01 de setembro de 2025.
Na terça-feira, 2 de setembro, terá início o julgamento que pode resultar na condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro e de mais sete aliados acusados de tentar dar um golpe de Estado após as Eleições de 2022. A partir das provas abundantes registradas nas 884 páginas do relatório da Polícia Federal, os réus serão julgados pelos crimes de: Organização criminosa armada, Tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, Golpe de Estado, Dano qualificado pela violência e grave ameaça e Deterioração de patrimônio tombado.
Ao lado do ex-capitão do Exército Jair, figuram ex-autoridades importantes: Alexandre Ramagem (ex-diretor da Abin e ex-delegado da PF), que, devido ao foro privilegiado, foi beneficiado com a suspensão de parte das acusações, respondendo somente a três dos cinco crimes; Almirante de esquadra Almir Garnier (ex-comandante da Marinha); Anderson Torres (ex-ministro da Justiça ); General do Exército Augusto Heleno (ex-chefe do GSI); General do Exército Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa); General do Exército Walter Braga Netto (ex-ministro e ex-candidato a vice-presidente); o Tenente Coronel do Exército Mauro Cid (ex-ajudante de ordens de Bolsonaro).
O julgamento é inédito. O Brasil não tem tradição de julgar e punir criminosos pertencentes às camadas mais privilegiadas da sociedade. Pelo contrário, nossa tradição colonialista reserva à população negra e pobre o rigor das leis, enquanto a impunidade reina entre aqueles que concentram mais renda, terras e poder. Também inédito é o acesso da sociedade às informações do processo, como os planos de assassinato do presidente eleito Lula, seu vice Geraldo Alckimin, além de Alexandre de Moraes entre outras autoridades.
A reprodução dos privilégios e a impunidade tem um preço alto para a democracia: há 46 anos atrás, após uma ditadura militar violenta e traumática socialmente, foi promulgada a Lei da Anistia, pelo então presidente militar João Baptista Figueiredo, impedindo a apuração e o julgamento dos crimes cometidos pelo regime durante três décadas no país. Nenhum militar ou civil foi sequer julgado pelo Golpe civil militar de 1964.De lá pra cá, o movimento Tortura Nunca Mais conquistou a Comissão da Verdade, enterrada após impeachment sem crime de responsabilidade da presidenta Dilma Rousseff. Nas palavras da ex-presidenta, e atual chefe do Banco dos BRICS, “A história será implacável com os que hoje se julgam vencedores.” (2016).
E ela estava certa. Grande parcela da sociedade é contra a anistia (entre 51% e 56% da população, de acordo com as pesquisas), pois entende que é necessário investigar e punir agressores da democracia, para que não se repitam novamente eventos como os que vivenciamos desde 2021, com as manifestações golpista em frente aos quartéis e nas beiras das estradas,, o atentado a bomba no aeroporto de Brasília e o ataque violento à sede da Polícia Federal, também na capital do país, até a invasão da sede dos três poderes em 08 de janeiro de 2023.
No cenário em que se inicia esse importante encontro do Brasil consigo mesmo, abundam escândalos de corrupção envolvendo a cúpula do bolsonarismo, o crime organizado (PCC) e o centro econômico do país, a Faria Lima. O deputado federal Eduardo Bolsonaro, filho de Jair, exerce mandato nos Estados Unidos e, em parceria com o neto do ditador Figueiredo, ameaça delegados da PF, e articula com o governo do golpista Donald Trump sanções contra os ministros do STF e contra a economia do Brasil. Interditam-se os trabalhos da Câmara dos Deputados, utilizando até mesmo um bebê como escudo humano. E esse Parlamento, parece incapaz de reagir, com seu presidente figurativo, Hugo Motta, oscilando entre o bolsonarismo, o silêncio e o cinismo. Com bilhões em emendas nada transparentes, o maior escândalo de corrupção institucionalizado já visto no país, os parlamentares tentam votar legislações que os anistiam antes mesmo de serem processados, como a PEC da Blindagem.
E em meio a tudo isso, a nossa imprensa hegemônica, naturalizando esses absurdos, dando voz para os bandidos defenderem o autoritarismo, a exemplo da entrevista de Flávio Bolsonaro à Folha, onde abertamente defende novo golpe, “Fechar o STF”, caso o presidente eleito em 2026 não conceda indulto ao seu pai, Jair. Aliás, Ciro Nogueira, que agora estampa as manchetes por receber propinas do PCC, em reportagem do ICL Notícias amplamente repercutida, até ontem atuava semanalmente como uma espécie de “comentarista de política” na Globo News. E o candidato das elites, o “bolsonarista moderado” Tarcísio de Freitas, aparece cotidianamente ao lado de golpistas, corruptos e outros tipos suspeitos. Além de Tarcísio, outros políticos disputam o espólio nefasto de um presidente que se negou a comprar vacinas na pandemia de Covid-19, atuando diretamente para a morte de mais de 700 mil cidadãos brasileiros.
A democracia, ainda que frágil, se levanta e busca justiça. E é neste cenário que a Plataforma dos Movimentos Sociais por Outro Sistema Político, composta por mais de 150 movimentos sociais e organizações da sociedade civil organizada, se manifesta publicamente para que a lei seja cumprida, e possamos, como sociedade, passar essa página rumo a uma democracia real, para todos e todas as brasileiras, quilombolas, indígenas, juventudes negras periféricas, LGBTIQAPN+, trabalhadores e trabalhadoras, mulheres, crianças, idosos e idosas, pessoas com deficiência. É o Brasil que subiu a rampa com Lula que precisa respirar, como na pandemia e como hoje, para construir um país verdadeiramente democrático, justo e acessível. E isso só será possível com um julgamento limpo, sem juízes suspeitos, com o devido processo legal, e com a punição efetiva dos envolvidos no crime, sejam eles generais, ex ministros, parlamentares ou o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Ditadura nunca mais!
Anistia não!
Fascistas não passarão!