A escola é nossa: livre, diversa e colorida!

Diante do projeto de lei conhecido como “Escola sem partido”, o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) promoveu o encontro “A escola é nossa: livre, diversa e colorida”, construído com adolescentes de diferentes regiões do Distrito Federal. A atividade, que aconteceu em dezembro de 2017, reuniu cerca de 70 crianças e adolescentes da Estrutural, Itapoã, Paranoá e Santa Maria (cidades do DF).

Com o objetivo de analisar as principais ideias que pautam a “Lei da Mordaça” (como o projeto ‘Escola sem Partido’ também é conhecido) e discutir sobre que escola desejam, as e os adolescentes trabalharam temas como sexualidade, gênero, religiosidade, raça/cor e liberdade de expressão, a partir de uma metodologia que combina arte, leituras e debate. Em linhas gerais, o projeto Escola sem Partido, arquivado logo após o encontro, no dia 14 de dezembro de 2017, pedia restrições ao que é tratado nas salas de aula, defendendo uma suposta “neutralização escolar”.

>>> Leia Também: Livro desmistifica suposta neutralidade do movimento Escola sem Partido

Para Márcia Acioli, assessora política do Inesc,não é possível falar de educação de qualidade sem escutar o que os e as estudantes entendem e desejam como a experiência mais presente em suas vidas: a escola”, defendeu. Segundo a educadora, o avanço da ideia de uma escola sem debate, ameaça uma concepção mais abrangente de educação de qualidade, democrática e transformadora.

A atividade fez parte do projeto Onda: Adolescentes em Movimento pelos Direitos, que tem como prática organizar um debate anual e coletivo sobre educação de qualidade como direito, reunindo crianças e adolescentes de todas as escolas que participam do projeto, inclusive uma escola da socioeducação.

Os debates foram registrados em uma série de vídeos curtos com a participação das e dos adolescentes. Confira!

Gênero e Sexualidade

Diversidade Racial

Diversidade Religiosa

É preciso lembrar: mulheres são maioria no lixão de Brasília

“…Não digam que fui rebotalho,
que vivi à margem da vida.
Digam que eu procurava trabalho,
mas fui sempre preterida.”

Carolina de Jesus

Por Dyarley Viana, assessora técnica do projeto OCA, moradora da Cidade Estrutural

Talvez você não saiba, mas as mulheres são maioria no exercício da catação no Distrito Federal. Segundo o Cadastro Único para Programas Sociais, existem no lixão de Brasília 2.827 catadores, sendo as mulheres 60% desse grupo. E são justo elas violadas em demasia, desassistidas de políticas públicas que atendam suas particularidades.

Em números exatos, são 1.702 mulheres que, desde 20 de janeiro deste ano, lidam com o fato do fechamento do Lixão da Estrutural – o maior da América Latina – como sinônimo de insegurança alimentar para elas e seus filhos. São mulheres negras, periféricas e com baixa escolaridade que estiveram em condição de trabalho infantil. São mulheres esquecidas, que passam despercebidas nas discussões de gênero e raça. Seriam seus trajes os responsáveis por tamanha invisibilidade? Qual crença sobre a identidade das mulheres é responsável por usurpar o lugar de mulher dessas trabalhadoras?

Historicamente, são notórias as resistências e as conquistas do Movimento de Mulheres, contudo, uma linha separatista, classista e racista segue “organizando” as conquistas das mulheres, pois as catadoras pouco se beneficiam dessas lutas. Vejamos: às vésperas do Dia internacional da Mulher, Brasília é mencionada com louvor na publicação de uma pesquisa, que tem como destaque a frase: “Brasília é o único lugar no país onde as mulheres recebem mais que os homens“.  É uma pena que essa notícia não contemple todas as mulheres da cidade, pois as catadoras receberam a vergonhosa quantia de 73 reais por quinzena trabalhada nesses dois primeiros meses do ano.

Percebe-se uma Brasília distinta, que se enaltece e afirma suas ações inclusivas e igualitárias, mas que em suas práticas segue a lógica de privilégios a um grupo que melhor acessa as políticas públicas.  Ressalto que esses privilégios são determinados pela cor da pele, o CEP, e a classe social.

Enquanto se propaga que Brasília deu um salto civilizatório com o fechamento do Lixão – e sim, deu! Esse salto se apoiou, pisou e pesou nos ombros delas: mulheres catadoras, mulheres negras, a base da pirâmide social, mergulhadas em exclusão e marginalização. Precisamos dar um salto muito maior, investindo em políticas públicas para todas as mulheres, sem distinção de cor, escolaridade, CEP, credo ou classe social.

A sociedade brasiliense revela uma urgência em reformular as narrativas sobre desigualdades sociais, pois no Distrito Federal, elas têm cor, a cor negra; têm Gênero, o feminino! E se ela caminha, come e trabalha, ela caminha na catação, se alimenta na mesa das muitas Marias catadoras da cidade Estrutural e trabalha no descarte da sociedade consumista. O 8 de março para elas, segue sendo dia de catar. Recicle seu lixo!

>>> Veja fotos da Exposição Eu Catador, com fotografias de catadores de material reciclável que atuavam no lixão da Estrutural (DF). As fotos foram feitas pelos próprios catadores, com curadoria do fotógrafo brasiliense Kazuo Okubo. A exposição teve patrocínio do Inesc e Fundação Banco do Brasil.

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Mobilidade assediada, retrato de uma sociedade machista

Por Cleo Manhas, assessora política do Inesc e integrante do Movimento Nossa Brasília

Publicado originalmente no Outras Palavras

Estamos em mais um 8 de março e precisamos  novamente refletir sobre o mundo machista no qual convivemos, circulamos, trabalhamos. Sempre um desafio, pois apesar de estarmos atravessando uma era de intensa velocidade do espaço/tempo devido ao avanço tecnológico, o tempo histórico nos lembra que faz menos de um século que as mulheres começaram a votar no Brasil.

De lá pra cá, as relações sociais alteraram-se significativamente. Antes, a maioria da população vivia no meio rural, agora, cerca de 85% residem em cidades, onde as interações são mais intensas, visto que nos relacionamos frequentemente com mais pessoas em todos os aspectos de nossas vidas.

Ao longo desses anos, o fenômeno da metropolização extrapolou o limite das cidades, gerando a necessidade de planejamento na área de mobilidade urbana – o que raramente ocorre ou, quando ocorre, é realizado por homens brancos, que ainda constituem a maioria dos gestores eleitos.

Hoje, as mulheres são maioria entre eleitores: 54% contra 47% de homens. Contudo, no Congresso Nacional são apenas 51 deputadas em um total de 513; no Senado, 12 senadoras em um universo de 81. Por aí dá para se ter uma ideia de como as relações de gênero são desiguais desde a representação. Então, o que esperar das políticas públicas aprovadas por um parlamento com esta conformação?

A falta de planejamento e a consequente concentração de postos de trabalho e equipamentos públicos deixou a vida das pessoas ainda mais difícil ao longo dos anos, especialmente daquelas que mais utilizam transporte público e se deslocam mais vezes – o caso da população que recebe até cinco salários mínimos, onde se situam a maior parte das mulheres negras.

Ora, quem mais se desloca pela cidade são as mulheres. Na sociedade machista, recai sobre elas a responsabilidade de levar os filhos para creches e escolas, fazer compras para a casa, além de se deslocarem para o trabalho e locais de estudo. Na maioria das vezes, circulam a pé por seus bairros, sofrendo com a insegurança e a falta de infraestrutura, visto que a situação das calçadas, principalmente nos bairros periféricos, é deplorável, dificultando a mobilidade a pé ou de bicicleta, especialmente, de pessoas idosas e com deficiência.

Registremos ainda que aquelas que estão em maioria no transporte público, caminhando dos pontos até suas casas, utilizando as (não) calçadas, são as mulheres negras, que ao contrário dos “planejadores”, estão no lado oposto da cadeia de privilégios, sendo muitas vezes assediadas nos ônibus ou nas ruas.

Em um estudo de caso realizado pelo ITDP no Recife, vários depoimentos demonstram que a maior parte das mulheres têm medo tanto de ficar esperando o transporte nas paradas quanto de caminhar da parada até suas casas. Vejam um trecho desse estudo: “Dentre todas as questões manifestadas por essas mulheres, destaca-se a percepção sobre os pontos de ônibus, considerados, na experiência delas, como o local da cidade onde sentem mais medo e estão mais vulneráveis à violência urbana e de gênero. A violência de gênero, sobretudo o assédio, faz parte da experiência cotidiana das mulheres nas cidades e no transporte público”.

Ainda de acordo com o estudo do ITDP, a partir de dados produzidos pela Actionaid , 86% das mulheres do Recife foram assediadas no espaço público e 40% no transporte público. Além disso, 80% já foram assediadas por agentes de segurança pública, que deveriam garantir que elas não fossem assediadas.

Se não há planejamento metropolitano, o que dizer de planejamento considerando diferentes públicos? Para piorar a situação, o planejamento não é participativo e muito pouco é feito pensando em longo prazo, até porque, o objetivo é sempre o próximo processo eleitoral. E agora vamos chover no molhado ao dizer o que sempre constatamos nestes períodos: no entendimento dos gestores de ocasião, a prioridade vai para ações que geram mais votos, como as grandes obras, que trazem visibilidade para quem as executa e ainda são muito “rentáveis”.

Além de os planejadores serem os gestores de ocasião, no caso da mobilidade, são em sua maioria homens brancos, ou seja, aqueles que ocupam o topo da cadeia de privilégios, que circulam menos e sofrem menos com a falta de segurança e iluminação das cidades. Ou sequer vivenciam os espaços públicos, pois saem de suas casas e entram em carros com ar-condicionado e películas nos vidros, vão até as garagens dos prédios de seus trabalhos, pegam elevadores até suas salas e, no final do dia, voltam para o carro com ar condicionado para se deslocarem até restaurantes fechados, também com ar-condicionado, etc. Não entendem sequer para que serve um poste de luz iluminando as calçadas e, por isso, priorizam a iluminação das vias por onde circulam os carros.

Escrevendo esse artigo reflito sobre o cansaço da repetição. Todos os anos precisamos falar as mesmas coisas e os dados refletem as mesmas desigualdades. Com alguma melhora do tempo em que as mulheres não votavam para cá, é verdade, mas em termos civilizatórios, ainda estamos na barbárie.

Sendo assim, não escrevemos somente para informar a quem é de direito, ou a quem pode mudar os números, porque estas já sabem. Escrevemos também para gritar e incomodar: as mulheres têm direito a se sentirem confortáveis e seguras no lugar em que vivem! Especialmente nas cidades onde também trabalham, estudam, se divertem, vão e vêm utilizando ruas, calçadas, transporte, cruzando com pessoas, vivenciando o espaço público da forma lhes dê mais prazer.

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8 de Março e a intervenção militar: a alegoria colonial do Brasil futurístico

Por Carmela Zigoni, assessora política do Inesc, para o Le Monde Diplomatique Brasil

“Agora eu estou acordada para o mundo. Eu estava dormindo antes. É assim que deixamos isso acontecer. Quando abateram o Congresso, nós não acordamos. Quando eles culparam terroristas e suspenderam a Constituição, nós também não acordamos. Eles disseram que seria temporário. Nada muda espontaneamente. Em uma banheira de aquecimento gradual, você é fervido até morrer antes de perceber”.[1]

A reflexão é da personagem Ofred, da série The Handmade’s Tale (“O conto da aia”, ou da criada, em português), em que, diferentemente da maioria das narrativas imagéticas sobre o poder, as mulheres oprimidas são brancas, de olhos claros, norte-americanas, de classe média. Na história, essas mulheres são escravizadas por famílias abastadas – um projeto justificado publicamente pela necessidade de salvar o planeta e, nos bastidores do poder, pela necessidade de gestão das populações, dos úteros, da força de trabalho e dos conhecimentos.

A série, baseada no livro de mesmo nome escrito por Margaret Atwood em 1985, é classificada como “futuro distópico”, conceito em moda na atualidade que abriga muitos outros sucessos, como Black Mirror e Colony, ao que o El Pais caracterizou como “A nova era dourada das distopias”. Mas se a distopia é uma ficção anti-utópica, um futuro totalitário e violento imaginado, é só olhar um pouco mais além dos corpos brancos das atrizes hollywoodianas para identificar um padrão de sociedade que nada tem de fictício ou futurístico: para as mulheres negras, africanas na diáspora – e para outras mulheres não brancas de diversas nações e etnias –, esse enredo[2] é uma evidência histórica, uma experiência real e tragicamente presente desde o período colonial até a atualidade.

Viajemos, então, dos Estados Unidos imaginados por Atwood em direção ao Brasil, ano 2018. No dia 16 de fevereiro, logo após o carnaval, o governo federal anunciava uma intervenção federal no Rio de Janeiro, com a justificativa de “garantir a ordem pública”. Em 20 de fevereiro, a Câmara dos Deputados vota a favor do Decreto e, horas depois, o Senado aprova a medida. É a primeira vez que um governo civil lança mão de uma medida tão drástica, ainda que a intervenção federal nos estados esteja prevista na Constituição desde 1988. Na prática, o general do Exército Walter Souza Braga Netto passou a ser o responsável pelas ações das polícias Civil e Militar, dos bombeiros e da administração penitenciária.

Desde então, as notícias sobre as ações no Rio de Janeiro são cada vez mais “distópicas”: cadastramento com fotografias de moradores de favelas, revista ostensiva de crianças, sem falar em declarações públicas de militares questionando institucionalidades que apuram abusos de autoridades. Uma das operações foi batizada de “Separar Joio do Trigo”, ou seja, o apartheid está posto, mais uma vez, como política de Estado. Persiste o tratamento diferenciado entre territórios negros pobres e os territórios brancos de classe média e alta, destino, aliás, do lucro gerado com o crime organizado em forma de riqueza, paraísos fiscais, lavagem de dinheiro etc.

Nesta cena montada pelo Governo Federal como cortina de fumaça de nossos verdadeiros problemas decorrentes da sociedade desigual em que vivemos, as mais atingidas são as mulheres, em sua maioria negras. São elas que têm sistematicamente enterrado seus homens, companheiros, irmãos e filhos: se a média anual de assassinatos de jovens negros é de 20 mil desde a Constituição de 1988, em nosso mais recente período democrático, são cerca 600 mil homens negros tombados, dados que corroboram com as noções de extermínio e genocídio desta população; são elas que se organizam e lutam por justiça e por direitos, a exemplo das Mães de Maio e dos movimentos de mulheres negras contra a violência e pelo bem viver em âmbito nacional. Estamos falando, por óbvio, das mulheres que não são encarceradas neste processo – a taxa de mulheres presas aumentou mais de 500% em dez anos.

É preciso dizer que são estas mesmas mulheres que pagam proporcionalmente mais impostos hoje no Brasil e que, no período de maior distribuição de renda e criação de políticas sociais da nossa história, continuaram a ser as maiores vítimas de violência letal: de 2003 a 2013, caiu 9% o feminicídio de mulheres brancas, ao passo que aumentou em 54% as mortes de mulheres negras. São estas mesmas mulheres que, a despeito da reforma trabalhista aprovada em 2017, só tiveram os seus direitos de trabalhadores domésticas reconhecidos em 2012, 124 anos após a abolição oficial da escravidão no Brasil.

Neste mesmo cenário do absurdo, convivemos ainda no início de 2018 com a notícia da mãe presa com seu bebê recém-nascido em uma cela de delegacia. No mesmo dia 20 de fevereiro, quando se aprovou a intervenção federal, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que “mulheres grávidas e mães de crianças de até 12 anos que estejam em prisão provisória (ou seja, que não foram condenadas) terão o direito de deixar a cadeia e ficar em prisão domiciliar até seu caso ser julgado”. Essa decisão impacta diretamente milhares de mulheres negras: segundo o Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos (CADHu), não há dados oficiais a respeito, mas estima-se que um terço da população carcerária feminina (hoje composta de mais de 42 mil mulheres) se enquadre na categoria de gestantes ou mães de crianças pequenas. A maioria delas são pretas ou pardas.

Ainda que a decisão do STF seja altamente positiva, ao analisarmos os dados do genocídio da juventude negra, pode-se pensar no que estas mães encontrarão ao retornarem às suas comunidades. Seria um tipo de “ventre livre” pós-moderno? Se considerarmos o que afirmou o próprio ministro da Justiça Torquato Jardim, sobre a intervenção federal, essas crianças (negras) não estarão a salvo em nenhum lugar: “Tem 1,1 milhão de cariocas morando em zonas de favelas, de perigo. Desse 1,1 milhão, como saber quem é do seu time e quem é contra? Não sabe. Você vê uma criança bonitinha, de 12 anos de idade, entrando em uma escola pública, não sabe o que ela vai fazer depois da escola”.

Seria, então, uma distopia para nossas hegemonias brancas, masculinas, proprietárias, pensar em um futuro com verdadeira liberdade – física, moral, psicológica – para as mulheres negras? Não deveria ser esta, portanto, a utopia política de quem defende uma sociedade justa e democrática?

Vivemos em um mundo onde o controle dos corpos femininos e negros é estruturante para a manutenção dos poderes econômico e político constituídos. Não é por acaso que as primeiras medidas após o golpe parlamentar no Brasil foram o congelamento do orçamento para direitos humanos, direitos das mulheres, igualdade racial e juventude. Os donos do poder compreendem perfeitamente que é minando as comunidades mais vulneráveis que se reprime a luta por melhores condições de vida. Uma fórmula colonial atualizada e trespassada por novas tecnologias de vigilância e controle.

Esse processo não é só brasileiro. Em toda a América Latina as mulheres indígenas enfrentam problemas semelhantes, assim como os jovens negros nos Estados Unidos. As formas de manutenção da subalternidade dos negros após o fim da escravidão oficial, tanto lá como cá, são perenes e sofisticadas: em sua versão contemporânea, o encarceramento, mais do que uma medida de repressão à violência, é uma forma de alijamento dos negros (e outros grupos étnicos e raciais em oposição ao branco fabricado em cada parte do mundo), e também um mercado muito lucrativo, pois manter tais estruturas implica em investimentos públicos que são direcionados para pagamento de empresas terceirizadas de alimentação, vestuário e segurança.

Angela Davis, em Freedom is a Constant Struggle: Ferguson, Palestine and The Foundations of a Movement (Haymarket Books, 2016) [A liberdade é uma luta constante: Ferguson, Palestina e as fundações de um movimento], chama nossa atenção: a vigilância e militarização, incluindo escolas que se parecem prisões nas comunidades negras periféricas dos Estados Unidos, definem cada vez mais nossas sociedades, “onde o que é chamado de ‘segurança’, sob a égide do Estado neoliberal, reforça não somente a privatização da segurança mas a privatização do aprisionamento, do bem-estar social, assim como a privatização da saúde e da educação” (tradução livre).

Como sugerido pela filósofa Donna Haraway em 1985, no livro Antropologia do ciborgue: vertigens do pós humano (mesmo ano da publicação de Handmade’s Tale), o mundo estaria se abrindo para uma nova biopolítica, na qual comunicação, tecnologia/ciência e política estariam sinergicamente atuantes para a configuração de sistemas de opressão e controle. A autora, de maneira otimista, apontava para a necessidade de os movimentos de mulheres capturarem essa configuração para a libertação necessária das identidades coloniais.

Ainda que os movimentos sociais de mulheres, LGBTI, de mulheres negras, do campo etc., tenham trabalhado incessantemente para isso, a capacidade de influência desses movimentos é muito menor do que aquela dos grupos dominantes. Segundo relatório da Oxfam (2016), estamos em um momento de forte concentração de renda e reescravização da força de trabalho em âmbito planetário. O gênero e a raça seguem sendo elementos cruciais para a reprodução do capital, dos privilégios e das desigualdades.

É necessária e urgente uma transição nos discursos políticos de defesa de direitos entre a noção de “pautas políticas da identidade” para um outro enunciado, a saber, “gênero e raça são estruturantes das relações econômicas e sociais”. Os omissos de hoje podem estar a salvo, como aponta nossa personagem do mundo distópico, pois a estrutura de privilégios implica em zonas de conforto para alguns grupos da sociedade, inclusive a classe média de esquerda.

Mas o capitalismo autoritário, no qual militarização e algoritmos atuam juntos para efetuar a gestão das populações, está aí para provar que saímos de um curto período histórico de emergência de novas classes médias para um possível futuro com um número muito maior de pobres do que registramos hoje. Se não pararmos para priorizar as pautas políticas de mulheres e, principalmente, levar a interseccionalidade a sério e olhar para as mulheres negras e pobres, não daremos conta de organizar lutas legítimas para enfrentar os horrores do autoritarismo. O Rio de Janeiro é, afinal, um laboratório para o Brasil, nas palavras dos próprios militares.

Os movimentos de mulheres se organizaram para atos em todo o país neste 8 de Março. Que possamos olhar para os absurdos do presente e agir: quando falamos em direitos das mulheres estamos falando do direito de toda uma sociedade à democracia e à liberdade.

[1] Trecho original: “Now I’m wake to the world. I was asleep before. That is how we let it happen. When they slaughtered Congress, we didn’t wake up. When they blamed terrorists and suspended the Constitution, we didn’t wake up either. They said it would be temporary. Nothing changes spontaneously. In a gradually heating bathtub, you’d be boiled to death before you knew it.” (Handmade’s Tale, Temporada 1, Episódio 3).

[2] Ainda que a própria série ofereça elementos para pensarmos as contradições no que se refere à questão racial, como o fato de a protagonista ter um marido negro, é na relação entre as próprias pessoas brancas – a escrava e o casal que escraviza –, que se baseia a narrativa da opressão. Neste sentido, a experiência de Ofred nos parece um tanto quanto distante (a não ser se comparada, por exemplo, ao genocídio da caça às bruxas na Idade Média). Não se trata, neste artigo, de hierarquizar lutas, mas de reconhecer distintos processos históricos que se unem e se distanciam de acordo com perspectivas muito diferentes: sejamos generosas e coloquemos nosso foco na relação entre classe, gênero e raça.

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Ações

O que é ser menina?

Em dezembro de 2017, 23 meninas de várias periferias do Distrito Federal reuniram-se em Planaltina de Goiás (GO) para criar e fortalecer uma rede de cuidado e autocuidado entre elas. Em comum, as jovens tinham histórias permeadas por violência de gênero e desigualdade social – motivo pelo qual algumas delas ingressaram na criminalidade – e também a necessidade e o desejo de novas construções de vida.

O Encontro foi promovido pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), em parceria com o Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), no âmbito do projeto Onda pela Paz.  A atividade teve como compromisso fortalecer laços entre as adolescentes e iniciar a construção de trajetórias individuais e coletivas.

De acordo com Márcia Acioli, assessora do Inesc responsável pelo projeto, as jovens participantes que já cumpriram medidas socioeducativas, diante da ausência do Estado, temem recair nas práticas delituosas como a única estratégia de sobrevivência possível. “Por isso, nosso objetivo é incentivar a elaboração de novas formas de estar no mundo, que rompam com o ciclo de violência e criminalidade e estimulem a construção de caminhos para uma vida adulta autônoma, livre de violência e que contemple os desejos e perspectivas de futuro das meninas e jovens”, afirmou.

No encontro, as meninas tiveram acesso a atividades artísticas, culturais e terapêuticas, além de terem participado de oficinas para pensar na própria história em conexão com as histórias de outras meninas.

“O que é ser menina pra você?” Fizemos essa pergunta para as jovens participantes do encontro e nos emocionamos com as respostas. Assista ao vídeo e inspire-se!

 

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Ações do documento

Sociedade civil repudia o cancelamento da visita do Especialista Independente da ONU ao Brasil

Um dos objetivos da visita era avaliar os primeiros impactos da Emenda Constitucional 95 (‘teto dos gastos’), que congela investimentos públicos por 20 anos e completou um ano de vigência.

Recente estudo produzido pelo Inesc, Oxfam Brasil e CESR – Center for economic and social rights, intitulado “Direitos Humanos em tempos de austeridade”, alerta para indícios de como a Emenda Constitucional 95 (´teto dos gastos´) já apresenta impactos negativos em políticas de combate à fome, de atendimento a mulheres vítimas de violência e no programa Farmácia Popular, por exemplo.

Leia a íntegra da nota:

NOTA PÚBLICA: Sociedade civil brasileira repudia o cancelamento da visita ao Brasil do Especialista Independente da ONU para dívida externa, finanças e direitos humanos pelo governo brasileiro

A sociedade civil brasileira abaixo assinada expressa sua profunda consternação e insatisfação com a decisão do governo brasileiro de cancelar, no último minuto, a visita oficial ao Brasil do Especialista Independente da ONU sobre dívida externa, finanças e direitos humanos, Sr. Juan Pablo Bohoslavsky, agendada há quase um ano e planejada para ocorrer nos próximos dias. O motivo alegado de troca de ministro dos Direitos Humanos para o cancelamento é pouco verossímil. Uma coalizão de 60 organizações e movimentos sociais tem trabalhado há meses para mobilizar as partes interessadas locais e preparar informações em primeira mão para contribuir com essa missão.

As medidas de austeridade têm afetado severamente o usufruto dos direitos humanos no Brasil. Promulgada no final de 2016, a Emenda Constitucional nº. 95 congelou por 20 anos as despesas com políticas públicas, sendo chamada de “pacote de austeridade mais severo do mundo” pelo Relator Especial da ONU sobre pobreza extrema e direitos humanos. Esta alteração aprofunda a concentração de renda no país e exacerba as restrições ao financiamento dos direitos sociais.  Verificou-se[1], entre 2015 e 2017:

a) O corte de 70% do financiamento de programas de aquisição de alimentos e de segurança alimentar e nutricional, que foram essenciais para saída do Brasil do Mapa da Fome, resultou em redução de 83% de agricultores familiares beneficiários, em especial aqueles em regiões mais pobres do norte do país. Além de deixar milhares de pessoas em situação de insegurança alimentar.

b) O corte de 55% do financiamento de políticas para as mulheres, resultando em redução de 15% da rede de serviços especializados para vítimas de violência de gênero.

c) Encolhimento da dotação orçamentária federal de 17% para a saúde e 19% para a educação.

d) A taxa de desemprego permanece elevada, em 12,2% em janeiro de 2018, atingindo 12,7 milhões de pessoas; sendo que em 2014, antes da adoção de medidas de austeridade, estava em seu nível mais baixo, 6,4%.

Neste contexto, é primordial o material que o Sr. Juan Pablo Bohoslavsky está desenvolvendo sobre “princípios orientadores para avaliar os impactos nos direitos humanos das políticas de reforma econômica”. As visitas aos países que implementam essas políticas são uma ferramenta-chave disponível ao Especialista para avaliar esses impactos sobre a vida dos povos. Essa era a razão fundamental para a visita ao Brasil nesse momento: conhecer o cenário brasileiro, emitir recomendações e fortalecer a elaboração dos princípios.

Em resposta aos problemas sociais causados pela política de austeridade, o governo brasileiro tem orientado sua política para o aumento do Estado penal, aumento do encarceramento em massa, criminalização das populações pobres e negras e dos movimentos sociais, o que se agrava neste momento com a intervenção federal militar no Estado do Rio de Janeiro.

As ações do governo também estão alinhadas a interesses privatistas e eleitorais, que nesta conjuntura, pela inexistência de diálogo, comprometem a democracia. Diante disto, tememos que o cancelamento desta visita possa ser apenas outro exemplo das medidas autoritárias impostas pelo governo, que não consideram os efeitos colaterais nefastos para os direitos humanos, em especial neste cenário de violações.

Demandamos ao governo brasileiro, em respeito aos mecanismos de proteção internacional, que reconsidere sua decisão de adiar a visita e garanta a vinda do especialista independente da ONU o mais rápido possível.

Finalmente, chamamos a atenção para uma série de Ações Diretas de Inconstitucionalidade tramitando atualmente perante o Supremo Tribunal Federal questionando a constitucionalidade da EC 95[2]. Estamos confiantes de que serão julgados considerando o que dita o Direito Internacional dos Direitos Humanos, incluindo os princípios de proibição do retrocesso social e de não discriminação.

 

Brasília, 02 de março de 2018.

 

Coalizão anti austeridade e pela revogação da EC95
Plataforma Dhesca
Instituto de Estudos Socioeconômicos – INESC
Conectas Direitos Humanos
Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social
Ação Educativa, Assessoria, Pesquisa e Informação
Geledés – Instituto da Mulher Negra
Terra de Direitos
Justiça Global
Central de Cooperativas e Empreendimentos Solidários do Brasil – UNISOL Brasil
Oxfam Brasil
Campanha Nacional pelo Direito à Educação
Associação Brasileira de Saúde Mental – ABRASME
Associação Brasileira de Economia da Saúde – ABRES
Brigadas Populares
Comissão Pastoral da Terra
Rede de Cooperação Amazônica – RCA
Instituto de Pesquisa e Formação Indígena – Iepé
Plataforma Política Social
Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil – CONIC
Centro Brasileiro de Estudos em Saúde – CEBES
Conselho Indigenista Missionário –  CIMI
CFEMEA
Movimento nacional de meninas e meninos de rua
Movimento dos atingidos e atingidas por barragens – MAB
Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil
Auditoria Cidadã da Dívida
Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas – IBASE
AMB – Articulação de Mulheres Brasileiras
AMNB – Articulação de Organizações de Mulheres Negras Brasileiras
ANCED – Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente
APOGLBT – Associação da Parada do Orgulho GLBT de São Paulo
CDVHS – Centro de Defesa da Vida Herbert de Souza
CEAP – Centro de Educação e Assessoramento Popular
Centro Dom Helder Câmara de Estudos e Ação Social – CENDHEC
Comissão de Justiça e Paz de São Paulo – CJP/SP
Comissão de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia – CFP
Comunidade Bahá’i
CRIOLA – Organização de Mulheres Negras
Dom da Terra AFROLGBT
Fala Preta! – Organização de Mulheres Negras
FASE Nacional  – Federação dos Órgãos de Assistência Social e Educacional
FIAN Brasil – Rede de Informação e Ação pelo Direito Humano a se Alimentar
GAJOP – Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares
IDDH – Instituto de Desenvolvimento e Direitos Humanos
Instituto Pólis – Instituto de Estudos, Formação e Assessoria em Políticas Sociais
MEB – Movimento de Educação de Base
MMC – Movimento das Mulheres Camponesas
MNDH – Movimento Nacional de Direitos Humanos
MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
Rede Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Reprodutivos
Rede Social de Justiça e Direitos Humanos
SDDH – Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos
SMDH – Sociedade Maranhense de Direitos Humanos
Associação Brasil Saúde e Ação – BRASA
Centro de Defesa da Criança e do Adolescente- CEDECA Ceará

 



[1] Inesc, CESR e Oxfam Brasil. Direitos Humanos em tempos de austeridade. Brasília, 2017. Disponível em: http://bit.ly/2F2I3OI

[2] As ADIs são: nº. 5715 (proposta pelo Partido dos Trabalhadores – PT), nº. 5734 (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação – CNTE), nº. 5633 (proposta pela Associação dos Magistrados Brasileiros – AMB, Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho – Anamatra e pela Associação dos Juízes Federais do Brasil – Ajufe), nº. 5643 (proposta pela Federação Nacional dos Servidores e Empregados Públicos Estaduais e do Distrito Federal – Fenasepe); nº. 5658 (proposta pelo Partido Democrático Trabalhista – PDT), nº. 5680 (proposta pelo Partido Socialismo e Solidariedade – PSOL)

“Participar do projeto Onda foi como aprender uma outra língua, uma língua mais importante para mim.”

Por Jéssica Almeida,

Desde muito pequena eu penso em fazer Direito na faculdade. Por isso, quando me falaram sobre o Projeto Onda, do Inesc, eu pensei: poxa, por que não participar?! Sou Jéssica Almeida e conheci o projeto em 2017, aos 12 anos, quando estudava no CEF Doutora Zilda Arns.

Quando entrei no ONDA, não imaginava que eu iria conhecer tantas coisas diferentes e que seria tão bom assim participar. Foi como aprender uma outra língua, uma língua mais importante para mim. Aprendi coisas que nem imaginava, como o que é exigibilidade, interdependência, o sistema de garantia de Direitos e muitas outras. Além de tudo isso, fomos conhecer o trabalho de alguns órgãos públicos, pois também é nosso dever verificar se os nossos direitos estão funcionando bem.

Achei tudo isso essencial na minha vida não só porque gostaria de estudar Direito no futuro, mas também por achar que toda as pessoas devem ter conhecimento de seus direitos.

O Projeto ONDA é o melhor, ele é único!

Ministério da Saúde tem represamento recorde de recursos

Levantamento feito pelo Estadão/Broadcast mostra que o governo federal segurou R$ 31,25 bilhões de gastos carimbados para a área de saúde nos últimos 15 anos. Destes, R$ 19,4 bilhões se referem a gastos represados e R$ 11,8 bilhões são gastos cancelados. Nos dois casos, essas cifras passam a fazer parte da rubrica “restos a pagar”, como são chamadas na contabilidade pública as despesas empenhadas (comprometidas e ainda não pagas) que são transferidas de um ano para o outro.

À reportagem do Estadão, Grazielle David, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), explicou que esse mecanismo utilizado pelo governo é semelhante a um cheque pré-datado. “Se empenha e o dinheiro de fato não chega”, afirmou.  Além disso, nos casos em que as despesas são pagas muito tempo depois de empenhadas, o são sem nenhum tipo de correção monetária.

Grazielle ressalta que isso já vinha acontecendo, mas que em 2017 a retenção dessa verba “foi assustadora” e que a tendência é que aumente nos próximos anos.  Isso porque a Emenda Constitucional 95, conhecida como “Teto dos Gastos”, prevê um congelamento nos gastos públicos por vinte anos. Exemplo disso é que, na virada de 2017 para 2018, com apenas um ano de vigência da EC 95, o Ministério da Saúde incluiu R$ 13,6 bilhões como “restos a pagar” – um valor recorde.

Ainda de acordo com Grazielle David, quem mais perde com esse represamento de recursos são os municípios, que precisam colocar mais dinheiro na área da saúde para atender a demanda crescente. “Os municípios já estão no limite”, constatou.

<<< Leia mais na reportagem do Estadão>>>

Brasil está aquém do potencial em participação social no orçamento público

Em entrevista a Rádio CBN no último domingo (18), a assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Carmela Zigoni, falou sobre a Pesquisa Orçamento Aberto 2017, divulgada no mês passado pelo Instituto. O estudo revelou que o Brasil não proporciona ambiente de participação social na gestão do orçamento público.

De acordo com Carmela, um dos motivos pelos quais o Brasil acumulou apenas 35 pontos em 100 possíveis no quesito “participação social” foi o fato de que alguns mecanismos de participação não foram efetivados pelo governo durante o período da pesquisa.

“Um desses mecanismos é o Fórum Interconselhos, que reunia diversos conselhos nacionais para discutir as políticas públicas, o plano plurianual e também orçamento. Esse Fórum deixou de acontecer. Avaliamos que ficamos aquém do nosso potencial de participação social, dada as instâncias institucionalizadas existentes, como conselhos, conferências e plebiscitos”, explicou.

Carmela Zigoni lembrou que os dados do orçamento público do país são disponibilizados e atualizados diariamente pelos sistemas do governo. No entanto, só é acessado por especialistas, acadêmicos e alguns jornalistas. No quesito “transparência orçamentária” o Brasil acumulou 77 pontos em 100 na pesquisa.

A assessora do Inesc defende que o governo deve investir em formação, inclusive nas escolas, e em divulgação dos dados do orçamento para despertar na população o interesse pela participação na gestão do orçamento público.

“É preciso aproximar a população desse tema e gerar interesse”, defendeu Carmela. “Nós estamos vivendo um momento de cortes orçamentários e ajuste fiscal e isso não está sendo discutido com a população. O Brasil é um país extremamente injusto do ponto de vista da tributação, pois a gente tributa mais no consumo do que na renda e no patrimônio e, proporcionalmente, as camadas mais pobres acabam pagando mais impostos do que as camadas médias e altas”. Esse imposto sobre fortuna e patrimônio que deixa de ser arrecadado poderia compor o orçamento e evitar o corte de investimentos em saúde, educação e assistência social, explicou Carmela Zigoni.

Escute a íntegra da entrevista

Pesquisa de Orçamento Aberto 2017

Apesar de transparência, Brasil não proporciona ambiente de participação social na gestão do orçamento público

De acordo com a Pesquisa de Orçamento Aberto 2017 (OBS, na sigla em inglês), o Brasil fornece informações orçamentárias substanciais à população, mas não fomenta a participação social. O relatório divulgado nesta terça-feira (30) mostra que o país ocupa a 7ª posição no ranking global de transparência orçamentária entre 115 países analisados. No entanto, as instituições brasileiras oferecem poucas oportunidades para a população se envolver nos processos de gestão dos R$ 3,57 trilhões que compõem o orçamento federal.

O Brasil caiu uma posição no ranking em relação a última pesquisa, divulgada em 2015, quando alcançou o 6ª lugar. Contudo, manteve a mesma pontuação: 77 de 100 pontos possíveis para transparência.  Além disso, perdeu a posição de líder da América Latina, agora ocupada pelo México.

<<< Acesse aqui a íntegra do relatório global (em inglês) >>>

Elaborado desde 2006, o Índice de Orçamento Aberto (OBI, na sigla em inglês),  que faz parte da pesquisa, utiliza 109 indicadores para transparência que avaliam se o governo disponibiliza documentos-chave do orçamento em tempo hábil. Além disso, investiga se os dados desses documentos são abrangentes e úteis. Os resultados são analisados por meio de um questionário de 145 perguntas respondido por especialistas independentes de organizações da sociedade civil em todo o mundo, e revisado por gestores públicos.

Carmela Zigoni, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) e responsável pelo Índice no Brasil, pondera que o acesso real a essas informações fica restrito ao próprio Estado, ao meio acadêmico e a algumas organizações e jornalistas que fazem o controle social. “Por exemplo, o Orçamento Cidadão, uma iniciativa positiva que visa à simplificação do orçamento para um público maior, não é muito conhecido, principalmente no segmento da juventude”.

O Inesc é a instituição responsável por analisar os dados do Brasil, em parceria com o International Budget Partnership (IBP). Além de recomendações técnicas relativas aos conteúdos dos documentos e mecanismos de controle, o Instituto ressalta a necessidade de fomento ao debate sobre orçamento nas instâncias de participação social existentes (conferências, conselhos e audiências públicas), criação de novos espaços para o debate público sobre este tema e popularização do Orçamento Cidadão.

Falta participação social

O Brasil acumulou apenas 35 pontos em “participação pública” na pesquisa atual – ainda assim, acima da baixa média global, que foi de 12 pontos. De acordo com Carmela Zigoni, um dos motivos foi o fato de que, em 2016, não foi realizada a reunião do Fórum Inter-Conselhos para debate sobre o orçamento de 2017. Além disso, as audiencias públicas não são obrigatórias e a participação nas consultas digitais é muito baixa.

Ainda segundo a assessora do Inesc, a pesquisa revela que, em uma conjuntura de austeridade fiscal e redução drástica de recursos para políticas públicas, a população brasileira pouco participa de momentos de decisões no ciclo orçamentário.  “Os cidadãos e cidadãs não tem acesso real a tais informações, seja porque são muito técnicas, ou porque não se investe em políticas de reuso de dados para apresentá-los de forma mais amigável para a população. As instâncias de participação institucionalizadas, como conferências e conselhos, nem sempre dialogam sobre o orçamento. Isso faz com que a participação em si não promova democracia e diminuição da corrupção: é preciso que as informações sejam apropriadas pelos diversos setores da sociedade.”, observou.

Fiscalização

A capacidade de fiscalização do orçamento também foi analisada na Pesquisa de Orçamento Aberto 2017. Segundo o relatório, as instituições responsáveis oferecem uma fiscalização adequada durante a fase de planejamento do ciclo orçamentário e uma fiscalização limitada durante sua execução. A pontuação do Brasil nessa área foi de 76 em 100, e recomenda-se que o Legislativo analise os relatórios do Tribunal de Contas da União e disponibilize a avaliação à sociedade. A Instituição Fiscal Independente do Brasil (IFI) não foi avaliada na pesquisa, pois ainda não tinha sido criada no momento da coleta dos dados.

Em termos globais, a Pesquisa do Orçamento Aberto 2017 mostra, ainda, que 89 dos 115 países deixaram de disponibilizar publicamente informações orçamentais suficientes. O IBP diz que esse retrocesso prejudica a capacidade dos cidadãos de todo o mundo de monitorar seus governos com relação ao gerenciamento de fundos públicos.

O processo de pesquisa ocorreu entre setembro a dezembro de 2016, envolvendo organizações independentes da sociedade civil de 115 países. Para o relatório completo, incluindo recomendações, e outros recursos, tal como resultados específicos por país, acesse www.openbudgetsurvey.org.

Vamos falar sobre Orçamento e Direitos?

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Dia Nacional da Visibilidade Trans

No dia 29 de Janeiro – Dia Nacional da VisibilidadeTrans – busca-se dar visibilidade para travestis, transexuais, mulheres e homens trans, grupo que ainda vive em situação de vulnerabilidade social devido à transfobia.

De acordo com a ONG Transgender Europe (TGEu), o Brasil é o país que mais mata pessoas trans no mundo.Em pesquisa divulgada pelo Grupo Gay da Bahia, o número de assassinatos de pessoas trans no Brasil no último ano aumentou em 6%, sendo que as transexuais e travestis negras foram maioria (38%) entre as mortes de LGBTIs no país em 2017.

Isso ocorre porque há interseccionalidade nas desigualdades, ou seja, as mulheres trans negras são vítimas de violências e discriminações de diversos tipos: machismo, transfobia, racismo e, em muitos casos, também por serem pobres.

Entre as pautas dos movimentos sociais estão a questão da inserção no mercado de trabalho, a despatologização, a saúde e, principalmente, a redução da violência.

Saiba mais sobre as contribuições do Inesc para a conscientização e visibilização da população trans no Brasil:

Oito de Março para Luana e Veronica

Visibilidade trans: alguns avanços não escondem graves violações dos direitos humanos

Eu te desafio a me amar

Assista também ao vídeo produzido pelo Inesc sobre inserção de pessoas transexuais no mercado de trabalho, com a participação de Ludymilla Santiago, integrante do Fórum Nacional de Travestis e Transexuais Negras e Negros do Brasil – FONATRANS; Wanda Marques Araújo, ativista na União Libertária de Travestis e Mulheres Transexuais – ULTRA e Miguel Haaran, estagiário do Inesc e integrante da Cia de Teatro Bisquetes:

“Acolhi e fui acolhida por outras mulheres negras que me mostraram que o afeto entre nós é muito importante.”

Venho de uma família de muitas mulheres negras professoras que me ensinaram que educar é um ato político. Esse foi o motivo que me levou a estudar Pedagogia. Sou Helena Rosa, tenho 26 anos, carioca estudante na Universidade de Brasília.

Desde criança fui educada pelos meus pais a enfrentar o racismo. Tinha consciência de que sou negra, mas meu despertar político aconteceu mesmo na universidade. Comecei com as pesquisas e leituras individuais, me matriculando em disciplinas com temática étnico-racial e participando de rodas de conversa voltadas para estudantes negras e negros. No entanto, ao me colocar nesses espaços de militância universitária percebi que meu próprio curso não tinha um currículo que contemplasse o ensino para uma educação antirracista. Foi neste momento que surgiu o Semeando Ubuntu: comunidade negra para estudos das Relações Étnico-Raciais, Gênero e Sexualidade, a partir de perspectivas negras do pensamento na aplicação da Lei 10.639/03, que estabelece a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira” no currículo oficial da Rede de Ensino brasileira.

Foi por meio deste coletivo criado por mim e outrxs colegas de curso que conheci o projeto “Mulheres Jovens Negras Fortalecidas na Luta contra o Racismo e o Sexismo”, ou “Hub das Pretas”, realizado em quatro cidades do Brasil, e aqui em Brasília pelo Inesc. A palavra “Fortalecidas” foi o que mais me chamou atenção quando recebi o convite. Por ser mulher, negra e gorda eu precisava de um espaço onde eu pudesse me fortalecer individualmente para continuar contribuindo com o Semeando Ubuntu.

Por meio de incidências políticas pensadas a partir do projeto consegui colocar em minha prática diária a luta antirracista que é para além da bolha universitária. E devido ao meu interesse e envolvimento no projeto acabei, também, sendo contratada como estagiária no Inesc, o que contribuiu de forma significativa para meu crescimento profissional. No Hub das Pretas, acolhi e fui acolhida por outras mulheres negras que me mostraram que o afeto entre a comunidade negra é muito importante.

Debate e lançamento do documentário “Um atentado violento ao pudor”

Por ocasião do mês da Visibilidade Trans, entidades promovem nesta quinta-feira (25) o lançamento do documentário “Um atentado violento ao pudor”, acompanhado de debate. A atividade, que acontece em Brasília, é uma parceria entre o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), a Associação Nacional das Travestis e Transexuais (Antra), a União Libertária de Travestis e Mulheres Transexuais (Ultra) e a Universidade Federal de Uberlândia (UFU).

O filme aborda as conexões entre a vida de Keila Simpson e o movimento social das travestis. Dirigido pela própria Keila e por Gilson Goulart, o documentário também retrata as estratégias traçadas pelo movimento e suas militantes que “evidenciam, ao invés de um empoderamento tutelado, um ativismo emaranhado com autonomia, solidariedade e estratégias educativas”, de acordo com a avaliação dos idealizadores.

Debate
A atividade também prevê um debate, logo após a exibição do filme, com a participação da professora da Universidade Federal de Uberlândia Flávia Teixeira, especialista em diversidade sexual; de Gilson Goulart, que dirige o filme ao lado de Keyla Simpson; e de Melissa Massayuri, presidente da Ultra.

Serviço

Lançamento de “Um atentado violento ao pudor” + Debate
Quando: 25/01, 19h
Onde: Auditório do Sindicato dos Urbanitários no Distrito Federal (STIU-DF). SCS, Quadra 6, bloco A, 110. Edifício Arnaldo Vilares, 7º Andar (em frente ao Shopping Pátio Brasil.

Ficha Técnica
Gênero: Documentário; Cor; 91 minutos.
Direção: Gilson Goulart e Keila Simpson
Fotografia e câmera: Gilson Goulart
Edição: Gilson Goulart
Produção: Flavia Teixeira

Orçamento para o Meio Ambiente em 2018: pior do que parece

Por Alessandra Cardoso, assessora política do Inesc

O orçamento aprovado para o Ministério do Meio Ambiente (MMA) e seus órgãos vinculados – IBAMA, SFB, ICMBio, ANA, FNMA, JBRJ, FNMC[1] – sofreu uma redução de R$ 480,5 milhões (12%) este ano. Em termos globais, os recursos destinados à pasta passaram de R$ 3,97 bilhões em 2017 para R$ 3,49 bilhões em 2018.

Corte orçamentário em um órgão com enormes desafios, fragilidades e pressões políticas que visam a redução de áreas protegidas, flexibilização de licenciamento, entre outras, já é uma má notícia. Quando analisamos a proposta orçamentária para o órgão em detalhes, vemos que a situação é ainda pior.

Portanto, esta breve nota tem o propósito de trazer questões que contribuem para uma análise mais precisa do cenário orçamentário do governo federal para o meio ambiente em 2018.

1)      As “Reservas de Contingência[2] embutidas nos orçamentos do MMA e seus órgãos vinculados representam uma perda importante de recursos, para além do corte orçamentário global.

Na proposta orçamentária para o MMA e seus órgãos em 2018, está incluído o valor de R$ 422,5 milhões como “Reserva de Contingência”. Este valor é oriundo de receitas próprias ou vinculadas, quer dizer, são receitas que pertencem ao órgão e, quando alocado na forma de Reserva de Contingência, não têm outro objetivo senão o de gerar economias para manter a dívida pública sob controle.

Em outras palavras, trata-se de um recurso que não será gasto com políticas públicas para o Meio Ambiente. A decisão política de alocar crescentes receitas próprias ou vinculadas na forma de Reserva de Contingência evidencia uma intenção clara, embora subliminar, do governo de esterilizar recursos que deveriam ser gastos com meio ambiente e esvaziar a capacidade orçamentária dos órgãos.

Esta Reserva, uma espécie de “fake orçamento”, cresceu quase cinco vezes em três anos. Os números alocados falam por si. Foram R$ 88,2 milhões em 2016; R$ 337,5 milhões em 2017 e R$ 422,5 milhões em 2018.

Estes R$ 442,5 milhões são oriundos de diversas fontes de recursos próprios e vinculados, incluindo boa parte das Doações de Entidades Internacionais ao Meio Ambiente. Por exemplo, de um total de R$ 24 milhões de Doações Internacionais para o Serviço Florestal Brasileiro em 2018, R$ 20 milhões foram parar na “Reserva de Contingência”.

O quadro a seguir especifica as fontes que vão compor os R$ 442,5 milhões da “Reserva de Contingência”. A quase totalidade dos R$ 142,7 milhões oriundos dos royalties do petróleo está alocada na Reserva de Contingência. Igualmente, boa parte dos R$ 72 milhões previstos na forma de Compensações pela Utilização dos Recursos Hídricos e a totalidade dos R$ 6,7 milhões previstos como Compensações pela Exploração de Recursos Minerais também foram drenados pela Reserva.

Os números mostram que não se pode analisar o orçamento do Meio Ambiente ignorando a perda decorrente da “Reserva de Contingência” que tem crescido a cada ano. Trata-se de recursos ímpares, alguns deles garantidos em lei, para que parte da arrecadação de atividades prejudiciais ao meio ambiente pudesse ser revertida para políticas públicas de meio ambiente e não bloqueados na Reserva de Contingência. Da mesma forma, as doações nacionais e internacionais que, evidentemente, não têm como propósito gerar economia de caixa à custa do meio ambiente.

Tal embargo de recursos penaliza e, em alguns casos, sentencia de morte iniciativas e políticas a cargo do MMA e seus órgãos, como é o caso do Bolsa Verde, que iremos abordar adiante.

Logo, se excluirmos os valores aplicados nas Reservas de Contingência dos órgãos onde eles estão alocados, teremos uma situação bem pior do que a inicialmente apresentada.

O gráfico a seguir mostra a variação das dotações iniciais de cada órgão entre 2017 e 2018, desconsiderando as reservas de contingência que somaram R$ 337,5 milhões em 2017 e os R$ 422,5 milhões em 2018. À exceção do Ibama e do JBRJ, que obtiveram pequeno aumento, todos os demais órgãos perdem parte expressiva de seus orçamentos comparativamente à 2017. No MMA, a reserva de contingência passa de R$ 93 milhões para R$ 208,9 milhões. Excluindo esta parte do seu orçamento, o órgão que tinha um recurso de R$ R$ 456,9 milhões em 2017 contará com apenas R$ 237,4 milhões em 2018, ou seja, encolhe 48%. No caso do Ibama, vale registrar que o aumento foi concentrado em ações finalísticas de comando e controle ligadas ao desmatamento e na própria unidade administrativa.

Já no caso do Fundo Nacional de Mudança do Clima (FNMC), não é considerada aqui a parte de recursos sob sua supervisão destinada ao “Financiamento de Projetos para Mitigação e Adaptação à Mudança do Clima”. Os recursos para esta ação em específico saltaram de R$ 23 milhões em 2017 para R$ 202,8 milhões em 2018. Tal aumento deve-se ao ganho de recursos oriundo das “Compensações Financeiras pela Produção de Petróleo, Gás Natural e Outros Hidrocarbonetos Fluidos”. Ocorre que esta parte do orçamento é executada pelo BNDES e destina-se ao “Apoio financeiro reembolsável, mediante concessão de empréstimos a empreendimentos que visem à mitigação da mudança do clima e a adaptação à mudança do clima e aos seus efeitos”. Dada a complexidade deste Fundo optamos por aprofundar o tema em outro momento.

2)      Os cortes no orçamento e o “fake orçamento” sentenciam particularmente algumas iniciativas, ações ou políticas.

– “Programa de Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade”: perde 91% dos recursos a cargo do MMA, restando apenas R$ 7,3 milhões em 2018, frente aos R$ 77,9 milhões autorizados para 2017. Esta queda deveu-se à extinção da ação de “Apoio à Conservação Ambiental e à Erradicação da Extrema Pobreza – BOLSA VERDE”, que em 2017 teve orçamento de R$ 72,2 milhões e em 2018 desapareceu do orçamento de 2018.

O Bolsa Verde, que chegou a garantir o atendimento de 76 mil pessoas até fevereiro de 2016, foi sendo progressivamente reduzido chegando ao final de 2017 com um público atendido de 48 mil pessoas em situação de extrema pobreza. Os beneficiários da Bolsa Verde eram residentes de Reservas Extrativistas (19,8 mil pessoas); ribeirinhos (4,8 mil pessoas) e assentados de Projetos de Assentamento (23,3 mil pessoas). A despeito das críticas e problemas desta modalidade de apoio financeiro de apenas R$ 300 reais a cada três meses, o fato é que era um programa importante que dava um suporte adicional de renda para pessoas e famílias que indiretamente recebiam o benefício. Seu corte radical em um contexto de recrudescimento da pobreza e extrema pobreza, de desmonte de outras políticas públicas, e ainda mais com a drenagem de recursos para “Reservas de Contingência”, denota um quadro angustiante de desrespeito à população mais vulnerável, em especial na Amazônia seu principal foco geográfico, e que tanto contribui para preservar a floresta.

A extinção do Bolsa Verde já havia sido alertada em 2017 pela ex-ministra do Meio Ambiente e também foi tema polemizado na participação do Ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho, durante a Conferência do Clima em Bonn, na Alemanha. Questionado acerca das notícias de extinção do Bolsa Verde, o Ministro justificou o fim do orçamento em 2018 em função do cenário de “teto de gastos” e da necessidade de direcionar recursos para outras ações, em especial de comando e controle, sinalizando, contudo, a possibilidade de uma nova modalidade de apoio financeiro a ser, ainda, construída como ação do Fundo Amazônia.

– “Programa de Qualidade Ambiental”: também perde 91% dos recursos, restando apenas R$ 10 milhões dos R$ 117,7 milhões aprovados em 2017. As ações mais prejudicadas foram a de “Apoio à Implementação de Instrumentos Estruturantes da Política Nacional de Resíduos Sólidos” e de “Apoio a Projetos de Desenvolvimento Sustentável Voltados à Qualidade Ambiental Urbana”.

3)      No caso do ICMBio a situação parece estável, apesar de crítica.

O órgão conta com um orçamento 33% menor em 2018, mas é preciso levar em consideração que a perda não se deve a reserva de contingência e sim à ação orçamentária “Pagamento de Sentenças Judiciais Transitadas em Julgado (Precatórios) devidas pela União, Autarquias e Fundações Públicas”. Segundo explicação oferecida pelo MMA, Nota de Esclarecimento sobre o Projeto de Lei Orçamentária para 2018 (PLOA 2018) divulgada em novembro de 2017, a redução desta despesa obrigatória justifica-se “por não haver decisões que demandassem a alocação de recursos”.



[1] Na sequência: Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, Serviço Florestal Brasileiro, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, Agência Nacional de Águas, Fundo Nacional de Meio Ambiente, Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, Fundo Nacional sobre Mudança do Clima.

[2] Esta Reserva tem como fundamento no art. 12, § 1º, inciso I, da LDO 2018. De acordo com a Mensagem Modificativa do PLOA 2018 foram constituídas reservas à conta de receitas próprias e vinculadas de diversos órgãos, totalizando R$ 23.2 bilhões. Para uma melhor compreensão do papel da Reserva de Contingência ver Nota Técnica Conjunta N° 05 de 2017 – CONOF/CD e CONORF/SF, item 4.6. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/orcamento/documentos/estudos/tipos-de-estudos/notas-tecnicas-e-estudos/subsidios-a-apreciacao-do-projeto-de-lei-orcamentaria-para-2018-pl-no-20-2017-cn-modificado

O emprego formal desaparece, a pobreza e a desigualdade avançam

Por Rodrigo Martins, da Carta Capital

A inflação oficial do País fechou 2017 em 2,95%, a menor alta anual desde 1998 e abaixo do piso da meta estabelecida pelo próprio governo. Após a divulgação dos resultados pelo IBGE, na quarta-feira 10, os palacianos anteviram um próspero período de juros baixos e de recomposição do poder de compra do trabalhador.

“Na verdade, a inflação em um patamar tão baixo é mais um sintoma da depressão que vivemos, da forte retração da demanda. Atribui-se o feito à safra agrícola recorde, mas parecem subestimar os efeitos dos sucessivos aumentos no preço da eletricidade, dos combustíveis e do gás de cozinha, estes últimos controlados pelo governo”, alerta João Sicsú, professor do Instituto de Economia da UFRJ e ex-diretor de Estudos Macroeconômicos do Ipea.

“Em 2015 e 2016, o Brasil perdeu 7,2% de seu PIB. A economia recuou seis anos, para o mesmo patamar que tinha no segundo semestre de 2010”, observa o economista. “É possível que tenha recuperado um ponto porcentual no ano passado, mas ninguém sabe com exatidão se existe uma recuperação. O mais provável é que seja apenas um suspiro de quem bateu no fundo do poço.”

Para 2018, os analistas do mercado vendem um cenário otimista. De acordo com o Boletim Focus, pesquisa feita pelo Banco Central com mais de cem instituições financeiras, projeta-se um crescimento do PIB da ordem de 2,69%, com uma inflação de 3,95%. Em outubro, o Fundo Monetário Internacional trabalhava com projeções mais conservadoras, prevendo uma expansão de 1,5% do PIB até o fim do ano. Ainda que o bolo volte a crescer, não há o mais pálido sinal de que será repartido com o conjunto da sociedade. Ao contrário, os indicadores acenam para um aumento da concentração de renda e dos níveis de pobreza.

A Síntese dos Indicadores Sociais do IBGE, divulgada em dezembro, revela um expressivo aumento do número de pobres e miseráveis. O Brasil encerrou 2016 com 24,8 milhões de cidadãos, 12,1% da população, vivendo com menos de um quarto de salário mínimo, o equivalente a 220 reais. O resultado representa um crescimento superior a 50% em apenas dois anos. No fim de 2014, quando a crise econômica esboçava os primeiros sinais, havia 16,2 milhões de brasileiros com essa faixa de renda, usada pelo Ipea para designar os “extremamente pobres” e empregada pelo governo federal como critério para a concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC) aos idosos em situação de miséria.

De acordo com a linha de extrema pobreza estabelecida pelo Banco Mundial, mais usada para comparações internacionais, 13,4 milhões de brasileiros, 6,5% do total, vivia com menos de 1,90 dólar por dia (cerca de 133 reais mensais) no fim de 2016. E um quarto da população possuía renda inferior a 5,50 dólares por dia (387 reais por mês), faixa de renda usada pela instituição para definir um nível menos agudo de indigência. Devido às recentes atualizações de valores nas linhas de pobreza do Banco Mundial, o estudo do IBGE não permite comparações com os anos anteriores.

Ex-ministra do Desenvolvimento Social, a economista Tereza Campello refez os cálculos com base na linha de corte anterior, de 1,25 dólar por dia para definir quem vive na miséria, e identificou alta expressiva. “Por esse critério, a extrema pobreza avançou de 2,5%, em 2014, para 4,9% em 2016. Retrocedemos ao patamar de dez anos atrás”, lamenta. “Para agravar o problema, difundiu-se um falacioso diagnóstico, a atribuir a crise à suposta elevação dos gastos públicos, sobretudo na área social. É mentira. Essas despesas não aumentaram nos últimos anos, o que houve foi uma brutal redução das receitas. O problema está na arrecadação.”

Em vez de ampliar a rede de proteção social, indispensável para amparar os desvalidos em tempos de crise, o governo empenhou-se em reduzi-la. A política de austeridade fiscal, iniciada pelo ministro Joaquim Levy no segundo mandato de Dilma Rousseff e aprofundada por Henrique Meirelles no governo de Michel Temer contribuiu decisivamente para a regressão social.

Um levantamento realizado pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), em parceria com a Oxfam Brasil e o Centro para os Direitos Econômicos e Sociais, revela queda de até 83% em políticas voltadas à área social nos últimos três anos. De acordo com o estudo, a área que mais perdeu recursos desde 2014 foi a de direitos da juventude, com queda de 83% nos investimentos.

<<< Leia também >>> Estudo “Direitos Humanos em tempos de austeridade”

Em segundo lugar, vêm os gastos com programas voltados à segurança alimentar, reduzidos em 76%. A área de moradia digna sofreu perdas de 62%, assim como a de Defesa dos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes. A Promoção da Igualdade Racial sofreu uma redução de 60% e os programas para mulheres, 53%. Um dos exemplos citados pelos pesquisadores é a queda significativa no Programa de Aquisição de Alimentos do governo federal, com perdas de 69% em três anos. O estudo alerta para a “ameaça de um retorno da forme e da desnutrição”.

O desemprego massivo é, possivelmente, a maior fonte de angústia do brasileiro. Embora o governo se apresse em anunciar a reativação do mercado de trabalho, a verdade é que Temer nem sequer conseguiu suprir as vagas perdidas durante a sua gestão. Em maio de 2016, quando foi alçado ao poder sem voto, em meio ao golpe branco deflagrado no Parlamento, a taxa de desocupação atingia 11,2% da população economicamente ativa, um total de 11,4 milhões de cidadãos sem emprego. O problema atingiu o ápice no primeiro trimestre de 2017, quando o País somava 14,2 milhões de desempregados, 13,7% do total. Em novembro passado, a taxa de desocupação alcançava 12%, algo em torno de 12,6 milhões de brasileiros. Os dados são da Pnad Contínua, divulgada pelo IBGE.

Curiosamente, em novembro, primeiro mês de vigência da reforma trabalhista, o Brasil fechou 12.292 vagas com carteira assinada, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). “Em dezembro, é comum haver um maior número de demissões, como consequência do encerramento de contratos de trabalho temporário para o comércio no período do Natal. Novembro não tem, porém, esse caráter sazonal. Essa oscilação negativa recomenda prudência ao falar da suposta reativação do mercado de trabalho”, observa José Dari Krein, professor do Instituto de Economia da Unicamp e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit).

Na realidade, os números revelam um processo de desaparecimento do emprego formal. Desde 2014, o País perde, em média, 1 milhão de postos com carteira assinada por ano, segundo a Pnad Contínua do IBGE. Além da retração da atividade econômica, a redução dos postos formais pode ter sido intensificada com a sinalização política de Temer, a considerar as regras trabalhistas excessivas e passíveis de flexibilização, diz Krein. “Diante desse aceno, os agentes econômicos sentiram-se à vontade para optar pelas formas mais baratas de contratação, antes mesmo de a reforma ser aprovada.”

Em vez de induzir à formalização, a reforma de Temer contribui para desestruturar o mercado, emenda o especialista. “A pejotização e o trabalho intermitente devem avançar, sobretudo, sobre o emprego formal”, avalia o economista da Unicamp, antes de citar o “didático exemplo do Grupo Estácio”. Em dezembro, instituição de ensino superior confirmou a demissão de 1,2 mil professores e anunciou a criação de um “cadastro de reserva”, para atender “possíveis demandas”. “Provavelmente, serão contratados docentes intermitentes, que vão receber por hora, e menos.”

Diante desse cenário, a insistência de Temer em nomear a deputada Cristiane Brasil como ministra do Trabalho só revela o descaso do presidente ilegítimo com a área. Desde o primeiro momento, ele transformou a pasta em um feudo do PTB. Sua primeira escolha foi o deputado Ronaldo Nogueira. Além de tramar o desmonte da Consolidação das Leis do Trabalho, que teve mais de cem artigos alterados, ele se notabilizou ao editar a portaria que afrouxou a repressão ao trabalho escravo, ao cabo revogada. Investigado pela Controladoria-Geral da União por supostas fraudes em um contrato de prestação de serviços de tecnologia, abandonou o governo no apagar das luzes de 2017.

O PTB indicou um deputado do Maranhão para substituí-lo, mas o nome acabou vetado pelo ex-presidente José Sarney. Temer chamou, então, o presidente do partido, Roberto Jefferson, delator do “mensalão” e condenado por corrupção e lavagem de dinheiro, para oferecer o cargo à sua filha. “Tínhamos três nomes em mente. No meio da conversa, o presidente me indagou: e por que não a Cristiane? Ela é experimentada, foi secretária municipal de diversos governos”, contou Jefferson. “Tenho que ligar para ela, porque ela é candidata. Fiz isso e ela, prontamente, respondeu: papai, eu aceito”.

Em resposta a uma ação popular, o juiz Leonardo da Costa Couceiro, da 4ª Vara Federal Criminal de Niterói, concedeu uma liminar para impedir a posse de Cristiane, após a revelação de que ela foi condenada a pagar 60 mil reais por dívidas trabalhistas com dois ex-motoristas. Segundo o magistrado, o ato configura um “desrespeito à Constituição no que se refere à moralidade administrativa”. Ao julgar um recurso apresentado pela deputada, Vladimir Santos Vitovsky, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, manteve a decisão. O caso segue sub judice, enquanto a parlamentar é alvo de novas denúncias, por usar verbas da Câmara para pagar serviços de uma locadora de veículos, aparentemente uma empresa fantasma, ligada a uma funcionária de seu gabinete.

Para os trabalhadores, a nomeação de uma ministra com esse invejável currículo só aumenta o desalento. Há três anos, o rendimento médio mensal está estagnado. No trimestre encerrado em novembro de 2017, estava em 2.142 reais, exatamente o mesmo valor auferido pelo IBGE no fim de 2014. Com a legalização de contratos precários de trabalho e a liberação das terceirizações, o valor pode despencar, alerta o sociólogo Clemente Ganz Lúcio, diretor técnico do Dieese. “O empregado pode se ver forçado a virar um microempreendedor, assumindo todo o ônus da atividade empresarial, ou mesmo ter a mão de obra intermediada por uma prestadora de serviços, que certamente vai reduzir os benefícios e achatar os salários para garantir a sua margem de lucro.”

De acordo com o especialista, o Brasil vive um dramático processo de desindustrialização e de queda do nível de emprego na agricultura, em razão do crescente processo de mecanização do campo. Esses dois fenômenos levaram a uma transição prematura da sociedade industrial para o setor de serviços, que ainda tem uma base frágil, de micro e pequenas empresas, na qual prevalece o trabalho precário e informal, explica Ganz Lúcio.

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O desmonte por trás do Orçamento de 2018

Julia Neves – EPSJV/Fiocruz

O presidente Michel Temer sancionou no dia 2 de janeiro a Lei Orçamentária Anual (LOA) para 2018, que prevê R$ 3,5 trilhões de receitas e despesas da União para o exercício financeiro deste ano. Este será o primeiro orçamento aprovado após a vigência da Emenda Constitucional do Teto de Gastos (EC 95), que limita as despesas públicas à inflação do ano anterior pelos próximos 20 anos. Uma das principais novidades é o aporte de R$ 1,7 bilhão para o Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), que vai custear com recursos públicos as campanhas dos partidos políticos.

Educação

Em contrapartida, foi vetado o recurso extra de R$ 1,5 bilhão para o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), que ajuda a custear o salário de professores de escolas públicas em estados cuja remuneração não alcança o piso nacional da categoria, e pode ser usado também em atividades como o custeio de programas de melhora da qualidade da Educação, a formação continuada dos professores, a aquisição de equipamentos e a construção e manutenção das escolas, por exemplo. Isso porque segundo o Palácio do Planalto, o Fundeb já possui previsão de R$ 14 bilhões para 2018.

De acordo com Catarina Almeida, professora da Universidade de Brasília (UnB) e coordenadora do comitê distrital da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, o veto de Temer a essa complementação inviabiliza o atendimento às demandas da educação básica. “Para que a educação básica seja implementada de forma mínima, nós precisamos objetivamente dessa complementação da União. Pelo menos dez estados hoje na Federação não conseguem, com sua arrecadação, chegar ao patamar de uma qualidade mínima necessária para a educação”, alerta a professora. Para ela, o veto também atingiria de forma negativa metas estabelecidas no Plano Nacional da Educação (PNE): “O veto vai impossibilitar uma expansão do atendimento às crianças que estão fora da educação infantil, além das expansões de creches e do ensino médio”.

Para Catarina, isso mostra definitivamente que a educação não é prioridade para o governo. “E além do mais, esse veto pode inviabilizar que se cumpra o mínimo que a EC 59 coloca – a universalização da educação básica obrigatória”, acrescenta.

Do total das despesas de R$ 3,5 trilhões do orçamento, R$ 1,16 trilhão serão destinados ao refinanciamento da dívida pública e outros R$ 316 bilhões com o pagamento de juros da dívida. Por tratar-se de uma despesa financeira da União, a dívida ficou de fora dos limites impostos pelo teto de gastos, que abrange apenas as despesas primárias. Os gastos com Previdência Social somam R$ 585 bilhões. O orçamento prevê ainda um déficit primário de R$ 157 bilhões para o ano.

Para a Educação e a Saúde, o quadro tem agravos. A LOA prevê R$ 130 bilhões para a Saúde e outros R$ 109 bilhões para a Educação, valor que, em teoria, faz com que o governo gaste com juros da dívida três vezes mais do que com Educação. “Claramente, o que se vê é a valorização de quem não precisa, seria a questão da dívida e do fundo eleitoral, e você tira da maior parte da população brasileira, que é exatamente quem vai precisar dos investimentos nas áreas sociais”, diz Cataria.

Se os cortes chegaram até a educação básica, com a educação superior a situação também não é diferente. No planejamento do governo em 2018, o orçamento previsto é de apenas R$ 5 bilhões para universidades, enquanto em 2017 foi de R$ 8 bilhões e de R$ 15 bilhões em 2015, uma queda progressiva. Segundo dados da Associação Nacional das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), a LOA de 2017 já trouxe uma redução no orçamento das universidades federais de 11,2% em relação a 2016. Os cortes atingiram principalmente as despesas com investimentos, que caíram 40%. E, segundo a Andifes, 35% dos valores previstos na LOA 2017 para as universidades sofreram contingenciamentos, agravando o quadro. As despesas com investimentos novamente foram as mais atingidas: o governo liberou apenas 40% do valor previsto em 2017.

Com esse orçamento, Catarina acredita ser provável um maior endividamento das universidades e até mesmo suspensão de atividades, como já vem acontecendo nos últimos anos com o corte de terceirizados. “Se elas já não estavam nas melhores condições e pedindo sempre mais verbas para o seu funcionamento básico e desenvolvimento de pesquisa, com esse corte a gente pode ter dificuldades de manter as universidades funcionando. Nessa perspectiva entra a lógica da privatização das universidades públicas, que vem na pauta de prioridades desse governo”, ressalta.
Na área de Ciência e Tecnologia, a redução é de R$ 2 bilhões em relação ao ano passado. “Como o país sai da crise se a gente não investe naquilo que pode provocar o seu crescimento, o seu desenvolvimento? Ao contrário, o que o governo está fazendo é exatamente cortar essa possibilidade de gerar novos empregos, pesquisas e conhecimentos”, lamenta Catarina.

O baixo orçamento também vem agravar a situação da Educação Profissional. “Os Institutos Federais (IFs) têm uma grande importância no processo de profissionalização. E como formar com qualidade com esses cortes?”, questiona Catarina. E continua: “O corte na verba da educação superior vai impactar também no trabalho dos IFs. E por outro lado, a gente tem uma lógica de Reforma do Ensino Médio que, para ser implementada como o governo supostamente diz, com a construção dos itinerários formativos, precisaria, na verdade, de mais verbas e não corte das verbas existentes. A gente coloca o país no lugar de consumidor do que se produz em outros países e não de produtor de conhecimento”, analisa, explicando que o orçamento expressa uma ação sistêmica de desvalorização da educação, que vai desde a educação infantil até a pós-graduação.

Saúde

A especialista em orçamento público e assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Grazielle David também observa algumas tendências para a saúde no orçamento deste ano. Segundo ela, em 2017, o governo previu um valor acima dos 15% da receita corrente líquida para saúde, mas não executou. “Era para ele ter executado, pelo menos, R$ 114 bilhões, mas ele só executou R$ 107 bilhões, então sobraram R$7 bilhões inscritos em restos a pagar. A grande questão é: quando isso vai ser pago? A saúde já tem R$ 51 bilhões inscritos em restos a pagar e sem previsão de quando vai ser pago”, afirma.

Em relação ao valor destinado para a saúde em 2018, de R$ 130 bilhões, Grazielle explica o cálculo realizado pelo governo: “Esse valor é superior ao mínimo que tem que ser aplicado, porque se eu pego 15% de 2017, que eram R$ 114 bilhões, acrescento 3% de Índice de Preços ao Consumidor (IPCA), que é aregra do teto dos gastos da EC 95, eu chego a R$ 118 bilhões, que seria o mínimo a ser aplicado em saúde em 2018”. Ela conclui: “Os R$ 130 bilhões estão de acordo com a lei e até um pouco acima. A grande questão é: será que ele vai executar esse dinheiro mesmo? Porque é bastante frequente que os governos não executem o orçamento destinado”, alerta.

Grazielle identifica um baixo investimento ao longo dos anos, aliado ao fato de haver um congelamento real dos gastos, só corrigido pela inflação, um crescimento e envelhecimento significativo da população e uma demanda tecnológica cada vez mais ampliada. Ainda assim, segundo ela, são destinados cada vez menos recursos para a saúde. Qual o grande risco disso? A especialista acredita que é a perda de abertura de serviços, o que segundo ela já é bastante previsto para este ano. “O orçamento de 2018 para a saúde praticamente não tem previsão de investimento em inversão financeira, então a gente pode esquecer ampliação de novos serviços e, ao longo dos anos, juntamente com o teto dos gastos, haverá diminuição ainda maior da qualidade dos serviços ofertados. E como o Ministério da Saúde também aprovou uma portaria que acaba com os blocos de financiamento – que tinha atenção básica, média e alta complexidade, vigilância em saúde, e agora só tem custeio e investimento -, o grande risco é que os setores que gastam mais, como ambiente hospitalar e medicamento suguem todo o recurso, deixando a atenção básica bastante prejudicada e afetando diretamente a população”, alerta.

Grazielle acrescenta que a LOA expressa apenas números de destinação orçamentária, não baseados em uma necessidade. “A gente não tem um planejamento de fato ascendente, é um cálculo de orçamento previsto não de acordo com a necessidade da população, mas meramente nas regras das emendas constitucionais 86 e  95”.

O mínimo

O gasto com funcionalismo público foi estimado em R$ 322,8 bilhões para 2018. Esse montante contempla os reajustes salariais previamente acordados e já conta com o aumento da contribuição previdenciária dos servidores (de 11% para 14%), conforme determinado pela Medida Provisória 805/17, embora ela tenha sido suspensa por uma liminar do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski, que será submetida a referendo do plenário do STF após o término do recesso forense e a abertura do Ano Judiciário de 2018.

Em relação ao salário mínimo, que era R$ 937 em 2017, no texto aprovado pelo Congresso Nacional em dezembro, a previsão para 2018 era de R$ 965. No entanto, o cálculo para o reajuste foi atualizado e o governo confirmou na última semana o novo mínimo de R$ 954, em vigor desde o dia 1° de janeiro – um reajuste de apenas 1,81%, que não repõe nem a inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) do ano, que fechou em 2,07%. Além de estar abaixo da estimativa que havia sido aprovada pelo Congresso, esse será o menor reajuste do piso nacional dos últimos 24 anos, desde a criação do Plano Real.

A lógica dos últimos anos, segundo Catarina, é que o salário mínimo fosse reajustado de forma que, em um futuro próximo, pudesse chegar o mais próximo possível daquilo que a Constituição Federal de 88 previa – no artigo 7º, inciso IV: “São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim”.

“Com esse salário mínimo, o Governo Temer mostra mais uma vez que a maior parte da população brasileira, que ganha um ou dois salários mínimos, não é olhada pelo governo, não faz parte desse processo de priorização”, afirma. E completa: “Além de ter um salário mínimo baixo, a gente teve uma reforma trabalhista e a aprovação do processo de terceirização que, na verdade, desobriga que muita gente, inclusive, olhe nessa perspectiva do valor do salário mínimo, já que existem agora diversas possibilidades de negociação e de precarização da oferta de trabalho”.

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Orçamento 2018: Funai respira, mas não se recupera

Se observado desde a perspectiva fria dos números, pode-se afirmar que em 2018 houve uma melhora de recursos para as políticas públicas indigenistas a cargo da Funai. O orçamento autorizado para o órgão neste ano é de R$ 596,90 milhões, frente aos R$ 548,65 milhões autorizados em 2017[1].

Contudo, esse ganho de R$ 48 milhões não é capaz de recompor a capacidade orçamentária da Funai, que segue como uma das mais baixas dos últimos 10 anos. Além disso, é preciso entender onde o recurso será alocado e se existem condições para ele ser executado, principalmente em uma conjuntura de desmonte do órgão e de “teto de gastos”.

Abaixo, apresentamos algumas lentes de observação que podem ajudar a entender melhor a questão:

  • Em termos de grupos de despesa (gastos com pessoal, gastos com outras despesas correntes, gastos com investimentos e gastos com inversões financeiras), o aumento observado está densamente localizado em “outras despesas correntes”, com acréscimo de quase R$ 47 milhões em 2018, em comparação com 2017.
  • Se analisarmos mais a fundo esta categoria “outras despesas correntes”, veremos que as despesas que mais cresceram foram as vinculadas à execução do programa orçamentário finalístico da Funai: “Proteção e Promoção dos Direitos dos Povos Indígenas”. Neste Programa, estão as ações que configuram  a expressão orçamentária da Política Pública indigenista: 1) Demarcação e Fiscalização de Terras Indígenas e Proteção dos Povos Indígenas Isolados; 2) Gestão Ambiental e Etnodesenvolvimento; 3) Promoção dos Direitos dos Povos Indígenas de Recente Contato; 4) Direitos Sociais e Culturais e à Cidadania; 5) Preservação Cultural dos Povos Indígenas.
  • No total, as despesas previstas com este conjunto de ações tiveram um aumento de R$44,6 milhões em 2018. São elas que tornam a política pública mais visível aos olhos dos povos indígenas, por isso são comumente denominadas ações finalísticas. As ações garantem, por exemplo, a contratação de laudos antropológicos para subsidiar processos de demarcação, a compra de combustíveis para carros e embarcações utilizadas para o trabalho de fiscalização das Terras Indígenas, ou, ainda, o apoio a projetos de processos educativos indígenas.
    • O gráfico abaixo evidencia o comportamento orçamentário de cada uma das ações nos últimos três anos. São as ações de “Demarcação e Fiscalização de Terras Indígenas e Proteção dos Povos Indígenas Isolados” e “Gestão Ambiental e Etnodesenvolvimento” que responderam por quase todo o crescimento do orçamento finalístico da FUNAI: a primeira, com um ganho de R$ 25,3 milhões e a segunda com um ganho de R$ 19,6 milhões.
  • As “despesas de pessoal” tiveram, por sua vez, um aumento de apenas R$ 5,5 milhões, sinalizando a manutenção do atual quadro de funcionários – que é muito precário e um dos muitos gargalos da Funai. Importante lembrar que em 2017 houve um corte de quase 20% do corpo técnico do órgão. Foram eliminados 87 cargos comissionados, desmonte que atingiu principalmente a Coordenação Geral de Licenciamento (CGLIC) e as Coordenações Técnicas Regionais (CTLs), áreas estratégicas responsáveis pela análise dos impactos de grandes empreendimentos em terras indígenas, além de fazer o trabalho de receber e levar demandas dos povos indígenas ao poder público. Mesmo com esse corte significativo, as despesas com pessoal consumirão 69,5% de todo o orçamento da Funai em 2018 o que evidencia, ainda mais, o quadro de penúria do órgão.
    • Por fim, há que se notar o aumento sem perder de vista o cenário prospectivo. O gráfico abaixo oferece uma análise em perspectiva do orçamento 2018 e mostra que, em termos reais, o aumento no orçamento total para 2018 é pouco expressivo e não permite a superação do desastre que acometeu o órgão nos dois últimos anos, mantendo a capacidade orçamentária da Funai como uma das mais baixas dos últimos 10 anos.

  • Além disso, embora o aumento de recursos para programas finalísticos seja uma “boa notícia”, o fato é que a Funai seguirá com severas dificuldades operacionais em 2018, sobrepostas às dificuldades e pressões políticas, o que tende a comprometer sua capacidade de executar o orçamento mesmo sendo ele tão reduzido. Isto aconteceu claramente em 2017. Somente 63,8% do orçamento autorizado para o Programa de “Proteção e Promoção dos Direitos dos Povos Indígenas” foi executado, já incluindo aí os chamados “restos a pagar”, que são aqueles compromissos de pagamento derivados de anos anteriores. Se considerado somente o que foi pago de compromisso assumido em 2017, a Funai conseguiu executar somente 44% do recurso que, teoricamente, tinha disponível. Isto porque, além do desmonte institucional, como já mostramos em outras notas, em 2017 os recursos da Funai também foram severamente comprometidos com os cortes orçamentários (contingenciamentos) que tiraram R$ 60,7 milhões de recursos do órgão, comprometendo principalmente as ações finalísticas.

>>>Leia também a Nota Técnica Orçamento e Direitos Indígenas na Encruzilhada da PEC 55

A Política Indigenista, assim como as demais políticas públicas e o orçamento público federal para 2018, sofre visivelmente a influência do Teto dos Gastos e da ideologia da austeridade fiscal sustentada pelo governo federal e incentivada pelo Banco Mundial. A fragilidade institucional e orçamentária da Funai é, também, reflexo da influência, por dentro do Estado, de pressões políticas de grupos de interesse que estão de olho no controle de terras e recursos naturais.

Nesse contexto, embora possa parecer alentador um aumento de recursos para a Funai, dificilmente este ganho se reverterá em alguma melhora efetiva na vida dos povos indígenas.


[1] – Optamos por utilizar os dados do orçamento inicial (dotação autorizada na Lei Orçamentária) em cada ano para buscar uma maior equivalência com o orçamento inicialmente aprovado em 2018. Ao longo do ano o orçamento sofre alterações seja em função de cortes (contingenciamento) seja em função da abertura de créditos que ampliam (marginalmente) a dotação autorizada. Em 2017 a Funai iniciou com um orçamento de R$ R$ 548,65 milhões, mas ao longo do ano este orçamento foi levemente ampliado alcançando R$ 560,15 milhões.

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Retrospectiva 2017: confira algumas das nossas principais lutas ao longo do ano

Estamos encerrando 2017 com a certeza de que fizemos o nosso melhor! Definitivamente, não foi um ano fácil: enfrentamos muitos desafios e retrocessos sociais, mas continuamos de cabeça erguida e lutando por justiça social.

Fizemos um levantamento de nossas principais lutas e conquistas em 2017. Muitos desses desafios terão sequência no ano que vem e contamos com sua parceria! Que venha 2018, pois estamos prontos para encarar os desafios com a mesma disposição, criatividade e esperança de sempre!

Confira:

JANEIRO

Já no começo do ano, a gente precisou defender as políticas de demarcação de terras indígenas dos ataques do governo Temer. Diversas organizações, entre elas o Inesc, divulgaram nota conjunta de repúdio à Portaria MJ n.º 80/2017, do Ministério da Justiça, e exigiram atuação do governo federal pelo fortalecimento da Funai. Leia aqui.

FEVEREIRO

Outra medida do governo ilegítimo de Temer precisou ser combatida: a “reforma” do ensino médio. Artigo de Cleo Manhas, assessora política do Inesc, questionou a ausência de temas importantes no texto da reforma, como bullying provocado por LGBTfobia, racismo, gravidez na adolescência, necessidade de trabalhar precocemente. Leia aqui.

MARÇO

Para marcar o Dia Internacional da Mulher deste ano, o Inesc decidiu juntar forças com o site Outras Palavras para a publicação de uma série de artigos sobre os atuais desafios do feminismo e como a maior parte das lutas são transversais. Reunindo textos dos assessores políticos do Inesc, a série abordou temas como justica fiscal, direito à cidade, igualdade racial, educação e homo e transfobia. Leia aqui.

ABRIL

Nesse mês, debate promovido pela Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político, com apoio do Inesc, reuniu representantes de diversas organizações para discutir os rumos do país após um ano do golpe institucional e perguntar: afinal, qual democracia o Brasil quer? Leia aqui.

MAIO

Artigo da nossa assessora política Grazielle David fez um apanhado das medidas de austeridade adotadas no país pelo governo de Temer até maio de 2017. Até então, muita maldade já tinha sido feita contra os brasileiros, sendo a mais perversa delas a execução da Emenda Constitucional do Teto dos Gastos, aprovada no ano anterior. Leia aqui.

JUNHO

Nesse mês divulgamos uma Nota Técnica sobre o modelo mineral brasileiro, que discute os favorecimentos tributários obtidos pelo setor em meio à crise fiscal e econômica brasileira, e violação de direitos socioambientais que as grandes empresas mineradoras promovem com dinheiro público. Leia aqui.

JULHO

Em julho, continuamos denunciando os efeitos das medidas de austeridade adotadas pelo governo. Análise de Alessandra Cardoso, Grazielle David e Iara Pietricovsky alerta para a improbabilidade de o Brasil cumprir com os compromissos assumidos na Agenda 2030, da ONU, devido à falta de um orçamento adequado para o financiamento de políticas públicas que enfrentem a desigualdade social no país. Leia aqui.

AGOSTO

Em agosto completamos 20 anos sem Betinho, um grande parceiro do Inesc na luta contra a fome e por direitos.Uma entrevista com Nathalie Beghin, coordenadora da Assessoria Política do Inesc que conviveu com o sociólogo no início dos anos 1990, foi nossa forma de homenageá-lo. Leia aqui.

SETEMBRO

No Dia Mundial Sem Carro, comemorado em 22 de setembro, publicamos artigo no jornal Correio Braziliense dos assessores políticos Cleo Manhas e Yuriê Baptista, sobre a situação da mobilidade urbana no Distrito Federal. Leia aqui.

OUTUBRO

Diante das notícias de que a fiscalização do trabalho escravo corria o risco de ser interrompida por ausência de recursos, o Inesc elaborou Nota Técnica que analisou os dados dos contingenciamentos orçamentários realizados pelo governo federal em 2017. Leia aqui.

NOVEMBRO

No Dia Nacional da Consciência Negra, 20 de novembro, denunciamos: Apenas 6% do recurso federal para a promoção da igualdade racial havia sido executado até a data. Nenhum centavo tinha sido gasto, por exemplo, com o Disque Igualdade Racial, que atende vítimas de racismo. Leia aqui.

DEZEMBRO

Mesmo após 70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos ainda foi preciso afirmar: acesso à saúde, educação, alimentação adequada, moradia e meio ambiente saudável são direitos essenciais. Não são opcionais. Por isso o Inesc realizou a Semana dos Direitos Humanos, onde divulgamos textos dos nossos assessores sobre a temática, a partir de diferentes enfoques. Leia aqui.

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MP 795: se não é trilhão, o que é então?

Indiscutivelmente, um dos grandes méritos da “Nota Técnica do Trilhão” é ter colocado em evidência uma matéria que passava, como tantas outras, despercebida pela opinião pública brasileira. A MP do Trilhão é agora amplamente conhecida como aquela que aumenta expressivamente isenções tributárias para todas as empresas petroleiras e que terá pelo menos duas consequências importantes: 1) maiores isenções significam menor arrecadação e, por suposto, menos orçamento para políticas públicas; 2) maiores investimentos para exploração do petróleo brasileiro, potencializados por menores custos tributários, significam maiores emissões de gases de efeito estufa – e isto tem consequências para o Planeta.

Por isso, ao contrário do que sugere o texto publicado pelo jornal Jornal Folha de S. Paulo, em 14 de dezembro, na coluna do jornalista Vinícius Torres Freire, independente das polêmicas técnicas, a mensagem do trilhão cumpriu o importante papel de descortinar um debate que não pode ser somente técnico-econômico, porque é essencialmente político, social e ambiental.

A propósito da matéria, o autor da “Nota Técnica do Trilhão” apresenta argumentos adicionais para sustentar sua posição técnica de que interpretações do artigo 1º da MP 795 “podem gerar renúncia fiscal da ordem de R$ 1 trilhão”.

Veja aqui resposta do autor da NT do Trilhão à matéria publicada pela Folha de São Paulo

Sim, sabemos que são muitos os fatores que afetarão, ao fim e ao cabo, o comportamento tributário do setor petroleiro depois desta MP, já que estamos falando de uma exploração em um futuro que é sempre incerto, com condições de partilha que dependerão de leilões que ainda não ocorreram, além da interação entre muitos fatores econômicos em um setor complexo e com muitos efeitos de encadeamento em sua cadeia produtiva, etc e etc…

Contudo, as ressalvas e críticas aos parâmetros e cálculos que chegaram ao trilhão, expressas tanto na Nota Explicativa da Receita Federal quanto na Nota Técnica da Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados, tampouco são claras na avaliação do tamanho do subsídio, confirmando uma conduta deste governo e dos legisladores que o apoiam de ser pouco transparente.

Do ponto de vista tributário, somente o futuro dirá o tamanho real dos subsídios às empresas petroleiras que aqui estão e que para cá virão. Mas não ficaremos sabendo – este é um ponto importante – porque depois da guerra de simulações que estamos vendo, o setor seguirá seu rumo, seus investimentos e seus subsídios ficarão protegidos pelo sigilo fiscal. O sigilo fiscal nos impede de saber quanto existe realmente de subsídios e quem se beneficia deles. Por isto, defendemos o fim do sigilo fiscal para os beneficiários dos gastos tributários no Brasil, assim como ocorre com os inscritos na Dívida Ativa da União.

Do ponto de vista orçamentário, se a isenção não é compensada por “medidas de compensação por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição” como prevê a Lei de Responsabilidade Fiscal” (Artigo 14, inciso II), ela implicará, necessariamente, em menos recurso para políticas públicas. Em outras palavras, a Medida Provisória 795 não apresentou, como prevê a LRF, como será compensada essa perda de arrecadação. Logo, sobrou para todos nós, brasileiros e brasileiras, pagarmos a fatura do subsídio às petroleiras com medidas do tipo Teto dos Gastos e Reforma da Previdência.

Por fim, do ponto de vista ambiental, as consequências do aumento da produção de petróleo serão creditadas ao nosso Planeta, que terá que lidar com mais emissões, além das projetadas.

Trilhão ou não, os subsídios são altos e têm muitas consequências!

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