Meninas de todo país vão à Brasília pelo direito a uma educação sem racismo, sem sexismo e sem capacitismo

13/08/2024, às 10:22 (atualizado em 13/08/2024, às 16:41) | Tempo estimado de leitura: 10 min
Objetivo foi incidir para um novo Plano Nacional de Educação (PNE) mais inclusivo
Foto: Ramona Jucá

“A educação deve ser livre e justa. Onde cada voz e cada corpo se ajusta. Sexismo é a raiz dos preconceitos, destrói sonhos, causas e respeito. Meninas e meninos iguais em valor, devem crescer com respeito e amor. Educação para todos sem distinção, em um mundo sem muros, sem segregação. Diversidade é a nossa força, nossa guia. Na escola da vida, essa é minha melodia. Que nasça uma educação consciente, onde a igualdade floresça eloquente. Contra o racismo, contra o sexismo e contra tudo que não é justo. Lutamos por um pouco de humanismo. Nas salas de aula, sem medo e sem dor, ensinem paz, ensinem o amor. Libertem as mentes e pensem em voar para um futuro brilhante alcançar, que essa palavra inspire uma educação mais justa e inclusiva”, poema de Ana Beatriz Alves do Nascimento, do Centro Integrado de Educação Pública César Pernetta, no Rio de Janeiro/RJ.

 

Foto: Ramona Jucá

Foi com esse espírito, mística e palavras de luta que mais de 25 meninas entre 16 e 23 anos, ocuparam espaços do governo federal, no mês de julho, em Brasília (DF). Em luta por uma educação antirracista, antissexista e anticapacitista, elas foram ao centro do poder do país afirmar que querem um novo Plano Nacional de Educação (PNE), mais diverso e inclusivo. Em agendas intensas no Congresso Nacional e no Ministério da Educação (MEC), colocaram em prática ações de incidência política em que se aprofundaram durante a participação em processos de formação e atividades promovidas nos últimos dois anos pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) por meio do Projeto Malala. Além da interação com os gestores públicos sobre suas demandas, as meninas também realizaram um ato político-cultural no Hall da Taquigrafia da Câmara dos Deputados e com discursos, música e dança, reivindicaram uma educação de qualidade para todas as pessoas. 

Vindas da Escola Bosque, em Outeiro no Pará, da CED 310 em Brasília, da Ciep 316 no Complexo da Maré no Rio de Janeiro, do Colégio Estadual Quilombola Diogo Ramos, no Quilombo João Surá no Paraná e do Centro de Defesa da criança e do Adolescente (Cedeca) Ceará, e acompanhadas também por professoras de suas escolas e a equipe do Inesc, as meninas tiveram agenda com a coordenação da Secadi (Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão), e falaram diretamente com gestores públicos. As deputadas federais Erika Kokay (PT/DF) e Sâmia Bonfim (PSOL/SP) também marcaram presença nas atividades protagonizadas pelas meninas. Esse encontro foi um marco importante do projeto, mostrando às participantes que esses espaços de poder pertencem a elas e ao povo brasileiro. 

“O novo PNE determinará diretrizes, metas e estratégias para a política educacional do Brasil no período de 2014 a 2024 e o objetivo do Inesc com a execução do projeto é de continuar reforçando uma educação emancipadora e inclusiva, que pode contribuir a redução das desigualdades que meninas, meninos e jovens também possam protagonizar essa luta colocando suas demandas e necessidades na busca do fortalecimento dos seus direitos”, explicou Cleo Manhas, assessora política do Inesc. De acordo com ela, foi por isso que, ao longo dos dois anos de execução do projeto, a equipe de educadoras do Instituto realizou formações em todas as regiões do país, sempre em construção conjunta com escolas, gestores, professoras e educadoras, além do envolvimento das meninas. 

Sabrina da Mata, de Fortaleza, no Ceará, contou que as atividades promovidas com o apoio do Fundo Malala deram voz às meninas. “Trouxemos essa pauta de cada estado e vimos que tínhamos muitas questões em comum. E o Projeto Malala possibilitou e possibilita nosso poder de fala, que muitas vezes não somos ouvidas. A gente acumulou mais conhecimento e é muito importante esse lugar que o Inesc proporciona. Eu estou muito feliz em estar com outras meninas tão incríveis”, compartilhou.

Cleo Manhas reforça a importância dessa ação com as meninas ocupando esses espaços de decisões políticas. “Conseguir reunir adolescentes e jovens mulheres em Brasília, para estarem nos espaços de poder e apresentarem suas reivindicações acerca da educação de qualidade, que seja para todas as pessoas, sem racismo ou preconceitos de qualquer natureza, é muito importante para a formação de ativistas que lutam por direitos.” 

Formação para incidência política

 

Foto: Ramona Jucá

A metodologia de trabalho do Inesc tem como princípio a participação das meninas para a incidência política. A atividade realizada por elas em Brasília foi a culminância de um processo de formação que teve como um dos módulos oficinas em educomunicação que debateram a construção do novo PNE diretamente com elas. A partir da premissa de que a comunicação é um direito humano e é essencial para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária e para luta por outros direitos, foram realizadas formações durante dez semanas. O processo de formação virtual foi um complemento das formações presenciais nas escolas, e nele trabalharam os temas relacionados ao PNE e os primeiros módulos foram facilitados pela equipe de educadoras do Inesc, com uma abordagem mais aprofundada sobre direito à educação de gênero. 

No terceiro encontro, sob a orientação das convidadas Paula Ferreira e Gal Almeida Costa, Rede de Ativistas, as meninas refletiram sobre a importância do letramento racial, tanto para pessoas negras quanto não negras, e o papel social da educação no processo de humanização. Temas como racismo, preconceito, discriminação, e a aplicação das Leis 10.639/2003 e 11.645/2008 foram amplamente discutidos. Em seguida se iniciaram sete oficinas com foco em educomunicação e temas correlacionados, facilitados por comunicadoras da agência Angola Comunicação

Entre os temas abordados estiveram a importância das narrativas na construção da identidade e da memória coletiva, comunicação como  ferramenta de transformação social, fake news e desinformação, criação de conteúdos, entre outros. Em uma etapa seguinte, as meninas produziram seus próprios conteúdos, com a proposta de mobilizarem suas escolas e espaços de atuação para a importância de um novo PNE que priorize questões como antirracismo, antissexismo e anticapacitismo. “As formações foram momentos em que a gente construiu conhecimento junto, tecendo conexões entre os temas, mas também entre as participantes. A gente viu que algumas coisas que não são tão legais e que estão acontecendo na minha realidade sobre educação também são questões lá do outro lado do país, que tem outras pessoas também passando. E vimos com isso a grande importância de nos juntarmos para, coletivamente, buscar melhorias”, explicou a estudante Kamillly Aguiar, de Brasília. 

Além das formações e da incidência política direta das meninas em Brasília, o projeto plantou sementes para a formação de futuras ativistas. Agora, as meninas tem mais informações sobre seus direitos e mais fortemente a capacidade de influenciar políticas públicas também locais e lutar por uma educação antirracista, antissexista e anticapacitista. E demonstra como a comunicação, aliada à educação, pode ser uma ferramenta poderosa para a transformação social e de mobilização. 

“Às vezes a gente sofre racismo, mas acaba deixando pra lá, só que não pode ser assim, a gente tem que lutar pelos nossos direitos, conhecer as leis e com nossa luta poder também ajudar outras pessoas. Para mim é muito importante estar aqui participando desse encontro e poder levar os conhecimentos para minha comunidade”, conta a estudante Deisiane Lima Pereira, da Escola Estadual Quilombola Diogo Ramos, no Quilombo João Surá, Adrianópolis, no Paraná. 

A expectativa é que as meninas continuem em luta por seus direitos e que mais iniciativas como essa sejam realizadas, fortalecendo a voz e a presença das meninas e mulheres na política e na sociedade brasileira.

Categoria: Notícia
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