O empenho dos ruralistas em colocar em regime de urgência a votação em plenário do Código Florestal indica de que no início da próxima legislatura, em fevereiro, voltará a pressão pela votação do relatório Aldo Rebelo.
Na linha de resistência, os esforços das organizações da sociedade civil contrárias às alterações no Código não têm sido suficientes para “convencer” parlamentares identificados com os interesses do agronegócio a não votarem favoravelmente à proposta, caso ela vá a plenário. Adicionalmente, no trabalho quase cotidiano de monitorar o Congresso e reagir às investidas dos ruralistas, tem havido ensaios no sentido de construir adaptações ao Código que não impliquem em retrocessos, mas este novo rumo para o debate ainda está por vir.
As entidades representativas dos pequenos produtores e assentados de reforma agrária têm demonstrado capacidades diferenciadas de mobilizar suas bases para uma resistência mais explícita às mudanças. Assim como são diferenciadas as reações de suas bases à sedução de se desobrigarem de manter a Reserva Legal. Isto, a despeito da clareza geral de que a medida de desobrigação da Reserva Legal nas propriedades até quatro módulos fiscais, que é de fato a única alteração endereçada especificamente ao pequeno produtor, está a serviço de uma estratégia dos ruralistas de ampliação da base social favorável a todo o pacote de alterações pretendidas.
Esta incerta resistência das entidades parece um reflexo da própria dificuldade de convencer suas bases de que a mudança, além de oportunista, não é uma saída para o pequeno produtor. Em grande medida isto ocorre porque, de fato, é difícil resistir à tentação de apoiarem uma proposta que promete isentá-los do ônus financeiro por ações de desmatamento e da culpa por não cumprirem “as leis”. Ou seja, a irregularidade ambiental da pequena produção é sim um problema que requer uma solução.
Pensando por essa ótica, a construção de uma resistência mais firme a essa proposta de alteração do Código Florestal passa, centralmente, pela capacidade de construir uma alternativa adequada à pequena produção.
Para o pequeno produtor, como já assinala a Via Campesina em sua nota, o caminho da sustentabilidade passa por: “assistência técnica capacitada para o manejo florestal comunitário; crédito e fomento para desenvolvimento produtivo diversificado; recuperação das áreas degradadas com sistemas agroflorestais; planos de manejo madeireiro e não-madeireiro simplificados; canais de comercialização institucional que viabilizem a produção oriunda das florestas”.
Além destes passos, outro que nos parece fundamental hoje, ainda mais diante da crise climática global, é valorizar mais efetivamente a função ambiental da pequena produção. A instituição de uma política de pagamento por serviços ambientais que remunere devidamente e de forma desburocratizada os pequenos produtores pela manutenção das suas Reservas Legais e Áreas de Preservação Permanente é um tema crucial neste debate. É um caminho que já vem sendo trilhado por inúmeras iniciativas, em Minas Gerais, na Bahia, no Espírito Santo; que precisam ganhar força e escala.
A proposta de novo Código Florestal está na contramão desta saída, tanto quanto também estão as duas propostas que tramitam na Câmara sobre Serviços Ambientais (PL nº 792/07) e REDD+ (PL nº 5.586/09), recentemente aprovadas pela Comissão de Agricultura. Estão construídas para compensar os produtores, em especial os grandes, pelo seu esforço de manutenção de áreas de preservação que excedem aquelas legalmente previstas. Por sinal, este é outro elemento que explica o anseio dos ruralistas em reduzir as áreas obrigatórias de preservação.
Fará grande diferença a retomada de esforços conjuntos entre organizações socioambientalistas e entidades representativas de agricultores familiares, camponeses e trabalhadores/as rurais objetivando a construção de alternativas que equacionem melhor a função social e ambiental da pequena produção.
É preciso que o diálogo e a articulação entre esses setores sejam rapidamente fortalecidos e que as falsas contradições sejam superadas em favor de propostas que contemplem os legítimos interesses dos pequenos produtores e a sustentabilidade ambiental.
Por Alessandra Cardoso – assessora do INESC