O Inesc vem a público, se somando ao movimento indígena, às organizações indigenistas e de defesa de direitos humanos, para reiterar que as medidas prometidas a uma parcela de eleitores e agora praticadas pelo governo brasileiro sob o comando de Jair Bolsonaro afrontam cruelmente os direitos dos povos indígenas, duramente conquistados e assegurados constitucionalmente.
À violência do discurso de campanha se seguiram medidas de desmonte estrutural da política indigenista brasileira, cujo pilar básico é o direito dos povos indígenas às suas terras, sem o que sua autonomia e sua reprodução física e cultural estarão fatalmente inviabilizadas.
Qual o sentido da transferência da atribuição de identificação, delimitação, demarcação e registro das terras tradicionalmente ocupadas por indígenas da FUNAI para o Ministério da Agricultura, expressamente a serviço dos interesses do agronegócio, senão o de inviabilizar de vez processos de demarcação?
Qual o sentido da desvinculação da FUNAI do Ministério da Justiça, seguida da atribuição ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos de uma vaga competência relativa aos “direitos do índio, inclusive no acompanhamento das ações de saúde desenvolvidas em prol das comunidades indígenas, sem prejuízo das competências do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento”?
Desmontar as estruturas responsáveis pela política indigenista e colocar a demarcação sob o julgo de uma estrutura burocrática poderosa e que sempre a combateu serve a que propósito, senão o de destruir aqueles que se considera inimigos? Mas por quê e de quem os povos indígenas do Brasil são inimigos? De onde vem a motivação ideológica e econômica que tem servido para animar o discurso e agora a prática revanchista do governo Bolsonaro?
Tamanha é a violência do discurso e das medidas adotadas pelo governo Bolsonaro já no seu primeiro dia, por meio da Medida Provisória N° 870 de 2019, que não permite outra leitura que não a de que, sim, os povos indígenas estão sendo tratados pelo governo brasileiro como inimigos. Por um governo que deve governar para todas e todos e que tem a atribuição constitucional de proteger os direitos indígenas. Resta saber o quanto os pesos e contrapesos, no Congresso Nacional e no Judiciário funcionarão, para fazer valer a Constituição brasileira.
Da parte do Inesc, que esse ano completa 40 anos de luta pelos direitos humanos, reafirmamos o nosso compromisso incondicional com os povos indígenas, as defesas de seus territórios e modos de existência. Como preconiza o artigo 231 da Constituição federal: “São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.” Não há, portanto, o que que discutir acerca dos direitos dos povos originários. O que nos falta é tirá-los cada vez mais do papel.