As instituições signatárias vêm, respeitosamente, por meio desta, manifestar ciência da importante campanha “Por uma Infância livre da Publicidade Comercial“, proposta pela Comissão Especial de Defesa do Consumidor da OAB, presidida por Marié Miranda, e idealizada pelo presidente da Comissão de Defesa dos Direitos dos Consumidores da OAB-RO, Gabriel Tomasete.
Por sua relevância, o tema tem despertado a atenção de integrantes do sistema de justiça e da sociedade como um todo. Assim, a aprovação da campanha, que se pretende ser desenvolvida por meio de atuação conjunta das Comissões de Defesa do Consumidor, da Criança e do Adolescente e da Mulher Advogada – mostra-se necessária. Nela estão expressos os graves impactos do consumismo na infância, bem como o dever de proteção a garantias fundamentais asseguradas às crianças, tais como a prioridade absoluta dos seus direitos, seu melhor interesse e proteção integral, inclusive nas relações de consumo.
Em vista de sua missão constitucional, é de suma importância que o Conselho Federal da OAB também leve a discussão sobre o consumismo na infância e o direcionamento de publicidade ao público infantil à sociedade e a outras fundamentais instituições do universo jurídico.
O direcionamento de publicidade aos indivíduos com menos de 12 anos de idade é considerado ilegal pelo ordenamento normativo brasileiro, pois se vale da peculiar condição de desenvolvimento bio-psicológico da criança para persuadir-lhe ao consumo de produtos e serviços, conforme fartamente fundamentado no parecer jurídico que embasa a referida Campanha, que se baseia no disposto nos artigos 227, da Constituição Federal, Lei nº 8.069 de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), Lei nº 8.078 de 1990 (Código de Defesa do Consumidor), especialmente os artigos 36, 37, §2º e 39, IV, e Resolução nº 163 de 2014 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda).
A abusividade do direcionamento de publicidade para crianças também vem sendo analisada pelo Poder Judiciário. Em março de 2016, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, condenou a empresa Pandurata, detentora da marca Bauducco, pela campanha “É hora de Shrek”, de 2007, e objeto de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público de São Paulo (REsp n. 1558086/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, d.j. 10.3.2016). A mesma Segunda Turma, em novo julgamento, também reconheceu como abusiva a campanha publicitária “Mascotes”, da Sadia, veiculada durante os Jogos Pan Americanos do Rio de Janeiro, em 2007, e que havia sido objeto de multa administrativa aplicada pela Fundação Procon de São Paulo (REsp n. .613.561/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, d.j. 25.4.2017).
No âmbito do Poder Legislativo, no último 24.5.2017, mediante pressão social exercida por mães, pais, responsáveis por crianças, organizações da sociedade civil, acadêmicos e deputados, a Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara dos Deputados rejeitou a proposta de mudança do art. 37, do Código de Defesa do Consumidor, apresentada pelo Deputado Federal Eli Corrêa Filho, no âmbito do PL n. 3.515 de 2015, que trata de superendividamento, e retiraria da legislação consumerista a proteção das crianças frente a publicidades abusivas. A respeito dessa iniciativa legislativa, no dia 16.5.2017 foi realizada audiência pública com participação de Cláudia Lima Marques, vice-presidente da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB, representando o Brasilcon; Arthur Rollo, Secretário Nacional do Consumidor; Adalberto Pasqualotto, professor titular da PUC/RS; Igor Britto, advogado do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e Renato Godoy, assessor de relações governamentais do Instituto Alana.
É certo, ademais, que o debate sobre comunicação comercial e infância não se restringe apenas ao meio jurídico, tendo alcançado as mais diversas searas. Em 2014, por exemplo, a publicidade direcionada à criança foi tema da redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), levando quase 10 milhões de jovens brasileiros a refletir e escrever sobre o assunto. Pesquisa do Instituto Datafolha, realizada em agosto de 2016, com 2.573 pessoas de 160 municípios das cinco regiões do país, revelou, também, um descontentamento da população brasileira para com a comunicação comercial dirigida ao público infantil. O trabalho aponta que 60% dos entrevistados são contra qualquer tipo de publicidade direcionada à criança.
No campo internacional, destacam-se os relatórios da Organização das Nações Unidas, Organização Mundial de Saúde e Organização Panamericana de Saúde, sobre o impacto das estratégias publicitárias, inclusive dentro de escolas, na fruição dos direitos culturais e nos riscos de publicidades de produtos alimentícios ultraprocessados à saúde das crianças. Inegáveis os crescentes níveis de obesidade e de doenças crônicas não transmissíveis que atingem a população mais jovem, o que gera repercussões negativas à economia dos países, conforme atesta estudo da consultoria McKinsey, segundo o qual o Brasil gasta 2,4% de seu PIB com custos decorrentes de obesidade, o que inclui despesas no campo da saúde pública, direitos trabalhistas e previdenciários.
Dado o destaque essas questões estão tendo na atualidade, algumas empresas também se pronunciaram a seu respeito. Coca-Cola Brasil, Ambev e PepsiCo reconheceram que crianças abaixo de 12 anos ainda não têm maturidade suficiente para tomar decisões de consumo e a Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e de Bebidas não Alcoólicas (Abir) recomendou às indústrias associadas que suspendessem a propaganda de seus produtos voltados para crianças até 12 anos.
Ante o exposto, diante do papel da Ordem dos Advogados do Brasil de colocar em pauta temas de relevância social e do compromisso firmado por essa nobre Instituição de se proteger os direitos das crianças com prioridade absoluta, inclusive nas relações de consumo, as instituições signatárias manifestam-se pela aprovação da campanha “Por uma Infância Livre da Publicidade Comercial” nos termos em que apresentada.
Atenciosamente,