O governo anunciou algumas medidas econômicas para segurar a valorização do real frente ao dólar. Entre elas estão duas modificações na área tributária: a isenção do IOF de 0,38% sobre as exportações e a cobrança de uma alíquota de 1,5% de IOF sobre os investimentos estrangeiros que entrarem no país para aplicações em renda fixa. Além disso, anunciou o fim da exigência de cobertura cambial para as exportações, ou seja, a necessidade dos exportadores trazerem as receitas recebidas em moedas estrangeiras para o Brasil.
As alterações na área tributária evidenciam um tratamento privilegiado que o governo concede às diferentes rendas na economia brasileira. Em 15 de fevereiro de 2006, foi editada a Medida Provisória (MP) n.º 281 (convertida na Lei 11.312, de junho de 2006) que reduziu a zero as alíquotas de Imposto de Renda (IR) — antes era 15% —e isentou a CPMF para investidores estrangeiros no Brasil. Os grandes beneficiários pela benevolência tributária do Estado brasileiro com a medida foram (e ainda são) os bancos. Pois, após a edição da MP cresceu o interesse de bancos estrangeiros, com filiais no Brasil, em captar recursos no exterior vinculado ao comportamento do Real. A operação é a seguinte: os bancos emitem títulos em reais fora do país pagando juros abaixo do Depósito Interfinanceiro (DI) e depois ingressam com esses recursos como investidores estrangeiros no Brasil, comprando títulos públicos que financiam a dívida. Em bom português é a política econômica favorecendo os rentistas que vivem de juros dos papéis da dívida pública brasileira.
A combinação de elevadas taxas de juros (a mais altas do planeta) e de um paraíso tributário para especulador estrangeiro permitiu a enxurrada de dólares em aplicações de curto prazo no país. O resultado é uma forte valorização do real frente ao dólar, que tem como conseqüência a perda de competitividade dos produtos brasileiros no exterior, trazendo efeitos negativos sobre a balança comercial (a diferença entre exportações e importações) e o saldo de transações correntes.
As medidas adotadas são paliativas, pois o que atrai recursos especulativos ao país é a elevada taxa de juros praticada pelo Banco Central do Brasil – Bacen e, ao que tudo indica, será elevada em abril, na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom). No tocante à questão tributária, apesar do importante retorno da taxação do investimento estrangeiro especulativo, com a cobrança de 1,5% de IOF sobre o valor do capital principal, a medida não retoma o mesmo patamar de incidência tributária existente em 2006 (15% de Imposto de Renda e 0,38% de CPMF) . O Brasil continua concedendo um tratamento tributário desigual às diferentes espécies de renda (juros, lucros, dividendos e salários). Assim, o especulador estrangeiro continuará pagando menos imposto que o trabalhador brasileiro.
O ministro da Fazenda também anunciou suas preocupações em não permitir déficits nas contas externas. O governo poderia começar a concretizar suas intenções revogando o artigo 10 da Lei 9.249/1995 que isentou de Imposto de Renda (IR) a renda dos capitalistas com a distribuição de lucro e dividendos, incluindo as remessas para o exterior. Neste particular, os dados do Banco Central revelam que a remessa de lucros e dividendos ao exterior alcançou, em 2007, o montante de US$ 22,4 bilhões, o maior volume desde 1947.
Em 2008, o Brasil voltará a depender de capitais estrangeiros para financiar as contas externas, pois a era de superávits em conta corrente chegou ao fim. As contas correntes são integradas pelo somatório da balança comercial, das transferências unilaterais (donativos) e da conta de serviços e rendas (lucros, dividendos, aluguéis, salários. O saldo de transação corrente vai ser a diferença entre o que Brasil enviou de recursos ao exterior e o que recebeu nessas contas. Esse resultado foi negativo em US$ 4,2 bilhões no mês de janeiro/2008, acumulando saldo negativo de US$1,2 bilhão, equivalente a 0,09% do PIB, nos últimos doze meses. A principal razão desse saldo negativo foi a elevada quantia enviada ao exterior em forma de lucros, dividendos e juros. O Bacen projeta para 2008 um déficit em conta corrente de US$ 3,5 bilhões.
Como as remessas de lucros e dividendos estão isentas de imposto de renda, o Brasil vem abrindo mão de receitas tributárias em favor da renda do capital. Houve época em que a taxação sobre essas transferências internacionais chegou a 25%, na época de edição da Lei 9.249/95 a alíquota era de 15%. Convertendo o valor de US$ 22,4 bilhões à taxa de câmbio média de 2007, chega-se ao montante de R$ 43,5 bilhões, que se fossem tributados com uma alíquota de 15% possibilitaria uma arrecadação tributária de R$ 6,5 bilhões.
No aspecto macroeconômico, o fim da cobertura cambial vai trazer implicações negativas para economia brasileira. O Bacen poderá ter dificuldades para formar reservas internacionais, já que o volume de dólares deixados pelos exportadores brasileiros no país será menor. Até fevereiro/2008, 33 grandes corporações já tinham aberto contas no exterior para aproveitar a regra, até então vigente, que permitia deixar até 30% das receitas com exportações no exterior. Além disso, o comportamento dos exportadores poderá seguir o mesmo padrão dos especuladores, que irão avaliar a partir agora a diferença entre juros internos e externos, a expectativa do câmbio futuro (Real/Dólar) e o risco de quebra do país. Com isso, restará como caminho principal na atração de dólares para financiar as importações, a manutenção de elevadas taxas de juros.
Por fim, o IBGE anunciou que Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 5,4%, a maior elevação de 2004, alcançando R$ 2,6 trilhões. A renda per capita também subiu 4%, com isso, estima-se a renda média dos brasileiros foi de R$ 13,5 mil, em 2007. Convém ressaltar que a renda per capita é uma média, o que esconde a enorme concentração de renda vigente no país, que só é comparada a de alguns países da África Subsaariana, uma das regiões mais miserável do mundo. Junto com os resultados do PIB, foi o anunciado o aumento recorde de 9,1% na tributação sobre produtos, reforçando a necessidade que a reforma tributária altere a marca indelével do sistema tributária brasileiro: a regressividade. Essa característica é resultado da concentração da arrecadação tributária sobre consumo, com os mais pobres pagando mais impostos que os mais ricos. Está na hora de submeter os rendimentos do capital (juros, lucros e dividendos) a tabela progressiva do imposto de renda, pois a atual legislação tributária trata de forma benevolente a renda dos capitalistas comparativamente à dos trabalhadores, ferindo a isonomia prevista na Constituição Federal. Com isso, fazer justiça tributária e distribuição de renda no país da concentração de renda e riqueza.