Durante a II Jornada sobre o Clima nas Cidades, ocorrido entre os dias 23 e 25 de fevereiro, em Fortaleza (Ceará), promovido pelo Iclei- Governos Locais pela Sustentabilidade, vários gestores públicos de diferentes municípios do Brasil apresentaram estratégias de mitigação e adaptação às mudanças climáticas nas cidades. Afinal, junto com agropecuária e o desmatamento, os transportes e os resíduos também são grandes fatores de emissões de gases de efeito estufa.
De acordo com dados apresentados pelos palestrantes, cerca de 30% dos municípios brasileiros tiveram, em 2015, algum evento climático extremo ligado às mudanças climáticas. E isso precisa colocar todos os entes governamentais em estado de alerta. Em diálogo com a sociedade, devem pensar em formas de redução das emissões, além de proporem políticas que protejam as populações de eventos dessa natureza.
Uma tendência dos governos é pensar em reduzir emissões raciocinando a partir das consequências geradas pelos eventos, no entanto, a desigualdade social nunca é considerada, apesar de as populações de baixa renda serem mais vulneráveis aos efeitos climáticos, por terem dificuldades estruturais de adaptação. Além disso, ainda não discutimos os nossos padrões de consumo, apesar de a maior parte das emissões nas cidades serem oriundas das pessoas que auferem as maiores rendas, tanto com relação à geração de resíduos, quanto com relação à mobilidade.
Em Brasília isso é gritante, tendo em vista que a capital brasileira é o território mais desigual do país, com maior coeficiente de gini (0,57), acima do nacional, 0,49, que já é bastante alto. Apresenta desníveis de renda com enormes variações. Um exemplo disso é a comparação entre Cidade Estrutural e Plano Piloto, a primeira com renda per capita de R$ 378,00 e a segunda com R$ 5.188,00[1], ou seja, quase quatorze vezes maior. Enquanto a Estrutural abriga o maior lixão a céu aberto da América Latina e a maior população de catadores e catadoras de resíduos sólidos do DF, o Plano Piloto é um dos maiores geradores de resíduos da capital, apesar de praticamente não sofrer os impactos ambientais gerados pelos descartes em local não apropriado.
Com relação à mobilidade, os pesos são os mesmos, visto que as regiões mais ricas têm uma frota de veículos particulares muito maior. O Distrito Federal já está com cerca de um milhão e 600 mil veículos individuais e, segundo o IPEA, em Brasília acontece um fenômeno diferente com relação à maior parte das cidades: o crescimento populacional não é do centro para a periferia, mas da periferia para o centro, provocando baixa produtividade dos sistemas de transporte coletivo, que já é de baixíssima qualidade. As populações mais pobres sofrem com uma qualidade de transporte ruim e com um trânsito engarrafado com uma frota crescente de automóveis dividindo as ruas da cidade e emitindo gases de efeito estufa.
Portanto, quando se fala em discutir padrões de consumo é necessário começarmos pelas altas rendas e seus padrões exagerados e não fazer o que sempre se faz primeiro, ou seja, cortar na carne de quem já tem tão pouco.
[1] Dados da Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios- PDAD