades de Conservação as demais hidrelétricas previstas na bacia do Tapajós trarão? O que isto irá significar do ponto de vista dos nossos compromissos assumidos de redução de emissões de CO2?
Mesmo do ponto de vista da ampliação, são muitas as questões a serem levantadas: Qual a situação dos 184 mil hectares que passarão a compor a área do Parque Nacional dos Campos Amazônicos? A mesma pergunta deve ser feita em relação ao Parque Nacional da Amazônia que incorporará outros 106.418 hectares. Quem são os ocupantes destas áreas públicas? Desde quando estão lá? Quais conseqüências da MP em questão para a vida destas pessoas? Questões como estas estão longe do debate público que, por sinal, não existe em relação a esta Medida Provisória.
É importante lembrar que a MP 558, assim como a MP 542 que caducou e que teve suas medidas incorporadas no texto da MP 558, já é objeto de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) ajuizada no Supremo Tribunal Federal pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Apesar de tudo, o governo pretende votá-la ainda em março deste ano. Para dar “ares de consulta pública”, a MP558 recorrerá ao mesmo recurso utilizado na MP 542: a convocação de uma audiência pública pelo relator da matéria, Deputado José Geraldo (PT-PA).
É preciso lembrar que a Lei que criou o Sistema Nacional de Unidades de Conservação prevê, além da edição de norma específica, a realização de consulta pública para alteração do limite da Unidade de Conservação com obrigação do Poder Público de “fornecer informações adequadas e inteligíveis à população local e a outras partes interessadas”. Por este motivo, a audiência pública que será promovida pelo relator da matéria, sem estas informações bem como sem representação dos envolvidos e afetados por esta MP, está longe de garantir caráter público à matéria.