O Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) lançou ontem, durante o International Indigenous Peoples Forum on Climate Change, na COP 26, o estudo Quanto custa tirar um PGTA do papel? (português e inglês), que traz uma metodologia inédita para calcular os custos para se realizar os Planos de Gestão Territorial e Ambiental das Terras Indígenas (PGTA).
A metodologia foi elaborada com base na experiência de cinco PGTAs da Amazônia Legal, mas pode ser expandida para outros biomas. “O objetivo dessa metodologia é que as comunidades indígenas tenham mais uma ferramenta para a captação de recursos para a defesa de seus modos de vida”, explica Leila Saraiva, assessora política do Inesc e autora do estudo.
A iniciativa surge em um contexto no qual a Política Nacional de Gestão Territorial das Terras Indígenas (PNGATI) vem sofrendo com a postura anti-indígena do governo Bolsonaro, e no calor das discussões sobre as estratégias de mitigação das mudanças climáticas, marcada pela realização da COP 26 em Glasgow.
Os PGTAs e as mudanças climáticas
Os PGTAs são instrumentos de planejamento, construídos pelos povos indígenas do Brasil, que sintetizam as demandas e expectativas de suas comunidades. Eles são ferramentas para reivindicar direitos e políticas públicas e têm papel importante na atual crise climática.
“O relatório do IPCC de 2019 demonstra como as políticas que apostam no apoio às comunidades indígenas e outros povos tradicionais são fundamentais para a mitigação das mudanças climáticas. Os povos indígenas são guardiões das florestas. O desmatamento no Brasil foi 20 vezes menor dentro das terras indígenas do que fora delas, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE)”, explica Leila Saraiva.
No entanto, os PGTAs têm sofrido com o subfinanciamento estatal. Não há qualquer menção a eles nos Planos Orçamentários do governo Bolsonaro, como demonstra o estudo do Inesc. Além disso, menos de 1% da Ajuda Oficial do Desenvolvimento para Mudanças Climáticas foi destinada a todos os povos indígenas do mundo na última década – segundo relatório da Rainforest Foundation Norway. Este cenário foi ainda agravado com as dificuldades impostas pelo governo Bolsonaro à chegada de recursos da cooperação internacional para elaboração e implementação de PGTAs, como é o caso do Fundo Amazônia.
“A nossa aposta é em ferramentas como os PGTAs, que se baseiam e reforçam estratégias de comunidades que efetivamente sabem viver junto com seu ambiente e de fato enfrentam as mudanças climáticas, porque acabam tornando-se sumidouros de carbono. É o que estamos chamando de soluções ‘baseadas em territórios’, em contraposição ao carro elétrico, as soluções baseadas na natureza e invenções tecnológicas que, em consonância com um sistema capitalista, são apresentadas como a solução das mudanças climáticas, mas provocam a financeirização da natureza”, defende Leila Saraiva.
Possibilidades de financiamento para os PGTAs
De forma complementar a metodologia que facilita os cálculos dos dos custos de um PGTA, o Inesc também lançou o documento “Possibilidades de financiamento para os Planos de Gestão Territorial e Ambiental das Terras Indígenas”, que traz um apanhado de fontes de financiamento já existentes para a elaboração e implementação dos PGTAs.
Para os indígenas brasileiros, embora a cooperação internacional precise apoiá-los como estratégia global para a mitigação das mudanças climáticas, é preciso que o Estado brasileiro cumpra suas obrigações constitucionais de proteção das terras indígenas.
Neste sentido, o documento aponta, ainda, um caminho de transição para as fontes de financiamento da defesa das terras indígenas. “Nós apresentamos uma possibilidade de futuro, a construção de um fundo de transição que seja inicialmente financiado por fundos da cooperação internacional e até mesmo por fundos privados, mas que possa vir a ser financiado por fundo público, estatal, a exemplo do que acontece com o Fundo Arpa”, explica Leila Saraiva.