Brasil confessa na ONU que ajuste fiscal é mais importante do que direitos humanos

O governo brasileiro deu mais uma prova esta semana de que não mede consequências para levar adiante o ajuste fiscal em detrimento da garantia dos direitos de seus cidadãos. Em votação realizada quinta-feira (23/3) na Conselho de Direitos Humanos da ONU, o Brasil se colocou contra resolução que renovou o mandato da organização para monitorar impactos de políticas fiscais de cada país sobre os direitos humanos de seus cidadãos.

Mesmo com o voto contrário brasileiro, a resolução foi aprovada por 31 a 16. Com isso, o Brasil rompe alinhamento que tinha com países em desenvolvimento, que votaram em peso a favor da resolução, alinhando-se aos Estados Unidos, Reino Unido e outros países europeus. Nas três últimas votações da resolução na Conselho, em 2008, 2011 e 2014, o Brasil votou a favor.

Leia aqui a ata da reunião do Conselho que discutiu o assunto.

Baixe aqui o PDF da resolução (em inglês).

“O argumento de que o ajuste fiscal é necessário para continuar e aprofundar as políticas sociais não convence ninguém, nem aqui no Brasil nem na ONU”, afirma Alessandra Cardoso, assessora política do Inesc, que vê o voto brasileiro contra a resolução da ONU como uma “confissão internacional de que o ajuste fiscal estrutural que está sendo imposto de forma autoritária e antidemocrática à sociedade brasileira produzirá graves violações aos direitos humanos”.

O Brasil conta cada vez mais com a ONU e seus mecanismos de monitoramento do cumprimento dessa resolução aprovada e também no monitoramento do Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (Pidesc), do qual o Brasil é signatário desde 1992. “As violações aos direitos produzidas pelas políticas monetária e fiscal do governo Temer têm que ser avaliadas e denunciadas internacionalmente”, diz Alessandra.

Entre as orientações do Pidesc estão a realização progressiva de direitos dos cidadãos, o não retrocesso em direitos e que os países sejam obrigados a aplicar o máximo de recursos públicos para a realização de direitos. Saiba mais sobre o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (Pidesc) aqui.

O voto contrário do Brasil ocorre três meses após Philip Alston, relator especial da ONU para Extrema Pobreza e Direitos Humanos, afirmar em comunicado oficial que a emenda constitucional brasileira que propunha um teto de gastos públicos por 20 anos, à época em discussão no Congresso, colocaria o país numa categoria única no mundo em termos de retrocesso social.

Essa emenda constitucional foi aprovada em dezembro de 2016 e seus efeitos já podem ser sentidos no Orçamento de 2017: forte limite nas despesas com políticas públicas e programas sociais e mais espaço para liberação de recursos para o pagamento de juros da dívida.

Confira aqui a análise que fizemos do Orçamento deste ano à luz do teto de gastos.

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As múltiplas faces da desigualdade na América Latina e Caribe

O relatório “O Escândalo da Desigualdade: as múltiplas faces da desigualdade na América Latina e Caribe”, recém lançado pela Christian Aid, indica que a desigualdade na região baseada na identidade, gênero, situação econômica, mudanças climáticas continua sendo vergonhosa. As desigualdades se conectam e excluem as pessoas, impedindo um desenvolvimento sustentável.

A mulher carrega boa parte do peso das desigualdades na região. São elas que mais sofrem com a violência e os injustos sistemas fiscais. Apesar de muitas terem conseguido sair da pobreza, a desigualdade social se mantém e a região continua sendo a mais desigual do mundo para as mulheres.

Clique aqui para baixar o estudo em arquivo PDF.

Para nós, a justiça social significa uma sociedade mais equitativa, não apenas em termos financeiros, mas também em termos de capacidade das pessoas de exercer seus direitos, em políticas que incluam todas as pessoas e que ajudem a acabar com as desigualdades”, afirma Mara Manzoni Luz, diretora da Christian Aid para a América Latina e Caribe.

O relatório explora a identidade racial e étnica, e dá atenção especial à situação dos povos indígenas e das comunidades quilombolas, que são os mais afetados pela exclusão social e pelo racismo. Examina ainda o tema da desigualdade no contexto da violência de gênero, incluindo a violência sexual e o feminicídio, que fazem da América Latina uma das regiões mais violentas do mundo. Dos cinco países mais perigosos para as mulheres, quatro estão na região, sendo El Salvador o país com a maior taxa de homicídios de mulheres no planeta.

O relatório destaca ainda que a justiça fiscal pode ter um papel chave na redução da desigualdade, não apenas por meio das transferências de impostos, mas também com a implementação de sistemas fiscais progressivos, e o uso dos impostos para financiar serviços públicos universais, garantidos por sistemas mais justos e transparentes.

A sociedade civil tem um papel fundamental no combate das desigualdades e na pressão para que os governos prestem contas, além de exigirem mudanças e denunciarem as desigualdades e divulgarem o que vem sendo feito para superá-las.

O relatório aponta alguns caminhos necessários para enfrentar a desigualdade na América Latina e Caribe:

* Atacar urgentemente a desigualdade dos povos indígenas e quilombolas, garantindo o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS);

* Implementar medidas referentes ao controle do poder político, participação política e o acesso à terra;

* Enfrentar diretamente o crescente problema da violência e da violência de gênero, e suas interrelações com as desigualdades;

* Usar o sistema de impostos para combater a concentração de riqueza e permitir que a região autofinancie seu próprio desenvolvimento. Melhorar o acesso a empregos decentes para superar, de maneira sustentável, a pobreza e a desigualdade;

* Responder aos desafios impostos pelas mudanças climáticas e a necessidade urgente de se avançar para um desenvolvimento de baixo carbono.

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Las múltiples caras de la desigualdad en América Latina y El Caribe

Nuevo informe “El Escándalo de la Desigualdad: las múltiplas caras de la desigualdad en América Latina y el Caribe”, lanzado por Christian Aid, señala que la desigualdad en la región basada en la identidad, género, situación económica, cambio climático y ubicación geográfica sigue siendo vergonzosa. Las desigualdades se conectan y excluyen a las personas, impidiendo un desarrollo sostenible.

La mujer carga con el peso de las desigualdades en la región, son las mujeres quienes más sufren por la violencia, los sistemas fiscales se ensañan contra ellas, las mujeres tienen menos oportunidades a acceder a trabajos dignos y son las más afectadas por el cambio climático.

Desde la publicación del último informe de Christian Aid sobre la desigualdad en el 2012, la región ha experimentado algunos cambios positivos, pero a pesar de que muchos han salido de la pobreza, la riqueza y la desigualdad social se mantienen y la región continúa siendo la más desigual en el mundo.

“Para nosotros la justicia social significa una sociedad más equitativa, no sólo en términos financieros sino en términos de la capacidad de las personas de ejercer sus derechos, en políticas que incluyan a todas las personas y que ayuden a acabar con las desigualdades”, afirma Mara Manzoni Luz, Directora de Christian Aid para América Latina y El Caribe.

El informe explora la identidad racial y étnica y da atención especial a la situación de los pueblos indígenas y las comunidades afro-descendientes, quienes son los más afectados por la exclusión social y el racismo.

El informe examina el tema de desigualdad en el contexto de la violencia de género, incluidos la violencia sexual y el feminicidio, tan prevalentes en la región, hacen de América Latina una de las regiones más violentas del mundo.  De los cinco países más peligrosos para las mujeres, cuatro se encuentran en la región, siendo El Salvador el país con la mayor tasa de homicidios de mujeres en el planeta.

El informe destaca que la justicia fiscal puede jugar un papel clave en reducir la desigualdad, no sólo a través de las transferencias de impuestos, sino también con la implementación de sistemas fiscales progresivos, y la inversión de los ingresos fiscales en la provisión de servicios públicos universales garantizados por sistemas más justos y transparentes de inversión en los países.

Se destaca que la sociedad civil incluidas las organizaciones basadas en la fe y los movimientos sociales tienen un papel fundamental en combatir las desigualdades y en asegurarse que los gobiernos rindan cuentas, exijan cambios, denuncien las desigualdades y lo que se está haciendo para superarlas.

El informe insta a los gobiernos y la sociedad civil a:

• Abordar urgentemente la desigualdad de los pueblos indígenas y afro-descendientes, garantizando el cumplimiento de los Objetivos de Desarrollo Sostenible

• Implementar medidas referentes al control del poder político, participación política y al acceso a la tierra

• Desafiar directamente el creciente problema de la violencia y de la violencia de género y sus interrelaciones con las desigualdades

• Utilizar el sistema de impuestos para combatir la concentración de la riqueza y permitir que la región autofinancie su propio desarrollo.  Mejorar el acceso a empleos decentes para superar de forma sostenible la pobreza y la desigualdad

• Responder a los desafíos que presenta el cambio climático y la necesidad urgente de avanzar a un desarrollo bajo en carbono

Farsa en Brasil y elecciones en Ecuador

Publicado por Agencia Publica de Noticias del Ecuador y Sudamérica (Andes).

El 11 de marzo del presente año, cuatro días después de su gestión como Ministro de Relaciones Exteriores de Brasil, Aloysio Nunes Ferreira dio una entrevista al Blog de Josías. Ahí el nuevo canciller comparó el gobierno del presidente Nicolás Maduro con el régimen militar brasileño establecido después del golpe de 1964, dijo: “Es una dictadura con algunas zonas que aún se conservan, como hemos tenido aquí en el tiempo del autoritarismo en Brasil. Tenías espacios para la oposición utilizándolos para acumular fuerzas…”.

Dicha declaración pública de Aloysio Nunes Ferreira revela claramente la subordinación del actual gobierno de Brasil a las imposiciones del imperio de Estados Unidos. Al hacer coro con ese gobierno a los ataques y conspiraciones contra el régimen y pueblo venezolano no deja sombra de duda respecto a los intereses geopolíticos que guiaron a la derecha en la conspiración que resultó en el derrocamiento del gobierno de Dilma en Brasil en 2016.

Cuatro días después de dicha entrevista, el 15 de marzo, las calles del país fueron tomadas por las protestas contra la retirada de los derechos de los trabajadores en el Congreso Nacional a través de proyectos de reforma constitucional, en especial los relativos a la legislación laboral y seguridad social. Otras iniciativas similares del gobierno golpista de Temer están en curso, las mismas están destinadas a intensificar el despojo de los campesinos y pueblos indígenas.

La radiografía del gasto gubernamental revelada recientemente por INESC también no deja duda sobre el retroceso actual en el país “Aprobado en diciembre de 2016, la Propuesta de Enmienda Constitucional (PEC) 55/241 – ahora Enmienda Constitucional 95 (CE 95) – revela su esencia: limitar el gasto en políticas públicas y programas sociales para liberar recursos para el pago de intereses, priorizando al sistema financiero en lugar de los ciudadanos brasileños. Sus efectos ya son visibles en el presupuesto de 2017 y más recortes están por llegar”.

Los siguientes datos presentados por INESC, muestran claramente lo señalado:

Fuente: https://inesc.org.br/noticias/noticias-do-inesc/2017/marco/orcamento-2017-prova-teto-dos-gastos-achata-despesas-sociais-e-beneficia-sistema-financeiro

Las consecuencias de la farsa engendrada por la conspiración de la derecha golpista en Brasil no se detienen ahí. Un artículo escrito por Marcos Sergio Silva, publicado el 17 de marzo, muestra lo que ya se sabía: el secuestro de la política por el poder privado para el incremento de su patrimonio y la corrupción que les caracteriza, dicho artículo que fue censurado en los medios de comunicación, como muestra nos dice:

Los registros históricos nos indican que recursos para usos ilícitos ya financiaron el golpe militar de 1964 “(…) el dinero en efectivo del llamado ‘caja dos’ (ardides de contabilidad que tienen como propósito ocultar el soborno) alimentó el golpe militar de 1964 ‘Cada uno llevaba dos maletas, una en cada brazo. En total, seis maletas. (…) les pide que abran. Empezó una pelea, pero me miró y vio que era sólo dólar, dólar. Todo lleno de dólares (…) Un millón y 200.000 dólares’. La frase anterior fue dicha por el coronel retirado Erima Moreira Pinheiro en la Comisión de la Verdad de la Cámara Municipal de la ciudad de Sao Paulo el 18 de febrero de 2014. Según él, el dinero – una cantidad ajustada a los valores de hoy sería alrededor de R$ 9.5 millones – fue llevado el 30 de marzo de 1964 por el entonces presidente de la Fiesp (Federación de Industrias del Estado de São Paulo), Raphael de Souza Noschese para financiar el apoyo del general Amaury Kruel, que era el jefe del gabinete militar y ministro de la guerra de João Goulart, que también comandaba al 2º Ejército en Sao Paulo…”

Farsas similares a la que supuso el derrocamiento del gobierno de Dilma en Brasil se sigue replicando en “Nuestra América”. En el caso de Ecuador el discurso utilizado por la derecha contra “Alianza PAIS” repite lo utilizado por la derecha en Brasil. Ojalá que el pueblo ecuatoriano no se deje engañar por los “cantos de sirena” y siga adelante luchando para expandir los logros conquistados en el curso de su heroica resistencia contra el neoliberalismo y neocolonialismo y las fracciones de clase subordinadas a las élites financieras.

Elder Andrade de Paula, es post doctorado en Sociología del Desarrollo de la Universidad Nacional Autónoma de México – UNAM, Profesor e Investigador de la Universidad Federal de Acre, Coordinador del Centro de Investigación: Sociedad Estatal de Desarrollo para la Amazonía occidental. Su accionar se centra en las luchas por la tierra / territorio en la Amazonía desde 1984.

Elder Andrade de Paula,  é Pós Doutor em Sociologia do Desenvolvimento pela Universidad Nacional Autónoma de México – UNAM, Prof e Pesquisador da Universidade Federal do Acre, Coordenador do Núcleo de Pesquisa: Estado Sociedade e Desenvolvimento na Amazônia Ocidental. Atua junto às lutas de resistência por terra/território na Amazônia desde 1984.

Livro discute projetos políticos de grupos evangélicos no Brasil

Quais são os projetos políticos dos grupos religiosos evangélicos no Brasil? Esse é o eixo central do livro “Religião e Política: medos sociais, extremismo religioso e as eleições 2014”, que será lançado nesta quarta-feira (22/3) no Rio de Janeiro.

O livro registra estudo sobre as eleições de 2014, com foco nas candidaturas do Pastor Everaldo (PSC) a presidente da República, e de Marcelo Crivella (PRB) e Anthony Garotinho (PP) a governador do Rio de Janeiro. A publicação foi desenvolvida pelo Instituto de Estudos da Religião (Iser) em parceria com a Fundação Heinrich Böll (HBS).

Os autores do livro têm como objetivo recuperar detalhes das eleições 2014 para refletir sobre comportamentos públicos de evangélicos no Brasil hoje – ações extremistas, conservadoras e progressistas; seu lugar como ator político, de “ovelhas” a players; e o lugar relativo que a religião e a tradição ocupam no debate público. Buscou-se olhar a eleição à luz das questões que tomaram a agenda pública desde a reeleição de Dilma Rousseff à Presidência da República e a culminância que tal processo atingiu com seu afastamento do cargo em maio de 2016. Desse modo, procurou-se refletir sobre o contexto tão turbulento e complexo que se desenrolou das eleições até o período mais recente.

Saiba mais aqui sobre o livro e seu lançamento.

Proposta de Serra para mudar regras eleitorais “é reformar para não mudar”

A ideia do senador José Serra de apresentar uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para retirar as regras eleitorais da Constituição, permitindo assim que sejam alteradas por meio de leis ordinárias, é o pior dos mundos, afirmam os especialistas ouvidos pela reportagem do Brasil de Fato, entre os quais José Moroni, do Colegiado de Gestão do Inesc.

Para Moroni, o atual Congresso brasileiro não tem legitimidade para propor reforma eleitoral alguma. “Esse Congresso – não só ele,  a própria proposta é fruto de uma articulação dos três Poderes – não tem legitimidade, hoje, para propor uma reforma nesse sentido”, diz. “É uma questão de legitimidade, mesmo. Independentemente das propostas que venham a ser votadas pelo Parlamento, há um problema de origem.”

Para Moroni, qual seria esse vício de origem? “O atual sistema político não tem legitimidade por uma série de fatores. O motivo que leva a essa proposição não é o enfrentamento do déficit democrático, da subrepresentação de diversos setores – mulheres, negros, indígenas, da classe trabalhadora. É unicamente para que os que estão no poder lá continuem. É reformar para não mudar. Para que, nas eleições de 2018, o mesmo grupo se perpetue”, explica. “Estão pegando propostas como financiamento público, lista fechada – coisas que defendemos – com um objetivo totalmente diferente da sociedade civil.”

Outros especialistas consultados concordam com Moroni, como Alessandro Soares, professor de Direito do Mackenzie, em São Paulo: “Do ponto de vista político, à medida que você tem um presidente da República que não tem o aval direto do voto popular, uma crise política, social e econômica, todo mundo vai buscar saídas de emergência. Acho que, antes de tudo, é preciso recuperar a legitimidade do governo democrático.”

Leia aqui a íntegra da reportagem.

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7 Razones por las que necesitamos #JusticiaFiscal para garantizar los derechos de las mujeres

Los líderes del mundo se han comprometido a cumplir los Objetivos de Desarrollo Sostenible para que en el año 2030 hayamos acabado con todas las desigualdades y formas de violencia contra las mujeres y niñas y logremos que la economía del cuidado, no remunerada, y el trabajo doméstico sean reconocidos y valorados a través de la implementación de servicios públicos gratuitos y de calidad. Pero, ¿de dónde saldría el dinero para lograr estas necesarias metas?

Actualmente, la ONU Mujeres afirma que los Planes Nacionales de Acción para la Igualdad de Género tienen hasta un 90% de déficit de financiamiento: ¿no hay dinero para combatir un problema tan grave como la desigualdad de género?

Un sistema fiscal justo puede ser la clave para acabar con las desigualdades. Un sistema tributario justo que cobre más a quienes más tienen e impida la fuga de recursos a paraísos fiscales, puede ser la herramienta más poderosa para reducir la brecha entre ricos y pobres –dentro y entre países- y entre hombres y mujeres.
Los impuestos son la fuente más sostenible de ingresos públicos, con ellos se financian la gran mayoría de los servicios públicos. Para acabar con la desigualdad de género y cumplir con los ODS, los gobiernos necesitan aumentar progresivamente su recaudación para gastar más recursos en el trabajo y los servicios que necesitan las mujeres.

La justicia fiscal, que abarca la elaboración de presupuestos públicos con perspectiva de género y la supervisión presupuestaria a nivel nacional, regional y local, adquiere en este escenario, una vital importancia. Es por eso que es un elemento clave en diversos protocolos y marcos internacionales, como la Convención sobre la Eliminación de todas las formas de Discriminación contra la Mujer de 1979 (CEDAW) y la Plataforma de Acción de Beijing (BPfA), a partir de 1995.

Sin embargo, la evasión fiscal y los beneficios tributarios para las grandes empresas, cuestan a los países en desarrollo más de 100 mil millones de dólares cada año. Sí hay dinero, pero en cuentas privadas y paraísos fiscales, no donde debería estar: financiando servicios para mejorar la vida de las mujeres y niñas. Porque cuando los servicios públicos carecen de fondos y los ricos no pagan impuestos, son las mujeres y las niñas quienes pagan el precio más alto.

#JUSTICIAFISCAL significa impuestos justos e invertidos con el fin de acabar con la pobreza y las desigualdades. ¿Las mujeres necesitan #JusticiaFiscal? Claro que sí y aquí te lo decimos punto por punto:

La #JusticiaFiscal contribuye a que las niñas obtengan una mejor educación

La educación es un derecho fundamental de todos los niños. Sin embargo, en el mundo hay 124 millones de niños y niñas que no asisten a la escuela. Además, existe una brecha significativa entre los géneros, 1 de cada 8 niñas (63,1 millones) en comparación con 1 de cada 9 niños (61 millones) no asisten a la escuela.

La educación es una de las herramientas más importantes para reducir la desigualdad y nivelar el terreno de juego en el que nos desarrollamos. Si todas las mujeres terminaran la educación primaria, las muertes maternas disminuirán en dos tercios y las muertes infantiles se reducirían en un 15%.

Un sistema progresivo de recaudación y gasto, puede generar ingresos significativos para los gobiernos, sin afectar la economía de los más pobres. Por ejemplo, Ecuador ha triplicado su gasto en educación: de US $ 225 millones en 2003-2006 a US $ 941 millones en 2007-2010 a través de políticas efectivas de movilización de impuestos.
La educación financiada y proporcionada con fondos públicos tiene mayor potencial transformador que la educación privada que, al contrario, puede empeorar la movilidad social y socavar el potencial de la educación para revertir la desigualdad.

Se calcula a nivel mundial que la brecha anual de financiación para alcanzar la educación universal en los niveles preescolar, primario y secundario en los países de ingresos bajos y medios bajos es de 39.000 millones de dólares. ¿Podemos cambiar esto? Sí, con #JusticiaFiscal.

La #JusticiaFiscal contribuye a reducir la carga de cuidados no remunerados de que realizan las mujeres y las niñas

El trabajo no remunerado de mujeres y niñas subvenciona el crecimiento económico. Las mujeres gastan 2,5 veces más tiempo en la atención no remunerada y el trabajo doméstico que los hombres, que se ha valorado en 10 billones de dólares anuales o alrededor del 13% del PIB mundial.

Cuando los estados no tienen ingresos suficientes para proporcionar servicios públicos esenciales, la constante es que sean las mujeres las que llenen la brecha con sus cuerpos y tiempo, reduciendo el tiempo que tienen para la educación, el empleo remunerado y el descanso y el ocio.

Del mismo modo, a medida que más mujeres entran en el mundo del trabajo sin el soporte básico de un estado que garantiza servicios fundamentales, la carga no remunerada del cuidado recae en otras mujeres miembros de la familia. Esto puede limitar las capacidades de las niñas para acceder a la educación y otros derechos, como el tiempo para jugar. Esto es particularmente cierto en el caso de las mujeres con un trabajo mal remunerado y jornadas de trabajo largas.

Sin embargo, el Estado no es el único responsable – los hombres tienen la responsabilidad de cuidar de sus hijos, el hogar y los parientes tanto como las mujeres. Los servicios públicos financiados con impuestos, en especial los servicios pre-escolares, son medidas eficaces para aumentar el acceso de las mujeres al trabajo decente, la educación, la participación política y el descanso.

Globalmente, uno de cada dos niños asiste a una guardería. Muchos estados, entre ellos Brasil, Liberia, Nigeria, Senegal y Sudáfrica, han dedicado fondos públicos a la atención de la primera infancia, pero la brecha de financiación para satisfacer las necesidades reales es enorme.

La #JusticiaFiscal contribuye a que las mujeres obtengan servicios de salud que salvan vidas

El embarazo y el parto aumentan la necesidad de las mujeres de una asistencia sanitaria de calidad que no ponga en riesgo sus vidas, al igual que la naturaleza endémica de la violencia contra las mujeres y las niñas en todo el mundo. Mujeres en todo el mundo mueren a diario por complicaciones prevenibles durante el embarazo y el parto. En 2015 se estimó que de cada 100 mil nacidos vivos, 216 nacieron muertos; 19 de cada 1000 recién nacidos no sobreviven su primer mes después del nacimiento. Los países africanos, con impuestos extremadamente bajos a las grandes empresas y riquezas, sufren los niveles más altos de mortalidad infantil. Casi todas las muertes maternas ocurren en entornos con recursos insuficientes.

Muchas formas de violencia contra las mujeres y las niñas requieren atención del sistema de salud incluyendo, pero no limitado a, ataques de ácido, agresión sexual, mutilación genital femenina y violencia de pareja.

Los estados deben aumentar la inversión en salud, las enfermeras y los médicos necesitan más recursos, sobre todo en las zonas con mayor escasez de fondos: zonas rurales pobres y los asentamientos informales en las ciudades. El derecho de las mujeres y las niñas a la salud es un derecho humano. Un sistema tributario que cobre lo justo a las grandes empresas y fortunas aumentaría la inversión pública desesperadamente necesaria.

Los líderes de la Unión Africana se han comprometido a gastar al menos el 15% de sus presupuestos anuales en salud. Si esto se convirtiera en realidad, se invertirían más de US $ 29 mil millones en sistemas de salud que salven vidas. ¿Cómo pueden conseguir esos recursos? ¡Con #JusticiaFiscal!

La #JusticiaFiscal ayuda a reducir la violencia contra las mujeres y las niñas

Una de cada tres mujeres ha sufrido violencia al menos una vez en su vida. Casi la mitad de las mujeres asesinadas en todo el mundo, son asesinadas por parejas íntimas o familiares.

Las mujeres pobres de los países en desarrollo son las que tienen más probabilidades de estar expuestas a la violencia sexual mientras están en las calles. El transporte público, en particular, es un gran desafío: en Bangladesh, el 84% de las mujeres preguntadas dijeron haber sufrido insultos o comentarios sexuales, y más de la mitad dicen haber enfrentado agresiones sexuales mientras viajaban. En las ciudades de Brasil, dos tercios de las mujeres dicen tener miedo de viajar solas. Se informa que en São Paulo, una mujer es asaltada en un espacio público cada 15 segundos.

Los servicios públicos financiados con impuestos que se centran en los derechos de las mujeres pueden mejorar su seguridad en lugares públicos, proporcionando una mejor policía, aseos públicos seguros, alumbrado público y sistemas de transporte diseñados teniendo en cuenta las necesidades de las mujeres.

Poner fin a esta violencia es una tarea gigantesca, ya que las normas sociales y las desigualdades de género no desaparecen simplemente cuando alguien asume un papel dentro del gobierno. Las normas patriarcales pueden socavar, subvertir e ignorar la política y la práctica de los derechos de la mujer, dejando los servicios que responden y tratan de prevenir y mitigar la violencia contra las mujeres y las niñas que sufren de insuficiencia crónica o no reciben financiación alguna.

Los gobiernos deben invertir en servicios públicos financiados con impuestos para cumplir con sus compromisos internacionales y nacionales de eliminar toda la violencia contra las mujeres y las niñas. Las inversiones en el trabajo preventivo que son oportunas y bien integradas pueden traer enormes beneficios a las mujeres ya sus comunidades.

Las organizaciones de derechos de la mujer están sub-financiadas y se requiere con urgencia un aumento significativo de la inversión en estas organizaciones.

Cuando las corporaciones multinacionales y los muy ricos no pagan su parte justa del impuesto, las mujeres son las más afectadas

La pobreza y la distribución de la riqueza es sexista. En el mundo, 9 de cada 10 multimillonarios son hombres. Transferir y redistribuir la riqueza a través de la tributación tiene el potencial de abordar la discriminación sistémica basada en el género, la raza, la edad, la orientación sexual, la discapacidad y el estatus socioeconómico.

Cuando los países no aumentan un impuesto progresivo sobre la renta de las personas que más poseen, no gravan los ingresos de las inversiones y al contrario, ofrecen exenciones fiscales a las grandes empresas y hacen la vista gorda a la evasión y evasión fiscal, la mayoría de los “ahorros” son hechos por hombres.

Los países de bajos ingresos recaudan alrededor de 2/3 de sus ingresos tributarios a través de impuestos indirectos, como el consumo y los impuestos al comercio –estos impuestos impactan de manera diferenciada a las personas según su ingreso, quienes menos tienen salen perdiendo. En los países de ingresos altos, estos impuestos juegan un papel mucho menor y sólo constituyen 1/3 del total de los ingresos tributarios en promedio.

Los impuestos indirectos no tienen capacidad redistributiva, al contrario de los impuestos directos -sobre la renta y la riqueza-, al contrario golpean fuertemente a las mujeres que viven en la pobreza aumentando el costo de los artículos de primera necesidad como la comida, la ropa de los niños y el jabón. En marcado contraste, menos del cinco por ciento de la población de los países en desarrollo paga el impuesto sobre la renta personal. Esta manera de recaudar los impuestos perjudica a las mujeres más pobres y beneficia a quienes más poseen.

Cada año, los gobiernos de los países en desarrollo donan un estimado de US $ 138.000 millones en exenciones fiscales a las empresas. Además, se calcula que las pérdidas por evasión fiscal son de cientos de miles de millones de dólares cada año.

Los paraísos fiscales, que desempeñan un papel clave en este drenaje de recursos públicos, también permiten los flujos financieros ilícitos derivados de la trata de mujeres. A medida que nuestro sistema financiero continúa ofreciendo oportunidades para esconder y lavar el dinero producto del crimen, y las élites dominadas por los hombres continúan evitando o evadiendo el pago de su parte justa de los impuestos, las mujeres y las niñas pagan el precio más alto con sus cuerpos y sus vidas.

La #JusticaFiscal contribuye a que aumentar el acceso al agua potable que mantiene a las mujeres más seguras y permite su empoderamiento económico

El agua se reconoce como un derecho humano básico y, por lo tanto, todos los ciudadanos deben tener acceso a agua limpia y segura en cantidades adecuadas. Por lo tanto, se espera que las regiones que experimentan una escasez aguda de agua inviertan en programas que mejoren el acceso y reduzcan la distancia media al punto de agua más cercano.

Cuando no hay servicios públicos de agua, las mujeres y las niñas suelen ser las encargadas de llevar agua a sus hogares, a cualquier costo humano, haciéndolas vulnerables a la violencia y manteniéndolas alejadas de la educación y otros trabajos más seguros.

El acceso al agua pública es vital para la autonomía económica de las mujeres.

La #JusticiaFiscal proporciona protección social para las mujeres

Las mujeres se enfrentan a diversos riesgos de protección debido a sus vulnerabilidades. Por consiguiente, los programas de protección social contribuyen eficazmente a la protección y la realización de los derechos de la mujer, incluida la salud sexual y reproductiva.

Sin embargo, la cobertura de la protección social suele ser limitada y se deben hacer inversiones para que la cobertura coincida con la necesidad real de las mujeres. Los programas de protección social se han visto previamente afectados por la falta de coordinación, ya que los distintos organismos y los asociados para el desarrollo aplican diferentes programas.

La reducción de la vulnerabilidad y la pobreza es un elemento clave de muchos programas de protección social, ya que ninguna sociedad puede ganar cohesión social si hay sectores significativos de la población que viven en una pobreza extrema y, por lo tanto, los países necesitan programas de protección social en forma de programas de protección social para los más vulnerables. Y mujeres marginadas en la comunidad.

Texto original elaborado por la Global Alliance for Tax Justice (Alianza Global por Justicia Fiscal) y está disponible: http://bit.ly/2lMfIC1

Semana da Mulher – Dia Internacional da Mulher – 8 de março de 2017

Para marcar o Dia Internacional da Mulher deste ano, o Inesc decidiu juntar forças com o site Outras Palavras para a publicação de uma série de artigos sobre os atuais desafios do feminismo e como a maior parte das lutas são transversais. Reunindo textos dos assessores políticos do Inesc, a série abordou temas como justica fiscal, direito à cidade, igualdade racial, educação e homo e transfobia.

Para cada texto, também foi produzido um card com mensagem sobre o tema em questão para ser divulgado pelas redes sociais. Reunimos todo o material nesta página para sua comodidade.

E seguimos na luta! Nenhum direito a menos!

SEGUNDA-FEIRA – 6/3

O primeiro dos artigos publicados foi sobre educação e feminismo, escrito por Marcia Acioli, mestre em Antropolia Aplicada à Educação pela Faculdade de Educação da Universidade de Brasília (UnB).

Marcia discute a incapacidade do atual modelo de educação de abordar temas cada vez mais fundamentais às jovens estudantes, como sexismo, identidades de gênero, sexualidade e cultura não padronizada. “A despeito da escola, meninas estão construindo alternativas, querem expressar sua sexualidade e o seu desejo sem censura”, diz Marcia, lembrando que elas “desejam, sobretudo, a pleniturde da existência e construir nova lógica social”.

Um trecho do artigo de Marcia Acioli:

Comprometida com o desenvolvimento de uma visão de mundo, a educação é indispensável para a promoção de uma nova ordem social. Portanto, quanto antes se inicia o trabalho pedagógico com o foco na equidade de gênero, maior é a possibilidade da formação de sujeitos mais sensíveis e dispostos a uma relação equânime, livre de opressões e de assimetrias.”

Leia aqui a íntegra do artigo.

TERÇA-FEIRA 7/3

Como se dá a relação das mulheres com os espaços públicos das cidades? Essa foi a reflexão proposta por Cleo Manhas no segundo artigo da série, “O direito à cidade, a esfera pública e as mulheres”, discutindo as interdições de gênero nos espaços públicos e a falta de políticas públicas inclusivas e justas nas cidades brasileiras.

Cleo Manhas é mestre em Educação e Políticas Públicas pela Universidade de Brasília (UnB) e articuladora do Movimento Nossa Brasília, que tem o direito à cidade e a mobilidade urbana entre seus temas de atuação. Em seu artigo, Cleo afirma que o controle sobre os corpos das mulheres é socialmente forte e, por isso, as cidades se tornam espaços inóspitos e violentos para as mulheres, “onde ficamos expostas a assédios de variadas formas”.

Historicamente as cidades foram divididas entre lugares para homens e lugares para mulheres, entendendo o público como masculino e o privado como feminino. No entanto, esta realidade mudou e as mulheres ocuparam os espaços públicos, porém, a geografia desses espaços não acompanhou as mudanças na mesma velocidade, até porque, vivemos em uma sociedade machista, racista, classista, valores que sustentam um sistema capitalista que a tudo privatiza, especialmente, a urbis.”

Leia aqui a íntegra do artigo.

QUARTA-FEIRA 8/3 – DIA INTERNACIONAL DA MULHER

A greve internacional de mulheres proposta para o Dia Internacional da Mulher em 2017 é um passo importante para um novo ciclo de legitimação das demandas de povos historicamente discriminados, como os negros. Segundo Layla Maryzandra, autora do terceiro artigo de nossa série, “com o slogan “Se nosso trabalho não vale, produzam sem nós”, há de se refletir que o trabalho em massa está nas mãos desses povos, sobretudo das mulheres negras” e, justamente por isso, é importante renovar as demandas desse dia de luta.

Layla é pedagoga, especializada em História e Cultura Afrobrasileira e Africana, e em Educação em Direitos Humanos pela Universidade Federal de Goiás (UFG), e coordena o Fórum da Juventude Negra de Brasília.

Quando mulheres negras chamam atenção sobre interseccionar às lutas, ela demonstra que apesar de estar num espaço extremamente marginalizado, esse mesmo espaço faz com que ela visualize a sociedade de outra forma: isso é herança malunga, é ver para além das brechas do navio, são os elementos simbólicos de sua origem reacendendo em suas memórias através do discurso político.

Assim, a mulher negra foi convivendo com esses saberes simbólicos, que foram se organizando e reorganizando, tanto para dentro do movimento de mulheres como para fora, em combate a uma conjuntura que nunca foi favorável a elas. O próprio 8 de março – Dia Internacional da Mulher, ainda não é um dia em que todos os movimentos de mulheres negras se sintam confortáveis para chamar de seu, e para atribuí-lo a uma luta histórica sua também, devido à deslegitimidades e silenciamentos ainda presentes no movimento de mulheres.”

Leia aqui a íntegra do artigo.

QUINTA-FEIRA 9/3

Por que histórias como as de Luana e Veronica, uma mulher lésbica e outra trans, violentamente torturadas por policiais, têm que ser trazidas à visibilidade no mês da mulher – e em qualquer outro espaço e data de luta e resistência contra os poderes estabelecidos? Luana morreu e Veronica foi desfigurada. Ambas foram humilhadas e tiveram seus direitos desprezados, uma múltipla violação de direitos humanos que são “tijolos a mais na construção de uma sociedade racista e machista que cala diante de tamanha violência”, afirma Carmela Zigoni, assessora política do Inesc, doutora em Antropologia Social pela Universidade de Brasília (UnB) com especialização em Gênero e Sexualidade pela Universidade de Amsterdã e em Avaliação e Monitoramento de Políticas Públicas pela Escola Nacional de Administração Pública (Enap).

“O silêncio é quase generalizado, seja na imprensa de massa, seja nos próprios veículos alternativos de mídia, com poucas e exceções. Cabe aos movimentos LGBTI, ao lado de familiares e amigos, buscar manter a vivas suas histórias”, afirma Carmela no quarto artigo da série do Inesc publicada na Semana da Mulher.

Um trecho do artigo de Carmela:

Luana e Veronica foram vítimas de violência porque não se encaixavam nos discursos de sexo e gênero dominantes. O feminino é construído como “falta” ou “ausência” em nossa sociedade, a opressão do patriarcado contra a qual lutam os movimentos de mulheres. Quando o feminino se descola da norma, subvertendo e exigindo o poder sobre o corpo monopolizado pelas autoridades médica e jurídica (geralmente masculinas e brancas), tem-se uma negação do sujeito ainda maior.

Ou seja, se às mulheres cis brancas heterossexuais são negados direitos fundamentais, no caso de mulheres lésbicas e mulheres trans a negação é total. Se acionamos a Judith Butler em diálogo com Beatriz Preciado, podemos dizer que a mulher lésbica e a mulher trans, ao se colocarem no mundo assumindo suas identidades e desejos, apesar da opressão e violência, apesar da negativa social em vê-las como pessoas, de alguma forma rompem com as epistemologias dominantes do gênero, do sexo, e por consequência, do controle. A norma é o masculino [branco], o regime político dominante é o heteronormativo.

Leia aqui a íntegra do artigo.

DOMINGO 12/6

O quinto e último artigo de nossa série para a Semana da Mulher abordou o tema da Justiça Fiscal e sua relação com os direitos das mulheres. A assessora Grazielle David explicou como a arrecadação de impostos pode financiar políticas públicas e programas sociais para garantir e ampliar esses direitos. A luta por igualdade de gênero, afirma Grazielle, tem uma forte dimensão fiscal, já que somente a justiça tributária é capaz de assegurar serviços públicos de qualidade e impede a penalização social das mulheres.

“Quando os serviços públicos deixam de receber um financiamento adequado, e quando os impostos não são arrecadados e alocados de forma justa, são as mulheres que pagam o preço mais alto”, explica Grazielle no artigo. “E entre as mulheres, são as negras que arcam com a carga mais pesada, uma vez que são elas que pagam proporcionalmente mais impostos que os demais segmentos sociais no Brasil, conforme estudo do Inesc.”

O texto elenca 7 motivos pelos quais a Justiça Fiscal é necessária para promover os direitos das mulheres. São eles:

1. #JustiçaFiscal melhora os níveis de educação

2. #JustiçaFiscal reduz a carga sobre as mulheres em decorrência dos trabalhos e cuidados não remunerados

3. #JustiçaFiscal possibilita o acesso das mulheres a serviços de saúde que salvam vidas

4. #JustiçaFiscal reduz a violência contra mulheres

5. Quando as multinacionais e os muito ricos não pagam seus tributos devidos, dói mais nas mulheres

6. #JustiçaFiscal garante o acesso à água limpa que mantém as mulheres mais seguras e constrói sua emancipação econômica

7. #JustiçaFiscal oferece proteção social para mulheres

Um trecho do artigo de Grazielle David:

Os tributos que pagamos de variadas formas são a fonte mais sustentável de receitas que um governo pode ter. Eles bancam a maioria dos serviços públicos dos quais as sociedades dependem, especialmente as mulheres. É por isso que defendemos a justiça fiscal com arrecadação e alocação orçamentárias sensíveis a gênero. Outros elementos, como a questão racial e diversidade étnica devem ser consideradas ao se pensar em justiça fiscal, uma vez que para o alcance dos direitos humanos é necessário que os orçamentos sejam não discriminatórios.

Leia aqui a íntegra do artigo.

Com desmonte institucional e orçamento reduzido, direitos das mulheres estão sob ataque

Não é de hoje que as mulheres precisam conquistar seus direitos na base de muita luta, transformando as instituições e as políticas públicas por meio de marchas, conferências, reuniões de conselhos e outras formas de atuação.

Entre as muitas conquistas alcançadas, temos:

a criação de órgãos de governo específicos para garantir direitos das mulheres e promover igualdade racial;

 

a incorporação de políticas para mulheres em agendas como desenvolvimento rural, meio ambiente, saúde, entre outras;

 

garantia de orçamentos públicos especificamente destinados a políticas de superação das desigualdades de gênero, de combate à violência e outros.

 

Apesar de ainda ser preciso avançar muito, o retrocesso vem ganhando fôlego nos últimos tempos: órgãos federais comprometidos com os direitos das mulheres foram extintos ou “incorporados” por outros ministérios onde nossos direitos são marginais e figurativos. Os orçamentos, já insuficientes, foram drasticamente cortados.

Convidamos lideranças femininas para nos ajudar a entender o que o Orçamento de 2017 revela sobre o compromisso do governo federal com os direitos das mulheres.

Assistência Técnica para agricultoras familiares

No Plano Plurianual (PPA) do governo federal para 2016-2019, existem metas destinadas para garantir acesso à assistência técnica específica para mulheres, como:

* ATER (Assistência Técnica e Extensão Rural) qualificada, direcionada e continuada para 1 milhão de famílias da agricultura familiar, incluindo ATER específica para jovens rurais e povos e comunidades tradicionais, e assegurando que pelo menos 50% do público atendido seja de mulheres e que 30% do orçamento seja destinado a atividades específicas de mulheres;

* Capacitação de mil agentes de ATER para atuarem com mulheres e com foco na agroecologia;

* Atendimento a 15 mil mulheres agricultoras familiares com ATER específica para mulheres.

Mas se olharmos para o orçamento de 2017, há somente R$ 2 milhões destinados a ações ligadas a essas metas. Em 2016, foram pagos R$ 4 milhões nessa ação.

Detalhe: esse recurso de R$ 2 milhões está hoje na Presidência da República porque o Ministério do Desenvolvimento Agrário foi extinto pelo governo Temer.

“É uma importante política que foi conquistada com a luta e organização dos movimentos de mulheres, que estava se estruturando e fortalecendo a produção e a organização produtiva das mulheres camponesas, garantindo acesso a renda e autonomia econômica das mulheres. A meta de atendimento de 15 mil mulheres em todo o Brasil em um mundo de mais de 4 milhões de famílias, sendo a metade deste número de mulheres, já e muito aquém da demanda real do campo brasileiro. E com o orçamento de 2 milhões de reais para ATER específica não serão atendidas nem sequer 1000 mulheres. Isso significa o fim da ATER para as mulheres e o retrocesso em uma política conquistada com tanta luta das mulheres camponesas. É um direito que sempre foi negado às mulheres, como políticas de incentivo e promoção a produção e comercialização para as mulheres trabalhadoras rurais. Reforçando mais uma vez o caráter machista e misógino do governo golpista de Michel Temer.

Iridiane Graciele Seibert – Liderança do Movimento de Mulheres Camponesas.


Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar – PAA

O PAA é reconhecido como um dos programas mais eficientes para garantir a comercialização a preço justo dos produtos da agricultura familiar. Ao mesmo tempo, contribui para a segurança alimentar e nutricional da parcela mais pobre e vulnerável da população brasileira.

Uma das metas do PAA 2016-2019 é ampliar a participação das mulheres no programa de 41% para 45% do total de fornecedores.

Mas, em 2017, o programa sofreu uma perda de R$ 132 milhões em relação a 2016 – um corte orçamentário de 28,4%.

“A redução dos recursos públicos destinados ao programa PAA, que construiu a interação entre instrumentos da política agrícola com a política social, é um grave retrocesso. Perdem os agricultores familiares e principalmente as mulheres agricultoras, que através de suas formas organizativas vinham fortalecendo-se como sujeitos de direitos e encontrando caminhos para a construção de sua autonomia econômica no enfrentamento das desigualdades de gênero. Perdem as organizações da rede socioassistencial que veem reduzidas as possibilidades de receberem alimentos saudáveis e diversificados. Perde a democracia, pois esse programa inovador  deveria avançar para a construção de uma política pública no caminho da justiça social e da garantia da segurança alimentar e nutricional, com a perspectiva igualitária e distributiva de “tratar desigualmente os desiguais”, rompendo  com a prática histórica de só favorecer preço e mercado para a agricultura do agronegócio.”

Maria Emília Pacheco – Dirigente da Fase, ex-presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea).

 

Promoção da Igualdade Racial e Superação do Racismo

Esse programa tem entre seus objetivos o de “promover ações afirmativas e incorporar a perspectiva da promoção da igualdade racial no âmbito das políticas governamentais e de organizações privadas, com ênfase para a juventude e mulheres negras”. Essa atribuição cabia à Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) mas, com sua extinção, o programa foi para o Ministério da Justiça.

No PPA 2016-2017, existem várias metas que seriam de responsabilidade da Seppir, entre elas:

  • Articular e incentivar a execução de políticas intersetoriais que possibilitem o aumento da geração de emprego formal e renda para a população negra, com ênfase nas mulheres e jovens;
  • Articular a ampliação do número de órgãos públicos e organizações privadas que promovem ações afirmativas e/ou adotem medidas de prevenção e enfrentamento ao racismo e sexismo institucional.

Em 2016, foram autorizados R$ 39 milhões para o Programa da Igualdade Racial e Superação do Racismo, e gastos R$ 32 milhões. Em 2017, estão autorizados apenas R$ 24 milhões.

“Se considerarmos que tanto a Seppir quanto a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM) seguiam para o fortalecimento de orçamento e políticas públicas, a avaliação é muito negativa. Provavelmente 2017 e 2018 seriam anos de consolidação dessas políticas. Esse valor atual é praticamente para pagar funcionários, não é para implementar política, porque em um país continental como o nosso não tem como implantar política com isso. E talvez as coordenações nem consigam se sustentar com esse valor durante o ano todo. Que política você implementa com esses valores? Na verdade você faz eventos como balão de ensaio retardado, produzindo atividades que na verdade tem pouco ou nada a ver com políticas de fato. É um exemplo de como esse governo golpista veio para atrasar todo o processo de diálogo, a conquista de direitos das mulheres, da população negra, dos gays, transexuais, comunidades e povos tradicionais, a juventude negra, a trabalhadora doméstica, um conjunto de públicos que de uma forma ou de outra depende de políticas públicas oriundas dessas secretarias. Com isso, estão dizendo que não precisa de política para a população negra e para a mulher. E eles ainda acham que é muito. A tendência é diminuir.”

Valdecir Nascimento – Coordenadora executiva do Odara – Instituto da Mulher Negra.

 

As mulheres e o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – Pronaf

O acesso ao crédito rural é mais uma luta das mulheres. A partir dela foi incorporada ao Plano Plurianual do governo (PPA 2016-2019) a meta de “disponibilizar os meios para efetivar a contratação por mulheres rurais de pelo menos 35% das operações de crédito efetivadas e 20% do volume total de crédito acessado no âmbito do Pronaf”.

Mas isso está cada vez mais longe de acontecer. Dados do Banco Central mostram que, de 2013 até março de 2017, o Pronaf Mulher emprestou somente R$ 87 milhões. Isso representa 0,08% do total emprestado pelo Pronaf e 0,01% do total do crédito rural no país.

“O Pronaf Mulher foi uma conquista da Marcha das Margaridas de 2004. Foi uma resposta do governo federal a nossa luta para que as mulheres rurais tivessem seu trabalho reconhecido e sua produção valorizada. Ter crédito específico também era, e ainda é, uma forma ampliar e qualificar os produtos feitos por elas, aumentando a renda e a autonomia social e econômica dessas mulheres. Para muitas, ter renda própria é uma forma, inclusive, de romper com ciclos de violência doméstica e familiar. No entanto, a lógica do sistema bancário, que é a mesma da sociedade patriarcal, tem dificultado o acesso das mulheres, pois o limite de crédito é de todos os integrantes da família, o que faz com que, muitas vezes, sobre muito pouco após o acesso do homem, ainda considerado como chefe de família. É preciso rever os critérios de concessão de crédito, possibilitando as mulheres trabalhadoras rurais o acesso de forma autônoma, independente do que já foi acessado pelo marido ou outros integrantes da família. Na Marcha das Margaridas de 2015 propusemos que os limites de acesso sejam individualizados e que os créditos do Pronaf Mulher passem a ser considerados riscos da União.”

Alessandra Lunas – Diretora Mulheres Rurais da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag).

 

Programa Políticas Para as Mulheres: Promoção da Igualdade e Enfrentamento à Violência

No orçamento público federal existe um programa orçamentário específico para as mulheres que tem vários objetivos, entre eles:

  • Promover a autonomia econômica, social e sexual e a garantia de direitos, considerando as mulheres em sua diversidade e especificidades.
  • Promover a transversalidade intra e intergovernamental das políticas para as mulheres e de igualdade de gênero, observando as diretrizes do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres.
  • Ampliar e fortalecer o diálogo com a sociedade civil e com os movimentos sociais, em especial com os movimentos feministas e de mulheres, mulheres com deficiência, LBTs, urbanas, rurais, do campo, da floresta, das águas, de povos e comunidades tradicionais, de povos indígenas e dos distintos grupos étnico-raciais e geracionais.
  • Ampliar a política nacional de enfrentamento a todas as formas de violência contra as mulheres, considerando sua diversidade e especificidades.

O programa já era frágil institucionalmente e, em termos de recursos, está hoje em situação ainda mais precária. Com a extinção da Secretaria de Políticas para Mulheres, o orçamento do programa foi para o Ministério da Justiça e Cidadania.

Em 2016, foram autorizados R$ 116 milhões para o programa e foram gastos somente R$ 83 milhões. Em 2017, o total autorizado é de apenas R$ 93 milhões.

Um exemplo claro do desmonte do programa é a ação orçamentária “atendimento às mulheres em situação de violência”. Em 2016, tal ação teve recursos de R$ 43 milhões e foram gastos irrisórios R$ 41. Em 2017, o total de recursos disponíveis foi reduzido para R$ 17 milhões.

“Esse corte revela o direcionamento antidireitos das mulheres por parte desse governo. Estamos vivenciando mais sofrimento entre as mulheres e também é perceptível o aumento da violência e de assassinatos.”

Guacira Cesar – Diretora do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea).

 

 

 

 

Vamos falar sobre Gênero, Raça, Etnia?

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Orçamento 2017 prova: teto dos gastos achata despesas sociais e beneficia sistema financeiro

Aprovada em dezembro de 2016, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 55/241 – agora Emenda Constitucional no 95 (EC 95) – já revela sua essência: limitar despesas com políticas públicas e programas sociais para liberar recursos para pagamentos de juros, priorizando o sistema financeiro em vez dos cidadãos brasileiros.

Seus efeitos já são visíveis no Orçamento de 2017 e mais cortes ainda virão. Isso porque os gastos sociais estão agora submetidos a um duplo teto: a EC 95 e a meta de superávit primário. E vamos provar isso, a seguir. Acompanhe.

NOTA METODOLÓGICA: Para fazer esse exercício utilizamos dados do Orçamento Federal do Portal SIGA Brasil. Os dados de 2016 referem-se às despesas realizadas que são equivalentes aos valores pagos mais restos a pagar pagos. Os dados de 2017 são referentes aos valores autorizados na Lei Orçamentária Anual. Para a análise das despesas primárias realizadas utilizamos a correção monetária de 7,2% conforme a EC 95 (Artigo 107, §1°, I).

 

 

Em apenas um ano, de 2016 para 2017, a parte do Orçamento da União comprometida com despesas financeiras* cresceu, passando de 45% para 53%, totalizando R$ 1,85 trilhão em 2017, o que equivale a um acréscimo de R$ 645 bilhões. Em contrapartida, as despesas primárias, apesar de terem tido um aumento de R$ 77 milhões, encolheram de 55% para 47%.

* DESPESAS FINANCEIRAS: o conjunto das operações financeiras, tais como empréstimos, concessões de empréstimos, amortização e juros.

 

Composição das Despesas Financeiras

As despesas financeiras são compostas por 4 grandes grupos: refinanciamento da dívida, serviço da dívida, amortização da dívida e outras despesas financeiras. Os valores relativos das despesas financeiras por grupos ficam assim:

Em 2017, a ação específica de refinanciamento da Dívida Pública Federal (DPF)* prevê um total de R$ 925 bilhões, o que dá R$ 274,5 bilhões a mais do que o realizado em 2016 (650,5 bilhões).

* Para REFINANCIAR a Dívida Pública, o governo emite títulos. Dessa forma, a previsão orçamentária com refinanciamento não deve ser considerada como um gasto, como os outros, já que o valor entra como receita financeira (de operação de crédito) e despesa (de refinanciamento).

Atenção! Na Lei Orçamentária 2017 e no Plano Anual de Financiamento da Dívida Pública Federal 2017 estão previstos R$ 946 bilhões de refinanciamento. A diferença, em relação aos R$ 925 bilhões, equivale a despesas que estão em outras ações orçamentárias, sendo o maior valor, R$ 17 bilhões, previsto para a “Assunção, Reconhecimento, Novação de Dívidas de Entidades Públicas e do Fundo de Compensação das Variações Salariais- FCVS”.

Para o serviço da dívida interna e externa, onde estão os juros, ocorreu um crescimento de 46%, passando de R$ 381 bilhões em 2016 para R$ 557 bilhões em 2017.

Moral da história: não é errado um país contrair dívida para o benefício da sua população ou de seus cidadãos, nem honrar seus compromissos financeiros. O principal problema da Dívida Pública Brasileira não é seu tamanho, mas os juros que a remuneram, os mais altos do mundo.

Estudos já mostraram que uma taxa de juros muito alta desloca um volume significativo do orçamento corrente para o pagamento de juros. Taxas de juros muito elevadas em um contexto de crise fiscal, impulsionada por baixa arrecadação, tem levado a um aumento da rolagem da dívida.

Em compensação, para as amortizações da dívida pública, que é o pagamento do valor principal da dívida, o valor aumentou pouco, saindo de R$ 1,6 bilhão em 2016 para R$ 1,8 bilhão em 2017, o que equivale a um incremento de pouco mais de 12%.

Os juros e a rolagem da dívida têm consumido quase a totalidade das despesas financeiras, restando baixa capacidade de pagamento da dívida em si.

Essa é a PROVA 1 de que o sentido da EC 95 foi limitar as despesas primárias para liberar recursos para as despesas financeiras.

 

 

Como já vimos, houve redução da participação das despesas primárias no bolo do Orçamento da União. Ou seja, enquanto a fatia das despesas financeiras cresceu de 2016 para 2017, a das despesas primárias* reduziu 14%.

* DESPESAS PRIMÁRIAS são o conjunto de gastos que possibilita a oferta de serviços públicos à sociedade. São todos os gastos com pessoal, investimentos, custeio da máquina pública etc.

Entendemos melhor a composição das despesas primárias, mostradas a seguir, decompondo-as em 4 grandes grupos: 1) as obrigatórias, que são aquelas vinculadas legalmente e que o gestor não tem o poder de utilizar em políticas ou entes distintos daqueles definidos em lei; 2) as discricionárias, que são aquelas que dependem de uma decisão política do governante e são definidas pela Lei Orçamentária Anual; 3) os investimentos de estatais e; 4) as emendas parlamentares individuais.

Na divisão do bolo das despesas primárias, de um ano para o outro, ocorreu redução da proporção das despesas obrigatórias, muito em virtude do fato de estarem vinculadas a porcentagens da arrecadação, que está baixa devido à crise econômica, além da intencionalidade do governo em reduzir cada vez mais as despesas vinculadas em lei.

Já as despesas discricionárias quase dobraram, passando de R$ 75,5 bilhões para R$ 145,6 bilhões. Os dados apresentados mais adiante, do orçamento por funções, darão boas pistas sobre quais despesas discricionárias cresceram. Como veremos, não foram despesas com políticas sociais!

Outro grupo de despesa que cresceu foi o das emendas parlamentares. Nesse caso, devido à Emenda Constitucional 86/2015, que garantiu que 1,2% da Receita Corrente Líquida deve obrigatoriamente ser destinada para emenda parlamentar individual.

 

 

A situação das despesas primárias efetivamente submetidas ao teto dos gastos é bem pior!

Isso acontece porque algumas das despesas primárias estão excluídas da Emenda Constitucional 95, fazendo com que o teto seja ainda mais sufocante para aquelas despesas que estão embaixo dele.

Em 2017, com a Emenda em vigor, as despesas primárias dentro do teto dos gastos, retirando-se as exclusões e as exceções, sofrerão diminuição de 11,55%.

As despesas primárias excluídas do teto são: Compensações pela exploração de recursos naturais (petróleo, recursos minerais e hídricos); Fundos de Participação dos Estados e Municípios (FPM e FPE); Educação (Cota parte do Salário Educação e FUNDEB); Fundos Constitucionais (Norte, Nordeste, Centro Oeste); Fundo Constitucional do Distrito Federal; outras transferências (cota-parte dos Estados e do DF referente ao IPI exportação e CIDE combustível, transferência dos impostos sobre o outro e do imposto territorial rural – ITR).

Mesmo excluídas do teto essas despesas mostradas acima deverão diminuir em 2017 devido à queda de arrecadação, provocada pela crise econômica. Em 2016, elas representavam 15,48% das despesas primárias, já em 2017 a previsão é de que essa proporção seja de 15,03%.

A EC 95 trouxe também duas exceções ao teto somente para o ano de 2017: Saúde e Educação.

Para a Saúde, existia a Emenda Constitucional (EC) n.86/2015, que garantia porcentagem mínima da Receita Corrente Líquida (RCL) a ser investida em ações e serviços públicos em Saúde (ASPS), a qual deveria atingir 15% em 2020. Com a EC 95/2016, esse patamar de 15% da RCL em ASPS foi antecipado para 2017. Contudo, isto não representa avanço uma vez que a partir de 2018 a Saúde entra no teto das despesas primárias e mesmo que a economia cresça não haverá possibilidade de aumento de recursos para a Saúde sem sufocar outra despesa primária, sob um teto bastante restrito.

Apesar de ter havido um aumento de recursos para a ASPS de R$ 8 bilhões de 2016 para 2017, a fatia das despesas com Saúde no bolo do Orçamento Federal reduziu de 3,93% em 2016 para 3,25% para 2017. Ou seja, ocorreu uma queda de 17% da participação da Saúde no bolo do orçamento da União em 2017.

Para a Educação foi garantida em 2017 a destinação do mínimo de 18% do total arrecadado pelo governo. Contudo, a partir de 2018 a Educação entra no teto das despesas primárias e mesmo que a arrecadação cresça não haverá aumento de recursos para essa área sem sufocar outras despesas primárias, sob um teto bastante restrito.

Apesar de ter havido um aumento de recursos para Educação, já descontados as despesas financeiras e as exclusões, de R$ 2,8 bilhões de 2016 para 2017, a fatia das despesas com Educação no bolo do Orçamento Federal reduziu de 1,76% em 2016 para 1,42% para 2017. Ou seja: ocorreu uma queda de 19% da participação da Educação no bolo do Orçamento da União em 2017.

É ainda importante destacar que para alcançar as metas do Plano Nacional de Educação recursos orçamentários adicionais são necessários. Eles estavam previstos para vir dos royalties do petróleo, por meio do Fundo Social. Porém, dos R$ 3,6 bilhões que deveriam ser aplicados em Educação, R$ 1,5 bilhão está alocado como reserva de contingência para gerar economia de caixa. Isso frustra a expectativa de recursos adicionais para o financiamento da Educação, em benefício da geração de resultado primário.

Essa é a PROVA 2 de que a lógica da EC 95 é ter recursos cada vez mais protegidos para o financismo e cada vez mais limitados para os direitos.

 

 

Quais políticas estão sendo sacrificadas para garantir o teto dos gastos e a liberação de recursos para o pagamento dos elevados juros da dívida pública? Avaliando por função orçamentária, temos o seguinte cenário referente à variação do Orçamento de 2016 para 2017.

Algumas poucas funções ganharam participação relativa no bolo de recursos em 2017: urbanismo, comércio e serviços, agricultura e encargos especiais. Essas funções explicam o crescimento das despesas discricionárias no orçamento das despesas primárias ressaltados anteriormente.

Porém quase todas as funções tiveram redução orçamentária em 2017.

Embora pela regra da EC 95 não haja limite específico por função, órgão ou programa orçamentário, os dados evidenciam que são aqueles relacionados com as populações em situação de maior vulnerabilidade e com menor poder dentro das estruturas do Estado que mais perdem.

 

 

No Orçamento da União, a fatia da Função “Direitos da Cidadania” foi a que teve a maior redução orçamentária, de 37,1%, saindo de R$ 2,6 bilhões em 2016 para R$ 1,6 bilhão em 2017.

Um caso marcante dentro dessa Função é o Programa “Políticas para as Mulheres: Enfrentamento à Violência e Autonomiaque teve redução orçamentária de 52%. É esse Programa que garante, por exemplo, o atendimento as mulheres em situação de violência. Esta ação orçamentária perdeu, em apenas um ano, R$ 5,5 milhões.

Outra importante Função Orçamentária para a promoção de direitos é a de “Assistência Social” que sofreu corte de 5%. Em termos de valores, essa função saiu de R$ 87 bilhões em 2016 para R$ 83 bilhões em 2017.

Um exemplo emblemático de corte dentro da Função Assistência é o do Programa “Segurança Alimentar e Nutricional” que visa garantir o direito à alimentação adequada.  Esse Programa é transversal a várias Funções: Assistência, Saúde, Gestão Ambiental, Agricultura e Organização agrária. Somente na função Assistência ele reduziu 44% e considerando todas as funções a redução foi de 55% do seu orçamento, um corte de R$ 944 milhões.

É o Programa de Segurança Alimentar e Nutricional que garante, por exemplo, o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que compra alimentos da agricultura familiar e distribui para a população em situação de risco alimentar e nutricional. Ele teve perda de R$ 132 milhões no seu valor em 2017, um corte orçamentário de 28,4% em relação ao ano anterior.

Outra ação orçamentária importante do Programa de Segurança Alimentar e Nutricional é a de apoio a tecnologias sociais de acesso a água para consumo humano e produção de alimentos na zona rural. Essa ação perdeu R$ 279 milhões em 2017, um corte orçamentário de 52,9% em relação ao ano anterior.

 

 

Além do teto das despesas primárias decorrente da EC 95, o Brasil tem, desde 2000, com a Lei de Responsabilidade Fiscal, o teto decorrente da meta de superávit primário*. Assim, quanto maior a meta de superávit primário a cada ano, mais baixo será o teto para as despesas primárias. Ou seja, além dos limites impostos pela EC 95, as despesas primárias serão duplamente penalizadas, pois deverão submeter-se também ao superávit primário.

* SUPERÁVIT PRIMÁRIO é o dinheiro que o governo “economiza”, deixando de realizar despesas primárias para poder usá-lo nas despesas financeiras, como pagamento de juros da dívida.

Em 2017, no cenário de crise fiscal, a previsão do governo federal é de que haja um déficit de R$ 143 bilhões. Para que o déficit não seja maior, a previsão é de que haverá um corte adicional de despesas de R$ 38,9 bilhões, o chamado contingenciamento. Em resumo, os gastos sociais serão submetidos a um duplo constrangimento: a EC 95 e a meta de superávit primário.

Enquanto isso, as despesas financeiras alimentadas por juros estratosféricos continuarão crescendo e enriquecendo ainda mais os credores da dívida.

Vamos falar sobre Orçamento e Direitos?

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O mundo dá uma guinada à direita, e quem paga a conta é o povo. Onde está a resistência?

Por Iara Pietricovsky, do Colegiado de Gestão do Inesc.

Nós, da periferia do mundo, estamos seguindo lealmente as tendências da potência-mãe do capitalismo e do neoliberalismo mundial. A capa da edição desta segunda-feira (13/3) do jornal Washington Post apresenta a seguinte manchete: “Cortes históricos no orçamento de Trump”.

A proposta encaminhada esta semana pelo presidente americano ao Congresso Nacional vai balançar as estruturas do governo federal dos Estados Unidos caso seja aprovada. Estão previstos cortes em vários programas sociais e ambientais, e na política externa, entre outros. Em termos de gastos, significa uma redução história – sem contar os cortes previstos de servidores públicos federais.

Por outro lado, Trump anuncia um aumento significativo do gasto militar do país, e um bom dinheiro para a construção do muro na fronteira com o México.  

Na área de educação, a nova orientação é priorizar as escolas chamadas ¨charter schools”, que são de iniciativa privada, mas subsidiadas pelo Estado. E tal decisão foi tomada sem ouvir as populações diretamente atingidas, como as comunidades negras.

Outro desafio que os Estados Unidos têm pela frente é a implementação do Acordo de Paris sobre Mudanças Climáticas, que teve pela primeira vez a assinatura do governo americano, ainda que sem a aprovação do seu Congresso Nacional. Nesta administração neoliberal e conservadora e privatizante, quase certamente o Acordo de Paris será descartado e não cumprido.

Segundo os analistas econômicos, é a primeira vez que um governo faz cortes desta magnitude nos Estados Unidos desde a Segunda Guerra Mundial.

Leia também: Como os países pobres desenvolvem os paísem ricos

A intenção dos cortes no orçamento americano é reduzir o papel do Estado e distribuir as responsabilidades das políticas públicas socioambientais para o setor privado e para os próprios cidadãos e cidadãs. Ninguém sabe dizer qual será o impacto final dessa medida, mas alguns já estimam um aumento no desemprego e, sem duvida, aumento da pobreza no país.

A proposta ainda será discutida no Congresso americano, e muita água vai rolar. No entanto, a capacidade de o Partido Democrata, de oposição, conseguir mudar alguma coisa na proposta de Trump é bem pequena, já que os republicanos têm maioria no Congresso. Ainda que haja uma certa reticência entre alguns republicanos sobre o sucesso da proposta de Trump, está claro que os Estados Unidos – e consequentemente o mundo – sofrerão profundas mudanças nos próximos anos.

Haja ansiedade e apreensão!

O impacto das medidas anunciadas pelo presidente Trump está sendo discutido intensamente e analisado por organizações da sociedade civil, analistas políticos e econômicos, membros do Congresso Nacional, movimentos sociais e sindicatos. No entanto, a capacidade dessas forças sociais em parar ou mesmo alterar essa investida do governo Trump parece ser nula. A loucura do novo presidente americano e seu governo parece estará bem ancorada nas instituições do país e numa parcela significativa da população que o elegeu.

É importante pensarmos o impacto dessas decisões no conjunto dos Acordos e Tratados Internacionais que vêm sendo firmados ou já assinados no âmbito da ONU. Vivemos uma crise do sistema multilateral sem precedentes. A redução da participação dos Estados Unidos nesses acordos e tratados impactará definitivamente a capacidade da ONU e sua relativa independência, tendo suas atividades cada vez mais privatizadas, resultando em redução de liberdade na tomada de decisão.

Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) ficarão pendurados na liquidez e rapidez da realidade (para lembrar o filósofo e sociólogo polonês Zygmunt Bauman, recém falecido), transformando tudo sem que possamos antes refletir e atuar – como uma agenda da utopia do vir a ser. Se os ODS já não significavam mudança estrutural alguma, imagine em um mundo em crise?

Estamos muito próximos de um momento em que avanços serão uma concreta impossibilidade política.

Os Estados Unidos influenciam fortemente uma tendência conservadora no mundo. Além da própria eleição de Donald Trump como presidente do país, temos ainda o Brexit (saída do Reino Unido da União Europeia), golpe parlamentar no Brasil e a grande ascensão de forças de direita na Holanda, França e Alemanha, que terão eleições em breve – o resultado desses pleitos dirão muito sobre o fortalecimento dessa direita extremista no curto prazo.

No mundo periférico em que o Brasil se situa, estamos reproduzindo exatamente a mesma lógica de retrocessos, ainda que com toques de cultura política específica de cada país. As elites realizam um golpe de Estado e implementam, à revelia do processo democrático, as mesmas reformas do centro do capitalismo.

A conta, claro, sobra para o povo, os 99% da população mundial. E onde está a resistência aos retrocessos? Por que, apesar de protestos aqui e ali, não tem força suficiente para brecar essa tendência conservadora e antidemocrática pelo mundo?

Vamos falar sobre agenda internacional?

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Brasília (DF): a juventude tem voz ativa

Publicado por Agência de Notícias das Favelas.

No último dia 23, um pouco antes do carnaval, tive a oportunidade de, pela primeira vez na vida, voar de avião e pisar em Brasília (DF). As missões: participar do lançamento da revista “Descolad@s”, para a qual escrevi um artigo sobre o extermínio da juventude preta, e participar de uma roda de conversa sobre Comunicação Crítica, Publicidade Afirmativa e Cultura Hip Hop. E lá fomos nós.

Olhar pela janela e ver que se está na altura das nuvens é algo lindo. Não teria como começar a discorrer sobre a viagem sem falar isso. Ao chegar no aeroporto de BSB, fui ao encontro de Márcia Accioli, professora de artes e uma das responsáveis pelo projeto Onda – Adolescentes Protagonistas desenvolvido pelo INESC – Instituto Nacional de Estudos Sócio Econômicos. A ideia do projeto é fortalecer a capacidade de atuação dos jovens na conquista de seus direitos e no monitoramento das políticas públicas destinadas a eles. Cerca de 200 crianças, adolescentes e jovens de quatro escolas públicas do Distrito Federal (Estrutural/Guará, Lago Oeste, Paranoá, Cidade Ocidental/Quilombo Mesquita) e da Unidade de Internação de Santa Maria (UISM) são atendidos, e o principal material gerado é a revista – integralmente pensada por eles com a orientação dos educadores.

Ao chegar ao Museu Nacional, o evento estava nos ajustes finais. Os próprios jovens pensaram e produziram a atividade, que foi mais do que apenas um lançamento da revista, mas também uma celebração do Onda. A abertura contou com dois jovens que participaram da primeira edição da revista contando sobre como surgiu a ideia da publicação e suas histórias até a chegada à sexta edição. “Para fazer uma revista dessa, é preciso ter muito espírito investigativo. A comunicação é oportunidade para pensarmos sobre várias coisas que nos acontecem. Ser ativo em comunicação é uma tarefa muito difícil, mas também nos empodera muito”, avaliou Pedro Couto. “Escrever para a ‘Descolad@s’ era um desafio imenso. Cada edição ajuda a gente a quebrar um preconceito”, completou Raquel Ferreira.

Na sequência houve uma atividade em que todos os presentes foram divididos em grupos para pensar em como a publicação poderia ser melhor utilizada no atual contexto onde há um retrocesso na garantia de direitos. Pelos grupos, crianças de 12 anos, adolescentes de 16 e alguns outros com mais de 20.

Durante o evento, houve atividades culturais como a Cia de Teatro Bisquetes, composta por jovens LGBTs moradores da Cidade Estrutural, região com o mais baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do DF. Outro destaque foi o poeta Marcelo Caetano que recitou “O Som dos Grilhões”, que fala da questão do povo preto pelas diásporas no mundo. De arrepiar! Ainda houve também apresentação de dança cigana. As dançarinas moram no acampamento cigano localizado no Distrito Federal e foram entrevistadas para a sexta edição da revista.

Ao chegar a minha vez, falei da minha trajetória, da maneira como o rap passou a ser meu canal de expressão e que, consequentemente, me levou para a Comunicação. Fica o registro de que uma menina e um menino trans que se encontram privados de liberdade, em medidas socioeducativas, colaboraram com a revista e não receberam liberação para estarem presentes no lançamento. O motivo teria sido a falta de agentes para fazer a escolta.

No dia seguinte participei de uma roda de conversa na sede do INESC, onde troquei experiências e ideias com um time de responsa: Kinah Monifa (artesã, militante do movimento negro), Dyarley Viana (assessora técnica do INESC), Caroline Lima (militante do Levante Popular da Juventude), Thallita Oliveira (educadora), Markão Aborígene (rapper/educador social), além da própria professora Márcia Accioli. Através dessas pessoas, conheci um pouco mais sobre iniciativas extremamente potentes que acontecem nas periferias do DF: Grito das Periferias, Clube das Pretas, Família Hip Hop, dentre outras. Em cada uma das falas, pude perceber um incômodo com a naturalização do racismo, machismo, da pobreza e violência nas periferias, incômodo que motiva essas pessoas a agirem e, de alguma forma, mudarem o panorama, principalmente para os mais jovens.

Ainda tive tempo de conhecer a Unidade de Internação de Jovens Granja os Oliveiras, no Recanto das Emas, onde menores que infringiram a lei recebem medidas socioeducativas. O INESC irá começar a desenvolver atividades naquela unidade nos próximos meses.

Foi uma experiência incrível ver um pouco do trabalho que essa galera desenvolve pelo DF. Em um país onde há um abismo de desigualdade entre pobres e ricos, essas iniciativas são fundamentais para se pensar a sociedade a partir da periferia e de quem faz a engrenagem girar nessa máquina. Volto do Distrito Federal com mais sonhos, ambições e disposição para realizar o que eu acredito, com as ferramentas que tenho: muito mais fome de conhecer esse país enorme e esse mundo gigante.

Seguimos firmes e expandindo nossas conexões e horizontes em prol de transformações sociais.

Sete motivos pelos quais precisamos de justiça fiscal para promover os direitos das mulheres

Nesta Semana da Mulher, o Inesc vai atuar em parceria com o site Outras Palavras com a publicação conjunta de artigos que examinam questões importantes de gênero e do movimento feminista em nosso cotidiano.

Acompanhe também nossas publicações pelo Twitter e Facebook (#8M e #Inesc8M).

Por meio da agenda dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), líderes globais se comprometeram, com um futuro melhor até 2030. O propósito é que todas as desigualdades sejam enfrentadas; todas as formas de violência contra as mulheres e meninas sejam eliminadas; e os trabalhos não remunerados de cuidados e domésticos sejam reconhecidos e valorizados, por meio da garantia de direitos e serviços públicos acessíveis e de qualidade.

Mas tais metas só serão alcançadas se tivermos um financiamento adequado, por meio de um sistema tributário justo. A política fiscal é uma das ferramentas mais poderosas que temos para reduzir as desigualdades entre pobres e ricos, entre mulheres e homens, dentro de um país e entre países.

Os tributos que pagamos de variadas formas são a fonte mais sustentável de receitas que um governo pode ter. Eles bancam a maioria dos serviços públicos dos quais as sociedades dependem, especialmente as mulheres. É por isso que defendemos a justiça fiscal com arrecadação e alocação orçamentárias sensíveis a gênero. Outros elementos, como a questão racial e diversidade étnica devem ser consideradas ao se pensar em justiça fiscal, uma vez que para o alcance dos direitos humanos é necessário que os orçamentos sejam não discriminatórios.

No entanto, ainda estamos longe de alcançar essa desejada justiça fiscal. Grandes empresas promovem evasão fiscal e ganham isenções fiscais que, somadas, custam bilhões de dólares por ano aos países em desenvolvimento. Só no Brasil, a evasão fiscal chegou a R$ 500 bilhões e os gastos tributários a R$ 270 bilhões em 2016.

Quando os serviços públicos deixam de receber um financiamento adequado, e quando os impostos não são arrecadados e alocados de forma justa, são as mulheres que pagam o preço mais alto. E entre as mulheres, são as negras que arcam com a carga mais pesada, uma vez que são elas que pagam proporcionalmente mais impostos que os demais segmentos sociais no Brasil, conforme estudo do Inesc.

A #JustiçaFiscal ocorre quando os tributos são arrecadados e aplicados de forma justa, progressiva, proporcional e com equidade.

As mulheres precisam de #JustiçaFiscal porque…

1. #JustiçaFiscal melhora os níveis de educação

A educação é um direito fundamental para todas as crianças e poderoso instrumento para redução das desigualdades. As estimativas são de que se todas as mulheres completassem o ensino primário, haveria uma diminuição de 2/3 das mortes maternas bem como uma redução de 15% da mortalidade infantil.

Um sistema tributário progressivo acompanhado de despesas redistributivas podem gerar receitas significativas para o País. Por exemplo, o Equador triplicou sua despesa com educação passando de U$ 225 milhões em 2003-2006 para US $ 941 milhões em 2007-2010 por meio de políticas eficazes de mobilização de arrecadação tributária.

A educação financiada e provida com recursos públicos tem maior potencial de transformação, ao contrário da educação privada, que pode piorar a mobilidade social e minar o potencial de redução das desigualdades advindas da educação.

2. #JustiçaFiscal reduz a carga sobre as mulheres em decorrência dos trabalhos e cuidados não remunerados

O trabalho não remunerado de mulheres subsidia o crescimento econômico. Estima-se que se o tempo que as mulheres gastam realizando cuidados não remunerados e trabalho doméstico fosse monetarizado, equivaleria a U$ 10 trilhões por ano, em torno de 13% do PIB mundial.

Quando os Estados não dispõem de receitas suficientes para prestar serviços públicos essenciais, é frequente que sejam as mulheres que preencham essa lacuna, dedicando importante parte do seu tempo, corpo e vida às atividades que o Estado deveria executar ou suprir. As mulheres gastam 2,5 vezes mais tempo realizando trabalho doméstico e cuidados com os familiares dos que os homens. É sobre elas que recai o peso dessas atribuições, limitando suas possibilidades de realizar outras atividades essenciais para a vida como, educação e formação, trabalho remunerado, descanso e lazer, entre outras. Da mesma forma, à medida que mais mulheres entram no mundo do trabalho sem o devido apoio de serviços públicos essenciais, como creches, escolas públicas ou asilos, o peso do cuidado não remunerado recaí sobre outras mulheres membros da família. O que reforça o círculo vicioso da exclusão de gênero.

O Estado não é o único corresponsável, os homens também têm a responsabilidade de cuidar de seus filhos, casa e parentes tanto quanto as mulheres. Mas os serviços públicos financiados por tributos, especialmente creches, são medidas eficazes para a efetiva realização dos direitos das mulheres ao trabalho decente, à educação, à participação política e ao descanso. Globalmente, uma em cada duas crianças está matriculada em uma creche. Muitos países têm dedicado fundos públicos para o cuidado da primeira infância, mas o financiamento ainda é muito limitado para cobrir as necessidades existentes.

3. #JustiçaFiscal possibilita o acesso das mulheres a serviços de saúde que salvam vidas

A gravidez e o parto aumentam a necessidade de cuidados de saúde para salvar vidas, assim como a natureza endêmica da violência contra mulheres e meninas em todo o mundo. Todos os dias, mulheres de todo o mundo morrem em decorrência de complicações da gravidez e do parto. Muitas dessas complicações são facilmente preveníeis com políticas públicas adequadas. Quase todas as mortes maternas ocorrem em locais com poucos recursos e a maioria poderia ser evitada. Os países africanos com receitas fiscais extremamente baixas sofrem com as maiores taxas de mortalidade materna.

No Brasil, há ainda o problema do racismo institucional na rede pública de saúde: de acordo com a Secretária de Política para Mulheres, de 2000 pra 2012 as mortes por hemorragia entre mulheres brancas caíram de 141 casos por 100 mil partos para 93 casos; entre mulheres negras aumentou de 190 para 202.

4. #JustiçaFiscal reduz a violência contra mulheres

Globalmente, um terço das mulheres e meninas sofre violência, sendo que pouco menos da metade das mulheres que são assassinadas são mortas por parceiros ou membros da família.

As mulheres que vivem em situação de pobreza nos países em desenvolvimento são as que estão mais expostas à violência sexual nas ruas. O transporte público, em particular, é um grande desafio. Nas cidades brasileiras, dois terços das mulheres dizem ter medo de se deslocar sozinhas, seja a pé ou por meio de transporte público. É relatado que em São Paulo, uma mulher é assaltada em um espaço público a cada 15 segundos; o quadro se agrava quando essas mulheres são pobres, negras, lésbicas ou trans.

As políticas públicas elaboradas com a participação das mulheres podem melhorar a sua segurança em espaços públicos e privados, oferecendo serviços como delegacia da mulher, abrigos, melhor policiamento, banheiros públicos seguros, iluminação pública, entre outros.

Combater a violência contra a mulher não é tarefa fácil, pois o patriarcalismo e o sexismo reinantes inviabilizam a efetiva realização dos direitos da mulher. Faltam recursos e políticas apropriadamente desenhadas para promover a igualdade entre mulheres e homens. Esse é o caso no Brasil: em apenas em um ano, entre 2016 e 2017, o programa “Políticas para as Mulheres: Enfrentamento à Violência e Autonomia” tem previsão de corte orçamentário de 52%, o equivalente a R$ 5,5 milhões, conforme dados do Siga Brasil e análise do INESC. É esse Programa que deveria garantir, por exemplo, o atendimento as mulheres em situação de violência.

Os governos devem investir em serviços públicos financiados por impostos para cumprir seus compromissos internacionais e nacionais em eliminar todas as formas de violência contra as mulheres e as meninas. Devem ainda apoiar organizações de direitos das mulheres que estão cronicamente subfinanciadas e que cumprem papel central na promoção da igualdade de gênero em todas as partes do mundo.

5. Quando as multinacionais e os muito ricos não pagam seus tributos devidos, dói mais nas mulheres.

Globalmente, 9 dos 10 maiores bilionários são homens brancos. Transferir e redistribuir a riqueza por meio da tributação tem o potencial de enfrentar a discriminação sistêmica baseada em gênero, raça/cor, idade, orientação sexual, deficiências e situação socioeconômica.

Os países de baixa renda arrecadam cerca de 2/3 de suas receitas tributárias por meio de impostos indiretos, como tributos sobre o consumo e serviços, que são regressivos e penalizam proporcionalmente mais os pobres. Nos países de rendimento elevado, estes impostos desempenham papel muito menor, representando, em média, 1/3 da arrecadação tributária. Os impostos indiretos não possuem o poder redistributivo que os impostos sobre a renda têm e, consequentemente, penalizam desproporcionalmente as mulheres mais pobres.

Quando os países não arrecadam de forma progressiva o imposto de renda, não tributam a renda decorrente de lucros e dividendos, favorecem as grandes corporações por meio de benefícios fiscais sem monitoramento do retorno social, ou “fecham os olhos” à elisão e evasão fiscal: a absoluta maioria desses recursos que deixam de ser arrecadados pelo Estado é acumulada por homens.

Os paraísos fiscais que desempenham papel central nesta drenagem de recursos públicos também abrigam fluxos financeiros ilícitos resultantes do tráfico de mulheres. Como nosso sistema financeiro continua a oferecer oportunidades para esconder e lavar dinheiro produto do crime, e majoritariamente são os homens brancos os arquitetos desse sistema, são as mulheres e as meninas que acabam pagando o mais alto preço dessa arquitetura.

6. #JustiçaFiscal garante o acesso à água limpa que mantém as mulheres mais seguras e constrói sua emancipação econômica

A água é reconhecida como um direito humano básico, todos os cidadãos devem ter acesso a ela em quantidades adequadas. Assim, as regiões que experimentam escassez aguda de água ou má distribuição devem realizar investimentos em programas que melhorem o acesso à água e, entre outras medidas, reduzam a distância média até um ponto de água.

Onde não há serviços públicos que viabilizem a obtenção de água, as mulheres e as meninas carregam o fardo de ter que buscar água para as suas casas, tornando-as vulneráveis à violência, sobrecarregando sua saúde e mantendo-as longe das oportunidades de educação, de trabalhos remunerados, de atividades políticas e de lazer, entre outras.

No Brasil, apesar dos avanços na última década com políticas públicas de construção de cisternas em áreas rurais, especialmente no Nordeste, o problema de abastecimento de água tem se tornado crítico nos grandes centros urbanos, onde as populações periféricas, onde estão as mulheres e meninas negras, sofrem mais com os racionamentos e a falta de saneamento básico. O acesso à água pública é vital para a autonomia econômica das mulheres.

7. #JustiçaFiscal oferece proteção social para mulheres

As políticas públicas de promoção e de proteção social contribuem para a realização dos direitos das mulheres. No Brasil, até recentemente, a cobertura do Sistema Nacional de Assisténcia Social era universal e até bem capilarizada e estruturada (CRAS, CREAS, com especificidades para indigenas, quilombolas, pop rua e pop LGBTI).

Entretanto, as políticas de austeridade, de corte de gastos, como as adotadas no momento no Brasil, quase sempre afetam essas políticas, penalizando ainda mais as mulheres. O caminho para alcançar os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) voltado para a igualdade de gênero ainda é longo: segundo a ONU Mulheres cerca de 90% dos Planos Nacionais de Ação para a Igualdade de Gênero que analisaram não contam com previsão de financiamento necessária.

Versão traduzida e adaptada pelo INESC

Texto original elaborado pela Global Alliance for Tax Justice (Aliança Global por Justiça Tributária) e disponível em: http://bit.ly/2lMfIC1

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Revista Descolad@s – Ano 6, nº 6

Em breve!

8 de Março para Luana e Veronica

Luana Barbosa dos Reis e Veronica Bolina não foram esquecidas. No entanto, a invisibilidade social que cerca a morte da primeira e prisão da segunda fazem parte da lesbofobia e transfobia, ao lado do racismo, determinantes das relações em nossa sociedade.  A múltipla violação de direitos humanos pelas quais elas passaram são tijolos a mais na construção de uma sociedade racista e machista que cala diante de tamanha violência. O silêncio é quase generalizado, seja na imprensa de massa, seja nos próprios veículos alternativos de mídia, com poucas e exceções. Cabe aos movimentos LGBTI, ao lado de familiares e amigos, buscar manter a vivas suas histórias.

Neste 8 de Março, Dia Internacional das Mulheres, trago-as lado a lado neste texto porque elas têm algo em comum: são mulheres negras periféricas que sofreram violência policial por não estarem de acordo com as normas hegemônicas de gênero. Se tradicionalmente o 8M marca a luta das mulheres por direitos, é na conjuntura política do avanço das forças conservadoras e aprofundamento das desigualdades econômicas que o chamado de Angela Davis desde os Estados Unidos revela a urgência de uma reorganização das resistências a partir dos movimentos de mulheres. E estes movimentos devem incluir as mulheres lésbicas e as mulheres trans, além de tomar o racismo como uma pauta central.

No Brasil, uma visão crítica permeia o 8 de Março, na medida em que a data não seria representativa da diversidade de mulheres e das formas diferenciadas de como as violações de direitos as impactam.  É bom lembrar que essa crítica [legítima] também foi feita internamente ao feminismo enquanto movimento social e na produção acadêmica, daí a emergência de feminismos no plural. No caso da convocação à greve, chama-se a atenção, também, para o fato de que as mulheres mais pobres não podem simplesmente “parar”, com perigo de perderem os empregos ou o dia de ganho em suas atividades produtivas.

As críticas antes e hoje são positivas e geram efeitos, e podemos compreender o próprio processo de construção deste 8 de Março como um momento de reafirmação de lutas específicas, como os movimentos de mulheres negras, do campo, indígenas, bissexuais, lésbicas e trans; mas também das latinas em relação às negras norte-americanas, e destas em relação às feministas brancas e assim sucessivamente: o fato é, a mobilização de mulheres em 2017, está ganhando visibilidade e adesão, além de estar produzindo muito debate sobre as desigualdades.

Homenagem à Luana Barbosa  mulher trans assassinadaLuana Barbosa dos Reis foi espancada por ser lésbica, “considerada masculina” pelos policiais que a revistaram. Ela se negou a ser violada – pois somente uma policial feminina poderia revistá-la de acordo com a lei –, disse ser mulher, mostrou os seios, mas seu feminino, sua maternidade [ela tinha um filho de 14 anos], seus estudos, seus conhecimentos sobre seus direitos, nada disso fez diferença para os agentes de “segurança”. Mesmo após o pedido de investigação imparcial feito em Nota pública do Alto Comissariado de Direitos Humanos das Nações Unidas para América do Sul e da ONU Mulheres Brasildestacando o risco de impunidade de um caso emblemático de racismo e a lesbofobia, em fevereiro deste ano o caso foi arquivado pela Justiça Militar por ausência de provas materiais de crime militar, e agora será investigado pela Polícia Civil.

Veronica Bolina foi torturada por ser travesti. Em que pesem acusações sobre ela, pelas quais está presa, nada justifica o espancamento e exposição de suas fotos na internet. Seu rosto foi transfigurado e seu corpo nu fotografado pelos próprios agentes policiais, que disponibilizaram as fotos na internet. A última notícia que encontrei sobre Veronica na internet é de maiode 2016, e traz uma importante reflexão sobre as constantes violações às quais são submetidas travestis e transexuais no sistema carcerário brasileiro.

Luana e Veronica foram vítimas de violência porque não se encaixavam nos discursos de sexo e gênero dominantes. O feminino é construído como “falta” ou “ausência” em nossa sociedade, a opressão do patriarcado contra a qual lutam os movimentos de mulheres. Quando o feminino se descola da norma, subvertendo e exigindo o poder sobre o corpo monopolizado pelas autoridades médica e jurídica (geralmente masculinas e brancas), tem-se uma negação do sujeito ainda maior.

Foto Verônica Bolina
Reprodução/Instagram

Ou seja, se às mulheres cis brancas heterossexuais são negados direitos fundamentais, no caso de mulheres lésbicas e mulheres trans a negação é total. Se acionamos a Judith Butler em diálogo com Beatriz Preciado, podemos dizer que a mulher lésbica e a mulher trans, ao se colocarem no mundo assumindo suas identidades e desejos, apesar da opressão e violência, apesar da negativa social em vê-las como pessoas, de alguma forma rompem com as epistemologias dominantes do gênero, do sexo, e por consequência, do controle. A norma é o masculino [branco], o regime político dominante é o heteronormativo.

Como eram lidas Luana e Veronica? O gênero é, ao lado da raça e da classe, uma classificação construída socialmente, necessária ao controle dos corpos para o capital. É na experiência colonial que estas categorias começam a se entrelaçar, por isso a interseccionalidade responde às nossas questões mais urgentes relativas às desigualdades na atualidade. As identidades sexo-diversas, em trânsito, onde masculino e feminino são mais deslizantes e resistem ao binarismo, a construção e poder sobre si, respondem resistindo e pautando a estrutura hegemônica que informa os gêneros. Com os povos escravizados, Luana e Veronica também compartilham a diáspora negra. Eram mulheres negras e periféricas. O racismo é estruturante de nossa sociedade e trata-se de um sistema de exploração e reprodução de privilégios. No caso de Veronica, ainda lhe é imputada a “loucura”, como forma de reafirmar seu caráter “agressivo” e “perigoso”, como se a criminalização dos corpos negros não fosse a própria norma social no Brasil [e nos Estados Unidos]. Em suma, Luana e Veronica foram lidas, no momento das agressões [e provavelmente em outros momentos] a partir de opressão de gênero, de classe e de raça. O fato de serem elas uma mulher trans e uma mulher lésbica interseccionam ainda mais sua vulnerabilidade social.

Se buscamos informações sobre a violação de direitos de mulheres negras, mulheres trans e mulheres lésbicas, podemos compreender como Luana e Veronica eram vulneráveis ao que lhes ocorreu. Segundo a ONG Transgender Europe (TGEU), entre janeiro de 2008 e março de 2014, foram registradas 604 mortes de pessoas trans no país, o que coloca o Brasil entre os países que mais mata transgêneros, transexuais e travetis no mundo. Somente em 2016 foram 144, de acordo com a Rede Trans Brasil. A Liga Brasileira de Lésbicas (LBL) estima que cerca de 6% das vítimas de estupro que procuraram o Disque 100 do Governo Federal em 2012 eram mulheres lésbicas. E, dentro desta estatística, havia um percentual considerável de denúncias de estupro corretivo. O Mapa da Violência 2015 elaborado pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), aponta um aumento de 54% em dez anos no número de homicídios de mulheres negras, passando de 1.864, em 2003, para 2.875, em 2013. No mesmo período, a quantidade anual de homicídios de mulheres brancas caiu 9,8%, saindo de 1.747 em 2003 para 1.576 em 2013.

O que significam estas violências e mortes sistemáticas, pouco divulgadas na mídia, pouco apuradas pelo sistema de justiça? Significa que estas violências são autorizadas socialmente, e autorizadas também pelo Estado.

As lutas das mulheres lésbicas e mulheres trans vem dizer à sociedade que as amarras de gênero da nossa sociedade, iniciadas com a chamada nomeação primária dada pelos médicos (é um menino, é uma menina), e legitimada pelas instituições familiar e jurídica, não encontram eco na realidade das múltiplas possibilidades de vivenciar o masculino e o feminino.

As lutas das mulheres negras vem dizer que elas estão em luta contra o racismo e pelo bem viver à revelia do racismo que as oprime desde sempre, contra o racismo institucional e a violação de direitos. Assim, ao lado das mães, irmãs e companheiras dos jovens negros assassinados cotidianamente no país, Luana e Veronica também são a face feminina do genocídio da juventude negra no Brasil. Elas sofreram grave violência em situações onde a polícia estava presente. Uma lésbica negra, uma mulher trans negra.

Muito se tem falado sobre crise civilizatória no campo da esquerda. Colunistas, acadêmicos, ativistas. No entanto, não sei se por ingenuidade ou cinismo, pois essa crise civilizatória é bastante anterior, e a conjuntura política atual vem revelar como as estruturas coloniais, como o patriarcado e a escravidão, uma vez não descontruídas, seguem determinando nossas relações sociais. Um exemplo disso é a “nova escravidão” da qual nos fala Angela Davis, ao denunciar o encarceramento em massa dos corpos negros como atividade lucrativa; mas também ao denunciar a militarização das relações sociais em todo o mundo. Aqui no Brasil, tristemente, mas não inesperadamente, o método tem sido o mesmo.

De forma legítima, as mulheres negras elegeram o 25 de Julho como o seu dia, e as pessoas trans tem o seu dia da visibilidade, 29 de janeiro. No entanto, Luana e Veronica devem ser trazidas à tona, à visibilidade, neste “mês da mulher” e em qualquer outro espaço e data de luta e resistência que questionem os poderes estabelecidos. É pela visbilididade lésbica, é pela visbilidade trans, é contra o racismo e pelo bem viver.

*Quem escreve este texto é uma mulher cis lésbica de classe média. Trata-se de uma contribuição que se apequena diante de Luana e Veronica, e do que suas histórias representam. Agradeço a generosidade de Antonella, Caetano e Ludmila, que dialogaram sobre a limitação do lugar de fala, mas também sobre a necessidade de dar visibilidade às mulheres lésbicas negras e às mulheres trans negras neste 8 de Março.

“O dia Internacional da Mulher é uma continuidade na luta das mulheres”

Publicado por Plataforma pela Reforma do Sistema Político.

No dia 8 de março, a Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma Política fez uma entrevista com a ativista do Fórum de Juventude Negra de Brasília e educadora social pelo INESC, pedagoga pela UDF, especializada em História e Cultura Afrobrasileira e em Educação em Direitos Humanos pela UFG, Layla Maryzandra, para fazer uma reflexão sobre a luta das mulheres não só pela igualdade de gênero, mas sobre todos os recortes de raça e classe.

A entrevista:

Layla estamos iniciando mais um mês em que a luta das mulheres se verbaliza, a partir da simbologia do dia 8 de março. Na história, o dia internacional da mulher foi criado a partir da organização das primeiras Conferências de Mulheres socialistas na Europa, embora exista o mito das mulheres queimadas em uma fábrica americana. Mas, diante de tantos processos anteriores de resistência, é correto afirmar que a luta das mulheres tem como marco inicial o dia 8 de março?

Não, esta afirmação está incorreta. O dia Internacional da Mulher – 08 de março é uma continuidade na luta das mulheres, afirmar isso é negar, por exemplo, a história de Rainhas e Guerreiras negras no período pré-colonial, além de 300 anos de escravidão negra no Brasil, e invisibilizar 128 anos de pós abolição.  Como se mulheres negras estivessem alheias aos processos ocorridos com ela e sua comunidade, apesar do papel passivo e submisso embutido na mulher negra, elas estavam a frente de Revoltas, Quilombos, Irmandades e Associações, em 1950, por exemplo, foi fundado o   Conselho Nacional de Mulheres Negras no Rio de janeiro. Mostra-se assim que não diferente de outros grupos de mulheres, a negra tem um papel fundamental na trajetória do que ocorreu antes e depois do 08 de março.

Existe um equivoco quando se pensa a política para as mulheres de uma forma generalizada, sem entender, de forma principal, os recortes de classe e raça. A mulher negra totaliza  58,86% das mulheres vítimas de violência doméstica, a partir do Balanço do Ligue 180 – Central de Atendimento à Mulher/2015, 68,8% das mulheres mortas por agressão são negras, a partir do diagnóstico dos homicídios no Brasil, feito pelo Ministério da Justiça/2015. Como ligar a discussão feminista ao combate ao racismo, como ligar a luta pela igualdade de gênero à justiça social?

Primeiro, penso que a teoria interseccional, consegue ligar essas pautas, pois a mesma explica como diferentes estruturas de poder interagem na vida das minorias, especialmente mulheres negras. O nome foi dado pela afroamericana Kimberlé Crenshaw em meados dos anos 1980. O conceito refere-se à continuidade de antigas articulações dentro do movimento feminista que sentiam a necessidade de pensar para além das lentes coloniais. O O feminismo negro, surge exatamente dessa necessidade, aliar as duas questões, em destaque, no Brasil temos Lélia Gonzales e nos Estados Unidos Angela Davis, dentre outros nomes, que dialogam com essa junção.

Segundo, a igualdade de gênero é uma questão de direitos humanos e uma condição de justiça social, é fomentado pelas demandas da sociedade e pela pressão política dos movimentos sociais que o Estado deve ser orientado na implementação de políticas de promoção da igualdade de gênero.

Falando sobre democracia e a representativa, um estudo realizado pelo INESC, analisou o perfis das candidaturas no pleito eleitoral de 2014. Os dados mostraram um pouco mais de 14% de candidatas negras disputando as eleições. O atual Congresso Nacional só tem apenas 56 mulheres, sendo 12 negras (11 eleitas  para a Câmara e 1 para o Senado). Como reverter esse contexto de subrepresentação?

Esse contexto está aliado a toda uma estrutura racista na política brasileira que foi construída ao longo dos séculos, e a subrepresentação reverbera isso. Então teremos mais longos décadas a reverter esse processo através de consciência racial que está aliada a consciência política e que conseqüentemente poderá mudar aos poucos o quadro da representação dos negros na eleição.

Notas de uma mulher negra sobre o 8 de março

Nesta Semana da Mulher, o Inesc vai atuar em parceria com o site Outras Palavras com a publicação conjunta de artigos que examinam questões importantes de gênero e do movimento feminista em nosso cotidiano.

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Por Layla Maryzandra, pedagoga, educadora social do Inesc e coordenadora do Fórum de Juventude Negra do DF e Entorno (Fojune).

As narrativas que acompanham o surgimento do Dia Internacional da Mulher são conseqüências de vários fatos históricos ocorridos entre direitos sociais e políticos de mulheres que se iniciaram na segunda metade do século 19 e se estenderam até os dias atuais. É um dia legítimo de memória e continuidade daquelas que rasgaram as mantas instauradas pelo patriarcado, impulsionando perspectivas para um debate inicial de gênero.

No entanto, as mulheres que instigaram esse debate neste período são as mesmas que foram formadas para não refletir, em primeira instância, sobre as desigualdades raciais e de gênero, e até mesmo de classe. Tendo pouco ou nenhum impacto em suas reflexões sobre o que ocorreu às mulheres negras entre os séculos 16 e 19 nas Américas, no período de tráfico negreiro, ou o que ocorreu pós-abolição no Brasil. Isso revela o abismo que o racismo provoca mesmo em mentes que buscam emancipação de um grupo oprimido.

Transgredindo as fronteiras instauradas pelo racismo, a mulher negra já trazia elementos ancestrais, que dialogam com o que a gente conhece hoje como interseccionalidade, isso através de uma herança malunga, onde foi recriado laços políticos e estratégias de sobrevivência.

E por que é uma herança malunga? Como isso dialoga com o movimento de mulheres no dia 8 de março e uma ruptura de uma lógica colonial? Bom, primeiro é importante compreender que a palavra ‘malungo’ vem de uma perspectiva epistemológica afrocêntrica, tecendo referências que ainda estão longe de serem aceitas no mesmo prisma dos modelos judaico-cristão e anglo-saxões, mas que exprimem de fato o que é a organização política de negros em diáspora.

A palavra ‘malungo’ vem dos povos de matriz bantu da África Central e Oriental, particularmente entre os falantes das línguas kikongo, umbundu e kimbundu. Entre seus vários significados, que dependem do tempo e lugar, está “companheiro de viagem”, termo utilizado pelos negros escravizados com os que estavam na mesma situação que ele no navio negreiro.

A interccionalidade é uma teoria que explica como diferentes estruturas de poder interagem na vida das minorias, especialmente mulheres negras. O nome foi dado pela afroamericana Kimberlé Crenshaw em meados dos anos 1980. O conceito refere-se à continuidade de antigas articulações dentro do movimento de mulheres que sentiam a necessidade de pensar para além das lentes coloniais.

Elas compreenderam o verbo malungar muito cedo, e levaram isso para a organização política de mulheres negras, com um olhar interseccional: é por meio do companheirismo, ou da irmandade, construída a partir da perda, da ruptura, mas também da transgressão identitária, que a ação ancestral de sobrevivência, incorporada em diáspora, vem sendo costurada. A travessia entre África e América propiciou violências, mas também desencadeou solidariedades entre grupos que poderiam ser inclusive inimigos étnicos em suas respectivas regiões na África.

Nota-se então a malunagem ativa na organização política de mulheres negras, pois as companheiras de viagem ainda navegam em um mar racista, sexista e classista, que estrutura suas vivências de forma subalterna. Mas as malungas ainda emergem na luta, respeitando as experiências comuns e distintas de cada uma.

É a consciência coletiva da mulher negra que traz a ruptura das invisibilidades, que chama atenção para as lacunas existentes na luta de mulheres, do negro e nas políticas de classe. Assim temos a insurreição de quem não tinha direito nem ao próprio corpo, mas que recriou no infortúnio a emergência de outras subjetividades, trançadas com o termo da interseção nas demandas.

É a malunga pondo ordem na casa. As experiências comuns entre as mulheres não podem desconsiderar as desigualdades existentes a este grupo.

Quando mulheres negras chamam atenção sobre interseccionar às lutas, ela demonstra que apesar de estar num espaço extremamente marginalizado, esse mesmo espaço faz com que ela visualize a sociedade de outra forma: isso é herança malunga, é ver para além das brechas do navio, são os elementos simbólicos de sua origem reacendendo em suas memórias através do discurso político.

Assim, a mulher negra foi convivendo com esses saberes simbólicos, que foram se organizando e reorganizando, tanto para dentro do movimento de mulheres como para fora, em combate a uma conjuntura que nunca foi favorável a elas. O próprio 8 de março – Dia Internacional da Mulher, ainda não é um dia em que todos os movimentos de mulheres negras se sintam confortáveis para chamar de seu, e para atribuí-lo a uma luta histórica sua também, devido à deslegitimidades e silenciamentos ainda presentes no movimento de mulheres.

No entanto, nota-se uma renovação nas demandas desse dia de luta,  mesmo que a  inclusão das demandas, discutidas pela interseccionalidade, não estejam no formato ideal, já se alcança aos poucos o que se espera. Possivelmente a Marcha de Mulheres Negras ocorrida em novembro de 2015 com presença de cerca de 40 mil mulheres contribuiu para dar um fôlego a isso no Brasil. O slogan dessa marcha foi: “Contra o racismo e pelo Bem-Viver”, com uma carta que resume tudo que o Estado deveria ter feito há 130 anos, pós-abolição. São demandas que o movimento social, seja de mulheres, negro, LGBTI, ou qualquer outro que tenha mulher negra, deve se ater.

As malungas provocam uma crítica radical de mudança social, suas demandas de outrora não deixam de ser demandas atuais.

No chamamento da greve internacional para este dia 8 de março de 2017 estão envolvidos pelo menos 30 países, boa parte deles vivendo um contexto de retrocesso político, o que só fortalece o contexto levantado pela carta da Marcha de Mulheres Negras no Brasil, além de marchas e protestos ocorridos recentemente na Argentina e nos Estados Unidos.

A greve internacional de mulheres representa um passo importante para um novo ciclo de legitimação das demandas de povos historicamente discriminados. Com o slogan “Se nosso trabalho não vale, produzam sem nós”, há de se refletir que o trabalho em massa está nas mãos desses povos, sobretudo das mulheres negras.

As vozes malungas estão ecoando seus saberes e conhecimentos, legitimando e partilhando uma nova ordem para instauração de outra matriz civilizatória. Qualquer avanço adquirido por mulheres negras nunca será um avanço individual; o avanço delas é a transgressão de toda uma sociedade.

Vamos falar sobre Gênero, Raça e Etnia?

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Direito à cidade, esfera pública e as mulheres

Nesta Semana da Mulher, o Inesc vai atuar em parceria com o site Outras Palavras com a publicação conjunta de artigos que examinam questões importantes de gênero e do movimento feminista em nosso cotidiano. O primeiro dessa série é sobre educação.

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Por Cleo Manhas, assessora política do Inesc.

A proposta aqui é dialogar com outras pessoas sobre as cidades, a esfera pública e as mulheres, tendo como mote o Dia Internacional da Mulher. Bom momento de reflexão sobre o não reconhecimento e as interdições de gênero nos espaços públicos, que em geral são masculinos e tentam, a todo momento e a todo custo, constranger mulheres, devolvê-las ao espaço privado de onde, aparentemente para o machismo e o patriarcalismo, nunca deveriam ter saído.

Bela, recatada e do lar. Essa foi a chamada de uma reportagem feita por uma revista de grande circulação, sobre a atual primeira-dama. Além do reforço a um estereótipo de mulher que cuida do privado enquanto o homem trabalha no espaço público, traz a ideia de que ser do lar é respeitoso, resguarda e protege as mulheres e seus corpos. Um contraponto à luta feminista, em constante disputa pelos espaços públicos e privados, pois nem sempre quatro paredes são protetoras, a violência doméstica é uma constante e, em briga de marido e mulher, é preciso sim meter a colher, tornar público, judicializar e punir agressores.

O controle sobre os corpos das mulheres é muito forte socialmente, por isso essa eterna força que faz das cidades espaços inóspitos e violentos, onde ficamos expostas a assédios de variadas formas. Para muitas a violência que vai além dos assédios, são ao mesmo tempo alvos da violência machista e responsabilizadas por ela, pela forma como interagem no espaço público.

E antes de avançar na reflexão sobre mulheres e cidades, é necessário esclarecer que não é possível falar de mulher ou feminismo no singular, são mulheres e feminismos, visto que há grandes diferenças, por exemplo, quando estamos falando de mulheres brancas, classe média, cisgênero, heterossexuais e mulheres negras faveladas cis e hetero e ainda mulheres, negras, faveladas, lésbicas ou mulheres transexuais. Somos seres multifacetadas, com suas distinções e diferenças. E se as cidades não são amigáveis com o primeiro grupo, imagine com os demais? Além de as cidades terem espaços interditados para mulheres de maneira geral, por serem pensadas por e para homens, há ainda as interdições por privatização de espaços públicos que não permitem a convivência com mulheres negras, lésbicas, trans.Momentos em que todas as desigualdades se juntam em um só corpo.

Então: direito à cidade e feminismo, o que temos a dizer sobre isso? Por que a relação ou a não relação? Como perguntaria um cineasta brasiliense, a cidade é uma só? Há várias cidades na cidade. Divididas e hierarquizadas, em geral segregadas. Os locais mais centrais, onde concentram os postos de trabalho não são os mais habitados, ao contrário, a maior parte da população precisa se descolocar por grandes distâncias. E aí mora o perigo, as mulheres de baixa renda gastam mais de três horas em deslocamentos, saem de suas casas muito cedo, ainda escuro, e retornam muito tarde. Os bairros periféricos, em geral, são pouco iluminados e inseguros. O transporte público é de má qualidade e lotado, facilitando o assédio que é corriqueiro em ônibus, metrôs e trens.

A resposta dada por alguns governos municipais aos assédios em transporte público foi, no caso do metrô, criar vagões exclusivos. Foi uma decisão polêmica, sem consenso, mesmo entre os movimentos feministas. E sem querer discutir se os vagões são necessários ou não, só uma problematização: as mulheres que não estiverem nos vagões exclusivos estão liberadas para serem assediadas? Ao que parece esta decisão mais uma vez as responsabiliza pela violência sofrida, ao precisarem ficar segregadas se não quiserem sofrer violações. Os espaços públicos não estão abertos e liberados, elas precisam esconder seus corpos se quiserem respeito.

As cidades em geral não são amistosas com a população periférica, mas as mulheres sofrem mais. Só no dia 2 de março o jornal Correio Braziliense veiculou uma notícia em três partes, a manchete principal dizia que na noite anterior uma jovem de 19 anos havia sido estuprada na parada de ônibus. Na sequência diz que uma aposentada de 62 anos foi estuprada por um vizinho embriagado. Por último, uma criança de 12 anos sofreu violência sexual no caminho da escola. Isso em apenas um dia na capital do país. Casos que foram registrados, pois há inúmeros não computados porque os equipamentos públicos oferecidos nas cidades para as mulheres registrarem ocorrência também não são amigáveis. Na maioria das vezes a vítima “torna-se” a culpada, conforme já problematizado aqui.

Como e por quem são pensadas as políticas públicas?

Historicamente as cidades foram divididas entre lugares para homens e lugares para mulheres, entendendo o público como masculino e o privado como feminino. No entanto, esta realidade mudou e as mulheres ocuparam os espaços públicos, porém, a geografia desses espaços não acompanhou as mudanças na mesma velocidade, até porque, vivemos em uma sociedade machista, racista, classista, valores que sustentam um sistema capitalista que a tudo privatiza, especialmente, a urbis.

E não há tradição no Brasil de se pensar políticas e planos participativamente, ouvindo de fato as usuárias de tais serviços públicos. Não é assim com a saúde e educação, que são tradicionalmente mais vivas no cotidiano das mulheres, o que dizer da mobilidade, apesar de termos de nos deslocar cotidianamente. As cidades não foram planejadas para as pessoas, mas sim para o capital, para as grandes empreiteiras e grandes corporações. E as formas de ir e vir e onde é o seu espaço na urbis determinam as relações sociais para com o local.

Mesmo que esses espaços urbanos sejam vivenciados de diversas formas por diferentes grupos sociais e pelos distintos gêneros, apesar de serem públicos, há inúmeras interdições culturais nos variados lugares e recantos das cidades. As distancias e os deslocamentos também são determinantes para as relações sociais nos espaços ditos públicos.

E quem pensa as políticas para as cidades? Sejam de mobilidade, segurança, uso e ocupação do solo? Em geral homens brancos que transitam de carro privado, não utilizam os espaços urbanos de fato, não circulam de transporte público coletivo.

Há reflexões importantes a serem feitas para mudanças de rumo, em primeiro lugar pensar que cidade queremos e quais as políticas necessárias para a sua concretização. A cidade é de todas as pessoas, portanto, as questões de igualdade e de reconhecimento devem estar presentes quando se pensa políticas. E as sujeitas das políticas devem participar ativamente em sua concepção.

É importante pensar a cidade e a esfera pública para quem nela convive, reconhecendo as desigualdades de gênero e, de forma participativa, pensar nas políticas, para que sejam de fato promotoras de direito e construtoras de espaços de convivência que contemplem, respeitem e sejam dignos das diferentes pessoas que nelas vivem.

Vamos falar sobre Direito à Cidade?

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Una agenda fiscal basada en derechos e igualdad convoca la Red Latinoamericana de Justicia Fiscal en Ecuador

Publicado en Instituto Centroamericano de Estudios Fiscales (ICEFI)

El Icefi asistió los días 13 y 14 de febrero al Seminario internacional «Hacia una agenda fiscal internacional basada en los derechos y la igualdad», realizado en la ciudad de Quito, Ecuador. La actividad fue convocada por diferentes redes, incluida la Red de Justicia Fiscal de América Latina y el Caribe –de la cual Icefi participa en su consejo directivo. También se sumó a la convocatoria el Ministerio de Relaciones Exteriores y Movilidad Humana de Ecuador, como país anfitrión, y como parte de la promoción de un referéndum para prohibir a funcionarios públicos tener bienes en paraísos fiscales.

El evento reunió a especialistas en temas de justicia fiscal de dentro y fuera de la región latinoamericana, y perseguía como objetivo abrir un espacio de diálogo y reflexión sobre los principios de justicia fiscal, con énfasis en la transparencia financiera y el abuso de poder corporativo. Y en ese marco, el evento se enfocó en la búsqueda de estrategias para poner fin a las guaridas fiscales (más conocidos como paraísos fiscales), y proponer un organismo intergubernamental dentro de Naciones Unidas orientado a combatir ese flagelo.

En torno a estos objetivos, se realizó una serie de paneles de discusión, en donde se discutió una agenda fiscal internacional con énfasis en los derechos y la igualdad. Uno de estos paneles se denominó «Derechos humanos en la política fiscal», y fue moderado por Abelardo Medina, economista sénior del Icefi y coordinador del área macrofiscal. La mesa de panelistas estuvo conformada por Nicholas Lusiani, del Center for Economic and Social Rights (CESR), de los Estados Unidos; Grazielle David del Instituto de Estudios Socioeconómicos (INESC), Brazil; y Jane Nalunga del Southern and Eastern Africa Trade Information and Negotiations Institute (SEATINI), de Uganda.

Al finalizar el evento, las organizaciones participantes hicieron pública una Declaración Final en la cual expresaron su respaldo al referéndum ecuatoriano, que es pionero en la búsqueda por eliminar los paraísos fiscales. En esta se reafirmó el compromiso de diversas organizaciones para «trabajar junto al gobierno de Ecuador por la justicia fiscal y erradicar los paraísos fiscales». El referéndum realizado el 18 de febrero, junto a las elecciones generales, dio un resultado afirmativo, por lo cual Icefi expresó sus felicitaciones al pueblo ecuatoriano por este importante precedente.

Educação e as novas demandas de feminismo

Nesta Semana da Mulher, o Inesc vai atuar em parceria com o site Outras Palavras com a publicação conjunta de artigos que examinam questões importantes de gênero e do movimento feminista em nosso cotidiano. O primeiro dessa série é sobre educação.

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Por Marcia Acioli, assessora política do Inesc.

Historicamente, as mulheres têm lutado pela emancipação, pela conquista de autonomia e pela entrada no mercado de trabalho como forma de equidade de gênero.

Simone de Beauvoir, filósofa francesa conhecida por seus tratados sobre feminismo, já sinalizava que pela via do trabalho as mulheres, ao lutar por independência concreta, diminuiriam a distância entre elas e os homens. Para isso, a educação seria estratégica na medida em que as prepararia para um trabalho mais qualificado.

A essas demandas clássicas, que permanecem atuais, soma-se uma diversidade de questões que se apresentam como urgentes. Hoje o feminismo na educação se entrelaça a outros temas indissociáveis. O ser menina na escola não é uma experiência única a todas as meninas e meninos que se percebem meninas. No mínimo, o ser menina se relaciona à raça/cor, à expressão de gênero, à sexualidade, à experiência familiar, ao local de morada, à construção do ativismo, ao talento e ao desejo intelectual, à produção e ao acesso à arte e à identidade cultural.

Ser menina, negra, moradora de favela é uma experiência diferente de ser menina não negra, de classe média, que por sua vez é diferente daquela de uma menina trans. A escola deve dar conta dessa diversidade, favorecendo o desenvolvimento do ser pleno, das possibilidades e dos desejos, visando à superação das desigualdades e ao fim da violência de gênero.

Portanto, o feminismo não diz respeito somente às meninas na escola. A dignidade é uma construção relacional que também tem nexo com as desigualdades estruturantes. Ela se estabelece num complexo de relações pessoais e sociais nas quais todas as pessoas devem ter o livre exercício da expressão de seus anseios e desejos. O ideal da educação é sempre ampliar possibilidades rompendo barreiras simbólicas que colocam sujeitos em relações assimétricas.

A educação sexista, a mais comum no Brasil, tem como pressuposto um fosso que separa o universo feminino do masculino, sendo este associado à força e aquele à fragilidade. A educação sexista condiciona, desde a mais tenra infância, meninos e meninas a se comportar de formas diferentes. Nega a sexualidade das meninas e estimula a dos meninos, prepara meninas para serem mulheres “cereja do bolo”, princesas inertes, delicadas e sem voz. Educa meninos para atitudes mais agressivas, mesmo que porventura não queiram esse lugar.

O Brasil é território violento para meninas. Estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada Ipea1 baseado em dados de 2011 do Sistema de Informações de Agravo de Notificação do Ministério da Saúde (Sinan) revelou que 70% das vítimas de estupro no Brasil são crianças e adolescentes, dos quais 89% do sexo feminino. A pesquisa estima que no mínimo 527 mil pessoas são estupradas por ano no Brasil e que, desses casos, apenas 10% chegam ao conhecimento da polícia. Desses estupros, cerca de 70% são cometidos por pessoas próximas ou da própria família. Ou seja, o estupro é uma violência banalizada que tem ganhado novos contornos. O estupro coletivo, por exemplo, violência perpetrada como forma de ostentação, tem ganhado espaço na mídia. A divulgação nos meios de comunicação e os trâmites da denúncia, não raras vezes, apontam a vítima como responsável. No mínimo, há esforço para desqualificar o caráter de quem sofreu a agressão. Em outra pesquisa também realizada pelo Ipea em 20132, 26% dos entrevistados concordam total ou parcialmente com a afirmação de que “mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas”. A lógica machista mata de diversas formas.

Vozes conservadoras da sociedade reclamam das iniciativas que propõem discutir questões de gênero na escola, alegando ser uma intervenção nos valores familiares. Ao contrário disso, a discussão de gênero não diz respeito ao mundo privado. Significa educar para a esfera pública; debate urgente no país líder mundial em assassinatos de gays, travestis e transgêneros. Como exemplo de debate sobre o tema, a revista Descolad@s 2017, uma produção de adolescentes do Inesc com o foco em direitos humanos, promove e divulga reflexões acerca do assunto, oferecendo para as escolas públicas um material rico e provocador.

Comprometida com o desenvolvimento de uma visão de mundo, a educação é indispensável para a promoção de uma nova ordem social. Portanto, quanto antes se inicia o trabalho pedagógico com o foco na equidade de gênero, maior é a possibilidade da formação de sujeitos mais sensíveis e dispostos a uma relação equânime, livre de opressões e de assimetrias.

A despeito da escola, meninas estão construindo alternativas, querem expressar sua sexualidade e o seu desejo sem censura. Querem escolher e escolhem suas roupas e cores livremente, buscam novas carreiras, querem dançar sem serem vistas como objeto disponível para o desejo do outro, querem expor seus corpos sem que isso signifique um convite ao estupro, querem namorar, querem estudar, querem não estudar, querem fazer rimas e batalhas de hip hop, querem fazer grafite, andar de skate, dançar ballet, fazer ciência, pensar e ser respeitadas. Elas têm rompido com padrões cristalizados na sociedade, muitas vezes com alegria, outras com dor. Elas, desejam, sobretudo, a plenitude da existência e construir nova lógica social. Querem viver sem violência!

Assim como a dignidade, a felicidade – afinal, a vocação mais radical de todas as crianças – deve emergir da educação feminista.

1Nota Técnica Estupro no Brasil: uma radiografia segundo os dados da Saúde.

2Sistema de Indicadores de Percepção Social (SIPS)

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