Crimes de Bolsonaro: mortes por Covid-19, fome e racismo - INESC

Crimes de Bolsonaro: mortes por Covid-19, fome e racismo

21/02/2021, às 20:50 (updated on 12/08/2025, às 11:02) | Tempo estimado de leitura: 7 min
Por Nathalie Beghin, Coordenadora da Assessoria Política

O presidente Bolsonaro é responsável pelas milhares de mortes por Covid-19 no Brasil em função de uma administração federal incapaz de conter a crise sanitária adequadamente e incapaz de imunizar a população brasileira satisfatoriamente. Ademais, sua falta de empatia com os mortos e suas famílias e sua recorrente desqualificação da pandemia e seus efeitos contribuem para que parte da população ignore as necessárias medidas de distanciamento social e de proteção (uso de máscaras, lavagem das mãos), contribuindo para o alastramento da doença. O presidente Bolsonaro é responsável pelo expressivo aumento da fome observado em janeiro de 2021, essencialmente em função da desativação do Auxílio Emergencial. Também é responsável pelo racismo institucional praticado pela sua administração, uma vez que a maior parte das pessoas que morrem de Covid-19 e que passam fome é negra.

O ano de 2021 se inicia com a fome rodando lares de milhões de brasileiros. Segundo a FGV Social, são 27 milhões de pessoas que vivem em situação de miséria, isto é, com uma renda mensal menor do que um quarto de salário mínimo. A pessoa tem pouco mais de oito reais por dia para, além de se alimentar, pagar aluguel, passagem de ônibus, recarga de telefone, remédios, água, luz e roupas, entre outras despesas. Impossível! A conta não fecha.

Para termos uma ideia da dramaticidade da situação, segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o salário mínimo necessário para a população arcar adequadamente com os custos mensais seria de pouco mais de cinco mil reais para uma família de quatro pessoas, o que equivale a uma renda per capita de um salário mínimo, mais de quatro vezes superior à renda das pessoas que vivem na miséria.

O que nos deixa mais atônitos é que o Brasil é o terceiro maior produtor de alimentos do planeta. Produz muito mais do que o necessário para alimentar os mais de 210 milhões de pessoas que habitam seu território. Então, qual o problema?

O problema tem várias causas, mas duas são centrais: as desigualdades que fazem com que essas pessoas não tenham renda suficiente para se alimentar e viver adequadamente e o desmonte das políticas de segurança alimentar e nutricional que, entre os anos de 2003 a 2016, contribuíram para tirar o Brasil do Mapa da Fome das Nações Unidas. As duas causas traduzem a ausência de Estado.

Com efeito, a partir de 2016 se consolida a narrativa de que o Estado no Brasil gasta muito e gasta mal. Por isso foram implementadas medidas, constitucionais, infraconstitucionais e administrativas que diminuíram os recursos para as políticas públicas (Teto de Gastos, contingenciamentos e cortes orçamentários) e que vêm desmontando as instituições de proteção social (reforma trabalhista, reforma da previdência, privatizações, progressiva eliminação da participação social, revisão dos critérios para diminuir o número de beneficiários, fechamento do Ministério do Trabalho e Emprego, entre tantas outras medidas).

No caso específico de políticas de combate à fome, o governo Bolsonaro fechou o Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), conhecido internacionalmente pela sua experiência bem sucedida, bem como desativou o Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), e deixou de consolidar e ampliar o Programa Bolsa Família reconhecido pela sua efetividade no combate à pobreza extrema.

As sucessivas medidas de cortes de recursos públicos e de desmonte das instituições de proteção social afetam proporcionalmente mais os negros, em especial as mulheres negras e, portanto, revelam o perverso racismo da administração Bolsonaro. Isto porque, a absoluta maioria dos que passam fome são pessoas negras.

Note-se, contudo, que o Congresso Nacional é cúmplice desses crimes, pois vem aprovando leis que não só expropriam o povo como excluem milhões de pessoas por causa de sua cor.

A melhor prova dos crimes cometidos pela administração Bolsonaro é o Auxílio Emergencial. Resultado de ampla pressão da sociedade junto ao Congresso Nacional, Bolsonaro teve que implementá-lo, muito a contragosto. Depois, quando viu que renderia votos, reescreveu a história e se apropriou do que não era seu.

O Auxílio teve impacto extremamente relevante na diminuição da miséria e na redução das desigualdades, especialmente em relação as mulheres negras. É o que mostra estudo recente e extremamente interessante e inovador, de Lygia Sabbag Fares, Ana Luíza Matos de Oliveira, Luísa Cardoso e Luiza Nassif-Pires. A partir de dados da Pnad-Covid, a pesquisa apresenta evidências de que a crise econômica afeta desproporcionalmente mais famílias chefiadas por mulheres negras e demonstra a importância que o Auxílio Emergencial teve em mitigar tais efeitos. As autoras mostram que a renda do trabalho de famílias chefiadas por homens brancos, homens negros, e mulheres brancas, respectivamente, chegou a ser 2,55, 1,41 e 1,88 vezes maior que a das famílias chefiadas por mulheres negras em agosto de 2020. Contudo, graças ao Auxilio Emergencial, a renda das famílias chefiadas por mulheres negras tornou-se mais próxima à renda de todos os outros grupos, mesmo quando comparado ao período pré-pandemia.

O que esses dados revelam, para além da importância de programas de transferência de renda para combater a miséria e a pobreza, é que o Estado tem papel central não só no combate à fome, como no enfrentamento das desigualdades estruturais que caracterizam o Brasil: classe, raça e gênero.

É por isso que o ato deliberado de desativar o Auxílio Emergencial deve ser considerado crime de lesa pátria que se soma à responsabilidade pelas mortes de Covid-19, consequências de um governo homicida, sexista e racista, que ofende o Brasil.

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Reforma da Renda é um avanço, mas a justiça tributária ainda está distante

06/11/2025, às 11:08 | Tempo estimado de leitura: 4 min
Nota do Inesc sobre a reforma da Renda aprovada no Senado Federal
Movimentos entregam a Alcolumbre mais de 2 milhões de assinaturas do Plebiscito Popular. Foto: Assessoria PT

Ontem (05/11), o Senado Federal aprovou a reforma da Renda, consolidando o texto do Projeto de Lei nº 1087/2025, que agora segue para a sanção presidencial. A proposta recebeu apenas alterações redacionais, o que dispensa nova votação na Câmara dos Deputados. Trata-se de uma vitória da mobilização popular em defesa de um sistema tributário mais justo e progressivo.

O Plebiscito Popular, do qual o Inesc integra a executiva nacional, teve papel decisivo nessa conquista. Em 103 dias de mobilização, o plebiscito coletou mais de 2,1 milhões de votos em todo o país, expressando o amplo apoio popular à tributação dos super-ricos e à construção de um sistema que reduza desigualdades.
Durante o processo, representantes da articulação se reuniram com os presidentes da Câmara e do Senado, com o presidente Lula, com relatores do projeto e outras lideranças políticas, incidindo de forma determinante para o avanço da proposta no Congresso Nacional.

A mobilização popular foi impulsionada por evidências contundentes das distorções do sistema tributário brasileiro. Segundo dados do Ministério da Fazenda (2025), os 0,01% mais ricos do Brasil — pessoas com rendimentos mensais superiores a R$ 5,3 milhões — pagam, em média, apenas 5,67% de Imposto de Renda efetivo sobre sua renda total . Nesse contexto, a criação de uma alíquota mínima de 10% sobre altas rendas representa uma medida relevante em um país onde os mais ricos contribuem proporcionalmente muito menos do que a maioria da população.

Essa conquista é importante não apenas pelo seu conteúdo, mas também pelo processo de mobilização social e de sensibilização popular sobre a urgência da justiça tributária. Ainda assim, há muito a avançar. A tabela progressiva do Imposto de Renda segue desatualizada e depende da vontade política dos governos para ser corrigida. O imposto mínimo sobre os super-ricos é, como o próprio nome indica, um ponto de partida — ainda muito aquém do que seria justo e necessário.

Os mais ricos continuam amplamente beneficiados por isenções e brechas fiscais, como a isenção sobre lucros e dividendos, o tratamento privilegiado de rendimentos do agronegócio e a subtributação de grandes patrimônios. Enquanto isso, a maior parte da população segue arcando com o peso dos impostos sobre o consumo, que são regressivos e penalizam especialmente as famílias de baixa renda.

A luta por justiça tributária precisa continuar. É essencial:

  • Garantir progressividade real, com quem ganha mais contribuindo proporcionalmente mais;
  • Tributar mais a renda e o patrimônio, e menos o consumo;
  • Atualizar periodicamente a tabela do IR;
  • Rever benefícios tributários ineficientes, que concentram renda e favorecem setores altamente lucrativos, inclusive aqueles que geram impactos negativos à saúde pública e à natureza;
  • Incorporar perspectivas de gênero e raça nas políticas tributárias, como parte de uma agenda de reparação histórica.

A Reforma da Renda é um passo importante, fruto da pressão social e de um debate público cada vez mais qualificado e diverso sobre o sistema tributário brasileiro. Ainda assim, a construção de um país mais justo e solidário depende de um sistema em que cada pessoa contribua de forma proporcional à sua capacidade econômica, assegurando que a tributação seja instrumento de redução, e não de reprodução, das desigualdades.

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