Por Gláucia Chaves, do Correio Braziliense.
Em sua recente visita ao Brasil, o sociológo francês Michel Maffesoli afirmou que estamos vivendo a “era dos sentimentos”. Antigos paradigmas estão sendo quebrados, conceitos como “sucesso” e “felicidade”, sendo ressignificados. Para ele, a competitividade está dando lugar ao espírito coletivo. Diversidade e respeito às diferenças hoje falam mais alto que o individualismo. Muita gente concorda com Maffesoli e o pensamento de que vivemos em uma era “líquida”, como prega o filósofo Zygmunt Bauman, começa a chamar a atenção. O mundo em rede, quando adaptado para a vida profissional, também ganha um nome: economia colaborativa.
Os adeptos dos novos vínculos de trabalho têm um perfil específico: não querem apenas trabalhar, querem algo que faça sentido. Querem trocar ideias, experiências, economizar, preservar o meio ambiente e, claro, ganhar dinheiro. As relações econômicas também mudaram. Há algumas décadas, o caminho de um profissional de sucesso era escalar cargos dentro de uma mesma empresa até chegar à chefia — ainda que, para isso, esse indivíduo tivesse que permanecer na mesma organização por toda a sua vida profissional. Hoje, a sociedade parece querer redefinir o próprio conceito de ser bem-sucedido.
Rotatividade de empregos, habilidades múltiplas, parcerias e a busca por ofícios que fazem sentido para o trabalhador são a nova ordem. A era comandada pelos afetos, de acordo com estudiosos do tema, já começou. Escolhemos alguns poucos exemplos que estão fazendo a diferença em Brasília. Vamos conhecer juntos?
Por fora, a casa não tem nada de diferente das outras da Cidade Estrutural: paredes sem reboco, a poeira vermelha na porta. Por dentro é que a coisa se transforma. O Coletivo da Cidade funciona como um espaço de aprendizagem que reúne vários outros coletivos e iniciativas sociais. Jaqueline de Sousa, 30 anos, faz parte da coordenação do trabalho pedagógico do coletivo. Há cinco anos, quando o projeto começou, ela explica que o trabalho consistia basicamente em minicursos para crianças e adolescentes sobre idiomas, desenho, grafite, direitos humanos e outros temas de interesse da comunidade.
O projeto nasceu como uma continuidade de outro trabalho, que atendia pais e filhos para a criação de vínculos e melhoria da convivência familiar em comunidade. Desde 2012, em parceria com a Secretaria de Estado de Trabalho, Desenvolvimento Social, Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos (Sedestmidh), o espaço funciona com sala de aula para meninos e meninas de 6 a 15 anos, no período em que os jovens não estão na escola. Atualmente, a parceria mais forte é com o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc). “Eles se aproximaram da gente com uma proposta de construção coletiva do projeto Observatório de Crianças e Adolescentes, o Oca”, detalha Jaqueline.
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A perspectiva do Oca era fortalecer a metodologia do Coletivo, que se propõe a transformar os jovens em protagonistas de suas próprias vidas. “É trabalhar o olhar deles na comunidade, para que possam monitorar o território, intervir, reconstruir juntos, acreditando no potencial de transformação que eles têm.” O trabalho do coletivo funciona a partir das chamadas rodas de aprendizagem. Cada uma contempla um eixo do saber, como criar, cuidar, conviver e brincar. Cada um dos verbos tem atividades específicas que contribuirão para que os saberes dos jovens sejam desenvolvidos. “Fomos amadurecendo isso e, hoje em dia, temos trabalhos bem concretos das crianças e adolescentes que se organizam em torno dessas rodas”, completa.
Os projetos feitos pelos integrantes do coletivo vão de objetos a videoclipes, passando pela produção de um jornal, o Voz da Quebrada, e até mesmo intervenções literais, como o projeto Beco da Esperança. A ideia deste último foi transformar um local sujo, cheio de lixo e perigoso em uma horta comunitária. “Os adolescentes foram especialmente protagonistas nesse processo de diálogo com a comunidade”, completa Jaqueline. Foram eles, inclusive, os responsáveis pelas reuniões com vizinhos, pelo planejamento, proposta, captação de parceiros e diálogo com representantes governamentais. Ajudá-los a encontrar os próprios caminhos é o principal objetivo da iniciativa, mas apurar o olhar dos mais novos para o mundo ao redor é tão essencial quanto o protagonismo. “Queremos que eles saiam dessa perspectiva de estudar para sair daqui. Aqui é um território de possibilidades, mas do que de problemas. O que temos que fazer é enxergar juntos.”
Cleo Manhas faz parte de um dos projetos desenvolvidos no Coletivo da Cidade. A assessora política do Inesc explica que um deles é o Mapa das Desigualdades, um levantamento para esquematizar a quantas anda a saúde, a educação, a mobilidade e outros indicadores das diferentes regiões do Distrito Federal. “A ideia é atuar pelo direito à cidade, torná-la mais democrática, sem tanto distanciamento entre o centro e a periferia”, explica. Outro projeto atuante no coletivo é o Engenheiros Sem Fronteiras, iniciativa internacional exportada para cá graças ao idealismo do estudante da Unb Tales Ferreira, 24 anos. “Trouxemos alguns projetos que já estavam sendo feitos em outros lugares, como as oficinas de sabão ecológico, de ciência para crianças e de aquecedores de chuveiro”, lista.
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Vamos aproveitar para falar mais sobre crianças, adolescentes e jovens?