Inesc participa do Fórum Social das Resistências 2020

Nesta semana, os membros do colegiado de gestão do Inesc, Iara Pietricovsky e José Antônio Moroni, vão a Porto Alegre (RS) e região metropolitana contribuir com as discussões do Fórum Social das Resistências, evento que compõe o processo do Fórum Social Mundial.

Com o lema “Democracia, Direitos dos Povos e do Planeta”, organizações e movimentos sociais do Rio Grande do Sul e do Brasil estarão reunidos entre os dias 21 e 25/01, debatendo estratégias de articulação, ações e iniciativas de resistência frente aos avanços de movimentos fascistas e antidemocráticos no Brasil e no mundo.

Agenda Inesc

Iara Pietricovsky é uma das painelistas da mesa “Direitos do planeta e os bens comuns”, que acontece na quinta-feira (23), em São Leopoldo, no Auditório Central da Unisinos, às 9h. Iara é também presidenta da Forus International e integra a direção executiva da Abong.

José Antônio Moroni vai acompanhar as atividades promovidas pelo Conselho de Educação Popular da América Latina e Caribe (CEAAL), do qual o Inesc é integrante. São elas, a atividade de convergência “Educação universal, democrática e libertadora”, que acontece na quarta-feira (22), no auditório do Simpa, às 9h; e  os “Diálogos da Educação Popular”, na sexta-feira (24), às 10h, no auditório CAMP. José Moroni também vai participar de debates sobre democracia, reforma política e conjuntura.

Saiba mais sobre a 2ª edição do Fórum Social das Resistências e confira a programação completa.

Ser menina é (e sempre foi) muito perigoso no Brasil

Estupro coletivo não é novidade do século 21, não é novidade no país. No Brasil colônia, o estupro era prática cotidiana compreendida como direito por senhores de escravos que violentavam diuturnamente negras e indígenas. O estupro que deu origem à mestiçagem brasileira foi ignorado por muito tempo e a mistura de raças foi amplamente difundida como  fruto de uma cordialidade do povo brasileiro. Cordialidade esta revestida com muito sangue e lágrimas.

Prática comum no cangaço, as meninas, assim como mulheres e idosas, eram alvo de uma macheza covarde, brutal e bestial. Arrancadas de casa ainda meninas (até crianças), eram violentadas até o limite que seus corpos suportavam, não raras vezes por muitos homens, como narra Adriana Negreiros no livro Maria Bonita, Sexo, Violência e Mulheres no Cangaço (2018).

Assim como o estupro coletivo não é recente, também não é fenômeno que podemos localizar somente no campo de uma direita misógina. Refazendo o caminho da Coluna Prestes, Eliana Brum, jornalista e escritora, registra histórias de estupro, saques, assassinatos e tortura – em entrevista a Antônio Abujamra em 2013.

Morte decretada via Facebook

A mais nova modalidade de violência contra meninas de que se tem notícia no Brasil é a execução de adolescentes no Ceará anunciada nas mídias sociais por meio de falsos perfis. Facções criminosas, por um motivo ou outro, decretam pelo Facebook quem deve ser eliminada. As meninas são arrancadas de casa, torturadas com requintes de crueldade e depois brutalmente assassinadas após estupros coletivos.

Percebe-se, portanto, que o estupro é uma prática aceita culturalmente desde que o Brasil é Brasil. A prática perpetua-se por gerações de tal modo que a violência chega a ser invisibilizada por sua naturalização. Há, no mínimo, uma permissão silenciosa; um encorajamento coletivo com inúmeros episódios ‘autorizados’ ou cometidos por juízes, parlamentares e outras autoridades públicas, como prefeitos, médicos e professores. Os exemplos são muitos.

Em comum, nota-se uma desqualificação das mulheres/meninas com termos que remetem à sua sexualidade e ao desejo. Hipócritas, “homens de Deus” as desejam e as desprezam e violentam-nas com suas consciências tranquilas.

A violência contra meninas ganha novos contornos e elementos como uso das redes sociais e o envolvimento do crime organizado, além da desqualificação das mulheres em discursos e pronunciamentos oficiais. “Não estupro você, porque você não merece”, disse o então deputado federal Jair Bolsonaro, hoje presidente da república, como se tal violência pudesse ser admitida em alguma circunstância.

Confusão entre Estado e religião agrava violência

Segundo a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, conhecida por exaltar o sexismo, na ilha do Marajó meninas são estupradas porque não usam calcinha. Sem qualquer preocupação em analisar a complexidade do problema, responsabiliza as próprias vítimas pelo estupro. Nesse sentido, a estratégia para enfrentar o problema pode ser reduzida ao fornecimento de peças íntimas às crianças e os agressores saem ilesos. Já na ONU, na Comissão de Direitos Humanos, o discurso da ministra se restringiu a uma fala genérica pela perspectiva moral e religiosa, se alinhando aos países mais conservadores do mundo e negando todos os tratados de direitos humanos dos quais o Brasil é signatário.

A confusão entre Estado e religião sempre prioriza pautas de costumes e de controle dos corpos femininos. Evita uma abordagem direta sobre os problemas, portanto, não se age sobre as causas e a tendência é o agravamento das violências.

Pesquisas mostram que o assassinato de meninas tem crescido vertiginosamente no país. Dados do Comitê Cearense pela Prevenção de Homicídios na Adolescência (CCPHA), instituído pela Assembleia Legislativa do Estado do Ceará (AL-CE) – relatório de 2018 – revela que homicídio de meninas cresceu mais de 400% em Fortaleza.

Diante de problemas de tal gravidade é imprescindível que se reúna esforços para prevenir violências, responsabilizar agressores, acolher e cuidar das vítimas. Para isso, se faz urgente determinação política para se estudar as violências e elaborar plano de enfrentamento com um desenho complexo abarcando toda a sociedade brasileira, especialmente as políticas públicas. Todos os segmentos da sociedade devem ser envolvidos para coibir a violência do estupro e a morte por violência, em especial de crianças e adolescentes que têm tido suas vidas exterminadas pela violência. Crianças e adolescentes negras, moradoras das periferias têm suas vidas ameaçadas diariamente.

Todas as vidas importam, vidas negras importam, vidas de meninas importam. O alerta foi dado.

Ano novo, tarifa nova (mais cara, como sempre)

Hoje o Distrito Federal (DF) amanheceu com passagens do Transporte Público Urbano (TPU) 10% mais caras. A justificativa do governo é a de que “é preciso melhorar as contas e manter o sistema em pleno funcionamento”. Na argumentação, o GDF informa que em 2019 o recurso dado às empresas para subsidiar a tarifa foi de R$ 700 milhões, o que não se sustenta quando analisamos o orçamento executado.

Esse total equivale a todo o programa orçamentário mobilidade integrada e sustentável, conforme dados da tabela 1. O que o governador Ibaneis joga na conta da subvenção é, na verdade, os recursos para toda a infraestrutura do TPU, como corredores exclusivos de ônibus e manutenção dos terminais rodoviários, por exemplo.

O montante que o governo dá para as empresas de transporte como subsídio, a chamada “Manutenção do Equilíbrio do Sistema”, é uma cifra muito menor, R$ 175 milhões. Com o aumento da tarifa, o governo projeta economizar cerca de R$ 160 milhões, ou seja, estão, na prática, retirando o subsídio.

Reforma da rodoviária do Plano Piloto

Ao observar a tabela do orçamento, verificamos também que se gastou cerca de R$ 1,3 milhão com a reforma da rodoviária do Plano Piloto. Contudo, há meses as escadas rolantes e elevadores não funcionam, constrangendo e tornando inviável o deslocamento de pessoas com deficiência e idosos, que têm muita dificuldade para acessar o terminal. Limpeza e conservação é algo que não existe. Outra questão é a superlotação e a precariedade dos veículos. Argumentam que as empresas tiveram de gastar mais com ônibus com portas dos dois lados por conta da Estrada Parque Taguatinga (EPTG), algo que estão devendo à população há oito anos e para a qual as empresas não pagaram multa por não respeitarem as regras contratuais.

Embarque por direitos

Ao mesmo tempo em que aumentam a tarifa, justificando que não podem subsidiar as passagens e a própria infraestrutura, reduzem o IPVA, favorecendo e incentivando os automóveis individuais motorizados. Essa política vai na contramão de todas as tendências internacionais que, por motivos sociais e ambientais, tentam reduzir a emissão de gases de efeito estufa.

Em consonância com esse esforço mundial para incentivar o transporte coletivo,  lançamos em outubro de 2019 a campanha “Embarque por Direitos”, pela regulamentação do transporte como direito social. Apresentamos uma proposta de fundo de financiamento ao TPU, que propõe que o coletivo seja financiado pelo individual, por meio de novas alíquotas para os impostos IPTU, IPVA, ICMS da gasolina, de maneira progressiva (quem tem maior renda paga mais).  Este fundo solidário com recursos municipais, estaduais e nacionais permitiria a não tarifação, ou tarifa zero. O que pretendemos é mostrar que é viável transformar o transporte em política pública de fato, ao contrário da política desenvolvida pelo governo Ibaneis, onde o transporte individual motorizado continua sendo priorizado.

O transporte público é um dos itens que mais pesa no orçamento das famílias de baixa renda, que muitas vezes não conseguem procurar emprego por não terem condições de pagar a tarifa. Além de pesar mais nas costas dos trabalhadores informais em tempos de desemprego. Na zona rural em Brasília, por exemplo, mesmo que seja circular interno, a tarifa é a mais alta, R$ 5,50, sem fiscalização por parte do poder público, que deixa todo o sistema por conta das empresas de transporte. Não há transparência com relação à composição tarifária, o valor da tarifa técnica é dado sem que a população acompanhe ou tenha conhecimento de como é feito o seu cálculo.

O Conselho do Transporte Público Coletivo do DF existe, mas sem poder, pois o aumento foi apresentado aos conselheiros dias antes da implantação e, mesmo com voto contrário, foi imposto à população. Então, nem mesmo um conselho pouco representativo tem voz de fato. Não há espaço de participação para a população que utiliza o TPU diariamente.

Seguimos com tarifas altas, qualidade baixa, população desassistida, ampliação de vantagens para a parte da população com maiores rendas e vida dura para quem tem menos, como sempre, aprofundando ainda mais as desigualdades gritantes.

Pouco divulgada, Cúpula dos Povos chilena privilegiou o diálogo com o contexto político local

Entre os dias 2 e 8 de dezembro aconteceu, em Santiago, Chile, a Cúpula dos Povos, evento anual promovido por movimentos sociais e representantes da sociedade civil global como um contraponto à Conferência das Nações Unidas sobre o Clima (UNFCC), onde atuam os governos signatários do Tratado de Paris sobre o Clima, assinado em 2015.

Também conhecida como Conferência das Partes, ou COP, a edição de 2019 foi, desde o início, marcada por uma série de revezes e, finalmente, entrou para a história pela incapacidade das delegações presentes em fecharem acordo sobre um dos pontos mais polêmicos e centrais à arquitetura da governança climática.

Já a Cúpula chilena ficou marcada por intensos protestos e graves denúncias de violações de direitos humanos.

Idas e vindas da COP 25

A Conferência do Clima da ONU discute a crise climática e busca engajar os países no combate ao aquecimento global. Trata-se de um fórum no qual os países se reúnem para discutir medidas de adaptação e mitigação frente às ameaças trazidas pela elevação das temperaturas no planeta.

A 25ª edição da conferência teve uma execução conturbada. Em 2018, logo após as eleições, o presidente Jair Bolsonaro declarou que o Brasil não presidiria nem sediaria, como fora previsto em edições passadas, o evento. Em novembro daquele ano, o governo brasileiro iniciou negociação com o chileno para que o país vizinho assumisse a Conferência. Um mês depois, a decisão foi tornada pública, em um contexto de reconfiguração da aliança continental dos governos de direita e crise dos progressismos latino-americanos.

No entanto, em 31 de outubro de 2019, a praticamente um mês da data prevista para o início da COP, a explosão de uma revolta popular no Chile impôs novo recuo para a realização do evento. Alegando questões de segurança, o Presidente do Chile, Sebastián Piñera,declarou incapacidade para sediar a Conferência em seu país.

Considerou-se, então, momentaneamente, transferir a COP para Bonn, na Alemanha, cidade-sede do secretariado da UNFCCC e onde ocorrem as reuniões preparatórias para o encontro anual. A medida, no entanto, não foi necessária. Uma rápida movimentação do primeiro-ministro da Espanha, Pedro Sanchez, em articulação com o presidente chileno, alterou, mais uma vez o cenário. Com o aval do secretariado da UNFCCC, Madrid foi declarada cidade-sede da Conferência, porém sem reclamar a sua presidência. Esta continuou com Chile, num ato atípico para a história das COP.

O impacto da transferência para a sociedade civil

A Cúpula dos Povos reúne movimentos sociais e ONGs de distintas partes do mundo. Por isso, este pode ser considerado um momento importante para a formação política e intercâmbio de experiências entre as organizações. A sua realização mobiliza grandes esforços tanto para garantir a infraestrutura do evento quanto para assegurar a presença dos participantes no país-sede, onde se promove um conjunto variado de atividades entre debates, intervenções públicas e ações de incidência, além de uma marcha que tem o objetivo de compartilhar com a sociedade o resultado dos dias anteriores de trabalho.

Levando-se em conta o contexto político, optou-se pela realização de duas Cúpulas dos Povos: Uma no Chile, em caráter de solidariedade à mobilização social em curso no país, e outra, em Madrid, cujo objetivo seria acompanhar mais de perto as negociações oficiais e pressionar os governos no sentido da justiça socioambiental.

O resultado desta divisão foi a invisibilidade do primeiro processo, além do esvaziamento de ambas as Cúpulas, na comparação com anos anteriores. As agendas apertadas de final de ano e os altos custos para remarcação de passagens aéreas e hospedagem, reduziram a participação da sociedade civil no evento e levaram ao cancelamento de muitas das atividades previstas.

Para o que ficou de pé, foram realizados debates de alto nível, obtendo-se, ainda, avanços relevantes no que se refere à articulação da sociedade civil em nível global e, particularmente, à divulgação das denuncias relativas a conflitos por terra, ataques a etnias indígenas e a grandes empreendimentos em áreas de florestas preservadas. De modo geral, a democracia e a redução do espaço democrático para a atuação da sociedade civil também foi um assunto de destaque.

Cúpula no/do Chile

Na data de início da Cúpula, o Chile entrava na sua sétima semana de protestos, totalizando quase 50 dias de ocupação das ruas da capital Santiago. A desaprovação do presidente chegou a 84% e o apoio às mobilizações variava, a depender da empresa de pesquisas consultada, entre 70 e 90%. A cidade vivia um clima de entusiasmo, que levou a uma atmosfera amena, de gentileza, solidariedade e esperança, em que pese a força da indignação que pairava no ar.

As reivindicações dos manifestantes envolviam, concretamente, o sistema privado de aposentadorias, educação e saúde, expressando-se, ainda, de modo difuso como descrença em relação à política institucional e aos políticos profissionais. Corria as ruas o burburinho de que o modelo para um projeto neoliberal latino-americano havia ruído.

Ao longo das mobilizações, Piñera adotou medidas para contornar a insatisfação popular. As ruas não cederam. Os chilenos seguiram seu cronograma de manifestações diárias. Finalmente, o presidente abriu o sistema político chileno a uma Assembleia Constituinte. Esta agenda foi amplamente aceita pela população, que passou a se organizar para monitorar e incidir sobre o processo Constituinte.

Neste ponto incidiu a Cúpula. A intensidade do cenário local tornou impossível resistir ao enfoque no processo político chileno, embora esta já fosse uma tendência observada ao longo da preparação do encontro. Assim, a Cúpula acabou se tornando um espaço (riquíssimo) para o compartilhamento das experiências regionais, bem ou malsucedidas, em relação a constituintes recentes, como nos casos da Bolívia, do Equador e da Venezuela.

Neste sentido, um aspecto trazido pelos debates durante a Cúpula foi a responsabilidade política que, agora, cai sobre os ombros da sociedade chilena. Isto porque, o processo Constituinte deflagrado no país será o primeiro após o ciclo progressista, dos governos de centro-esquerda na região, e acontece num cenário de ascensão da extrema direita no mundo.

Como produzir uma Constituição cidadã, capaz de contemplar os direitos dos povos e da natureza, é um resumo possível para as discussões ocorridas no âmbito do encontro. Mais do que um evento que aconteceu no Chile, a Cúpula dos Povos foi plenamente apropriada pelos chilenos e posta a serviço das preocupações políticas locais.

Aqui, outro aprendizado: prevaleceu o olhar enraizado no território para o debate climático, a partir da vida e da experiência dos sujeitos políticos, o que favoreceu uma abordagem transversal dos temas debatidos do local ao global.

Ainda naquela semana, deputados chilenos, com apoio da oposição de esquerda, aprovaram um projeto de lei que criminaliza os protestos. No dia 13 de dezembro, a ONU divulgou relatório que confirmou graves denúncias sobre violações de direitos humanos – incluindo mortes, estupros e tortura de manifestantes – sob comando do governo. O relatório foi divulgado em meio a discussões dos chefes de Estado na COP 25, em Madrid.

Em Madrid, organizações brasileiras tiveram destaque

Em Madrid, organizações brasileiras organizaram evento em defesa dos povos e comunidades tradicionais da Amazônia e pelo Bem Viver. APIB, Grupo Carta de Belém, FASE, Coletivo pelos Direitos no Brasil – Madrid e Maloka denunciaram os retrocessos socioambientais promovidos pela gestão Bolsonaro. Desmonte das políticas públicas para o setor, perseguição política, intensificação dos conflitos agrários e assassinatos de indígenas foram temas do debate.

Nesta edição do evento, a sociedade civil teve o seu acesso aos espaços de negociação restringido. No passado, as organizações sociais, assim como os empresários, compunham a delegação brasileira ao lado dos diplomatas e dos representantes do Executivo. Sob esta condição, embora os representantes não-governamentais não tivessem voto nos principais espaços de discussão, havia certa liberdade para circulação dentro das instalações do evento e, consequentemente, para o acompanhamento dos debates e articulações políticas.

Em 2019, o governo brasileiro não admitiu representantes não-governamentais como membros da sua delegação, restando-lhes o status de “observadores”, com acesso bem mais reduzido no que se refere aos espaços da Conferência. Além disso, do ponto de vista da transparência e da participação democrática, o governo brasileiro não se preocupou em garantir espaços para diálogo e repasses relativos à negociação.

Contudo, este cenário não pode ser considerado surpreendente, entre outras coisas, porque segue a quebra de uma rotina estabelecida de consultas entre os negociadores brasileiros e a sociedade civil. O próprio Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas foi enfraquecido nesta gestão. O atual governo ignora que a construção de um processo doméstico, prévio à realização da Conferência, ou seja, de concertação Estado-sociedade, foi um fator de projeção internacional do país e serviu à redução dos custos de internalização dos acordos externos, contribuindo para uma ação internacional robusta da diplomacia brasileira na agenda climática global.

O encerramento da COP 25

A COP 25 será lembrada como um ponto de inflexão na história da diplomacia brasileira nas COP. Talvez seja possível dizer que esta edição marca o pior desempenho da diplomacia nacional desde o início do evento, há 25 anos. A imprensa internacional fez questão de noticiar a impostura do governo brasileiro, que obstruiu a negociação para um, quase literal, recolhimento de dízimo com base nos resultados de mitigação do país.

Mesmo diante da patente piora dos resultados de mitigação e escandaloso aumento das queimadas e desmatamento, o governo chegou a Madrid para pressionar quanto à possibilidade de legalizar e expandir os negócios com créditos de carbono. No Tratado de Paris, essa possibilidade é regulada pelo Artigo 6º, particularmente, pelos incisos 6.2 e 6.4. Essas linhas regem a introdução de mecanismos de mercado para “abordagens cooperativas”, ou seja, offset, no jargão. Isso significa que se permite a transferência dos resultados de mitigação de um país para outro.

Quando a imprensa menciona a falência do processo negociador da COP 25, refere-se, em especial, ao fechamento da regulamentação do artigo 6º. Do ponto de vista dos movimentos sociais, a dificuldade para concluir um acordo em torno desse ponto pode ser visto por um viés positivo, ainda que por linhas tortas. Pois a posição histórica do campo crítico no debate climático é de rejeição à introdução dos mecanismos de mercado para offset propostos em Paris, conforme se pode ler na nota lançada pelo Grupo Carta de Belém. Esta era a postura historicamente defendida pelo Itamaraty até então.

Embora não tenha sido possível concluir a negociação pertinente ao funcionamento do Tratado de Paris, 2020 abre o período de vigência do novo acordo do clima. Além disso, o próximo ano inaugura uma nova lógica para a implementação das medidas de mitigação climática. O Tratado de Kyoto diferenciava as responsabilidades de mitigação entre países ricos (industrializados) e pobres (extrativistas). O Tratado de Paris, que substitui o anterior, não reconhece essas diferenças. Esta é uma das explicações para que a disputa, agora, envolve a definição dos parâmetros de operação do Artigo 6º.

O modo de funcionamento dos mecanismos de mercado previstos neste capítulo do acordo pode implicar responsabilização dos países mais pobres no que tange ao aquecimento global. O desafio para frente é, portanto, evitar que isso aconteça sem que grandes países poluidores do Sul Global (como Brasil, China e Índia) passem impunes das suas próprias responsabilidades, sobretudo, no que se refere aos efeitos socioambientais destrutivos da indústria extrativista.

Orçamento 2020: quais as previsões para o ano que chega?

O Congresso Nacional aprovou na última terça (17/12), a Lei Orçamentária Anual (LOA) 2020, que estabelece a previsão de receitas e a alocação de gastos do governo federal para o ano que vem. O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) foi primeiramente entregue em agosto pelo Executivo para o Legislativo, que o aprovou após fazer alterações na forma de emendas. A lei agora vai para a sanção presidencial.

A LOA possui caráter autorizativo, isto é, nada garante que os recursos alocados serão de fato executados, porém, todo recurso gasto precisa ter o consentimento da lei. Baseado na análise do orçamento autorizado, de R$ 3,565 trilhões, faremos aqui seis previsões para 2020:

1. Será o fim da política de valorização do salário mínimo

O documento aprovado estima uma elevação de 2,32% do PIB para 2020, um pouco maior do que o esperado pelo mercado, de 2,25%.  Esse otimismo, porém, pode não se concretizar, considerando que na LOA do ano passado a previsão era de 2,50% e hoje se avalia que será em torno de 1%, ou seja, duas vezes e meia menor do que o alardeado pelo governo.

A previsão generosa com o PIB também não foi traduzida em aumento real do salário mínimo – que corresponde à renda de metade da população brasileira. Nos últimos 20 anos, o salário mínimo cresceu 250% em termos reais, devido principalmente às medidas legais que atrelaram o aumento do soldo ao crescimento do PIB, para além da inflação. A última lei de valorização do salário mínimo foi sancionada em 2011 , renovada em 2015 e expirada em 2019. Como não houve novas renovações por parte do Legislativo, o fim da obrigatoriedade significou o fim da política de aumento do salário real.

Dessa forma, o salário mínimo proposto na LOA 2020 é de R$ 1.031,00, uma correção de apenas 3,3%, que não resulta em ganho real.  Note-se, contudo, que o valor final será estipulado pelo Executivo no início de 2020*.

2. Saúde, habitação e turismo serão valorizados, mas a educação continuará sofrendo

O orçamento de R$ 3,565 trilhões aprovado apresenta adicional de R$ 7 bilhões comparado com o projeto de lei enviado em agosto pelo Executivo. Durante a votação no Congresso, o relator afirmou que os parlamentares conseguiram aumentar os recursos para áreas como saúde e educação.

Com efeito, a análise dos números revela que a saúde foi a área mais favorecida, pois o Ministério da Saúde teve recursos adicionais da ordem de R$ 5,1 bilhões. Os aumentos beneficiam principalmente os serviços de atenção básica e assistência hospitalar e ambulatorial. Houve ainda alocação complementar considerável no Ministério do Turismo, de 379%, com as verbas direcionadas, principalmente, para obras de infraestrutura. Por fim, o Fundo de Desenvolvimento Social, que financia o programa Minha Casa Minha Vida, viu seu orçamento crescer em R$ 188,5 bilhões.

O caso da educação, porém, é menos animador. O incremento autorizado pelo Congresso em relação ao encaminhado pelo Executivo foi de apenas R$ 700 milhões para uma área considerada estratégica para o país. Além disso, o aumento orçamentário concedido pelo Legislativo não compensa o elevado corte proposto pelo Executivo para o ano que vem, quando comparamos com os gastos autorizados para este ano. Em 2018, o orçamento aprovado pelo Legislativo foi de R$ 122,9 bilhões, quase R$ 20 bilhões a mais que o orçamento de R$ 102,9 bilhões que teremos para 2020.

3. Investimento do governo vai subir, mas as estatais continuarão em apuros

No caso de investimentos dos órgãos públicos, o orçamento de 2020 aprovado pelo Congresso autoriza gastos de R$ 40,5 bilhões, maior que os R$ 22,5 bilhões previstos no PLOA encaminhado em agosto pelo Executivo. Esse aumento é considerado positivo pelos economistas, pois os investimentos públicos são gastos governamentais que possuem grandes efeitos multiplicadores, impulsionando o investimento privado e o crescimento econômico.

O cenário para os investimentos das estatais, porém, vai na direção oposta, com o processo de sucateamento proposto pelo Executivo. Não houve alteração no orçamento para as empresas controladas pelo Estado, que tiveram os  cortes de 9,6% no orçamento do BNDES, 30,5% no orçamento dos Correios e 63% no orçamento da Infraero mantidos.

4. A PEC Emergencial tem grandes chances de ser aprovada no Congresso

Como vimos anteriormente, o Congresso autorizou aumento de despesas em algumas áreas do governo, como saúde e investimentos. A LOA ampliou as chamadas despesas discricionárias (sobre as quais o governo tem liberdade para decidir) em quase todos os ministérios. Para fechar as contas, os parlamentares elevaram as estimativas de receita ao mesmo tempo em que diminuíram outras despesas. No que tange às fontes de financiamento, aumentou-se a previsão de receitas da ordem de R$ 7 bilhões, relacionadas ao pagamento de dividendos à União.

Em relação às despesas, a diminuição dos gastos deve-se à aposta na aprovação da PEC Emergencial, um dos projetos de Emenda à Constituição recentemente enviada pelo Executivo ao Senado. A referida PEC prevê medidas para reduzir despesas obrigatórias, e sua aprovação, segundo o relatório da LOA, levará a uma economia de R$ 6 bilhões aos cofres públicos. Essa PEC propõe a redução da jornada de trabalho em até 25% para os servidores públicos, com diminuição proporcional das remunerações, nos anos em que a União descumprir a Regra de Ouro – que é o cenário projetado para o ano que vem. Dada a incorporação do impacto dessa PEC na redução dos gastos com pessoal da presente LOA, é possível concluir que a maioria dos deputados está disposta a votar a favor dessa proposta de Emenda Constitucional.

5. O Bolsa Família está assegurado, mas a previdência rural continuará dependente de nova aprovação do Legislativo

Na análise realizada pelo Inesc sobre o PLOA 2020, explicamos o que é crédito suplementar e a dinâmica política que ele envolve, basicamente uma escolha entre qual recurso está garantido na LOA e qual terá que ser aprovado pelo Congresso novamente em 2020. A LOA, votada pelo Congresso esta semana, prevê despesas no montante de R$ 343,6 bilhões que estão condicionadas à aprovação de crédito suplementar, uma redução quando comparado ao valor proposto pelo Executivo no PLOA.

No projeto encaminhado pelo governo Bolsonaro em agosto, cerca de um terço do programa Bolsa Família estava enquadrado como crédito suplementar. O Legislativo, porém, mudou essa realidade, ao garantir na LOA o orçamento para todo o programa. A Previdência Rural, porém, não teve a mesma sorte: enquanto apenas 8% dos benefícios previdenciários urbanos estarão condicionados, 45% dos benefícios previdenciários rurais vão requer a aprovação do Congresso.

6. Vale a pena lutar pelo orçamento, mas será necessário monitorar sua execução

O Plano Plurianual (PPA) 2020-2023, aprovado pelo Congresso Nacional em dezembro, foi um grande retrocesso em termos de transparência do gasto governamental. Como a análise do Inesc apontou,  programas que detalhavam os gastos da União foram eliminados na proposta enviada pelo Executivo, principalmente nas áreas de direitos humanos e socioambiental.

Graças às ações de incidência da sociedade civil no Legislativo, foram introduzidos ao PPA 2020-2023 os programas “Prevenção e Controle do Desmatamento e dos Incêndios Florestais nos Biomas” e “Proteção e Promoção dos Direitos dos Povos Indígenas”. A partir desses programas, será possível acompanhar a execução orçamentária para essas duas importantes pautas nos próximos quatro anos. Serão alocados, em 2020, R$ 134,1 milhões e R$ 73,3 milhões para cada programa, respectivamente. Porém, em um cenário de desmantelamento dos órgãos públicos e de descaso do Executivo para a agenda socioambiental, a chance dos recursos previstos não serem gastos é muito grande.

Ainda que a LOA aprovada esta semana tenha autorizado aumento de despesas em áreas essenciais, como a da saúde, a execução dos gastos não está garantida. Além disso, a Lei não corrigiu problemas de fundo, relacionadas à desigualdade social brasileira e à falta de vontade do governo em priorizar no orçamento pautas importantes para a garantia de direitos humanos, como mostramos em análises anteriores. Cabe a nós, sociedade civil, monitorar e pressionar para que 2020 não seja tão desastroso quanto o ano que está acabando.

*Atualização: o presidente Jair Bolsonaro sancionou em 31/12/2019 o salário mínimo no valor de R$ 1.039, um pouco maior do que o previsto na LOA. Ainda sim, o reajuste não representa ganho real em relação ao soldo anterior, que era de R$ 998.

Na cidade do maior projeto de minério do mundo, royalties são utilizados sem compromisso com garantia de direitos

Estudo inédito realizado pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), em parceria com a Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (UNIFESSPA), mostra que em Canaã dos Carajás, no Pará, centro do maior projeto de minério do mundo, o S11D da Vale, os recursos dos royalties da mineração são consumidos em sua maior parte pela administração do município.

A Compensação Financeira pela Exploração do Recurso Mineral (CFEM), como é chamada, responde por 66,30% da receita da cidade, um dos índices mais altos do Brasil, o que mostra a elevada dependência econômica da mineração. Os dados foram apresentados em evento realizado em Canaã nos últimos dias 13 e 14 de dezembro.

Dos R$ 413,5 milhões arrecadados pela prefeitura via CFEM em 2019, cerca de 60% são aplicados na máquina pública e em urbanismo, o que inclui o pagamento de auxílios financeiros, asfaltamento, limpeza urbana e manutenção de prédios, por exemplo.

Para Alessandra Cardoso, assessora política do Inesc, o trabalho que vem sendo feito há dois anos de monitoramento da CFEM em Canaã tem mostrado que a transparência e o compromisso do uso do recurso com a garantia de direitos são ainda uma miragem.

“Ao cidadão comum não é permitido saber para onde está indo este recurso que é a maior parte da arrecadação, que é finito e vinculado a uma atividade que traz inúmeros impactos sociais e ambientais para o município”.

Junto com a implantação do projeto da Vale veio a explosão demográfica: a população de Canaã passou de 11 mil habitantes em 2000 para 53 mil em 2014, quase 5 vezes mais habitantes em apenas 14 anos. Hoje, o município já é segundo em arrecadação da CFEM no estado do Pará e no Brasil, o primeiro é Parauapebas (PA), cidade vizinha.

Com este cenário vieram muitos problemas, como o aumento do desemprego e a ampliação dos conflitos por terra, já que parte da população excluída buscou nas ocupações de terra um caminho para a sobrevivência.

Falta de transparência dificulta pesquisa

Para chegar aos dados, os pesquisadores analisaram o Portal da Transparência da prefeitura. A mudança na forma de apresentar as informações, no entanto, dificultou o trabalho e aponta para falta de transparência da prefeitura na administração de Jeová Gonçalves de Andrade (MDB), o que contraria inclusive a Lei N° 13.540 de 2017.

Somente em 2018 os recursos da CFEM passaram a ser evidenciados nos dados sobre quais fontes pagavam quais despesas. Antes disto, o recurso entrava no bolo das receitas sem especificação da fonte, o que impedia o monitoramento do seu uso. Em 2018, na execução do orçamento de Canaã, a Fonte-CFEM passou a ser marcada com um código específico no detalhamento das receitas. Isto ocorreu por recomendação do Tribunal de Contas dos Municípios, pressionado pela referida lei de 2017.

Contudo, no orçamento de 2019 não foi mais possível identificar quais são as despesas previstas com a fonte CFEM, um retrocesso. Além disso, a prefeitura só disponibiliza os documentos da Lei Orçamentária Anual em formato de imagem, o que impede a busca por palavra-chave que permitiria localizar com muito mais facilidade o recurso da CFEM. Por isso, os pesquisadores precisaram ler os documentos um a um.

Outro problema é o caráter genérico das despesas principais. A natureza das despesas da função administração são as mais diversas possíveis, indo desde a manutenção das secretarias e algumas fundações e promoções de convênios como também a manutenção das moradias oficiais de prefeito e vice-prefeito. Ou seja: há pouco ou nenhum ganho social na forma com que a prefeitura aplica os recursos recebidos.

Giliad Souza, vice-coordenador do Instituto de Estudos e Desenvolvimento Agrário da UNIFESSPA, lembra que a CFEM é um recurso estratégico por ser finito e que são muitas as dificuldades que a população de Canaã dos Carajás enfrenta para entender para onde está indo o dinheiro da CFEM. “Em 2019, a CFEM foi utilizada para financiar a máquina pública, não necessariamente para estimular a diversificação da atividade econômica e a criação de novas iniciativas que dialoguem com a realidade local. A administração municipal não busca superar a dependência da mineração”, diz.

Para 2020, já está garantido na UNIFESSPA um projeto de extensão dedicado para o monitoramento das despesas da CFEM. Também participam da pesquisa pela universidade, Antônia Larissa, mestranda em Planejamento Urbano e Regional; Felipe Ferreira e Jessica Costa, estudantes de economia. A expectativa dos pesquisadores e do Inesc é expandir a pesquisa para outros dois municípios no Pará, em Parauapebas e Marabá.

Também existe a possibilidade de levar esse modelo de análise municipal para outras cidades em estados afetados pela mineração, como Minas Gerais, Goiás e Maranhão, replicando o modelo com parceiros locais.

37% da área de Carajás sob concessão da Vale

O município de Canaã dos Carajás possui uma área de 3.146 km², dos quais 37% estão sob concessão da Vale S.A para exploração mineral, sendo o principal responsável por isso o S11D.

Maior investimento privado realizado no Brasil nesta década, com US$ 14,3 bilhões, o Complexo S11D inclui mina, usina, logística ferroviária e portuária. Depois do rompimento da barragem de Brumadinho em Minas Gerais, a Vale anunciou que está aumentando a produção no Pará para compensar as metas. Com capacidade já instalada de 100 milhões de toneladas/ano, a empresa cogita ampliar o projeto para 150 milhões de toneladas de minério de ferro por ano. A previsão é de que esta mina seja exaurida até 2060.

Com a entrada em operação comercial da mina S11D, a CFEM recebida por Canaã dos Carajás saltou de R$ 19 milhões em 2016 para R$ 40,25 milhões em 2017, para R$ 178,5 milhões em 2018 e R$ 413,5 milhões em 2019, até o dia 16 de dezembro.  O total arrecadado e distribuído depende de três fatores: o volume produzido, o valor do minério que é cotado em dólares americanos e a taxa de câmbio.

O aumento expressivo em 2019 se explica tanto pelo aumento da produção na mina S11 D, quanto pelo fato de que a tonelada de minério de ferro atingiu US$ 100, o maior valor em cinco anos e o dólar frente ao real chegou a  superar R$4,23, recorde nominal.

No Brasil, a extração de minério de ferro responde por 69% da CFEM arrecadada pela exploração mineral. Na sequência vem o cobre, com 7%, o ouro com 5%, e a bauxita – com 3% dos valores arrecadados. Em paralelo aos volumes extraídos e valores gerados por esta exploração, o município de Canaã dos Carajás enfrenta graves problemas de desemprego, desmonte da agricultura familiar, violência, acesso precário a direitos sociais.

Inesc e UNIFESSPA apresentam estudo sobre CFEM em Canaã dos Carajás

A pesquisa desenvolvida pelo Inesc em parceria com Unifesspa pretende, portanto, não somente monitorar a CFEM, mas também contribuir para que a população se envolva em ações de controle social e para a destinação de parte destes recursos para a garantia de direitos.

“O compromisso do Inesc é contribuir para que a população local e os grupos organizados entendam o que é a CFEM e cobrem do poder público não só a transparência, mas também o compromisso com o uso do recurso em políticas que melhorem a vida das pessoas e superem a excessiva dependência da economia local em relação à mineração, pois ela estrangula outras atividades produtivas que são fundamentais para garantir empregos e diversidade econômica”, afirma Alessandra Cardoso.

Declaração conjunta sobre crise do desmatamento e queimadas na Amazônia é divulgada na COP25

Uma declaração conjunta sobre a crise do desmatamento e queimadas na Amazônia, assinada por 110 organizações da sociedade civil, incluindo redes e movimentos sociais, e endossada por parlamentares do Congresso Nacional, foi divulgada, nesta quinta-feira (12/12), na Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP25), em Madri, na Espanha. O documento foi apresentado durante coletiva de imprensa e num evento da Frente Parlamentar Ambientalista.

O deputado federal Nilto Tatto (PT), que preside a Frente, afirmou que o documento é uma provocação a parlamentares e órgãos governamentais “sobre o que é possível e necessário ser feito para que o Brasil cumpra as metas de redução do desmatamento e de emissões de gases de efeito estufa com as quais se comprometeu”.

A carta apresenta os principais desafios que têm preocupado organizações da sociedade civil do Brasil e de outros  países do mundo, que demonstram a necessidade urgente de uma mudança de posicionamento do atual governo brasileiro frente ao aumento alarmante  do desmatamento e das queimadas na região, que ameaça os serviços ecossistêmicos da floresta amazônica e os direitos de populações locais.

O documento critica o “desmonte” das políticas públicas de prevenção e controle do desmatamento na Amazônia e a consequente abertura de espaço para grileiros, garimpeiros e madeireiros ilegais, detalhando as ações e omissões do governo brasileiro que, segundo os signatários, estão diretamente relacionadas ao salto nos altos índices de desmatamento e queimadas registrados em 2019.

Durante o evento na COP25, Márcio Astrini, coordenador de Políticas Públicas do Greenpeace Brasil — uma das organizações que a assinam a carta, ressaltou que o desmatamento da Amazônia está crescendo e que ele não pode ser bem-vindo em nenhuma hipótese. “Se desmatamento trouxesse desenvolvimento, a Amazônia seria o local mais rico e desenvolvido da América do Sul”, disse.

Astrini lembrou que o Brasil sabe como combater o desmatamento e, com medidas concretas, conseguiu, na última década, diminuí-lo em cerca de 80%. Entre elas, ele citou o reconhecimento de áreas protegidas, criação de ferramentas de governança e, especialmente, a mensagem de que o desmatamento não pode ser tolerado. “Tudo isso está sendo demolido pelo atual governo e é por isso que o desmatamento aumentou outra vez. Com a Amazônia, o Brasil tem uma oportunidade, mas, infelizmente, este ano a escolha tem sido de transformá-la em um problema”, afirmou, destacando que os parlamentares precisam trabalhar para impedir o avanço dessa agenda.

Carta pede que governo federal mude sua trajetória

As redes ambientalistas, movimentos sociais e parlamentares que subscrevem a declaração pedem que o atual governo mude sua trajetória e passe a tomar decisões com base na Constituição, nas leis e nos acordos internacionais dos quais o Brasil é parte, entre eles o Acordo de Paris, que une esforços globais para manter o aumento das temperaturas médias do planeta abaixo de 1,5 Cº graus.

Entre as sugestões concretas para o governo federal, estão: retomar o Plano de Ação de Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia (PPCDAm); combater crimes ambientais associados à grilagem de terras públicas, desmatamento, queimadas e exploração ilegal de recursos naturais; e retomar a Comissão Interministerial de Combate aos Crimes e Infrações Ambientais. Outro pedido é pela retirada de pauta todos os projetos de lei, em tramitação no Congresso Nacional, que representam retrocesso na legislação de proteção ambiental do país.

Além disso, a carta aponta para a necessidade de implementar mecanismos efetivos para garantir que as importações de commodities do agronegócio e da exploração madeireira e mineral sejam exclusivamente e estritamente legais e certificadas e que todos os investimentos na Amazônia contribuam para acabar com o desmatamento e fortaleçam uma economia de baixo carbono que respeite e valorize os modos de vida das populações locais.

Os temas do documento foram debatidos durante o seminário “Desmatamento e Queimadas na Amazônia: Tendências, Dinâmicas e Soluções”, realizado no dia 28 de novembro, na Câmara dos Deputados, em Brasília, quando parlamentares, instituições públicas, cientistas e organizações da sociedade civil analisaram características, causas e consequências do que acontece na região.

O deputado Tatto informou, ainda, que a Frente Parlamentar Ambientalista irá estudar como as reivindicações da declaração conjunta de organizações da sociedade civil podem ser traduzidas em ação parlamentar.

Conheça a íntegra da declaração com assinaturas (em português, inglês e espanhol) e assistir a um vídeo sobre o assunto

 

CONTATO DE IMPRENSA

Thaisa Pimpão

thaisapimpao@omundoquequeremos.com.br

Whatsapp: +55 11 99904-0014

Desmatamento e queimadas na Amazônia

Em dezembro de 2019, na COP 25 da Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC), em Madri, ativistas brasileiros de direitos humanos e ambientais lançaram uma declaração conjunta sobre a crise do desmatamento e queimadas na Amazônia brasileira.

Assinada por 110 organizações da sociedade civil, redes e movimentos sociais, a declaração apresenta uma análise crítica das tendências recentes e fatores de desmatamento e queimadas na Amazônia, bem como consequências para a crise climática global e outros impactos sociais e ambientais. A declaração também apresenta um apelo à ação, destinado a mobilizar a sociedade brasileira e a comunidade internacional para que adotem medidas concretas em defesa da Amazônia e dos direitos de seus povos. A declaração foi emitida em inglês, espanhol e português:

Leia a declaração em português

Leia a declaração em inglês

Leia a declaração em espanhol

A declaração conjunta é resultado também de um seminário intitulado “Desmatamento e queimadas na Amazônia: tendências, dinâmicas e soluções”, organizado pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS) da Câmara dos Deputados no Congresso Brasileiro. O evento foi realizado em Brasília, em 28 de novembro de 2019.

Mais informações sobre o seminário estão disponíveis aqui

O lançamento da declaração conjunta na COP 25 foi acompanhado por um vídeo curto produzido pelo documentarista Todd Southgate, em parceria com organizações da sociedade civil. O vídeo, com versões em inglês e português, inclui imagens da Amazônia e destaques do seminário do Congresso, incluindo depoimentos de representantes de povos indígenas, movimentos sociais, ONGs e instituições públicas.

Falta de transparência e prestação de contas dos benefícios fiscais: um problema latino-americano

A América Latina gasta, em média, entre 10% e 20% da sua arrecadação e 4% do PIB por ano na concessão de benefícios fiscais. Eles são isenções, incentivos, deduções e créditos tributários que reduzem a quantidade de impostos pagos por pessoas físicas ou jurídicas ao governo.

Conhecidos na literatura especializada como gastos tributários por serem de fato gastos indiretos do governo realizados pela política tributária, os benefícios podem ser ferramentas para promoção de investimentos, empregos e crescimento econômico. Porém, o mais recente estudo publicado pelo International Budget Partnership (IBP) chega à conclusão de que hoje, apesar dos países gastarem bilhões de dólares com essa política, a sociedade não tem como saber se os ganhos socioeconômicos prometidos estão se efetivando na região, devido à falta de transparência e prestação de contas dos gastos tributários.

Projeto Lateral

Nos últimos anos, um grupo de organizações da sociedade civil latino-americana representando oito países da região, facilitado pelo IBP, desenvolveu  um projeto para promover pesquisa, incidência e aprender sobre gastos tributárias na América Latina. O grupo, intitulado Lateral, publicou estudos sobre os efeitos dos gastos sobre a desigualdade, além de um manual para ajudar a sociedade civil a pesquisar sobre gastos tributários.

Em seu último estudo, “Contabilizados, mas não responsabilizados: transparência nos gastos tributários na América Latina”, de autoria de Paolo de Renzio, as organizações compararam a transparência e prestação de contas nos informes sobre gastos tributários dos países da região, com objetivo de descobrir e comparar o que é possível saber sobre os incentivos outorgados pelos governos latino-americanos.

As principais conclusões do estudo foram sistematizadas nos infográficos que estão neste texto, como este:

Do ponto de vista contábil, a apresentação de informações sobre despesas tributárias na América Latina é razoável, pois quase todos os governos publicam um relatório anual que inclui dados sobre quais os gastos tributárias existentes e quanto eles representam. A cobertura dos relatórios e o nível de detalhes que eles incluem, porém, variam muito na região. Os países com relatórios mais completos, de acordo com uma série de critérios estabelecidos no estudo, são o Brasil e a Bolívia, enquanto países como Colômbia e Costa Rica ainda possuem um caminho maior a percorrer.

Contudo, do ponto de vista da prestação de contas, todos os países da região deixam a desejar. Os relatórios permanecem, em grande parte, silenciosos sobre vários aspectos-chave dos gastos tributários, incluindo objetivos políticos e medições de desempenho, e não incluem informações sobre os beneficiários e o impacto. Além disso, possuem poucos detalhes sobre os processos por meio dos quais são tomadas decisões em relação à introdução, revisão e avaliação dos gastos tributários.

Vamos, por exemplo, pensar num incentivo fiscal para o setor de construção civil. O incentivo pode impulsionar a construção de infraestrutura no país e, assim, gerar desenvolvimento econômico. Em todos os países comparados nesse estudo, porém, não podemos saber quais são as empresas de construção civil que estão se beneficiando e quanto estão deixando de pagar de impostos. Não existe uma avaliação desse incentivo com o objetivo de entender se houve de fato o incremento na infraestrutura do país. Também não sabemos qual foi o processo de decisão sobre a criação desse incentivo e se não haveriam medidas mais eficazes para gerar o resultado esperado, como o investimento direto do governo em infraestrutura. Na maioria dos países da região, também não sabemos o prazo de vigência do incentivo, podendo ficar décadas sem um processo de revisão desse gasto indireto.

Essa falta de transparência e prestação de contas se configura como um privilégio, pois os gastos governamentais diretos, as despesas orçamentárias, possuem processo de revisão, participação e divulgação de informações muito mais completo e transparente.

E o Brasil?

Como destacado anteriormente, o Brasil possui um dos melhores relatórios de gastos tributários da região, o Demonstrativo de Gastos Tributários, divulgado anualmente pela Receita Federal. A cada ano, a União gasta cerca de 20% de sua arrecadação e 4% do seu PIB com Gastos Tributários. A estimativa de gasto para 2020 é de R$ 326 bilhões de reais, um valor muito próximo ao chamado “rombo da previdência social”. Os benefícios abrangem diversos setores, desde produtores de bebidas açucaradas, como os refrigerantes, até a produção de combustíveis fósseis, privilegiando grandes multinacionais que atuam no país.

Apesar de dispor de relativamente bons relatórios de gastos tributários, o Brasil possui alguns dos mesmos problemas do resto da região no que diz respeito à transparência e à prestação de contas. O governo concede incentivos fiscais com a justificativa de que eles podem estimular investimentos, gerar empregos e contribuir com o crescimento da economia. Porém, não avalia se os benefícios estão realmente promovendo o desenvolvimento econômico e os ganhos sociais que prometem. Além disso, não sabemos quem recebe esses incentivos e nem o valor, pois estão protegidos por sigilo fiscal.

Diante disso, o Inesc, além de participar do projeto Lateral, anima a campanha #SóAcreditoVendo, pela transparência dos Gastos Tributários, além de apoiar a aprovação do PLP 162/2019, que permitirá a divulgação das empresas beneficiárias dos incentivos fiscais e os montantes de impostos que cada beneficiário está deixando de pagar. Sem transparência, como nós, cidadãos, podemos avaliar se esse dinheiro está beneficiando a sociedade brasileira de forma justa e democrática?

Dia Mundial dos Direitos Humanos: #SomosTodosONG

Em resposta ao crescente processo de criminalização das ONGs, ativistas e movimentos sociais, hoje, no Dia Internacional dos Direitos Humanos (10/12), damos início à campanha #SomosTodosONG, a fim de resgatar entre a sociedade civil a importância de sermos livres, para atuarmos na construção de um país melhor. A iniciativa propõe a defesa da democracia, dos direitos humanos e da proteção do meio ambiente.

A campanha é uma iniciativa da Abong  (Organizações em Defesa dos Direitos e Bens Comuns) e da Cardume, das quais o Inesc faz parte. Assista ao vídeo do lançamento:

Leia o manifesto conjunto no Dia Mundial dos Direitos Humanos

QUEREMOS MAIS DIREITOS HUMANOS, PARA TODOS E TODAS!

As organizações signatárias vêm a público para manifestar sua profunda preocupação com os caminhos da política de direitos humanos no Brasil. Em que pese o fato de que a política de direitos humanos nunca fora efetivamente uma política de Estado no Brasil, mas sim de alguns órgãos e setores de determinados governos, o que ora vivemos é um processo de total desestruturação, desmonte e retrocesso nas garantias constitucionais e de direitos humanos, conquistados a partir de muita luta da sociedade civil organizada. O atual governo brasileiro ataca de forma flagrante os compromissos com direitos humanos e age no sentido de desproteger a cidadania. Não há o menor respeito ao princípio da proibição do retrocesso e de investimento do máximo de recursos para a garantia dos direitos humanos. Há um movimento brutal de submissão dos direitos e da vida aos interesses fiscais que, em nome de sanear o Estado, drenam recursos para o capital financeiro especulativo e retiram as condições para o investimento em políticas voltadas aos direitos humanos. Diante deste quadro, as chamadas instituições democráticas brasileiras, não têm sido capazes, não possuem mecanismos ou não querem enfrentar as perdas e os retrocessos que vivemos.

As organizações estão especialmente preocupadas com o abandono dos compromissos constantes no terceiro Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3) – que, em breve completará 10 anos (publicado em 21/12/2009) -, e com vários outros planos, entre eles, o Plano Nacional de Educação, o de políticas públicas para mulheres, o de igualdade racial, o de promoção da população LGBTQI, o de educação em direitos humanos, entre tantos outros. O anúncio do “Programa Juntos pela Vida: Família e Direitos Humanos”, feito pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos para o período 2019-2023, por meio da Portaria nº 2.467, de 06/09/2019, aponta para prioridades que são muito diferentes daquelas constantes destes compromissos construídos com a participação da sociedade civil brasileira. Há clara sobreposição de propostas de ação e, ainda que as anteriores não tenham sido revogadas, de longe estão entre as prioridades a serem implementadas. Muito nos preocupa também o fechamento e inviabilização dos espaços de participação social, tais como os Conselhos, Comitês e as Conferências, em várias áreas de direitos e políticas. Está claro para nós que a série de ações de restrição orçamentária, estrutural e de autonomia política, são tentativas de desgastar e inviabilizar a atuação efetiva e de denúncia que vem sendo executada pelo Conselho Nacional de Direitos Humanos. O recente fato da destituição da Procuradora Débora Duprat da função de conselheira no Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) e em perspectiva de assumir a presidência do CNDH em 2020, pelo atual Procurador Geral da República Augusto Aras, é uma amostra do desrespeito, autoritarismo e intervencionismo na autonomia deste Conselho.

Além de todas as perdas já ocorridas, nos preocupa profundamente o potencial de projetos e medidas já anunciadas e em andamento que colocam risco a garantia dos direitos humanos e das vidas de muitas pessoas. Entre elas está a afirmação do Estado punitivo constante na proposta do pacote anticrime e o teor do que será aprovado do projeto apresentado pelo governo (já passou pelo Senado e agora vai para a Câmara). Aspectos como o aumento do tempo máximo de cumprimento de pena, de 30 para 40 anos, são vistos por especialistas como um risco que favorece a lógica do encarceramento, num Brasil que já tem aproximadamente 812 mil pessoas presas, conforme dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de julho deste ano. Outra crítica ao projeto diz respeito à criação de um banco de perfil genético para fichar informações de pessoas que passam pelo sistema de Justiça criminal, medida esta, que segundo especialistas, pode ajudar a endossar o preconceito social que atinge ex-detentos, por exemplo. Tão, ou mais grave, é a da insistência do governo em querer garantir o excludente de ilicitude para os agentes de segurança pública, mesmo diante da inconstitucionalidade contida nesta matéria e dos reais riscos à ampliação da ação violenta das polícias, colaborando para o aumento dos confrontos na sociedade, para o avanço no extermínio da juventude negra e pobre das periferias e com a população negra em geral, bem como para o ataque a lideranças e defensores/as de direitos humanos, que fazem luta pela terra, pelos territórios, pela natureza e pelos bens comuns e se encontram expostos a diversas situações de violências.

As propostas de Emendas Constitucionais do Plano Mais Brasil, efetivamente vão na contramão de conquistas históricas, destruindo, inclusive, direitos já garantidos. É grave a proposição de que “será observado, na promoção dos direitos sociais, o direito ao equilíbrio fiscal intergeracional”, sugerido como parágrafo único ao artigo 6º da Constituição Federal. Junto com esta estão as propostas de desvinculação dos recursos, inclusive com mudanças para os recursos previstos para a garantia do direito à saúde e à educação. Estas medidas, somadas a outras e aos impactos da Emenda Constitucional nº 95/2016 agravarão ainda mais os problemas para a garantia e a efetividade dos direitos sociais, com forte impacto na ampliação das desigualdades sociais no país. Esta preocupação se intensifica, com o Plano Pluri Anual (PPA 2020-2023) proposto pelo governo, que não menciona o fortalecimento da democracia e “esvazia os direitos”, uma vez que os recursos previstos para o período na área social são 40% menores do que os recursos previstos para a área econômica, que é objetivamente prioritária em favorecimento aos mais ricos. Ou seja, em nome da “simplificação” e do “realismo fiscal”, os direitos humanos, definitivamente, não estão nos planos do governo brasileiro, a não ser para serem desmontados e atacados.

As organizações também manifestam sua profunda preocupação em relação à participação e aos direcionamentos realizados pelo Brasil nos espaços multilaterais, em especial nos de direitos humanos. Nestes espaços a diplomacia brasileira tem assumido posições que rompem com a tradição brasileira acumulada há décadas, às quais, em grande medida, historicamente afirmaram e se comprometeram com a defesa do universalismo, do avanço das liberdades, da promoção progressiva dos direitos humanos, vide os ataques perpetrados contra documentos e convenções internacionais que versam sobre a defesa da igualdade de gênero, racial, entre outras. Estas posições, que também se traduzem em ações dentro do País, não reconhecem os direitos humanos como proteção e garantia para todos e todas. Elas são seletivas, pautadas por valores conservadores e com forte caráter de fundamentalismo religioso de cunho cristão. Tais posições que se orientam pela defesa de que os direitos humanos são para os “humanos do bem”, os “humanos direitos”, em oposição aos demais seres humanos, caracterizados como minorias, como “bandidos” e apoiadores de bandidos são frequentemente defendidas por setores do governo com argumentos bíblicos distorcidos em detrimento da Constituição. Distorcem o direito à liberdade religiosa para promover o racismo religioso, a misoginia, a LGBTIQfobia, o ódio às populações originárias e tradicionais, a violência e a eliminação daquelas pessoas e grupos sociais que são consideradas expressão do mal, entre elas: mulheres, LGBTIs, indígenas, quilombolas, povos e comunidades tradicionais, negros e negras, juventudes, crianças e adolescentes. Estabelecem falsa dicotomia entre “defesa de valores e direitos da maioria moral e valores e direitos da minoria. Dizem que os valores e os direitos das minorias não podem estar acima dos valores e direitos da maioria. Para a sociedade civil, que recentemente se manifestou contra a recondução da candidatura do Brasil ao Conselho de Direitos Humanos da ONU, fica a preocupação com a falta de orientação para a atuação na perspectiva da universalidade, da imparcialidade, da objetividade e da não-seletividade, do diálogo internacional construtivo e da cooperação com vistas a aprimorar o respeito, a promoção e a proteção de todos os direitos humanos, de acordo com o Artigo 4º da Resolução nº 60/251 da Assembleia Geral das Nações Unidas.

Finalmente, as organizações signatárias instam as instituições, tais como o Parlamento, o Ministério Público, o Poder Judiciário, a cumprirem com suas responsabilidades no que se refere ao fortalecimento da democracia e ao cumprimento das garantias constitucionais e com os compromissos em direitos humanos. Também manifestam solidariedade aos lutadores e às lutadoras do povo, aos defensores e às defensoras de direitos humanos, às lideranças sociais e políticas, que seguem em luta pelos direitos humanos, de cabeça erguida, com coragem, dizendo “queremos todos os direitos humanos para todas e todas, já!”. Solidarizam-se também com os sujeitos, as lideranças, organizações e povos que estão na resistência e na luta no Brasil e em vários países da América Latina e do mundo. Conclamam à solidariedade interorganizacional no plano nacional e internacional e afirmam que somente a formação de alianças estratégicas de resistência ativa e criativa ajudarão nesta travessia difícil, mas que se alimenta do esperançar dos que há séculos lutam e conquistam espaços de mais igualdade e participação. Afirmam que direitos humanos continuam cada vez mais fazendo sentido como conquistas, razão pela qual seguirão fazendo processos de resistência, luta e de organização no cotidiano, em cada pedaço, em cada canto, em cada mente e em cada coração.

Viva os direitos humanos, viva o dia mundial dos direitos humanos.

Brasil, 10 de dezembro de 2019

Assinam este Manifesto:

1. Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil
2. Movimento Nacional de Direitos Humanos – MNDH Brasil
3. Fórum Ecumênico ACT Brasil – FEACT
4. Processo de Articulação e Diálogo Internacional – PAD
5. Sociedade Maranhense de Direitos Humanos – SMDH
6. Acesso Cidadania e Direitos Humanos
7. Aliança Nacional LGBTI
8. Associação Nacional de Travestis e Transexuais – ANTRA
9. Art Jovem
10. Associação Brasileira de Saúde Mental – ABRASME
11. Associação Nacional de Educadores e Educadoras Sociais – ANEES
12. Articulação de Mulheres Brasileiras – AMB
13. Articulação Nacional de Organizações de Mulheres Negras Brasileiras – AMNB
14. Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos –
ABGLT
15. Associação Brasileira de Homeopatia Popular – ABHP
16. Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais – ABONG
17. Associação de Apoio à Criança e ao Adolescente – AMENCAR
18. Associação de Mulheres Negras do Acre
19. Associação de Mulheres Unidas da Serra (AMUS)
20. Associação de Pesquisa Xaraiés – Xaraiés
21. Associação dos Amigos do Centro de Formação e Pesquisa Olga Benário Prestes –
AAMOBEP
22. Associação dos Retireiros do Araguaia – ARA
23. Associação Sócio Cultural e Ambiental Fé e Vida – Sociedade Fé e Vida
24. CDDH Pedro Reis
25. CDEs Direitos Humanos
26. Centro Burnier Fé e Justiça, CBFJ
27. Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas – CAA
28. Centro de Apoio aos Direitos Humanos Valdicio B dos Santos (CADH)
29. Movimento Nacional de População de Rua no ES (MNPR-ES)
30. Centro de Apoio as Iniciativas Sociais – CAIS
31. Centro de Defesa da Cidadania e dos Direitos Humanos Marçal de Souza Tupã I/MS
32. Centro de Defesa da Vida Herbert de Sousa – CDHVS
33. Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente Pe. Marcos Passerini
34. Centro de Defesa dos Direitos Humanos Antônio Conselheiro – CDDHAC
35. Centro de Defesa dos Direitos Humanos da Serra/ES
36. Centro de Defesa dos Direitos Humanos de Londrina e MNDH/PR
37. Centro de Defesa dos Direitos Humanos Dom Tomás Balduíno de Marapé/ES
38. Centro de Defesa dos Direitos Humanos e Educação Popular do Acre – CDDHEP
39. Centro de Defesa dos Direitos Humanos Nenzinha Machado/PI
40. Centro de Direitos Humanos de Cristalândia
41. Centro de Direitos Humanos de Formoso do Araguaia
42. Centro de Direitos Humanos de Palmas
43. Centro de Direitos Humanos Dom Máximo Biennès – CDHDMB
44. Centro de Direitos Humanos Dom Pedro Casaldáliga
45. Centro de Direitos Humanos e Memória Popular – CDHMP
46. Centro de Direitos Humanos Henrique Trindade – CDHHT
47. Centro de Direitos Humanos Maria da Graça Braz
48. Centro de Direitos Humanos Sarandi
49. Centro de Educação e Assessoramento Popular – CEAP
50. Centro de Estudos Feministas e Assessoria – CFEMEA
51. Centro de Estudos, Pesquisa e Ação Cultutal – CENARTE
52. Centro de Referência em Direitos Humanos – UFRN
53. Centro do Negro do Pará – CEDEMPA
54. Centro Dom Hélder Câmara de Educação e Ação Social – CENDHEC
55. Centro Dom José Brandão de Castro – CDJBC
56. Centro Pastoral para Migrantes – CPM MT
57. Centro de Promoção da Cidadania e Defesa dos Direitos Humanos Pe. Josimo
58. Coletivo LESBIBAHIA
59. Comissão Regional de Justiça e Paz de Mato Grosso do Sul – CRJPMS
60. Circulo Palmarino
61. Coletivo Catarinense Memória, Verdade, Justiça
62. Coletivo Feminino Plural
63. Coletivo Mães Eficientes Somos Nós
64. Comissão de Direitos Humanos de Passo Fundo – CDHPF
65. Comissão de Justiça e Paz de Brasília
66. Comissão Pastoral da Terra – CPT
67. Comissão Pastoral da Terra – CPT – MT
68. Comissão Regional de Justiça e Paz de Mato Grosso do Sul – CRJPMS
69. Comitê de Direitos Humanos Dom Thomás Balduíno
70. Comitê de Prevenção e Combate a Tortura do Piauí
71. Conceitos Ecológicos e Etnoecológicos aplicados à conservação da água e Biodiversidade
do Pantanal – CONECTE
72. Conselho Indigenista Missionário – CIMI – MT
73. Conselho Nacional de Igrejas Cristãs – CONIC
74. Coordenadoria Ecumênica de Serviço – CESE
75. Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional – FASE/ES
76. Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional – FASE/MT
77. FIAN Brasil
78. Fórum Municipal de Defesa dos Direitos Humanos de Campinas
79. Fórum de Mulheres do Mercosul – Seção Lages/SC
80. Fórum Direitos Humanos e da Terra – FDHT- Mato Grosso
81. Fórum Mato-grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento – FORMAD
82. Fórum Mato-grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento – Formad
83. Fórum Nacional da Sociedade Civil nos Comitês de Bacia Hidrográfica – Fonasc CBH/MT
84. Fórum de Mulheres do ES
85. Fundação Instituto Nereu Ramos
86. Fundação Luterana de Diaconia – FLD
87. Grupo Arareau de Preservação e Educação Ambiental – Grupo Arareau
88. Grupo de Mulheres Negras Mãe Andresa
89. Grupo Dignidade
90. Grupo de Pesquisa sobre Democracia e Desigualdades – Demodê (Universidade de Brasília)
91. Grupo Identidade LGBT
92. Grupo Pesquisador em Educação Ambiental, Comunicação e Arte, GPEA-UFMT
93. Grupo Semente da Chapada dos Guimarães/MT – Grupo Semente
94. IDEAS – Assessoria Popular
95. Identidade – Grupo de Luta Pela Diversidade Sexual – Campinas
96. Instituto Braços
97. Instituto Brasil Central – IBRACE
98. Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas – IBASE
99. Instituto Caracol – ICaracol
100.Instituto Centro de Vida – ICV
101.Instituto Dakini
102. Instituto de Desenvolvimento e Direitos Humanos – IDDH
103. Instituto de Direitos Humanos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais – IDHESCA
104. Instituto de Estudos Socioeconômicos – INESC
105. Instituto de Pesquisa e Educação Ambiental – Instituto Gaia
106. Instituto DH
107. Instituto Terramar
108. Instituto Trabalho Digno
109. Instituto Vladimir Herzog
110. Koinonia – Presença Ecumênica e Serviço
111. Marcha Mundial de Mulheres / SC
112. Movimento Nacional de Direitos Humanos – MNDH/SC
113. Movimento Nacional de Filhas e Filhos de Trabalhadoras e Trabalhadores
114. Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua – MNMMR
115. Movimento de Mulheres do Campo e da Cidade/PA
116. Movimento do Espírito Lilás
117. Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB
118. Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST
119. Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST MT
120. Movimento Luta Antimanicomial – ES
121. Núcleo de Estudos Ambientais e Saúde do Trabalhador NEAST ISC
122. Núcleo de Estudos Rurais e Urbanos – NERU – UFMT
123. Observatório da Juventude/ES
124. Observatório Nacional de Justiça Socioambiental Luciano Mendes de Almeida – OLMA
125. Organização de Direitos Humanos Projeto Legal-RJ
126. Pastoral Carcerária Nacional
127. Pastoral da Juventude
128. Pastoral Carcerária do Regional NE 1 da CNBB – Ceará
129. PASTORAL OPERÁRIA NACIONAL
130. Plataforma Nacional de Crianças e Adolescentes com Familiar Encarcerados. CAFE’s
131. Projeto Meninos e Meninas de Rua – PMMR
132. Rede Internacional de Pesquisadores em Educação Ambiental e Justiça Climática –
REAJA
133. Rede Mato-grossense de Educação Ambiental – REMTEA
134. Rede Afro LGBT
135. Rede Gay Latino
136. Rede SAPATÁ
137. RENAP – Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares
138. SERPAZ – Serviço de Paz
139. Sindicato dos Trabalhadores no Ensino o Público de Mato Grosso – SINTEP MT
140. Sociedade Colatinense dos Direitos Humanos
141. SOS Corpo – Instituto Feminista para a Democracia
142. União Nacional das Organizações Cooperativistas Solidárias – UNICOPAS
143. UNA LGBT – União Nacional de Lésbicas Gays Bissexuais Trans Travestis e Intersexos
144. UNISOL Brasil
145. Sindicato dos Psicólogos no Estado do Espírito Santo (SINDPSI-ES)
146. Associação ECCOS
147. ISER Assessoria – RJ

A educação para os direitos humanos desapareceu

A Câmara dos Deputados vota amanhã (10/12) o relatório da Comissão Externa criada para acompanhar o trabalho de gestão e planejamento do Ministério da Educação (MEC). O documento é uma extensa e importante análise, que vai desde a execução orçamentária, até os cargos de direção (DAS 5 e 6), apresentando questões graves sobre o descaso com a política de educação por parte do atual governo, e proporcionando informações que o próprio Poder Executivo não disponibiliza.

Ao apresentar o relatório, o Poder Legislativo realiza um dos seus compromissos de fiscalização das ações governamentais.

Nos debruçamos sobre o documento e destacamos, a seguir, alguns pontos que merecem atenção por serem ilustrativos da ineficiência e retrocesso da atual gestão da pasta, comandado pelo ministro Abraham Weintraub.

Fim da educação para a diversidade

O fechamento da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (Secadi), substituída pela Secretaria de Alfabetização (Sealf) é um exemplo, pois a nova secretaria não assumiu todas as ações da antiga e não realizou o que anunciou, que era a tal “alfabetização acima de tudo”, já que as metas do Plano Nacional de Educação (PNE) para alfabetização total e alfabetização funcional não se moveram.

Além de não combater o analfabetismo tal qual a promessa feita, a Sealf não atuou nas áreas de educação indígena, quilombola, jovens e adultos, ribeirinhos, e educação do campo como a Secadi atuava. Essas pautas foram diluídas entre várias secretarias, que ao serem pulverizadas, enfraqueceram. A educação para direitos humanos simplesmente desapareceu.

As duas únicas dotações orçamentárias dedicadas à Educação de Jovens e Adultos tiveram execução de menos de 1% até novembro de 2019, o que indica a descontinuidade das políticas destinadas para este fim. A Política Nacional de Alfabetização proposta por esta gestão estabelece a prioridade da alfabetização indígena por língua portuguesa, contradizendo frontalmente o Estatuto do Índio que determina que ―a alfabetização dos índios far-se-á na língua do grupo a que pertençam e em português, salvaguardado o uso da primeira.

A Secretaria de Articulação com os Sistemas de Ensino (Sase), criada em 2011 depois da Conferência Nacional de Educação (Conae), para ser a guardiã do PNE, também foi extinta. Além do PNE, a Sase lideraria o acompanhamento de estados e municípios, proporcionando a efetivação do Sistema Nacional de Educação, preconizado na Constituição Federal e reforçado pelo PNE, que indicava que até 2016 o sistema precisava ser criado. Ele não foi criado a tempo e agora, provavelmente, não será criado na vigência desse atual Plano, especialmente com o fim da Sase.

Escolas cívico-militares

Ao mesmo tempo em que não está cumprindo com os próprios compromissos com relação à alfabetização, o Ministério já ampliou várias vezes o número de escolas que poderão se tornar “cívico-militares”, no entanto, sem critério algum, ou evidências de que os resultados poderão ser efetivos. E, principalmente, sem participação das comunidades escolares neste processo.

A proposta não é transparente e não diz de fato a que veio, já que separa o pedagógico do disciplinar, criando uma aberração. Além disso, como o relatório reforça, o projeto não está no Plano Nacional de Educação, ao qual a política educacional deveria estar submetida.

No que tange ao planejamento desta gestão até o presente momento nada foi feito e está adiado para fevereiro de 2020, de acordo com os relatores, por estar totalmente submetido ao calendário do Ministério da Economia. Há apenas alguns planos de trabalho pouco consistentes, sem metas, distribuição de responsabilidades, prazos etc. Até porque, houve danças de cargos ao longo de todo ano, com pouca qualidade nas escolhas, muita gente sem experiência na área.

PNE

O PNE possui 20 metas, destas, apenas 4 foram atendidas parcialmente, e desde a sua vigência (2014), 4 não foram descumpridas. Mais grave é a política de austeridade, com o teto dos gastos e agora a PEC do Pacto Federativo, que tornarão impossível o alcance da meta de financiamento ampliado e de criação do Custo Aluno Qualidade (CAQ), que lista os insumos necessários para o cálculo do valor aluno/ano para o Fundeb.

Outra questão relevante destacada no relatório é a dificuldade de mensurar algumas metas do PNE, pois não há dados para vários indicadores, tais como: porcentagem de redes municipais e estaduais com planos de carreira aprovados; porcentagens de docentes do ensino médio com curso superior etc. Metas relacionadas à educação infantil, ensino médio, alfabetização, educação superior, educação integral, dentre outras, ficaram bem distantes do previsto até 2019. No entanto, os projetos apresentados pela atual gestão, nada tem a ver com estas metas do PNE, mostrando total desinteresse por uma Lei aprovada pelo Congresso e respaldada pela população.

Orçamento

Com relação ao previsto no Plano Plurianual 2020/2023 em tramitação no Congresso e prestes a ser votado, não há indícios sobre a correlação do que está proposto com o PNE, que deveria ser o norteador da política, já que vigora até 2024. Além disso, metas e indicadores são insuficientes para um monitoramento verdadeiro da política, seja por parte do Legislativo, seja por parte da população.

A Educação foi a área mais afetada pelo contingenciamento orçamentário. E mesmo que tenha acontecido a liberação de recursos, as políticas foram prejudicadas, atrasadas, descontinuadas. As universidades, por exemplo, foram bastante lesadas, pois o ensino superior detém a maior parte dos recursos discricionários do MEC, sujeitos ao bloqueio.

Mesmo com o desbloqueio, cerca de R$ 1bilhão de reais foram cortados definitivamente, conforme aventado em artigo publicado pelo Inesc em outubro. E além do contingenciamento, em várias áreas e programas a execução foi bastante lenta. O relatório informa que o Pronatec teve apenas 1% do orçamento empenhado e o Programa Dinheiro Direito na Escola 24%. Das 4 mil creches prometidas até 2022, praticamente nada foi realizado no primeiro ano.

O relatório da Câmara dos Deputados é um importante documento de denúncia da não política de educação executada por esta atual gestão, que tem atacado cotidianamente todas as áreas, especialmente, as universidades, alvos de declarações esdrúxulas, falsas e de tentativa de desmonte por parte do ministro totalmente inábil para o cargo que ocupa.

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Em 10 anos, despesas do Ministério da Saúde com medicamentos dobraram

Nos últimos 10 anos, os gastos do Ministério da saúde com medicamentos praticamente dobraram, passando de R$ 9 bilhões em 2008 para R$ 17 bilhões em 2018. O aumento foi proporcionalmente maior do que o do orçamento da Saúde no mesmo período: os recursos do Ministério cresceram 41% em termos reais.

O levantamento foi feito pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), com dados extraídos do portal Siga Brasil, do Senado Federal, em julho de 2019. Com o objetivo de avaliar a alocação de recursos federais na promoção do acesso a medicamentos no Brasil, o Inesc utiliza a ferramenta do Orçamento Temático de Acesso a Medicamentos (OTMED).

Nesta terceira edição, o OTMED traz os dados de 2018 e revisita toda a série histórica da execução financeira do Ministério da Saúde analisada pelo Inesc nestes 10 anos.

O estudo* mostra que o aumento proporcionalmente maior do OTMED em relação ao do orçamento da Saúde em geral pressiona os já escassos recursos destinados para esse setor, inclusive aqueles designados à promoção e à prevenção. Para Luiza Pinheiro, assessora política do Inesc, ainda que o aumento do OTMED seja, a princípio, uma boa notícia, é importe verificar se eles estão de fato ampliando o acesso da população a medicamentos.

“O crescimento do investimento público em medicamentos é importante, tendo em vista as expressivas carências em saúde que acometem grande parte da população brasileira e a centralidade que os medicamentos ocupam no cuidado atual. Contudo, boa parte desses recursos é retida pelas indústrias farmacêuticas e pelo varejo, em sua maioria multinacionais e de grande porte, que têm lucros crescentes mesmo no cenário de crise”, explicou a autora do estudo.

O mercado farmacêutico apresentou crescimento acima do PIB nos últimos anos e foi um dos poucos setores não afetado pela crise de 2008. O setor faturou R$ 69,5 bilhões em 2017.

Gastos por componente

No detalhamento por componente, o Componente Estratégico (CESAF) é o que apresentou maior crescimento no período em termos reais, chegando, em 2018, a um valor duas vezes e meia maior do que o observado em 2008. O Componente Especializado (CEAF) aumentou 53%, enquanto o Componente Básico (CBAF) permaneceu praticamente constante, com elevação de apenas 3%.

O CBAF garante o custeio e a distribuição de medicamentos e insumos essenciais destinados à Atenção Básica, além de ações para a qualificação da Assistência Farmacêutica. A estagnação do orçamento do CBAF pode significar, na avaliação de Luiza Pinheiro, uma priorização da distribuição de medicamentos via programa Farmácia Popular (FP), cujo recurso triplicou, em termos reais, em 10 anos.

“O problema é que o Farmácia Popular não atende pessoas que o CBAF atende. Além disso, o Farmácia Popular, por meio da rede conveniada, acaba beneficiando a rede privada de varejo farmacêutico”, explicou Luiza. “Os programas deveriam ser complementares, mas o que acontece é a opção pela via privada”, completou.

Judicialização da assistência farmacêutica

Os gastos do MS com a judicialização de medicamentos voltaram a crescer em 2018, alcançando a marca de R$ 1,31 bilhão, mas ainda não atingindo o mesmo patamar de 2016, considerando-se a inflação.

De acordo com o levantamento, “o aumento dos gastos com a judicialização nos dois últimos anos está, em grande parte, relacionado com a aquisição de medicamentos de alto custo. Soma-se a isso a necessidade de cumprimento tempestivo das determinações impostas à União pela Justiça. Isso piora com a crise financeira dos estados, fazendo com que o governo federal assuma as obrigações judiciais, devido à obrigação solidária entre os entes públicos”.

Saúde Indígena

O Subsistema de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas recebe por ano, em média, R$1,5 bilhão. Deste total, 1,4% é gasto com medicamentos. O valor investido na saúde indígena é insuficiente para atender de forma adequada os 24 Distritos de Saúde Indígena espalhados por todo o território nacional, considerando as características específicas destas populações e seu acesso.

Recomendações

Ao final do estudo, o Inesc faz recomendações ao setor público com o objetivo de contribuir para a ampliação do acesso a medicamentos, bem como para a redução das desigualdades na realização do direito à saúde no Brasil. Algumas delas: criar mecanismos de promoção da equidade via assistência farmacêutica; fomentar a participação popular, envolvendo a sociedade civil nas questões relacionadas à Assistência Farmacêutica; e debater a efetividade dos gastos tributários, já que o setor apresentou elevações substantivas de benefícios fiscais, passando de R$ 4 bilhões em 2018 para R$ 7,5 bilhões em 2016, último dado efetivo disponível.

Metodologia Orçamento e Direitos

Desde os anos de 1990, o Inesc analisa o orçamento de políticas e serviços públicos com o prisma da realização dos direitos humanos. Para isto, desenvolveu a metodologia Orçamento & Direitos, que foi revisitada e atualizada no ano de 2017, processo que originou a publicação de sua nova edição, disponível aqui.

A metodologia prevê os Orçamentos Temáticos, construídos por meio de agrupamentos de despesas, utilizando-se plataformas de dados abertos oficiais e solicitações de informação, de forma a integrar as rubricas que destinam recursos à promoção do direito que se pretende pesquisar – o que nos permite monitorar séries históricas e acompanhar tendências dentro de um mesmo tema, sem que nos limitemos a uma política ou a um programa específicos.

*ERRATA: substituímos o arquivo do estudo para corrigir alguns erros:

–Na página 10, no Gráfico 1, onde se lia “R$ milhões a preços de 2018” o correto é “R$ bilhões”.

– Na página 19, onde se lia “Não houve aumento no número de ações que justifique a queda do valor, pois elas decrescem desde 2016 (foram 2.639 novas ações em 2016 e 1.240 novas ações em 2018)”,  o correto é “Não houve variação no número de …”.
– Na página 27 , onde se lia “O preço unitário desses medicamentos é muito alto, pois eles custam apenas 3,8% dos produtos comercializados“,  o correto é “pois eles correspondem a apenas 3,8% das unidades comercializadas“.

– Na página 28, onde se lia “Os gastos tributários com o setor também apresentaram elevações substantivas, passando de R$ 4 bilhões em 2018 para R$ 7,5 bilhões em 2016, último dado efetivo disponível”,  o correto é ” passando de R$ 4 bilhões em 2008 para R$ 7,5 bilhões em 2016, último dado efetivo disponível.”

 

Orçamento Temático de Acesso a Medicamentos: série histórica (2008-2018)

Orçamento Temático de Acesso a Medicamentos (OTMED): análise de 10 anos de recursos federais destinados à assistência farmacêutica. Estudo apresenta avaliação das execuções financeiras do Ministério da Saúde com medicamentos de 2008 a 2018.

O que muda com o novo financiamento da atenção básica à saúde?

Primeiro, o que é atenção básica?

A atenção básica à Saúde (ABS) ou atenção primária é conhecida como a porta de entrada dos sistemas de saúde. Ou seja, é o atendimento inicial, o primeiro nível de atenção. Ela oferece desde a promoção da saúde (por exemplo, orientações para uma melhor alimentação) e prevenção (como vacinação e planejamento familiar) até o tratamento de doenças agudas e infecciosas, bem como controle de doenças crônicas, cuidados paliativos e reabilitação. A ABS organiza o fluxo dos serviços nas redes de atenção à saúde, dos mais simples aos mais complexos.

Na sua essência, a atenção básica cuida das pessoas, em vez de apenas tratar doenças ou condições específicas. Ela é baseada na comunidade, ou seja, considera outros determinantes da saúde, como o território e as condições de moradia e trabalho. É o famoso postinho de saúde do bairro, a Unidade Básica de Saúde (UBS). Ela pode atender mais de 80% das necessidades de saúde de um indivíduo ao longo de sua vida.

Como ela era financiada?

O financiamento era composto por um valor fixo (PAB Fixo), corrigido por alguns parâmetros (PIB per capita, percentual da população com plano de saúde, percentual da população com Bolsa Família, percentual da população em extrema pobreza e densidade demográfica), multiplicado por toda a população do município. Além dele, era pago um valor variável (PAB Variável) para estimular a implementação e expansão da Estratégia de Saúde da Família e outros programas, por exemplo, as Equipes de Saúde da Família, Saúde Bucal e Consultório na Rua, Agentes Comunitários de Saúde, dentre outros.

O que muda com a nova portaria?

O novo modelo publicado na portaria 2.979/19, que começa a valer a partir de 2020, busca estimular o alcance de resultados e é composto por capitação ponderada, pagamento por desempenho e incentivo para ações estratégicas. Ou seja, o financiamento será feito a partir do número de usuários cadastrados nas equipes de saúde, com foco nas pessoas em situação de vulnerabilidade social (ao exemplo das que recebem auxílio financeiro do Programa Bolsa Família, Benefício de Prestação Continuada ou benefício previdenciário no valor máximo de dois salários mínimos), pagamento baseado no alcance de indicadores e adesão a projetos do governo federal, como Saúde na Hora, de informatização, dentre outros.

Quais os problemas do novo modelo?

Considerar o conjunto da população é importante para se planejar e implementar estratégias que beneficiam a todas as pessoas. Limitar o financiamento às pessoas cadastradas pode na verdade diminuir a ação do SUS e sufocar ainda mais um sistema que já conta com menos recursos que o necessário, o chamado subfinanciamento crônico.

A restrição de recursos pode prejudicar a ação comunitária, o planejamento territorial e a vigilância em saúde, ações que valem para a população como um todo e vão muito além só das pessoas cadastradas. Como a maior parte das pessoas que usa o SUS é de baixa renda, a proposta é de um SUS para os pobres, ao invés de um SUS para todos.

Com a nova portaria, algumas cidades vão ficar sem mais da metade dos recursos, uma soma que ultrapassa R$ 400 mil. Elas irão perder a única transferência governamental em saúde de base populacional atualmente existente e que pode ser aplicada com autonomia – e isso certamente é um risco para a sustentabilidade financeira do SUS municipal.

E isto é ruim, pois em vez de priorizar estas pessoas, na verdade o que está sendo feito, pouco a pouco, é o desmonte do sistema, considerando que existem diversas medidas em curso que vem asfixiando o SUS. Por exemplo, a Emenda Constitucional 95 de 2016, conhecida como Teto dos Gatos, estabeleceu um limite nas despesas do governo federal, inclusive com saúde. Agora está em discussão no Congresso a Proposta de Emenda Constitucional do Pacto Federativo que prevê a junção dos mínimos a serem aplicados em saúde e educação pelos municípios, gerando uma queda de braços entre estes dois direitos, ao invés de ampliar o recurso para ambos.

Além de outras mudanças na atenção básica: a Medida Provisória 890 ( 2019), aprovada na última semana, que cria o Médicos pelo Brasil, institui uma agência de direito privado, a Agência para o Desenvolvimento da Atenção Primária à Saúde (Adaps), para realizar serviços de responsabilidade do Estado com orçamento público e pode realizar parcerias com a iniciativa privada. Ela teria em seu conselho deliberativo um representante das empresas privadas da saúde, e não do Conselho Nacional de Saúde (CNS), que conta com a participação dos usuários e dos trabalhadores do setor. É o governo implementando cada vez mais uma lógica de privatização, ao invés do fortalecimento do serviço público. Quer dizer, é dinheiro indo para empresários e não para população, sem a comprovação de que o serviço privado tem melhor desempenho que o público.

O programa Médicos pelo Brasil, substituto do Mais Médicos, prevê ainda contratar médicos em regime CLT, abrindo mão da exigência de residência médica, e focando a estratégia apenas neste profissional e não em uma equipe multidisciplinar. Tampouco prevê a melhoria e construção de UBS. Ainda, o Ministério lançou uma consulta pública para estipular uma carteira de serviços da atenção primária, que, apesar de poder padronizar os serviços entre as diferentes UBS e aumentar a transparência para população, neste cenário de corte de recursos, pode na verdade restringir o serviço, ao invés de ampliá-lo.

Adotar a lógica do desempenho e produtividade, também importada da iniciativa privada, é complicado, pois a saúde não é – ou não deveria ser – mercadoria. Por exemplo, um maior número de atendimentos, mas feitos às pressas, não significa um melhor cuidado aos pacientes. Da mesma forma, cadastrar um número grande de pessoas sem se preocupar com suas reais necessidades em saúde pode comprometer a efetividade da estratégia adotada para aquele território.

Outro problema é a falta de transparência e de participação popular. A apresentação do novo modelo foi feita por slides, sem um documento robusto de embasamento, ou sem detalhar pontos importantes, como quais indicadores serão considerados. Além disto, apesar de ter sido aprovado na Comissão Intergestores Tripartite (CIT), composta por representantes do Ministério da Saúde e de secretários de saúde estaduais e municipais, não passou pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS). A proposta foi apresentada em julho, a portaria publicada em novembro e passa a valer em janeiro de 2020.

Em suma, os princípios do SUS, em especial a universalidade e a participação popular, e sua própria existência enquanto sistema público, são colocados em risco nesse novo modelo.

E por que defender o SUS e seus princípios é importante?

O SUS tem vários problemas, pois não é tarefa fácil criar um sistema gratuito e para todos em um país grande e diverso como é o Brasil. Mas nenhum provedor privado de saúde fornece tantos serviços quanto o SUS, que vai desde a vigilância sanitária, para garantir que a comida do restaurante seja feita com higiene, até cirurgias complexas, como transplantes cardíacos, passando pela produção de medicamentos, gestão de hospitais e unidades de pronto atendimento (UPAs) e oferta de tratamentos de alto custo.

Certamente, há muito a ser melhorado, mas mesmo com uma histórica falta de recursos, o SUS conseguiu resultados importantes, como redução da mortalidade infantil ou o controle e a eliminação de doenças por meio da vacinação. Além disso, por mais que tenha problemas como filas ou demora no atendimento ou marcação de exames e consultas, ele é um sistema ao qual todos os brasileiros podem recorrer, sejam eles pobres ou não, ao contrário do que acontece em outros países, em que os gastos com saúde levam famílias a falência.

O melhor caminho, então, seria aprimorar o SUS – e não limitar ainda mais seu financiamento. A ideia de uma cesta mínima de serviços apenas para populações mais vulneráveis é o que prega a Cobertura Universal de Saúde. Essa corrente é apoiada por organismos internacionais como a Organização Mundial da Saúde e o Banco Mundial. Mas, para nós brasileiros, na prática, essa cobertura restrita significa um retrocesso em relação ao sistema público universal, e em relação ao pacto social na saúde que acordamos na Constituição Federal de 1988.

Usa-se mais uma vez o argumento da escassez de recursos e a lógica da privatização, em vez de se promover o uso máximo de recursos e a realização progressiva de direitos bem como a participação popular, pilares importantes para o uso do orçamento público, registrados na metodologia Orçamento & Direitos do Inesc.

Essa lógica levanta soluções como os planos de saúde acessíveis ou populares. Eles podem até seduzir pela marcação de consulta imediata ou seu preço baixo. Mas se o paciente precisar de respostas mais complexas, por exemplo, uma cirurgia ou um exame mais elaborado, ele fica sem assistência. E com um SUS pequeno e limitado, no fundo, quem não tiver dinheiro não terá para onde correr.

Orçamento do Meio Ambiente encolhe e desmatamento dispara

Dos R$ 3,2 bilhões autorizados para o Ministério de Meio Ambiente em 2019, o governo Bolsonaro executou até o momento apenas R$ 2 bilhões. Para 2020, a situação é ainda pior: o orçamento previsto é de R$ 2,7 bilhões, redução de 15% em relação a 2019 e o menor de toda a série histórica.

O alerta foi feito pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) durante o seminário “Desmatamento e Queimadas na Amazônia: Tendências, Dinâmicas e Soluções”, realizado nesta quinta (28) na Câmara dos Deputados. A análise inédita do Instituto mostrou ainda que alguns programas foram praticamente extintos já este ano.

Em 2019, dos R$ 436 milhões autorizados para o Programa Mudanças Climáticas, foram gastos até 26 de novembro apenas 9%, ou R$ 40 milhões. Uma das metas do programa é justamente ampliar a capacidade de monitoramento do desmatamento na Amazônia Legal. Nenhum centavo do Fundo Nacional sobre Mudança do Clima foi aplicado até esta data.

A relação entre queda do orçamento e da sua execução e o aumento do desmatamento, que cresceu 29,5% de agosto de 2018 a julho de 2019, é inequívoca.  Para Alessandra Cardoso, assessora política do Inesc, há uma decisão política deliberada de não executar o recurso que por si só já é insuficiente para preservar a floresta e desenvolver os projetos previstos. “Temos um orçamento sistematicamente estrangulado ao longo dos anos que em 2019 atinge níveis críticos nesse cenário criminoso em que estamos vivendo”, disse.

Parte do Programa Mudanças Climáticas, a principal ação orçamentária do Ibama destinada à “Prevenção e Controle de Incêndios Florestais” encolheu de R$ 63 milhões (autorizado) em 2016 para R$ 47 milhões no primeiro ano do governo Bolsonaro. Até agora foram gastos apenas R$ 28 milhões. A proposta de orçamento do governo para 2020 reduz ainda mais os recursos previstos esta ação: apenas R$ 29,6 milhões.

Mais que os números, no entanto, é importante politizar a discussão, lembrou Alessandra. “Por que o orçamento do MMA não pode ser R$ 6 ou R$ 10 bilhões? Qual o valor social e ambiental disso? É uma escolha política não haver um orçamento 10 ou 20 vezes maior. A discussão de que não há dinheiro por conta da crise fiscal é um discurso equivocado e oportunista. Tem que ousar mais e refletir sobre qual é o destino que se quer para a Amazônia”.

A assessora do Inesc também defendeu que é preciso recompor e retomar o orçamento do Meio Ambiente para 2020. O Inesc propõe que no Plano Plurianual (PPA 2020/2023), se aprove a emenda que cria o Programa “Prevenção e controle do desmatamento e dos incêndios nos biomas” com o objetivo de reduzir o desmatamento e os incêndios e aperfeiçoar o controle ambiental.

>>> Acesse o levantamento completo com gráficos e dados sobre o orçamento destinado às políticas ambientais*

100% dos processos de demarcação de terras indígenas estão parados

Durante discurso feito em Manaus esta semana, Bolsonaro criticou o que considera “indústria da demarcação” de terras indígenas. “Nós temos no estado Amazonas, hoje, a maior parte tomado por reservas indígenas, áreas de proteção ambiental, estações ecológicas, parques nacionais, entre outras políticas ambientalistas que, em parte, prejudicaram o crescimento do nosso Brasil”, disse.

Além disso, Bolsonaro tem reiteradamente dito que enquanto for presidente, não haverá demarcação de terras indígenas. Durante o seminário, Kleber Karipuna, representante da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, lembrou que isso é inconstitucional. “É um direito garantido na Constituição Federal, mas de uns tempos para cá praticamente 100% dos processos de demarcação estão parados”.

Para Karipuna, estamos voltando à época de massacres constantes que ameaça inclusive povos isolados “Esses povos podem ser dizimados antes mesmo de confirmada a sua existência. Isso se agrava com o crescimento da política desse governo em favorecer o avanço do agronegócio e asupressão dos direitos conquistados”, disse.

Levantamento do CIMI mostra que 21 Terras Indígenas com registros da presença de povos isolados foram invadidas por madeireiros, garimpeiros, grileiros, caçadores e outros em 2019.

Kleber Karipuna lembrou também que, nos territórios indígenas, o princípio do combate aos incêndios é feito pelos próprios povos indígenas, seja com brigadas e com iniciativas como os Guardiões da Floresta. E lembrou o caso da TI Arariboia, no Maranhão, onde foi assassinado o guardião Paulino Guajajara e área que enfrenta incêndios constantes.

“O caso do Paulino nos preocupa porque pode ser o estopim de vários se não enfrentarmos essas questões. Não foram os pistoleiros. Quem apertou o gatilho indiretamente foram outras pessoas”, afirmou.

Desmatamento só cairá com comando e controle

Outros participantes do seminário apresentaram dados sobre a incidência de desmatamento e queimadas na Amazônia com destaque para a importância da fiscalização, monitoramento e medidas efetivas para resolver esses problemas.

Claudio Almeida, do INPE, Paulo Barreto, do Imazon, Ane Alencar, do IPAM e Mariana Napolitana, do WWF, enfatizaram que a ciência é fundamental para dar suporte a essas ações.

Diretora de ciência do IPAM, Ane afirmou que, pelas análises, já é possível saber onde irão acontecer as queimadas em 2020. “As áreas que não queimaram em 2019 precisam ser passíveis de investigação. Nós sabemos onde vai acontecer o fogo ano que vem. Só em terras públicas está um terço do desmatamento. É importante que isso seja uma prioridade desse governo”, cobrou.

O procurador federal Felício Pontes, da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF, que atua no Pará, relatou que acompanhou todos os planos de controle do desmatamento implantado pelos últimos governos federais. Para Pontes, havia um plano que atacava diretamente o desmatamento e uma intenção do governo em fazer que aquilo acontecesse, independente de algumas iniciativas serem mais ou menos bem-sucedidas. Hoje, a situação é diferente.

“O Ministério Público deve ser visto primordialmente como termômetro da situação. Quando a política ambiental não dá certo, há uma demanda que em primeiro lugar bate dentro dos órgãos do sistema de Justiça. Temos exata noção do que deu certo e não deu certo dentro da área em que trabalhamos”, lembrou.

“Quando a gente vê o debate acontecendo hoje, que tem como objetivo desqualificar o trabalho técnico e científico do INPE e de organizações da sociedade civil, a gente vê um retrocesso que remonta há 30 anos”, afirmou Adriana Ramos, do Instituto Socioambiental (ISA).

Para Ramos, retrocedemos para a época da Rio 92, quando se começou a construir um consenso de que o Brasil tinha que mudar o padrão de ocupação da Amazônia, de uma lógica que dizia que o desmatamento era caminho para o desenvolvimento. “E o que a gente vê hoje é essa mudança de paradigma. O governo federal traz para a agenda política o fortalecimento de ações que são ilegais e pressionam o uso sustentável da floresta”, criticou.

Brent Millikan, da International Rivers, citou o “Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm)” como exemplo de políticas que já existem e funcionam para superar a emergência crônica de desmatamento e queimadas. “Mas isso requer a atuação coordenada de governo e colocar o desmatamento no centro da política ambiental. Essa ação integrada e efetiva pressupõe a superação de velhas dicotomias de desenvolvimentismo versus política ambiental, senão não tem como ter uma política coordenada. Isso continua como um desafio”, disse.

Para o deputado Airton Faleiro (PT-PA), é importante trazer capital técnico científico e vencer a disputa narrativa. “Em diversos momentos vencemos a guerra pela questão científica. Esse povo nunca aceitou regramento, ordenamento, o capital está muito encorajado com o discurso oficial. Não é questão cultural e climática”, afirmou.

Já de acordo com o deputado Nilto Tatto (PT-SP), da Frente Parlamentar Ambientalista e autor do requerimento para a realização do evento, é importante lembrar que o governo Bolsonaro tem maioria na Câmara e no Senado, mas que eventos como esse fortalecem a articulação intersetorial para um debate técnico em defesa da Amazônia.

Também participaram do evento representantes de movimentos sociais e organizações da sociedade civil como a Comissão Pastoral da Terra (CPT), Terra de Direitos, Greenpeace , Amigos da Terra, Xingu Vivo, entre outros.

É possível assistir ao evento no arquivo do site da Câmara dos Deputados.

 

*Errata: o levantamento impresso distribuído ontem durante o seminário continha dois erro: na legenda do gráfico “Orçamento cai, desmatamento sobe”, onde se lê “dados de julho a agosto de cada ano” considerar “dados de agosto a julho”. E no texto referente ao gráfico “Ação de prevenção e controle de incêndios florestais”, onde se lê “seu orçamento encolheu de R$ 63 milhões em 2018 para R$ 45 milhões em 2019” considerar “encolheu de R$ 63 milhões em 2016 para R$ 47 milhões em 2019”.

Povo Munduruku denuncia o garimpo e a retomada de projetos na Amazônia

Mais de 50 lideranças do povo indígena Munduruku realizaram uma coletiva de imprensa em Brasília, no dia 21/11, depois de viajar mais de 2.000 quilômetros em três dias. Em pauta, o garimpo ilegal, a retomada de grandes projetos na Amazônia, a saúde em risco, a demarcação de terras e a guerra declarada pelo governo federal.

“Quando Bolsonaro disse que não ia demarcar mais um centímetro de terra ele declarou guerra aos povos indígenas. Estamos aqui para mostrar quem somos e de onde viemos. Nós, mulheres, nos sentimos ameaçadas pelo futuro dos nossos filhos. Sempre resistimos e vamos resistir”, declarou a liderança Maria Leusa Munduruku.

Garimpo ilegal

O tom se justifica. A FUNAI, tomada pelos ruralistas, se recusou a recebê-los. A região do Tapajós é a que mais concentra garimpo ilegal em toda a Amazônia, segundo o ICMBio, e grande parte está nas terras Munduruku.

O Complexo do Tapajós tem 43 projetos de usinas hidrelétricas previstas, obras que o governo Bolsonaro diz querer retomar. Além destas, há também portos e ferrovias, como a Ferrogrão, investimento bilionário que ainda não ouviu os povos indígenas, como exige a Constituição.

“Não aceitamos projetos e garimpo em lugar algum. Vamos reivindicar a demarcação de terras e lutar”, disse o cacique José Emiliano.

Pesquisas recentes indicam que a população indígena está contaminada por mercúrio. O garimpo também traz outros problemas, como a intensificação de epidemias de malária.

Além das usinas hidrelétricas planejadas, os Munduruku já sofrem os impactos das hidrelétricas de Teles Pires e São Manoel, construídas sem qualquer consulta prévia.

Para Ana Poxó, violar a Constituição é desrespeitar tudo que os antepassados do seu povo conquistaram. “Quando tocam nos rios e nas florestas, estão tocando em nós. Queremos viver em paz e vamos continuar lutando”, disse. O cacique Geraldo Munduruku continuou. “Vocês achariam bom se invadissem a terra de vocês? A casa de vocês? Imagino que não. Parem de levar projetos que destroem o nosso povo”, pediu.

Os impactos que os indígenas sofrem na Amazônia e a atual conjuntura da região será debatida no seminário “Desmatamento e Queimadas na Amazônia: Tendências, Dinâmicas e Soluções”, que será realizado pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS) da Câmara dos Deputados nesta quinta-feira, dia 28 de novembro.

Representantes da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e da Associação Terra Indígena do Xingu (ATIX) estarão presentes. Durante o seminário também será divulgada uma nova análise do orçamento destinado à prevenção e controle de desmatamento. O estudo do Inesc foi elaborado após a divulgação pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) de que o desmatamento na Amazônia aumentou 29,5% de agosto de 2018 a julho de 2019, em comparação com os 12 meses anteriores.

“A Amazônia está sendo vista só como dinheiro”

Além do garimpo ilegal, os povos indígenas enfrentam também o projeto de regulamentação da mineração em terras indígenas que o governo Bolsonaro deve enviar a qualquer momento ao Congresso.

Atualmente, constam na Agência Nacional de Mineração 4.332 pedidos de pesquisa mineral que podem incidir sobrepelo menos 215 terras indígenas (TIs) e 160 etnias em todo o país (30% do total) em áreas que somam o equivalente a 28 milhões de campos de futebol somente na Amazônia Legal.

“Nós não queremos ser donos do Brasil. Queremos apenas a nossa terra. A Amazônia está sendo vista só como dinheiro. Para nós a Amazônia é cultura, vidas, etnias, crenças, lugares sagrados, não é ouro, nióbio, bauxita. Para nós a terra é vida”, disse o líder Valdemir KabáMunduruku.

De acordo com Valdemir, mesmo depois de várias denúncias ao longo dos anos, o Estado brasileiro nunca cumpriu o seu dever. “E agora estamos diante de um presidente que se senta com o agronegócio e os ruralistas. Temos uma Funai que não nos representa. Hoje quem dita as regras são os grandes empresários que viabilizam a destruição do território”, afirmou.

Alessandra Munduruku. Foto: Cimi

Para Alessandra Munduruku, a situação das terras indígenas com a invasão do garimpo ilegal sempre foi crítica e agora piorou. “O garimpo é a morte do rio, da Amazônia. Uma guerreira perguntou para um deputado se ele tem coragem de beber a mesma água que as nossas crianças bebem todos os dias”, lembrou.

Para Alessandra, é alarmante que a FUNAI também não cumpra o seu papel e o presidente da instituição se recuse a receber os povos indígenas. “A FUNAI foi receber ruralista que está nos matando. Para que existe a Funai então? Temos que ir sozinhos? Não tem apoio de ninguém?”.

Segundo o relatório “Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil” de 2018 do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), no último ano foram registrados 109 casos de “invasões possessórias, exploração ilegal de recursos naturais e danos diversos ao patrimônio”, enquanto em 2017 haviam sido registrados 96 casos. Nos nove primeiros meses de 2019, dados parciais contabilizam 160 casos do tipo em terras indígenas do Brasil.

Também houve um aumento no número de assassinatos registrados (135) em 2018, sendo que os estados com maior número de casos foram Roraima (62) e Mato Grosso do Sul (38). Em 2017, haviam sido registrados 110 casos de assassinatos.

Alessandra Munduruku lembra que a demarcação é fundamental para provar que a terra é de fato dos povos originários. “Isso é dever do Estado. Bolsonaro é um grande mentiroso. Ele precisa respeitar a Constituição e os povos indígenas”, cobrou.

Nova análise do orçamento destinado à prevenção e controle de desmatamento será divulgada durante seminário no Congresso

A ação orçamentária “Prevenção e Controle de Incêndios Florestais nas Áreas Federais Prioritárias”, vinculada ao Programa de “Mudanças do Clima” encolherá de R$ 45 milhões em 2019 para R$ 29,6 milhões em 2020, segundo a proposta de orçamento do governo federal que tramita no Congresso Nacional. A análise do orçamento destinado a esta finalidade nos últimos três anos será divulgada na quinta-feira (28/11) pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), no Plenário 02 da Câmara dos Deputados, durante o seminário “Desmatamento e Queimadas na Amazônia: Tendências, Dinâmicas e Soluções”.

O novo estudo do Inesc foi elaborado após o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) ter divulgado dados do Programa de Cálculo do Desflorestamento da Amazônia (Prodes) relativos ao período de 1º de agosto do ano passado e 31 de julho deste ano. Segundo o Inpe, o desmatamento na Amazônia aumentou 29,5%, maior taxa desde 2008 e, percentualmente, a maior alta de um ano para o outro dos últimos 22 anos.

De acordo com assessora política do Inesc, Alessandra Cardoso, responsável pelo levantamento, este é o momento crucial para discutir o comportamento do orçamento de políticas que estão vinculadas ao enfrentamento do desmatamento, já que o Plano Plurianual (PPA) 2020-2023 está em análise no Congresso Nacional.

Para ela, o levantamento é importante, pois demonstra como o atual governo atua para que as políticas públicas relativas ao desmatamento implementadas nos últimos anos deixem de operar.

“Não tem como combater o problema do desmatamento sem políticas públicas, sem que o estado atue no comando e controle. É perceptível com esse estudo que, muito além do discurso adotado pelos representantes do governo, que é muito danoso, as ações propriamente ditas estão em processo de desmonte muito acelerado. Há cortes de pessoal, orçamento, o que inviabiliza que os analistas ambientais façam seu trabalho corretamente”, afirma.

O Inesc analisou o comportamento orçamentário dos últimos três anos e considerou as ações e programas que estão vinculados ao desmatamento, tais como a fiscalização de terras indígenas, gestão e fiscalização das unidades de conservação federais e ações específicas de combate ao desmatamento e incêndios florestais.

Seminário na Câmara

O seminário “Desmatamento e Queimadas na Amazônia: Tendências, Dinâmicas e Soluções” é realizado pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS) da Câmara dos Deputados, e está previsto para começar às 9h de quinta-feira (28 de novembro).

Além do estudo do Inesc, cientistas, organizações da sociedade civil, parlamentares, setor privado e governo debaterão o tema com avaliações e recomendações baseadas em experiências bem-sucedidas de comando e controle.

Para Sérgio Guimarães, secretário executivo do GT Infraestrutura, “os dados do Inpe sobre o desmatamento são alarmantes e exigem que medidas urgentes sejam pensadas para cessar os danos à maior floresta tropical do mundo, às comunidades que nela vivem e ao mundo inteiro.”

Segundo Flávio Montiel, da International Rivers Brasil, o seminário dará a oportunidade de um debate mais aprofundado sobre o tema. “O que esperamos é um debate qualificado sobre tendências recentes do desmatamento e queimadas e suas causas, lições de experiências inovadoras na sua prevenção e controle, e desafios para viabilizar soluções práticas para os problemas identificados”.

O evento contará com a participação de pesquisadores que têm liderado esforços de monitoramento do desmatamento e queimadas na Amazônia, como Claudio Almeida, coordenador do Inpe, Paulo Barreto do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (IMAZON) e Ane Alencar do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM).

Também estarão representantes dos povos indígenas e movimentos sociais, como a Associação Terra Indígena do Xingu (ATIX), e de entidades da sociedade civil, como a Comissão Pastoral da Terra (CPT), Terra de Direitos e Instituto Socioambiental (ISA).

A lista ainda inclui representantes do Ministério Público Federal (MPF) e do setor privado, além dos deputados federais Rodrigo Agostinho, presidente da Comissão de Meio Ambiente da Câmara, e Nilto Tatto da Frente Parlamentar Ambientalista, autor do requerimento para a realização do evento. Confira a programação completa abaixo.

O que: Seminário “Desmatamento e Queimadas na Amazônia: Tendências, Dinâmicas e Soluções”

Quando: 28 de novembro de 2019 (quinta-feira)

Onde: Plenário 02 – Anexo II – Câmara dos Deputados, Brasília/ DF

Horário: 9h às 18h

Mais informações: https://inesc.org.br/seminariodesmatamento/

Movimento Nossa Brasília e Inesc lançam segunda edição do Mapa das Desigualdades do DF

O Movimento Nossa Brasília, o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) e a Oxfam Brasil lançaram a segunda edição do Mapa das Desigualdades do DF. A publicação analisa as desigualdades que permeiam o território do Distrito Federal, a partir do cruzamento dos dados coletados na Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios – PDAD (Codeplan/2019) do Governo do Distrito Federal com pesquisas qualitativas realizadas pelas duas organizações.

De acordo com o coeficiente de GINI, que mede o grau de concentração de renda em determinado grupo ou localidade, a desigualdade no DF ampliou: o número foi de 0.53 em 2015, para 0.58 em 2018. Essa pesquisa mostrou que cerca de 55% da população está entre a renda baixa e média baixa, sendo que as de menores rendas residem na Estrutural, Fercal, Itapoã, Paranoá, Recanto das Emas e Varjão, regiões historicamente desassistidas pelas políticas públicas.

O Mapa das Desigualdades, por sua vez, mede e compara, além de renda, dados sobre saúde, educação, cultura, saneamento básico e segurança pública, entre outros, de regiões administrativas do Distrito Federal com o Plano Piloto da capital. Nesta edição, as cidades presentes no primeiro Mapa tiveram seus dados atualizados: Samambaia, Estrtural, São Sebastião. A grande novidade é a inclusão de mais duas Regiões Administrativas, o Paranoá e o Itapoã.

“O catálogo é um importante instrumento de análise das políticas públicas no DF. É preciso que se planeje e execute políticas de ação afirmativa, de infraestrutura das cidades, especialmente aquelas com menores rendas e piores condições de vida. O Mapa mostra quão ruins estão as condições das cidades”, afirma Cleo Manhas, educadora e integrante do Movimento Nossa Brasília.

Raça e renda

Cidade Estrutural, DF. Foto: Arthur Menescal

A primeira análise da publicação é o mapa de renda e raça no DF. Os dados escancaram que os territórios majoritariamente negros são os mais pobres. Nestes locais faltam vagas nas escolas, postos de saúde, saneamento básico, segurança pública que de fato atenda à população e não a reprima, calçadas, ciclovias, paradas de ônibus cobertas. É explícito como o Estado vai ficando ausente na medida em que se afasta do centro onde residem as populações mais abastadas e brancas, como o Plano Piloto, Lagos Sul e Norte, Sudoeste, Noroeste, Park Way. De acordo com os indicadores da PDAD, estes locais são os mais servidos de políticas públicas.

Nos indicadores de bem-viver, lazer (parques, jardins e quadras esportivas) e arborização fica visível a desigualdade. O Plano Piloto é abastecido de todos eles, de árvores a parques e quadras, enquanto o Itapoã tem apenas 20% dos seus domicílios em ruas arborizadas. O único quesito que o Paranoá é próximo do Plano é quanto às quadras esportivas, ainda assim, no Itapoã é insuficiente.

Analisando a educação, há muitas crianças e adolescentes frequentando escolas fora de suas regiões, principalmente por falta de vagas próximos de suas residências. O que se verifica nos territórios com mais baixa renda, como Estrutural e Itapoã. Na Estrutural, houve uma pequena melhora entre 2016 e 2018, indo de 38% para 51% aquelas (es) que conseguem estudar próximos de casa, no entanto, no Itapoã esse número fica em 26% apenas. Plano Piloto e Samambaia estão com melhor oferta, ficando acima de 80%, São Sebastião em 94%.

A Cidade Estrutural se destaca em problemas de infraestrutura e saneamento básico. Ela apresenta o maior número de ruas esburacadas, cerca de 55%, em contraponto ao Plano, com 15%. É também a região com maior número de domicíios próximos a áreas de descarte de entulho. Além disso, é campeã nas ruas alagadas, seguida de Samambaia, Paranoá, São Sebastião, Itapoã e por último, Plano Piloto.

Com relação à saúde, o abismo é ainda maior. No Plano Piloto estão a maior parte dos equipamentos, mesmo com a população quase que integralmente usuária de planos de saúde privados: 83% da população do Plano Piloto possui plano de saúde, enquanto que nas demais regiões não passa de 20% em Samambaia, 17% em São Sebastião e, na outra ponta, a Estrutural, com apenas 5%. Nas cidades onde há menos equipamentos de saúde pública a grande maioria da população depende exclusivamente deles.

Mapa das Desigualdades 2019

O Movimento Nossa Brasília, o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) e a Oxfam Brasil lançaram a segunda edição do Mapa das Desigualdades do DF. A publicação analisa as desigualdades que permeiam o território do Distrito Federal, a partir do cruzamento dos dados coletados na Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios – PDAD (Codeplan/2019) do Governo do Distrito Federal e a partir de pesquisas qualitativas realizadas pelas duas organizações.

Essa pesquisa mostrou que cerca de 55% da população está entre a renda baixa e média baixa, sendo que as de menores rendas residem na Estrutural, Fercal, Itapoã, Paranoá, Recanto das Emas e Varjão, regiões historicamente desassistidas pelas políticas públicas.

Seminário reúne cientistas e diversos setores da sociedade para debater desmatamento e queimadas na Amazônia

Atualização:

Assista ao vídeo com a íntegra do Seminário no site da Câmara dos Deputados

Acesse as apresentações (slides) dos palestrantes

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O desmatamento na Amazônia subiu 29,5% entre 1º de agosto do ano passado e 31 de julho deste ano, em comparação com os 12 meses anteriores, atingindo a marca de 9.762 km², segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) divulgados na segunda-feira (18/11).  Os últimos números do desmatamento trazidos à tona pelo Inpe são os mais altos desde 2008 e, percentualmente, representam a maior taxa de um ano para o outro dos últimos 22 anos.

Esse cenário crítico na região amazônica será o tema do seminário “Desmatamento e Queimadas na Amazônia: Tendências, Dinâmicas e Soluções”, que será realizado pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS) da Câmara dos Deputados, na quinta-feira, dia 28 de novembro.

Assista ao teaser do Seminário:

Para Sérgio Guimarães, secretário executivo do GT Infraestrutura, “os dados são alarmantes e exigem que medidas urgentes sejam pensadas para cessar os danos à maior floresta tropical do mundo, às comunidades que nela vivem e ao mundo inteiro.”

Segundo Flávio Montiel da International Rivers Brasil, a motivação para a realização do seminário foi a necessidade de um debate mais aprofundado sobre o tema, reunindo diversos setores da sociedade brasileira: cientistas, entidades da sociedade civil, parlamentares,  setor privado e governo. “O que esperamos é um debate qualificado sobre tendências recentes do desmatamento e queimadas e suas causas, lições de experiências inovadoras na sua prevenção e controle, e desafios para viabilizar soluções práticas para os problemas identificados”, afirma.

O evento contará com a participação de pesquisadores que têm liderado esforços de monitoramento do desmatamento e queimadas na Amazônia, como Claudio Almeida, coordenador do Inpe, Paulo Barreto do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (IMAZON) e Ane Alencar do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM).

Também participação representantes de povos indígenas e movimentos sociais, como a Associação Terra Indígena do Xingu (ATIX), e de entidades da sociedade civil, como a Comissão Pastoral da Terra (CPT), Terra de Direitos, Instituto Socioambiental (ISA) e do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).

Ainda estão previstas as presenças de representantes do Ministério Público Federal (MPF) e do setor privado, além dos deputados federais Rodrigo Agostinho, presidente da Comissão de Meio Ambiente da Câmara, e Nilto Tatto da Frente Parlamentar Ambientalista, autor do requerimento para a realização do evento

Confira a programação:

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