Crenças e descrenças na economia verde

A edição nº.29 do boletim “Orçamento e Política Ambiental” aborda a realidade nacional e internacional da economia verde, além de apresentar dúvidas e questionamentos sobre a sua aplicação e os  benefícios que ela pode gerar. A publicação também alerta para os riscos da apropriação deste conceito pelos setores políticos, econômicos e financeiros que levaram o planeta e o mundo ao estado de alarme em que hoje nos encontramos.

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Racismo, Igualdade e Políticas Públicas

Ação afirmativa no ensino básico e superior
Número: PL 2827/2003
Autor: Ivan Valente – PT/SP
Descrição:

Institui a obrigatoriedade de incluir o quesito cor/raça nas fichas de matrícula e nos dados cadastrais das Instituições de Educação Básica e Superior, públicas ou privadas, em suas diversas modalidades de ensino.

Situação:Aguardando Retorno na Mesa Diretora da Câmara dos Deputados (MESA)

Casa:Câmara

Criminaliza a veiculação de informação que induza ou incite a discriminação
Número: PLS, Nº 337 de 2003
Autor: SENADOR – Paulo Paim
Descrição:

Define o crime de veiculação de informações que induzam ou incitem a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, na rede Internet, ou em outras redes destinadas ao acesso público.

Situação:AGUARDANDO DESIGNAÇÃO DO RELATOR
Casa:Senado

Define os crimes resultantes de discriminação e preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem.
Número: PL 6418/2005
Autor: Senado Federal – Paulo Paim – PT/RS
Descrição:

Define os crimes resultantes de discriminação e preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem.

Situação:Aguardando Parecer na Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM)
Casa:Câmara

Determina a obrigatoriedade de unidades policiais para o atendimento às minorias
Número: PL 2289/2007
Autor: Alberto Fraga – PMDB/DF
Descrição:

Determina a obrigatoriedade de existência nos Estados, no Distrito Federal e nos Territórios de unidades especializadas de polícia para atendimento da mulher, do idoso, da criança e do adolescente, das minorias e das vítimas de crimes de preconceito de raça, cor ou religião e investigação de crimes ambientais, e dá outras providências.

Situação: Arquivada na Mesa Diretora da Câmara dos Deputados (MESA)
Casa:Câmara

Dispõe sobre a ação civil destinada ao cumprimento da obrigação de fazer ou de não fazer, para a preservação da honra e dignidade de grupos raciais, étnicos e religiosos.
Número: PL 4800/1998
Autor: SENADO FEDERAL – ABDIAS NASCIMENTO – PDT/RJ
Descrição:

Dispõe sobre a ação civil destinada ao cumprimento da obrigação de fazer ou de não fazer, para a preservação da honra e dignidade de grupos raciais, étnicos e religiosos.

Situação:Aguardando Retorno na Mesa Diretora da Câmara dos Deputados (MESA).
Casa:Câmara

Dispõe sobre medidas de ação compensatória para a implementação do princípio da isonomia social do negro
Número: PL 1866/1999
Autor: Luiz Salomão – PDT/RJ
Descrição:

Dispõe sobre medidas de ação compensatória para a implementação do princípio da isonomia social do negro.

Situação: Aguardando Parecer na Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM)
Casa:Câmara
Institui a responsabilidade penal de pessoas jurídicas cujos funcionários realizem práticas de racismo.
Número: PL 27/1999
Autor: Paulo Rocha – PT/PA
Descrição:

Acrescenta art. à Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, que define os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, instituindo a responsabilidade penal de pessoas jurídicas cujos funcionários realizem práticas de racismo.

Situação: Aguardando Designação de Relator na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC)
Casa:Câmara

A COP 18 deixou um gosto amargo para o nosso futuro comum

INFORME FINAL DA COP 18 – DOHA

Iara Pietricovsky*

COP 18 acabou deixando um resultado modesto e neste caso, o modesto não serve ao Planeta. Um sentimento amargo de quem vai mais uma vez para um espaço de luta política numa tentativa de que as mentes dos negociadores, que representam os “interesses” de seus governos, saberão chegar a um acordo que satisfaça e que proteja o Planeta Terra do aquecimento global. Tem que ser menos de 2º C caso contrário nossa situação ficará crítica neste habitat.

Acabamos um processo exaustivo de negociações, depois de duas semanas andando para cima e para baixo, no Centro de Convenções de Doha, lugar enorme que nos consumiu e nos impedia de ter a noção do que acontecia por dentro. Muitas atividades, e as negociações mais importantes eram fechadas, sem acesso público até de delegados. Era um mundo de coisas difíceis  de se localizar. Dava uma enorme sensação de solidão.

Um pouco diferente das outras COPs de Mudança Climática, que pelo menos, tinham gente do lado de fora, fazendo barulho nas ruas existia um sentido imediato entre dentro e fora. Isso nunca me pareceu tão fundamental como nesta conferência. Mesmo as manifestações internas se perdiam naquela imensidão de espaço e a mídia também, pouco se importava. Dos noticiários que acompanhei, dos grandes jornais o AL Jazeera e o The Gardian foram as melhores coberturas.

No contexto da sociedade civil, tivemos importantes manifestações feitas pela Christian Aid, Oxfam, Grennpeace, Action Aid, IBON, TWN, Articulações de Mulheres, APRODEV/ACT, a CUT do Brasil, Vitae Civilis, Fórum de Mudanças Climáticas, e eu pela REBRIP/INESC, entre outros grupos acompanhando, organizando debates e fazendo demonstrações contra o processo dentro do Centro de Convenções. Foram importantes momentos de demonstração de nossas posições e frustrações com os tomadores de decisão.

O Protocolo de Quioto foi adiado por mais 8 anos, parece que esta é a boa notícia. Essa era a posição defendida pelo governo brasileiro desde o princípio. Porém, o custo deste acordo foi a saída de importantes poluídores do Planeta, tais como Russia, Japão e Canadá. Somando com os EUA e China que continuam fora. Podemos afirmar que os 35 países desenvolvidos que ficaram, Austrália + UE, respondem por apenas 15% das emissões de gás estufa que promovem, segundo os cientistas do IPCC, o aquecimento acelerado do Planeta.

Como o Protocolo era o único mecanismo de tratado internacional com caráter vinculante, a saída destes países e a não entrada dos EUA e China, acabam tornando profundamente frágil  o PK (Protocolo de Quito).  O PK obriga aos países signatários baixar suas emissões radicalmente para aquela que estava sendo realizada antes de 1990.

Os cerca de 200 países presentes na conferência, que não teve presença massiva de Chefe de Estados, só de Ministros, concordaram também  em revisitar o tema de financiamento aos países pobres a partir do ano que vem. Temos importantíssimos como transferência tecnológica, Desenvolvimento de Mecanismos Limpos (MCD), REDD, ADP(Plataforma de Durban) entre outros. ADP será o espaço onde vários destes temas serão recolocados e como observou o Embaixador brasileiro, André Lago, deverá ser feito de uma nova forma, mais criativa do que tem sido as negociações da COP até agora.

A Ministra do Meio Ambiente do Brasil, disse em suas palavras finais que “não estamos satisfeitos com o resultado. Queremos mais, acreditamos que é preciso mais. Mas, acredito que a reafirmação do segundo termo do Protocolo de Quioto, por definição, é um sucesso.”

Lamentavelmente, não é o que pensamos nós e o que pensa a vasta maioria das organizações da sociedade civil presentes ( ou ausentes daquele evento em Doha), nem da grande maioria dos acadêmicos assim como para os países não desenvolvidos, especialmente os mais pobres e os insulares (onde o risco e a eminência de sumirem, literalmente, do mapa é real e já com evidencias em alguns destes países).

O resultado rebaixou o Protocolo de Quioto, fragilizou-o a níveis que não esperávamos. Agora resta pensar e refletir sobre estes resultados, somar com aqueles fracos resultados da Rio+20 e observar como o mundo atual se reestrutura no âmbito mundial por meio de redução dos espaços multilaterais, redução do marco internacional dos Direitos e buscando soluções por meio da privativação não só dos Estados Nacionais (processo antigo da tendência neo-liberalizante e de redução do papel do Estado e fragilização dos governos como instância prioritária de mediação e fiscalização dos diferentes setores), mas agora, em passado recente uma clara privatização das instituições de caráter público e multilateral, como é a  Organização das Nações Unidas (ONU) e suas instituições vinculadas, como é o caso do PNUMA, entre outras.

Por essas e por outras é que o que ficou, na longa volta para casa, deste processo da COP 18 foi um grande gosto amargo no corpo e na alma. Quando vamos tomar as decisões ? Quem serão aqueles que de fato terão capacidade de fazê-las? O tempo dirá.

Antropóloga, membro do colegiado de gestão do Inesc que integra a Rede Brasileira Pela Integração dos Povos (Rebrip). É  uma das representantes da sociedade civil organizada brasileira na COP 18.

Avanços e Desafios da Democracia Participativa: renovando as utopias

Uma digressão para entender os impasses da COP 18, em Doha.

Por Iara Pietricovsky*

O mundo, e em especial os brasileiros, ainda guardam na memória o acontecimento de um dos mais importantes eventos deste século, a Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, conhecida como a Rio+20, realizada na cidade do Rio de Janeiro, em junho deste ano. Foi um processo que mobilizou organizações da sociedade civil e movimentos sociais nos âmbitos local, nacional, regional e global. Da mesma forma, movimentou governos e o setor empresarial corporativo, maior ganhador neste processo todo, lamentavelmente. A lógica financeira e comercial prevaleceu.

Paralelo à Ri0+20 oficial, no parque do Flamengo da linda cidade do Rio de Janeiro, aconteceu outro evento oriundo de processos sociais, de maior sucesso e efetividade, a Cúpula dos Povos.  Este reuniu os setores democráticos da sociedade civil organizada e conseguiu, numa tentativa profunda de reorganização do campo político envolvido, construir agendas de comum acordo. O documento final apresentou propostas alternativas e a Cúpula estabeleceu um diálogo com o processo oficial e com a sociedade mais ampla. Foi incomparavelmente mais responsável em sua missão que a Cúpula Oficial, que em contrapartida produziu um documento pífio, com poucos avanços e alguns retrocessos, além da evidente privatização do sistema multilateral internacional.

A Rio+20 aconteceu 20 anos após um dos ciclos mais ricos de reafirmação de marcos jurídicos internacionais no âmbito dos direitos humanos: a Rio 92, também realizada na cidade do Rio de Janeiro, foi o começo de um Ciclo de conferências sobre desenvolvimento e meio ambiente, direitos sociais, mulheres, população, financiamento e racismo da Organização das Nações Unidas (ONU), que a despeito do auge do neoliberalismo no mundo aprofundou acordos internacionais primordiais para a democracia e ampliou o campo dos direitos fundamentais envolvendo os aspectos, econômicos, culturais, sociais, ambientais, sexuais, além daqueles conceitos amplamente já reconhecido que são os direitos políticos e civis. Em 20 anos a compreensão e as interpretações do que são os direitos coletivos e individuais ficaram mais claros e com capacidade de aplicação real nos fóruns internacionais assim como nos planos nacionais, (Ex: as novas constituições da maior parte dos países na América do Sul expressam a incorporação destes direitos).

Também foi nesta década de 90, que paralelo ao aprofundamento dos Direitos, o mundo neoliberal e capitalista, mais propriamente em 1994/95 trouxe à agenda regional e global o debate sobre a ALCA (Área de Livre Comércio das Américas) e todo o ciclo da Rodada de Doha no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC). Na contra mão do que se defendia no marco dos Direitos Humanos e entre os movimentos da sociedade civil organizada. Os governos, cada vez mais capturados pela lógica privada do Estado mínimo e da supervalorização da iniciativa privada começaram a abrir frentes de negociação numa lógica de subordinação dos países em desenvolvimento aos chamados países desenvolvidos e centrais do capitalismo, Europa e EUA especialmente e do grande capital financeiro.

Essa lógica dominou a agenda em meados dos 90 e no caso da América do Sul, com os novos governos de esquerda, foi possível suspender o debate dobre a ALCA, porém, transformando a OMC num espaço de decisão dos rumos do mundo, numa lógica de mercantilização generalizada. A aposta é que esse ciclo se encerraria em Hong Kong, com a anuência de importantes países do sul, inclusive Brasil, que apostou e ainda aposta suas fichas no espaço multilateral da OMC. Entretanto, esta também parece que sucumbiu, como consequência de sucessivas crises e tensões políticas e econômicas. Hoje, ficou reduzida a uma instituição secundária no cenário internacional e segue, neste momento, em estado letárgico, porém ajudando a lógica de mercantilização.

O século XXI vem precedido de uma das manifestações populares mais importantes contra a lógica da comercialização do mundo que foi a Batalha de Seatlle, nos EUA, contra o livre comércio. Reação a supervalorização da OMC como organização de poder daquele momento no mundo. Ali começou uma série de manifestações contrárias à lógica da comercialização nos padrões hegemônicos e que continuou em diferentes formatos de expressão social, anti-globalista, em diversas partes do Planeta. Podemos citar a formação do Fórum Social Mundial, Conferência dos Povos, Enlaçando Alternativas, Campanha Contra a Dívida Externa, entre outros. Assim como manifestações nas ruas contra OMC, mais recentemente, contra sistemas opressivos, antidemocráticos, contra o domínio do mundo financeiro sobre o destino dos países e de seus povos, bem como demonstrações contra as decisões no âmbito das conferências internacionais relativas à mudança climática ou outros temas ambientais (Copenhague e Rio+20).

A partir 2008, com o aprofundamento das crises políticas e econômicas, pipocam eclosões no norte da África por défict democrático e por causa da crise econômica nos países do norte, tais como Espanha, Grécia, Portugal, EUA entre outros. Agora era o norte desenvolvido que entrava em profunda tensão e se mostrava frágil e incapaz de apresentar soluções. Essa era uma crise política e comercial, mas fundamentalmente uma crise do sistema financeiro. O desequilíbrio econômico que se iniciou nos EUA com a falência das instituições financeiras, antes tidas como sólidas e críveis. Uns chamam de crise do capitalismo e outros de crise civilizatória. Na verdade, parece mais uma crise que rearticula o capitalismo para introdução de uma nova onda de acumulação, agora fundamentado na exploração da natureza, inaugurando a onda verde, ou o ciclo da economia verde. Haja vista a maneira agressiva que a lógica corporativa e do capital vai penetrando nas instituições, tradicionalmente dominadas pelos Estados Nacionais e pelo caráter multilateral, como é o caso da ONU e suas instituições vinculadas.

Nessa luta do Armagedon (entre o bem e o mal, resta saber onde está um e o outro) a ONU, abre o novo milênio com uma proposta reducionista chamada as “Metas do Milênio”. Acordo esse de baixa intensidade, considerado o possível para ser atingido, até 2015, por todos os países. Já sabemos que essas metas não serão alcançadas e o mundo em crise coloca em cheque o pouco que se logrou em redução de pobreza e resolução das desigualdades.

Essas metas foram uma redução radical de todo os esforços realizados durante o chamado Ciclo Social das Nações Unidas, incluindo os acordos sobre a questão ambiental e suas convenções de clima e de biodiversidade, obtidas na Rio 92. Algumas organizações da sociedade civil acreditavam que pelo menos havia, pela primeira vez, metas definidas, mesmo que reduzindo o escopo daquilo que já tinha sido acordado e assinado pela maioria dos países membros da ONU.

Para outros, foi uma agenda de resistência e construção crítica. Entretanto, uma coisa parecia clara: os setores que buscavam alternativas ao capitalismo selvagem ou contra o próprio capitalismo estavam perdendo terreno. O que podemos dizer é que o Século XXI veio reduzindo direitos, impondo uma lógica financista e comercial em níveis nunca antes imaginados pela mente humana. E é nesse ponto que parece que nos encontramos agora.

É neste contexto que conferências e debates como a Rio+20 ou as Conferências das Partes sobre Mudança Climática, (COP 18), ou Biodiversidade estão sendo realizadas e suas decisões adiadas, na melhor das hipóteses. Na vida real, vemos retrocessos e países sem vontade política para assumir os compromissos já firmados, quem diria compromissos mais audaciosos.

Passaram-se cinco meses da Rio+20, nos encontramos com a Conferência das Partes 18,  acontecendo na capital do Catar, Doha. Quem chega nesta cidade não acredita nem um pouco que a lógica frenética do crescimento a todo custo vai mudar. Quem entra nesta cidade não pode acreditar que esta conferência terá resultados audaciosos, muito menos, alguma definição. Doha é uma cidade em frenética construção de prédios, usando a mão de obra de países como Índia, Indonésia, Bangladesh, Morrocos, Filipinas etc.  É um ponto de encontro de gente de todos os lugares do mundo sem uma personalidade própria. Muçulmanos mesclados e cortados pelo munso ocidental cristão. Esta foi minha primeira impressão.

Quais são os temas fundamentais desta conferência sobre clima? Entre outros, definição final sobre a adoção (ou não) de um segundo termo do Protocolo de Quioto. Neste Protocolo os países ricos deverão assumir a redução das emissões de efeito estufa. Esse Protocolo é importante porque é vinculante e tem consequências importantes para o futuro;  a Cooperação de Longo prazo sobre o Plano de Bali, de 2007. Resoluções ainda precisam ser tomadas sobre a redução das emissões de gazes de efeito estufa; financiamento efetivo e com capacidade de ajudar os países em desenvolvimento com adaptação, mitigação; transferência tecnológica, e; Integrar os EUA aos Acordos.

Os impasses e as resoluções desta COP estão intrinsecamente ligadas às definidas pela Rio+20 e os caminhos que serão apresentados também começam a revelar aspectos preocupantes. Passada a primeira semana de trabalhos, nada avançou, relativos a estes temas mais fundamentais. Países como Canadá, EUA, Japão, Austrália, Nova Zelândia, entre outros, não querem firmar um segundo termo do Protocolo de Quioto. Decisões sobre o financiamento de longo prazo, que substituirá o atual mecanismo ainda não saíram do papel. Esta semana estão chegando os ministros e chefes de Estado e assim esperamos que algumas decisões sejam tomadas. O que sairá daqui será tímido, mesmo que os debates se encerrem para uma nova retomada no próximo ano e temo que em níveis pouco ambiciosos.

A questão é que em Doha, sequer contamos com uma sociedade civil local consciente capaz de manifestar-se publicamente. Poucos sabem o que está acontecendo nesta cidade, lamentavelmente, e os que aqui estão carregam uma desilusão sobre os processos, que neste 2012 encerram um longo ciclo iniciado no início dos anos 90, com a Rio 92. Neste sentido, resta-nos pensar com mais profundidade não só os processos como nossas estratégias. Sem medo de sermos, em algum momento, felizes.

 

Antropóloga, membro do colegiado de gestão do Inesc que integra a Rede Brasileira Pela Integração dos Povos (Rebrip). É  uma das representantes da sociedade civil organizada brasileira na COP 18.

 

 

Para mudar: Reforma Política Já!

Chega de conversa fiada: Governo Dilma inviabiliza o controle social das políticas públicas

Gilda Cabral[1]

Por que o governo adota a transparência das ditaduras? O que faz o governo dizer uma coisa e fazer outra totalmente diferente? Não temos essas respostas, mas devemos pensar muito nessas perguntas. Recentemente, o governo sancionou a Lei de Acesso à Informação (LAI), criou sites, portais e telefones para contato direto com a população, estimulando denúncias de mau uso das verbas públicas. Ao mesmo tempo, embola e confunde as pessoas com a falta de transparência sobre os recursos e gastos governamentais.  No campo das finanças públicas, retoma a prática da ditadura militar, na qual o Congresso Nacional e a sociedade não têm voz sobre os recursos públicos e nem acesso a informações que permitam monitorar e avaliar os gastos governamentais e as políticas públicas. Discursos e dispositivos legais conflitantes nada têm com dialética, é prática autoritária mesmo. Além disso, tornam inviável o controle social do gasto público e dificultam o controle externo feito pelo Tribunal de Contas e Ministério Público. Entre os tempos de ditadura e o atual momento, a diferença básica é que agora tudo foi devidamente autorizado pelo Congresso Nacional. Mas o que, exatamente, tornou o controle dos gastos governamentais inviável?

A partir de 2013, parlamentares e sociedade ficarão totalmente dependentes do governo federal para saber as informações orçamentárias e aquelas relativas à execução financeira das ações que implementam as políticas públicas. Não há mais correspondência entre as leis que definem o Planejamento e o Orçamento da União devido ao grau de agregação adotado no Plano Plurianual (PPA) e na Lei Orçamentária Anual (LOA). Apesar das muitas normas legais sobre participação social, transparência e acesso a informações e ainda tantos discursos e intenções democráticas, o governo não está promovendo de fato a transparência. Se não forem derrubados os vetos à Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) 2013, o governo tem autorização do Congresso para informar o que, quando, como e onde quiser.

Aparentemente, os parlamentares federais abdicaram de decidir e monitorar os recursos públicos, pois aumentaram de 31 (em 2002) para 96 as hipóteses de alteração da LOA por decreto, e ainda autorizaram ampla flexibilidade ao Executivo para abertura de crédito (20%) e alteração das verbas do PAC (30%) criando situações de total independência para o governo.

Nem ao menos autorizativo é o orçamento da União, pois com tanta flexibilidade e delegação de competências para o Executivo, a permissividade é total. O atual momento é muito semelhante aos tempos dos governos militares quando ao Congresso só cabia homologar os gastos do governo. O que se observa é uma inversão de papéis: onde o Legislativo propõe e o Executivo veta, como observamos no caso recente da LDO2013 e, por outro lado, tudo que é proposto pelo governo, o Parlamento aprova.

Toda essa flexibilidade dada ao Executivo traz sobreposição de regras, detalhamentos excessivos e situações específicas que prejudicam a compreensão do conjunto dessas autorizações, além de percentuais aplicáveis para aberturas de crédito cada vez maiores. Estes problemas, somados à generalidade aplicada no detalhamento das ações orçamentárias e da dissociação do planejamento (PPA) e orçamento (LOA), geram o seguinte questionamento: até que ponto a Lei Orçamentária é pra valer ou apenas uma peça formal de aceite homologada pelo Parlamento?

Para os movimentos de mulheres e feministas, atuar no campo das finanças públicas e no monitoramento dos recursos permitiu uma significativa educação política. Foi na militância e na luta por mais recursos que nos qualificamos e incidimos na política econômica do país. Foi monitorando o gasto público que mostramos quão desigual podem ser algumas políticas governamentais que reforçam o papel tradicional e reprodutivo das mulheres.

Nossa atuação nessa área trouxe mais que recursos financeiros para as políticas da igualdade. A bancada feminina no Congresso passou a receber subsídios do Orçamento Mulher e a atuar sistematicamente no processo e discussão das peças orçamentárias; os movimentos de mulheres se apoderaram de informações importantes, passando a propor ações governamentais concretas. Foi essa atuação que contribuiu para o entendimento de que as políticas públicas são um direito da cidadania e não apenas uma ação governamental para solucionar um problema da sociedade.

O governo perde muito ao inviabilizar o Orçamento Mulher

O Brasil era o único país que tinha o acompanhamento diário, com amplo acesso às informações sobre a aplicação dos recursos públicos voltados para as políticas para as mulheres. Para nossa tristeza, será justamente no governo da primeira mulher presidenta que o país não mais poderá ostentar tal façanha. Os orçamentos sensíveis a gênero (PSG) representam um esforço de décadas da ONU MULHERES que, no Brasil, teve sua implementação pela ONG CFEMEA em parceria com a SPM da Presidência da República, os movimentos de mulheres e feministas e o Senado Federal, através do SIGA (Sistema de informações sobre orçamento público).

O Orçamento Mulher tem mais de 10 anos de existência e presta inegáveis serviços às entidades, especialistas e pessoas que acompanham e avaliam as políticas do governo federal. É o instrumento principal para monitorar o gasto e a execução orçamentária e financeira das ações governamentais e políticas para efetivar os direitos das mulheres. Atualmente, com a generalização e agrupamento das ações da LOA, será impossível identificar o montante de recursos destinados às políticas para as mulheres. Como o planejamento governamental não é elaborado a partir da perspectiva de gênero, sempre haverá dificuldades para conhecer o montante real de recursos para implementar políticas para a igualdade. Contudo, até 2012 era possível ponderar e alertar para possíveis distorções dos valores alocados, o que passa a ser inviável a partir de 2013.

Na área das políticas sobre violência contra a mulher, por exemplo, o CFEMEA conta com informações do gasto federal desde 1995 até 2012. Com as novas metodologias do governo federal, só nos restará acompanhar ações pontuais e específicas. A falta de continuidade histórica das análises é uma perda inestimável. E lamentavelmente todas essas mudanças metodológicas são passadas como “melhorias técnicas” quando na realidade são decisões políticas com conseqüências lamentáveis para o exercício da cidadania.

 


[1] Gilda Cabral é feminista, sócia fundadora do CFEMEA, aposentada do IPEA  e especialista em políticas públicas.

Inesc: História em memórias (1979-2011)

Ministro explica política externa na Câmara

Edélcio Vigna, assessor político do Inesc

 

A Audiência Pública na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CREDN), da Câmara dos Deputados, com o Ministro Antonio Patriota, de Ministério de Relações Exteriores, deixou a desejar. A pauta “Planejamento do MRE para o ano de 2012”, é um vazio de objetividade que dá margem a qualquer tipo de discurso. O Ministro abusou da generalidade e ficou boa parte do seu tempo quantificando as suas reuniões e as da Presidenta Dilma Rousseff.

Tocou como excesso de diplomacia nos problemas “chaves” que os deputados queriam ouvir, como a questão da suspensão do Paraguai e a entrada da Venezuela do MERCOSUL. Negou enfaticamente que a Presidenta Dilma interferiu na decisão de suspender o Paraguai do MERCOSUL. Enfatizou a importância da democracia, da Clausula Democrática, e da unanimidade para suspensão do Paraguai. Recorreu à Declaração da Unasul, que abriga países da Alba e países que assinaram tratados de livre comércio com os Estados Unidos, para justificar a posição do Brasil.

Reafirmou que não existe tolerância para a violência contra a democracia. Retomou o tema da integração como um impulso a democratização e o fundamento d parceria com os países vizinhos. O governo não vê a amizade Brasil-Paraguai comprometida e espera restabelecer rapidamente contatos plenos.

Avaliou a importância da entrada da Venezuela no MERCOSUL. Declarou que a proposta de cooperação continental crescente envolve a região da América do Sul e a do Norte. A construção de uma região de paz significa a pacificação definitiva dos conflitos. Citou o presidente Juan Manuel Santos, da Colômbia, que está negociando a paz com as FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia). Vê nesta atitude de Santos uma oportunidade histórica para as gerações que não viram uma Colômbia pacífica.

Tocou rapidamente na relação entre os BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China) e a necessidade de inserir na agenda de discussão a pauta ambiental. Apresentou o que denominou de “Agenda da Paz e Segurança Internacional”. Esta agenda aborda os conflitos no Oriente Médio: a questão Israel-Palestina e a guerra civil que está ocorrendo na Síria.

A posição brasileira na questão Síria é de apoiar os refugiados e buscar recuperar a integridade da Síria com a comunidade internacional. Avaliou que Kofi Annan, ex-secretário-geral da Organização das Nações Unidas e Nobel da Paz (2001), é o melhor negociador para mediar o conflito sírio.

A questão Israel-Palestina não foi foco vertical e o Ministro se bastou em dizer que o conflito está sendo monitorada pelo “quarteto” ONU-Rússia-Estados Unidos-União Europeia. Sobre a África fez apenas breves considerações.

Sobre as metas da presidência pró-tempore do Brasil no MERCOSUL, neste semestre, o Ministro Patriota adiantou que a prioridade é capacitar o os Estados Partes pra um mundo competitivo. Resaltou que a produção brasileira se destaca, além dos produtos primários, com bens elaborados e de alta tecnologia.

A intervenção dos deputados da CREDN se restringiu a entrada da Venezuela e da suspensão do Paraguai do MERCOSUL e do conflito-guerra civil na Síria. Sobre a questão sul-americana o debate ocorreu mais entre os parlamentares do que entre estes e o Ministro Patriota. Quanto à segunda questão o Ministro se limitou a apoiar o nome de Kofi Annan como negociador do conflito.

Ao terminar a sessão ficou no ar uma sensação de debate inacabado. Com questões não respondidas e muitos temas não aprofundados. Havia, por parte dos deputados e participantes, que Patriota havia apenas formalmente cumprido o dever de atender ao convite da Comissão. Não acrescentou nada além do que já foi publicado na mídia. Considerando o Congresso como um dos poderes do Estado o Ministro deveria ter ousado e debatido os rumos da política externa brasileira na atual conjuntura.

O Embaixador Patriota não fez nenhuma análise conjuntural do impacto da China no mercado internacional, em especial sobre os mercados do Cone Sul ou no Brasil. Não tocou na instabilidade da zona do Euro ou da situação econômico-eleitoral dos Estados Unidos. A opção do Ministro de apresentar aos parlamentares uma visão cartesiana das relações exteriores do país prejudicou muito a compreensão da dinâmica da comunidade e dos mercados internacionais.

O Itamatary, que tradicionalmente foi um órgão menos dependente, está se subjulgando ao poder presidencial e abrindo mão de ser um propositor da política externa para o conjunto do governo.

Bancada Ruralista volta a desafiar a presidente Dilma Rousseff

Edélcio Vigna, assessor político do Inesc

Os rios são grandes porque recebem águas de seus afluentes. A Bancada Ruralista não entende que os grandes rios precisam dos pequenos, pensam que são grandes porque são. Seguindo essa lógica primária, aprovaram uma emenda que acaba com as florestas ciliares em rios não perenes.

Os ruralistas parecem desconhecer a existência de uma rede hidroviária. Um complexo de canais de águas perenes e sazonais ou não perenes que alimenta não só os rios permanentes, mas que compõe ecossistemas aquáticos interiores como rios e canais subterrâneos, lagoas, brejos e pantanais.

Os ruralistas, mais uma vez, viraram as costas ao futuro do país para eleger com mesquinha prioridade os lucros setoriais de curto prazo. O Estado como representante institucional da Nação não pode mais se omitir. Setores produtivos, religiosos, acadêmicos, de pesquisa, artistas, organizações e movimentos populares e sócio-sindicais se manifestaram à exaustão contra o processo de elaboração do Código Florestal aprovado no Congresso Nacional, que praticamente não acatou nenhuma proposta destes setores. A Campanha “Veta, Dilma!” ganhou as ruas e chegou ao Palácio do Planalto, mas não foi suficiente para sensibilizar a Presidenta.

A presidenta da República Dilma Rousseff sancionou o Código e vetou alguns artigos Em seguida, editou uma Medida Provisória para que não houvesse descontinuidade no Código sancionado. Os vetos devem ser aprovados ou rejeitados pelo Congresso Nacional. Para isso, foi formada uma Comissão Mista (deputados e senadores) que recebeu mais de 600 emendas. O presidente é o deputado Bohn Gass (PT-RS) e o relator é o senador Luiz Henrique (PMDB-SC).

A Bancada Ruralista, liderada pela presidenta da Confederação Nacional da Agricultura, senadora Kátia Abreu (PSD/TO), se sentiu desrespeitada pela Presidenta Dilma Rousseff. E, em nome da Bancada lançou um desafio ao poder Executivo e impôs o interesse econômico e a visão de mundo conservadora e retrógrada da oligarquia rural, como se fosse a visão do Legislativo.

A provocação ruralista vai além da emenda dos rios não perenes. Aprovaram outro destaque que tratava do regime de pousio, que é um período em que se deixam as terras de semeadura para recuperarem a fertilidade. Na proposta dos ruralistas estava embutido que o pousio poderia se estender a toda propriedade, sem limite de tempo. Se aprovada na íntegra a proposta seria mais um impedimento para a reforma agrária, pois os imóveis rurais improdutivos não poderiam ser desapropriados.

O senador Luiz Henrique (PMDB-SC), relator da MP, fez uma contraproposta segundo a qual as áreas em pousio poderiam ser computadas como reserva legal do imóvel por um período máximo de cinco anos observado o limite de até 25% da propriedade. Na negociação de um texto de consenso os ruralistas conseguiram retirar o trecho que trata da área máxima (até 25%), mas manteve o prazo até cinco anos.

Dessa forma, por cinco anos a reforma agrária terá que enfrentar mais um obstáculo, além da resistência da oligarquia agrária e seus representantes nos três poderes da República. O ministro do Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas, recebeu da Presidenta Dilma uma missão que dificilmente poderá ser cumprida caso o Código Florestal continue sendo instrumentalizado pela Bancada Ruralista.

Os ruralistas insistem em se esconder por detrás do véu do poder Legislativo para impor seus interesses à Nação. O Estado, em especial o Executivo, deve romper com a letargia em que se encontra e, dentro de suas competências, atuar com energia contra o esse ou qualquer setor que tente impor sua vontade como vontade da Nação, que deve ser aferida por meio da realização de referendos.

Elites aterrorizadas: depois de Chaves vem Evo Morales

Por Edélcio Vigna, assessor político do Inesc

As elites paraguaias cometeram um erro político primário ao instituir um golpe parlamentar contra o presidente Fernando Lugo, cujo mandato terminaria em abril de 2013. Estimuladas pelos setores sociopolíticos mais conservadores do país e  pelos produtores de soja e criadores de gado – ambos acostumados a respeitar somente suas próprias leis –, abriram as portas do Mercado do Cone Sul à Venezuela.

Com impaciência, as elites acabaram por promover o que menos queriam: a presença do presidente venezuelano, Hugo Chaves, como membro pleno do Mercosul. O governo do Paraguai ameaça entrar na justiça, mas dificilmente os fóruns internacionais darão admissibilidade ao processo.

As elites do Cone Sul se sentiram ameaçadas pela presença de Chaves. Isso ficou evidente na divisão das bancadas parlamentares do Brasil e do Uruguai no Parlamento do Mercosul (Parlasul). O pior dos medos das elites é que, em seguida a entrada da Venezuela, começará uma campanha para admissão da Bolívia, que acaba de expulsar a Coca-Cola do país e anunciar a falência do McDonald’s.

O Itamaraty avalia que a Venezuela terá que adotar a normativa comercial do bloco, o que poderá demorar até quatro anos. Enquanto isso, o governo venezuelano participará de todos os foros do Mercosul e indicará os parlamentares para compor o Parlasul.

O setor industrial e comercial brasileiro avalia que o Mercosul, agora com um produto interno bruto (PIB) de US$ 3,3 trilhões, será responsável por 83,2% do PIB de toda a América do Sul. Assumindo a quinta economia mundial, o Mercosul terá a participação aumentada de 70% a 80% na economia sul-americana em um mercado de 270 milhões de pessoas (70% do continente).

O setor energético terá, igualmente, um salto de produção e o bloco poderá se consolidar como uma potência nas áreas de energia e produção de alimentos.

Independente do avanço econômico do Mercosul, há preocupação quanto à capacidade do presidente Chaves de gerar controvérsias. Sua figura e declarações polêmicas antiamericanas, que destoam da posição de outros membros do bloco, poderão gerar tensões políticas.

Problemas futuros não se resolvem, mas pode-se preveni-los para minimizar os estragos.

 

Batalha parlamentar radicaliza posição do Paraguai

Edélcio Vigna, assessor político do Inesc e cientista político

O processo de integração latino-americana está ameaçado com a postura adotada pelas autoridades paraguaias desde o golpe parlamentar contra o presidente Fernando Lugo.

O embaixador paraguaio criou uma situação vexatória ao forçar a participação na Cúpula Presidencial em Mendoza, na Argentina. Os parlamentares da bancada paraguaia que compõem o Parlamento do MERCOSUL (Parlasul) pressionaram a realização da sessão sem a presença da Bancada da Argentina. De acordo com o art. 117 do Regimento Interno, “as sessões do Parlamento (…) poderão iniciar-se com a presença de pelo menos um terço de seus membros, no qual estejam representados todos os Estados Partes (PCPM, art. 18.1).

O Senado do Paraguai aprovou uma declaração rejeitando a resolução do MERCOSUL que suspendeu a participação do Paraguai até 2013, quando em abril desse ano ocorrerão as eleições presidenciais. Na declaração, os senadores paraguaios exigiram a retirada do embaixador paraguaio na Venezuela e a expulsão dos adidos militares venezuelanos. Os parlamentares consideram que a decisão de suspender o Paraguai do MERCOSUL é violadora do processo legal. Ademais, rejeitam a aprovação da Venezuela como membro pleno do MERCOSUL.

Esta batalha parlamentar poderá resultar em sanções econômicas por parte dos demais integrantes do MERCOSUL, caso não bem administrado, prejudicará o povo paraguaio. A mídia poderá manipular esta situação e colocar  o povo paraguaio contra os outros Estados Parte e a favor do vice-presidente Franco.

Por isso, é importante que o Conselho de Defesa Sul-americano da União das Nações Sul-Americanas (UNASUL) atue segundo as normas estatutárias, em especial, de acordo com o princípio declarado no art.3, alínea “c”, que implica na “promulgação da paz e a solução pacífica de controvérsias”.

O art.1 do Protocolo Adicional ao Tratado Constitutivo da Unasul sobre Compromisso com a Democracia é aplicado em caso de “ruptura ou ameaça de ruptura da ordem democrática, de uma violação da ordem constitucional ou em qualquer situação que ponha em risco o legítimo exercício do poder e a vigência dos valores e princípios democráticos”.

O art. 4, alínea “a”, garante a legalidade da sanção de “suspensão do direito de participar nos diferentes órgãos e instâncias da UNASUL, bem como do gozo dos direitos e prerrogativas decorrentes do Tratado Constitutivo da UNASUL”. A alínea “b”, do mesmo artigo é mais incisiva ao permitir o “fechamento parcial ou total das fronteiras terrestres, incluindo a suspensão e/ou limitação do comércio, transporte aéreo e marítimo, comunicações, fornecimento de energia, serviços e abastecimento”.

Neste contexto de pressão parlamentar, em que  a manipulação pode levar a uma divisão do povo paraguaio, o Conselho de Defesa tem que se mobilizar com agilidade a fim de conter o acirramento dos ânimos. De acordo com a Reunião Extraordinária de Chefes de Estados e de Governos da Unasul, ocorrida em San Carlos de Bariloche (2009), foi reiterada a disposição de “consolidar na América do Sul uma zona de paz, (…) por meio da prevenção de conflitos, da solução pacífica das controvérsias e a abstenção de recorrer à ameaça ou ao uso da força”.

Era esperada a reação das autoridades paraguaias conservadoras e de oposição em defesa do governo do vice-presidente Federico Franco que alçaram o poder ao deporem o presidente eleito, Fernando Lugo. Entretanto, ressalte-se, há protocolos internacionais firmados que devem ser acionados diante de situações como a de deposição sumária de um presidente legalmente eleito. A integração regional não pode ser ameaçada por interesses de elites que, mais uma vez,  zombam da democracia.

A sociedade paraguaia está dividida e a mídia aproveita-se desta fragilidade cidadã. Nesta situação as autoridades responsáveis pela ordem democrática devem atuar no sentido de desarmar os espíritos e respeitar as decisões que estão nos tratados e resoluções firmadas.

AGU se une a ruralistas, empreiteiros e ao capital para se apropriar das Terras Índigenas

Por Alexandre Ciconello, assessor político do Inesc

De acordo com a absurda Portaria nº 303 publicada pela AGU (Advocacia Geral da União), o governo federal se dobrando à lógica predatória de ruralistas e empreiteiros, pretende abrir caminho para a exploração econômica das Terras Indígenas. O direito dos povos indígenas aos seus territórios nunca esteve tão ameaçado, não só pela ganância de madeireiros, grileiros, garimpeiros, ruralistas, mineradoras, empreiteiras e grandes corporações, mas também pelo próprio Estado.  

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), em nota, “repudia esta medida vergonhosa que aprofunda o desrespeito aos direitos dos povos indígenas assegurados pela Constituição Federal e instrumentos internacionais assinados pelo Brasil. Entre outras aberrações jurídicas, a Portaria relativiza, reduz e diz como deve ser o direito dos povos indígenas ao usufruto das riquezas existentes nas suas terras; ignora o direito de consulta assegurado pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT); reduz o tratamento dos povos indígenas à condição de indivíduos, grupos tribais e comunidades; afirma que são as terras indígenas que afetam as unidades de conservação, quando na verdade ocorre o contrário, e, finalmente, enterra, ditatorialmente, o direito de autonomia desses povos reconhecido pela Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas”.

O INESC repudia essa medida autoritária, sorrateira, que representa um enorme retrocesso aos direitos indígenas e socioambientais no país. Logo após a Rio+20, o governo brasileiro continua implementando uma estratégia desenvolvimentista, revestida do embuste da Economia Verde, que atende aos interesses de mercado; mercantiliza a natureza e viola os direitos dos povos que convivem com a floresta. Essa Portaria serve para abrir caminho para a implantação de uma política energética predatória e anti-democrática que pretende construir 30 hidrelétricas na Amazônia custeada com o imposto pago por milhões de brasileiros/as.

Além disso, para facilitar o lucro de empreiteiras e de mineradoras como a Vale, eleita em janeiro de 2012 como a pior empresa do mundo no que se refere a direitos humanos e ao meio ambiente. Seguimos o padrão histórico de exploração colonial predatória dos recursos naturais e dos povos originários. Para além da lei, o capital e o Estado (por omissão) se utilizam de ameaças, assassinatos e da criminalização dos defensores/as e lideranças populares que se colocam na defesa de seus modos de vida e da natureza. Conclamamos que o governo federal respeite a Constituição Federal e os acordos internacionais firmados pelo Brasil.

Saiba mais:

http://www.socioambiental.org/nsa/detalhe?id=3622

DOE UMA CHARGE

Doe uma charge

Promova a Reforma Política: doe uma charge ou desenho para divulgar o projeto de iniciativa popular

Junte-se às pessoas que se mobilizam por uma Reforma do Sistema Político. Uma reforma ampla, popular, democrática e que possibilite a participação da população nas decisões políticas e não apenas nos momentos eleitorais. Queremos uma nova forma de se pensar e fazer política. Por isso defendemos:

•    O fim dos privilégios dos parlamentares, como por exemplo, férias de 60 dias, 14º e 15º salários, do foro privilegiado e da imunidade parlamentar para que estes não sejam usados como instrumentos para a impunidade.

•    Mudança na definição de decoro parlamentar, que passa a considerar qualquer fato indecoroso, de não conhecimento público, que aconteça ao longo da vida do parlamentar e não apenas durante seu mandato.

•    A participação da sociedade no Conselho de Ética que julga o Parlamentar.

•    Uma nova regulamentação do art. 14º da Constituição Federal que trata do plebiscito, referendo e iniciativa popular no sentido de aumentar a participação popular nas decisões políticas do país.

•    Que determinados temas só podem ser decididos pelo povo, por meio de plebiscito e referendo. Exemplo: aumento dos salários dos parlamentares, megaobras.

•    A diminuição das exigências para a iniciativa popular, menos assinaturas e um rito próprio no Congresso Nacional.

•    Reformas no sistema eleitoral que possibilitem aos segmentos subrepresentados nos espaços de poder (mulheres, população negra e indígena, em situação de pobreza, do campo e da periferia urbana, da juventude e da população homoafetiva, etc) a disputa em pé de igualdade com os demais.

•    A votação em lista pré-ordenada com alternância de sexo e critérios de inclusão destes segmentos sociais subrepresentados no poder (ex.: mulheres, população negra e indígena, em situação de pobreza, do campo e da periferia urbana, da juventude e da população homoafetiva, etc) e financiamento público exclusivo com punições severas para quem desrespeitar as regras de financiamento eleitoral.

•    A democratização e transparência dos partidos.

E estamos convidando você a entrar nesta Campanha, doando uma charge ou desenho sobre um dos seguintes temas:

1)    Ampliação da representação de mulheres, negros e negras, indígenas e população homoafetiva no Poder Legislativo: a forma de organização da política partidária, atualmente, não possibilita a participação desses grupos, que estão subrepresentados no Parlamento e, por isso, suas demandas  não conseguem o devido destaque e concretização, pois não estão verdadeiramente representadas. Hoje não existe diversidade em nossos parlamentos, seja o Congresso Nacional, Assembleias Legislativas ou Câmaras Municipais.

2)    Financiamento Público exclusivo de Campanha: fim da interferência do dinheiro privado no exercício da atividade publica, com severas punições para o partido que se utilizar de outros recursos, que não aqueles oriundos da parcela que lhe cabe do financiamento público, para financiar sua campanha.

3)    Ampliação e fortalecimento dos mecanismos de Democracia Direta: precisamos de uma política com ética, transparência, participação de todos os segmentos da sociedade e para isso o fortalecimento dos mecanismos de Democracia Direta possibilita o ativismo de todos e todas, mesmo daquelas pessoas que não estão organizadas/representadas por grupos ou associações.

4)    Fim da corrupção, dos privilégios e da impunidade: o mandato não pode se tornar um “passaporte” para privilégios e garantia da impunidade como é hoje. Parlamentar deve ser um cidadão/ã com os mesmos direitos e deveres dos demais.

Desenhos e charges são lúdicos e mobilizadores. Como esta é uma causa popular, convidamos qualquer pessoa a criar uma charge e doar os direitos sobre essa arte para a nossa Campanha. A sua arte será divulgada em vários sites e eventos promovidos para a Campanha de assinaturas à Proposta de Iniciativa Popular que tem como principal objetivo mobilizar e sensibilizar a sociedade e o Congresso Nacional para a mais importante das reformas.

Para Mudar: Reforma Política Já!
Envie sua charge doeumacharge@inesc.org.br acompanhada do seguinte formulário preenchido:

 

TERMO DE AUTORIZAÇÃO

Promova a Reforma Política: doe uma charge ou desenho para divulgar o projeto de iniciativa popular

Eu,……………………………………………………………………………………………………………….., residente do município………………………………………………………………………….., UF……………………. e portador do RG nº …………………………………………………………… autorizo o Instituto de Estudos Socioeconômicos – INESC, sediado no endereço SCS, QD 01, Bloco L, Nr 17, cobertura – Ed Marcia, Brasília, a utilizar a desenho/charge/arte, de minha autoria, que envio para o e-mail doeumacharge@inesc.org.br com o objetivo de ser  utilizada na promoção da campanha “Iniciativa Popular para a Reforma do Sistema Político”, que é uma iniciativa promovida pela Plataforma dos Movimentos Sociais para a Reforma do Sistema  Político no Brasil (www.reformapolitica.org.br).

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Assinatura do autor

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Direita quis usar o Parlasul para apoiar golpe no Paraguai

Edélcio Vigna, assessor político do Inesc

As forças conservadoras, incluindo as golpistas do Paraguai, pressionaram para que a primeira reunião do Parlamento do Mercosul (Parlasul) ocorresse na esperança de aprovar algum apoio ao governo de Frederico Franco. A essas forças somaram os opositores de José Mujica, presidente do Uruguai, e alguns parlamentares da representação brasileira.

A bancada argentina, deputados uruguaios pró-Mujica e alguns brasileiros entendem que a decisão de suspender a participação do Paraguai do Mercosul atingiu as atividades do Parlasul. O deputado Dr. Rosinha (PT-PR) afirmou que “Ao suspender o Paraguai, suspende o Poder Executivo, o Judiciário e o Legislativo de qualquer uma das atividades do Mercosul. É uma suspensão política”.

O presidente do Parlasul, o paraguaio Ignacio Mendoza, não tem o mesmo entendimento e insiste que o Parlasul é um órgão soberano e que a orientação dos governos é uma ingerência entre poderes. De fato, o Protocolo Constitutivo em seu art. 1º reza que “o Parlamento, como órgão de representação de seus povos, independente e autônomo, integrará a estrutura institucional do Mercosul”. Porém o art.4º diz que ao Parlasul compete velar “pela preservação do regime democrático nos Estados Partes (Protocolo de Ushuaia)” e propor “projetos de normas do MERCOSUL para consideração pelo Conselho do Mercado Comum (CMC)”. Sendo assim, a autonomia do Parlamento está limitada pelo CMC à medida que todas as decisões normativas aprovadas no Parlasul devem ser submetidas ao crivo deste órgão superior.

O CMC (art. 3º do Protocolo de Ouro Preto), integrado pelos Ministros de Relações Exteriores, é o órgão superior do Mercosul e tem a competência da condução política e tomada das decisões. O Inesc já apontou esta contradição no texto Fratura exposta: Parlasul versus CMC*” ao questionar: “Como poderá um parlamento eleito diretamente estar submetido a um órgão formado por autoridades executivas indicadas pelos governos nacionais?”.

O Parlasul tem muito terreno a percorrer até se constituir em um espaço parlamentar independente e autônomo e, o primeiro passo, serão as eleições diretas simultâneas, em dia específico, em todos os Estados Partes. Enquanto o Parlamento não for provido da delegação e do poder soberano popular não será um órgão independente dos governos e da camisa de força institucional do Mercosul.

A acusação do presidente da delegação brasileira, senador Roberto Requião, de que os deputados argentinos e uruguaios (pró-Mujica) são subservientes às ordens do Executivo é uma declaração ideológica que oculta à realidade dos fatos políticos.  De fato, o que o espírito de corpo conservador latino-americano procurava era a possibilidade de aprovar algum apoio do Parlasul ao “governo democrático – sem quebra de regras” de Franco.

O jogo não deu certo, pois sem a Argentina a sessão não pode acontecer.

Boletim nº 28

A edição nº 28 do boletim “Orçamento e Política Ambiental” traz uma análise dos Planos de Investimento do Brasil e da América do Sul, que são estratégicos para o governo brasileiro e baseados na manutenção e potencialização de um ritmo e um padrão de crescimento centrado na exploração de recursos naturais. A publicação também trata dos riscos que as hidrelétricas, as hidrovias e as ferrovias em construção e planejadas no Brasil trazem para vários povos indígenas e comunidades quilombolas e tradicionais.

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Rio +20 ou Rio – 20?

 

Por Iara Pietricovsky*

Está praticamente definido o texto que será aprovado amanhã, 22 de junho, na Cúpula oficial da Rio+20 – o evento internacional mais importante deste ano. Um cenário lamentável de retrocesso. Os governos, pressionados por uma lógica de “cada um por si” e o mundo que se dane, nos levaram a assistir uma farsa. A abertura oficial, comandada pela presidenta brasileira, Dilma Rousseff, e pelo Secretario Geral da ONU, Ban Ki Moom,  foi realizada em um ambiente insosso, burocrático. Os governantes discursaram para uma plateia desinteressada e como se tivessem copiado um o discurso do outro. Monocórdios, sem luz, sem compromisso repetiam a mesma ladainha, sem brilho e vigor. Esse foi o sentimento predominante dos representantes da sociedade civil que assistiram a abertura.

Pensar que em 1992 o mundo vivia a expressão máximo do neoliberalismo, quando presenciou o desmantelamento do papel do Estado, a transferência progressiva do poder às grandes corporações financeiras, comerciais, industriais e agrárias. Hoje observamos um processo declarado de apropriação privada do espaço público de forma geral e irrestrita,  inversão de uma ordem que nos custa reverter 20 anos depois e com a anuência dos governos.

Vimos governos fracos, apresentando um documento inconsistente  e sem a ambição necessária para reagir à destruição do Planeta, que ainda pensam na lógica do crescimento econômico como base para o enfrentamento das crises econômica, social e ambiental.

Nosso cenário, em números, é desanimador. Constatamos que existem mais de um bilhão de pessoas ameaçadas de morrer de fome, que a distância entre ricos e pobres está aumentado, com 70% dos recursos mundiais desfrutados pelos 20% mais ricos, enquanto aqueles no quintil inferior ficam somente com 2%. Comprovamos uma ausência de vontade política dos países mais ricos em mudarem seu padrão de consumo, estilo de vida, porque em grande medida é disso que se trata, os mais ricos são os maiores responsáveis por este padrão que se mostra esgotado e em crise.  Lacunas e falta de vontade política no momento de colocar em prática os acordos internacionais, a Agenda 21, os Princípios do Rio, que saíram das Rio92, e todos os  outros do Ciclo Social. A nossa crise é de implementação e não de ausência de um marco decente para que possamos fazer a mudança de modelo de desenvolvimento. É uma tensão política e econômica, onde os algozes  defensores de um modelo predatório insistem em sua sobrevivência e hegemonia.

O documento que será aprovado amanhã retrocedeu nos direitos das mulheres, não resolveu o problema do financiamento ao desenvolvimento sustentável e muito menos os problemas diretamente relacionados à mudança climática, assim como, não solucionou o problema de transferência de tecnologia, direito a água, piso social básico, entre muitos dos temas fundamentais para que os direitos humanos sejam efetivados e os países caminhem para um rota de sustentabilidade.

Mesmo naquilo que o documento aponta como positivo a linguagem é pouco substanciosa, voluntária e fragiliza os Princípios aprovados há 20 anos na Rio92. Os governos reconhecem a crise econômica e sua profundidade, no entanto, não se mostraram corajosos nas decisões que poderiam atacar esta situação. A proposta dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável deveria estar vinculada aos Princípios de responsabilidades comuns, porém diferenciadas; país poluidor-pagador e o da precaução, o que infelizmente não ocorreu, a sua citação é frágil.

O que nós, da Cúpula dos Povos, preconizamos é que a efetivação dos direitos e a busca de processos sustentáveis só será possível, com novas formas de fazer política, com participação das populações, em especial, aquelas afetadas por este desenvolvimento predatório, assim como com outra forma de relação política entre os povos do Planeta. Os países e seus governos não podem mais trabalhar  na lógica dos interesses econômicos, mas sim da solidariedade e da mudança radical de padrões de produção e consumo. Cada país possui uma responsabilidade neste processo e deveria estar atuando de forma efetiva.

*Antropóloga, membro do colegiado de gestão do Inesc e do Comitê Facilitador da Sociedade Civil Brasileira para a Rio+20

A quem atende o documento final da Rio+20?

Por Iara Pietricovsky*

Nós da sociedade civil organizada acompanhamos, desde o ano passado, todo o processo de elaboração do documento final da Rio+20 (o Rascunho Zero). Intitulado “O Futuro que Queremos”, o texto foi apresentado oficialmente na manhã de hoje, 19, e aprovado por 193 países. O documento ignora a justiça social, os direitos humanos e a justiça ambiental, optando pelo crescimento e expansão do modelo econômico existente, tornando-o “verde” e transformando todos os serviços dos ecossistemas em commodities e produtos de mercado. A afirmação do marco dos direitos humanos é fundamental porque gera obrigação dos Estados para sua realização e deveriam ser estes, por meio de seus governos eleitos democraticamente, os realizadores e implementadores dos mesmos.

Mas, observem bem, para os mais atentos ao documento, existe todo uma afirmação dos direitos, mas construídas de uma maneira em que a linguagem da obrigação de realização, por parte dos Estados, seja aliviada. Isto é, desconstrói-se a ideia da obrigação pela ideia  da simples referência e, ao mesmo tempo, abre-se caminho para a entrada do setor privado na decisão e realização das obras e atividades que originalmente seriam obrigação do Estado. É onde a idéia da economia verde se conecta com as Metas de Desenvolvimento Sustentável, pois a maneira em que estão sendo construídas valerão apenas para os países pobres ou em desenvolvimento e não envolvem os países ricos.

Mercantilização e financeirização dos bens comuns e privatização das instâncias públicas é a lógica que vem organizando todos os debates oficiais da Rio+20. Acredito ser fundamental estarmos atentos porque rapidamente está se promovendo uma mudança lenta e efetiva contra os parâmetros de direitos humanos e de dignidade humana e ambiental que, a duras penas, se construiu nas últimas décadas.

A crise de modelo é tão forte que a luta por sobrevivência está se dando por meio da constituição de novos espaços da governança global como é o caso do G20, de redesenho institucional, acento na captação de financiamento no setor privado (o setor privado como parceiro fundamental por meio das Parcerias Público Privadas – PPPs) e com mais desregulamentação dos mercados financeiros. Os direitos humanos atrapalham, neste sentido, a realização e reprodução de um sistema em crise.

As negociações do pilar econômico estão se dando no âmbito do G20, entre outros arranjos entre países ricos e em desenvolvimento (BRICS, IBAS, BASIC), enquanto na Rio+20 se dão os debates no âmbito ambiental e o social escondido e restrito á idéia de economia verde, inclusiva e de combate a pobreza. Como se o mundo, da maneira em que se encontra hoje se resolvesse apenas com o combate à pobreza. O G20 não é legítimo para lidar com as necessidades da humanidade e da natureza, muito menos para deliberar em nome dos povos e nações que estão ausentes. O fato de se constituir, como a maioria da população, dos produtores de alimentos e detentores de poder econômico não lhe faculta o direito de decidir em nome dos outros. Democracia incluí minorias à  igualdade. Sem falar na inversão de poder econômico que existe hoje entre os países chamados desenvolvidos e em desenvolvimento quando comparadas suas economias.

É esse o futuro que queremos? A resposta tenderá ser por meio de mais lutas políticas e uma mobilização geral e irrestrita contra a submissão dos Estados e dos povos ao mundo da lógica do capital e dos interesses privados como condutores de nossas vidas. Processos como o levante do norte da África, Indignados na Espanha, estudantes no Chile, entre outros são expressão da insatisfação da grande maioria impactada. É neste sentido que a organização civil global se junta. Queremos reorganizar nosso campo de luta para disputar sentidos e realizar o contra-ponto, a contra-hegemonia necessária à afirmação daquilo que acreditamos que deva ser o norte da humanidade: processos diversos, democráticos e de afirmação dos direitos humanos de forma radical e inegociável.

*Antropóloga, membro do colegiado de gestão do Inesc e do Comitê Facilitador da Sociedade Civil Brasileira para a Rio+20

Código Florestal inconcluso

Edélcio Vigna, Assessor do Inesc

A Presidenta da Repúbica, Dilma Rousseff, utilizando-se do poder presidencial de veto cortou cinco artigos e fez 32 alterações em parágrafos e incisos (art. 3º, 4º, 5º e 26º) na proposta de Código Florestal aprovada pelo Congresso Nacional.

O Comitê Nacional Florestas* apontou em documentos que publicou diversos itens que ameaçam o meio ambiente. De acordo com sua Nota Pública, o Comitê “avalia que o veto parcial da Presidenta Dilma Rousseff foi insuficiente para o cumprimento de sua promessa, apesar de contrariar interesses dos setores mais arcaicos do latifúndio, e ainda mantém a anistia e a redução de áreas de proteção”.

Os resultados das distintas avaliações sinalizavam que a Presidenta teria dificuldades em vetar totalmente a proposta do Congresso devido às tensões existentes dentro da equipe de governo. O veto parcial era o provável – o que acabou ocorrendo –, mas as organizações integrantes do Comitê esperavam que a Presidenta Dilma acataria as sugestões das organizações e movimentos sociais e sindicais, assim como as das instituições científicas.

O Comitê infere que  a “situação é fruto da força do agronegócio, que está posicionado de forma hegemônica no Congresso Brasileiro e no próprio Governo Federal”, chama a “convergência das lutas populares e sociais contra o agronegócio para enfrentá-lo e avançar com as necessidades reais da sociedade brasileira”.

Na relação de vetos considerados importantes para a sociedade civil e outros efetuados por motivos técnicos ou por conta de impedimentos legais, apenas  três foram acatados. Ao que tudo indica nem os ruralistas, nem os ambientalistas, nem os movimentos vinculados à agricultura familiar e camponesa ficaram satisfeitos com o resultado do processo. Para o governo foi o que pode ser feito, dentro da correlação de forças políticas existente. O problema é que o “real possibilitismo” leva a preservação do status quo.

Os ruralistas anunciaram que já prepararam 50 emendas à MP e vão tentar recompor os interesses perdidos na Medida Provisória encaminhada pelo Executivo. Mesmo sem ter sido contemplado, o Comitê Floresta está mobilizando a sociedade para “pressionar o Congresso e o Governo Federal contra a anistia aos desmatadores”.

As leis são elaboradas sob um contexto específico e na mudança deste modificam-se igualmente, as legislações. Ocorre que a realidade se altera com maior rapidez do que a o marco jurídico e os embates se dão em tempo real e não em tempo legal. Assim, o processo de debate em torno do Código Florestal deve continuar  enquanto não houver um equilíbrio, um entendimento mínimo, entre as forças políticas, as forças sociais e entre ambas.

O enfrentamento já está marcado na Comissão Mista que vai apreciar a Medida Provisória, encaminhada pelo governo, para regularizar o art. 1º, da Lei no 12.651, de 25 de maio de 2012 – Código Florestal, vetado integralmente.

*O Comitê é formado pelas organizações não governamentais e movimentos sociais nacionais como Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB); Central Única dos Trabalhadores (CUT); Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (ABONG); Coalizão SOS Floresta; Comissão Justiça e Paz; Via Campesina; Comitê Inter-Tribal; entre outras)

Saiba mais sobre os Vetos

Como um dos vetos se deu sobre o art. 1º, foi necessário que o governo editasse uma Medida Provisória (MP) e a encaminhasse à Mesa da Câmara dos Deputados, que determinou a formação de uma Comissão Mista (deputados e senadores). A função desta comissão será elaborar um relatório sobre os vetos e apresentá-lo ao Plenário para aprovação ou rejeição.

De acordo com a explicação do governo, o art. 1º não indicava “com precisão os parâmetros que norteiam a interpretação e a aplicação da lei” e a MP “corrige esta falha e enumera os princípios gerais da lei”.

O senador Luiz Henrique (PMDB-SC) deverá retornar à cena na qualidade de relator da Comissão Mista. Este parlamentar foi o mesmo relator do Código Florestal no Senado Federal e acatou várias propostas da Bancada Ruralista. O presidente da comissão deverá ser o deputado Elvino Bohn Gass (PT-RS), que possui vínculos estreitos com os movimentos sociais gaúchos e nacionais. Estes são os nomes que o governo está trabalhando no Congresso.

No artigo 3º, a Presidenta vetou o inciso XI que conceituava o termo “pousio”. De acordo com o governo, o “conceito de pousio aprovado não estabelece limites temporais ou territoriais para sua prática, o que não é compatível com o avanço das técnicas disponíveis para a manutenção e a recuperação da fertilidade dos solos”. Outra razão alegada para tal veto foi que a ausência desses limites tornaria possível que “uma área permanecesse em pousio indefinidamente”.

O § 3º do art. 4o desconsiderava que as áreas de várzea, as de salgados e apicuns fossem ponderadas  como Área de Preservação Permanente (APPs), exceto quando ato do poder público dispusesse. O veto repõe esta falha e observa que “esses sistemas desempenham serviços ecossistêmicos insubstituíveis de proteção de criadouros de peixes marinhos ou estuarinos, bem como de crustáceos e outras espécies”.

 

Os §§ 7º e 8º do art. 4o tratam de faixas marginais em cursos d’água em áreas urbanas determinadas nos Planos Diretores e Leis de Uso do Solo. O governo avaliou que a definição destes cursos d’água pelas leis municipais é um “grave retrocesso à luz da legislação em vigor ao dispensar, em regra, a necessidade da observância dos critérios mínimos de proteção”.

O § 3º do art. 5º versava sobre  a implantação de parques aquícolas e polos turísticos e de lazer no entorno de reservatórios. A equipe jurídica do governo entendeu que “o texto traz para a lei disposições acerca do conteúdo do Plano Ambiental de Conservação e Uso do Entorno de Reservatório Artificial, disciplinado em nível infralegal”.

O governo vetou os §§ 1o (I, II e III) e 2o do art. 26 (I, II e II), que tratavam da supressão de vegetação nativa para uso alternativo do solo.  As razões apontaram que além da proposição abordar de forma parcial e incompleta a matéria, a mesma está disciplinada pela Lei Complementar no 140/11.

O Art. 43 (e seus três parágrafos), que foi vetado integralmente,  tratava  de recuperação e manutenção de vegetação nativa em Áreas de Preservação Permanente existente “na bacia hidrográfica em que ocorrer a exploração”. De acordo com o governo, há um duplo entendimento: as concessionárias devem recuperar, manter e preservar as áreas nas quais atuam ou toda a  extensão da bacia hidrográfica.

Outro dispositivo vetado foi o Art. 61(seus §§ e incisos) que autorizava a continuidade das atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural em áreas rurais consolidadas até 22 de julho de 2008. O governo justifica o veto afirmando que o artigo “parece conceder uma ampla anistia aos que descumpriram a legislação que regula as áreas de preservação permanente até 22 de julho de 2008, de forma desproporcional e inadequada. Com isso, elimina a possibilidade de recomposição de uma porção relevante da vegetação do País”.

O artigo 76, que outorgava ao Poder executivo prazo para estabelecer as especificidades da conservação, da proteção, da regeneração e da utilização dos biomas brasileiros foi vetado por ferir o princípio da separação dos Poderes ao “firmar prazo para que o Chefe do Poder Executivo encaminhe ao Congresso Nacional proposição legislativa”.

O art. 77 foi vetado integralmente, pois se referia à ‘Diretrizes de Ocupação do Imóvel”, sem que haja definido o conteúdo desse instrumento, trazendo insegurança jurídica.

Violência Sexual e injustiça consentida

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