Orçamento de 2021 mantém equilíbrio fiscal acima das necessidades da população

No dia 31 de agosto, o executivo enviou para o Congresso Nacional o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) 2021, com todos os gastos que o governo pretende realizar no próximo ano. Em um cenário de crise econômica, social, política e sanitária, faz-se ainda mais fundamental analisar esse instrumento sob a ótica dos direitos humanos, para entender quais os planos e prioridades do governo Bolsonaro para ano que vem, já que o documento não prevê os impactos da pandemia em 2021. O PLOA ainda será emendado pelos parlamentares (entre 1 e 20 de outubro) e precisa ser aprovado até o final do ano.

O Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO), enviado para o Congresso em abril, já foi analisado pelo Inesc. O texto coloca que o Teto de Gastos será a “âncora fiscal” de 2021, pois o governo não pretende gastar ano que vem além do delimitado pelo teto. Atitude diferente da que o governo tomou este ano, quando vem realizando gastos extraordinários além do teto para enfrentar a pandemia, ainda que estes gastos tenham apresentado graves atrasos em sua execução.

No PLOA não é diferente. Seguindo as diretrizes do PLDO, a pandemia e suas consequências se restringirão a 2020, e em 2021 voltaríamos ao normal, com prioridade para o equilíbrio fiscal e redução do déficit primário. “Não trabalhamos com extensão de calamidade para 2021”, disse Waldery Rodrigues, secretário especial de Fazenda do Ministério da Economia, ao justificar que os gastos extraordinários em função da pandemia ficaram restritos a 2020.

Mas o que é o “normal”? O país está mergulhado numa recessão econômica e vivenciando cortes de gastos sociais há anos que, como analisado pelo Inesc, deixaram o Brasil sem imunidade para o enfrentamento da Covid-19. As consequências da pandemia sequer são completamente conhecidas, que dirá superadas. Indiferente a esse cenário, o governo pretende voltar à austeridade e aos cortes aos gastos sociais.

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Veja abaixo o que isso significa em termos de garantia de alguns direitos: saúde, meio ambiente, povos indígenas, mulheres, população negra e criança e adolescente.

Saúde: governo Bolsonaro ignora a pandemia e suas consequências

A saúde foi uma das áreas que sofreu cortes com o PLOA 2021 apesar de o Brasil ser o epicentro da pandemia do novo coronavírus na América Latina. O projeto de lei, que reserva R$ 136,7 bilhões para o Ministério da Saúde, simplesmente ignora a continuidade da pandemia da Covid-19 e seus efeitos no próximo ano. O recurso previsto tem quase R$ 40 bilhões a menos que a dotação atual do programa em 2020 e é apenas 4% maior que o apresentado no PLOA 2020. O governo federal desconsidera também o aumento do desemprego resultante da crise econômica, que certamente fará com que várias famílias fiquem sem plano de saúde e passem a depender do SUS.

A principal queda em relação à verba autorizada em 2020 é observada no programa de Atenção Especializada, que tem cerca de 40% a menos de recursos. Ou seja, a gestão do Presidente Bolsonaro não pretende contribuir com a manutenção dos leitos de UTI que foram criados para o enfrentamento da pandemia. Ademais, a Atenção Básica e o Desenvolvimento Científico e Tecnológico terão perdas de 13% e 3%, respectivamente. Apesar da importância de uma vacina contra o novo coronavírus, os programas de Assistência Farmacêutica e Vigilância em Saúde, de onde sairão os custos para sua aquisição, e o programa de Vacinação terão aumentos irrisórios, por volta de 4%. Em resumo, em 2021 o governo federal pretende manter sua gestão negacionista e irresponsável da saúde pública.

Educação: ainda estamos longe de cumprir o PNE

Para a Função Educação, foram pervistos R$ 108,8 bilhões (2020) e  R$ 111,8 bilhões (2021): apenas R$ 3 bilhões a mais diante do atual quadro de crise e abandono da política de educação por parte do governo federal. Para as ações de Manutenção e Desenvolvimento da Educação (MDE) previu-se R$ 95 bilhões (2020) e R$ 98 bilhões (2021) , os mesmos R$ 3 bilhões a mais, ainda que o sistema de educação atravesse uma de suas maiores crises, advinda da pandemia: escolas públicas precisam se adaptar sem recursos financeiros ou tecnológicos, agravando desigualdades entre estudantes de escolas públicas e privadas, especialmente das periferias, zonas rurais, territórios indígenas e quilombolas. Então, em vez do poder público investir mais recursos para mitigar os efeitos da crise sanitária, que também se transformou em uma crise para a educação, há recursos de menos e maiores responsabilidades para os entes que menos arrecadam.

Há um Plano Nacional de Educação a ser cumprido, o qual registra em sua meta 20 que a partir de 2019 o financiamento da educação deveria ficar em 7% do PIB e 10% em 2024. Ao que tudo indica, o Brasil caminha no sentido contrário, não apenas com relação aos recursos, como também na busca por educação de qualidade.

Direito à cidade: orçamento não garante segurança no direito ao transporte

O PLOA 2021 propõe para a função Urbanismo R$ 1,5 bilhão: R$ 200 milhões a menos do que foi aprovado para 2020. As principais políticas que possibilitam maior acesso ao direito às cidades inserem-se nesta função orçamentária, tais como projetos de acessibilidade, reformulação de áreas centrais, urbanização de assentamentos precários, regularização fundiária, além de implementação, modernização e contribuição para o funcionamento dos sistemas coletivos de transporte urbano.

A parte que cabe à União é apoio a estas ações que são de responsabilidade dos municípios. No entanto, este ente federado é quem menos arrecada, especialmente os de menor porte. São, ainda, os que mais têm sentido os efeitos da pandemia. Aqueles que precisam de um sistema de transporte urbano e rural estão sofrendo nas mãos de empresas, que cobram caro do poder público para não fecharem as portas. O Governo Federal, portanto, tem obrigação de aportar mais recursos para contribuir com a urbanização das favelas, locais com menos acesso a água potável e saneamento básico. Os recursos propostos não atendem às necessidades mais básicas da população, como ir e vir com tarifas acessíveis e segurança contra os efeitos da pandemia, ao serem ofertados mais veículos para locomoção, evitando aglomerações.

Meio Ambiente: o desmonte orçamentário segue como projeto de governo

Entre 2019 e 2020, assistimos a sucessivas medidas infra legais de esfacelamento da capacidade institucional dos órgãos vinculados ao Ministério do Meio Ambiente (MMA), o que amplificou a dificuldade desses órgãos executarem seus poucos recursos autorizados. Em 2021 a tendência é que isto piore. O MMA, incluindo o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e o Instituto de Pesquisa Jardim Botânico do Rio de Janeiro (IJBRJ), perdeu 35% do orçamento se comparado ao PLOA 2020 e 40% se comparado à dotação atual.

No PLOA 2021, a previsão de corte de pessoal e encargos é de 45% se comparado com o valor autorizado para o ano em curso. A falta de pessoal tem sido motivo de alerta e denúncia, nacional e internacional.

Além disso, observa-se uma queda geral de recursos para ações finalísticas. Duas perdas chamam atenção. Primeiro, no programa “Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade e dos Recursos Naturais”, sob responsabilidade do ICMBIo. No PLOA de 2021 o programa perde R$ 33 milhões, se comparado ao PLOA  2020. Segundo, a extinção em 2021 do programa “Prevenção e Controle do Desmatamento e dos Incêndios nos Biomas”. Cabe lembrar, como já analisado pelo Inesc, que na tramitação do PPA 2020-2023 no Parlamento este programa havia sido inserido por meio de emenda, com uma meta de redução do desmatamento e incêndios ilegais nos biomas em 90% durante os quatro anos do PPA, com  a linha de base estabelecida em dezembro de 2019. E, ainda, que no primeiro semestre de 2020 houve um aumento de 24% no desmatamento se comparado ao primeiro semestre de 2020: foram 2.544 km² de floresta perdida. Em 2020 o orçamento atual deste programa é de R$ 173 milhões dos quais foram gastos até agosto R$ 48 milhões somente.

O Ministério da Defesa vinha há dois anos arregimentando recursos públicos para operações de Garantia da Leia e da Ordem (GLO) e intensificando a presença militar na Amazônia. Esta estratégia, do ponto de vista orçamentário, perdeu fôlego, pelo menos se analisado na perspectiva da intenção do governo expressa no PLOA 2021. De uma dotação atual de R$ 1,68 bilhão para ações vinculadas à Amazônia, restou no PLOA 2021 apenas R$ 112 milhões. Há que se notar, contudo, que ao longo do ano de 2020 os militares conseguiram aprovar créditos suplementares que inflaram ainda mais seu orçamento, movimento que tem passado desapercebido do debate público.

Indígenas: aumento do orçamento para a saúde indígena deve ser monitorado

Em uma primeira análise, a comparação entre o orçamento atribuído para a Funai pelo PLOA 2021 parece otimista: no ano que vem o órgão conta com cerca de R$ 11,5 milhões a mais do que no PLOA 2020 e R$ 6,1 milhões a mais que a dotação atual. No entanto, boa parte desses recursos está sujeita à aprovação legislativa, devido ao sufocamento orçamentário fruto da Regra de Ouro: dos R$ 648,5 milhões atribuídos para a Funai em 2021, R$ 338,5 milhões estão sujeitos à aprovação do Congresso. Além disso, o acréscimo orçamentário previsto para o ano que vem está longe de ser suficiente para recuperar a esgarçada estrutura do órgão. O valor, por exemplo, está muito distante dos R$ 870 milhões atribuídos à Fundação em 2013, o que representa uma queda de 26%.

No que tange à Saúde Indígena, o PLOA 2021 atribuiu R$ 67,9 milhões a mais para a principal ação orçamentária da área, totalizando R$ 1,4 bilhão. É possível que tal aumento seja resultado das mobilizações por ações mais efetivas no enfrentamento ao novo coronavírus nos territórios indígenas. No entanto, levando em conta que um estudo recente do Inesc demonstrou que a os recursos para a Saúde Indígena não têm chegado mesmo diante da pandemia, e que em setembro segue na taxa de 62% de execução orçamentária, resta saber se o acréscimo orçamentário na principal ação da saúde indígena implicará em melhor atendimento para indígenas por parte da SESAI.

Mulheres e População Negra: baixa execução orçamentária em 2020 não pode continuar

Os recursos para garantir direitos humanos no orçamento do governo Bolsonaro foram, em sua maior parte, aglutinados em um só programa orçamentário, executado pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH). O PLOA 2021 prevê R$ 132,3 milhões para este programa, que abriga políticas para diversos públicos: mulheres, população negra, idosos, crianças e adolescentes, pessoas com deficiência, indígenas e quilombolas. Esse recurso é 66% inferior ao PLOA 2020 (R$ 394 milhões) e 77% inferior ao autorizado em 2020 (R$ 575 milhões), que leva em consideração o incremento dos créditos extraordinários da Covid-19.

Para as políticas específicas voltadas para a promoção dos direitos das mulheres, o PLOA 2021 prevê apenas R$ 1 milhão, a ser investido na implementação de Casas da Mulher Brasileira e Centros de Atendimento à Mulher. Esta ação conta em 2020 com quase R$ 64 milhões, mas nenhum recurso foi pago até o presente momento. Outras ações orçamentárias para mulheres não foram citadas no PLOA para o ano que vem, como por exemplo, a Ação Políticas de Igualdade e Enfrentamento a Violência contra as Mulheres, que em 2020 conta com R$ 24 milhões, mas apenas R$ 1,5 milhão foram executados.

As políticas de enfrentamento ao racismo são de responsabilidade do MMFDH, que possui inclusive uma Secretaria Nacional dedicada ao tema. Todavia, assim como em 2020, não há recursos específicos para estas políticas, a não ser para o funcionamento do Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial.

Sobre os quilombolas, o MMFDH também não destinou qualquer recurso para esse grupo, ainda que seja possível que verbas de ações mais genéricas possam ser alocadas ao longo de 2021. No que se refere à regularização fundiária dos territórios quilombolas, realizada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), a situação é vergonhosa: o PLOA 2021 prevê cerca de R$ 330 mil reais. Em 2020, R$ 3,2 milhões foram autorizados para esta ação, mas nada foi pago até o momento. O governo prevê R$ 80 milhões para Ações e Serviços de Saneamento Básico em Pequenas Comunidades Rurais ou Comunidades Tradicionais – entre elas, quilombos. O programa apresenta um valor significativo, considerando que em 2020 não teve dotação orçamentária. Contudo, os valores apresentados para 2021 são 20% menores que o efetivamente observado em 2019, quando a ação teve execução de R$ 100 milhões. O Programa de Segurança Alimentar e Nutricional, por sua vez, destinou R$ 18,6 milhões para a distribuição de alimentos a grupos populacionais tradicionais e específicos. Em 2020, essa política contou com R$ 7,2 milhões, mas até o momento foram pagos somente R$ 364 mil reais. Por fim, para a Fundação Cultural Palmares foram destinados apenas R$ 2,7 milhões, um corte de 35% em relação aos R$ 4,2 milhões autorizados em 2020, dos quais foram executados 50% até o momento.

Podemos aferir que a execução orçamentária das políticas para mulheres e população negra em 2020 está muito baixa e as perspectivas para 2021 não são promissoras.

Criança e adolescente: o desmonte das políticas da infância e adolescência

A política de promoção, proteção e defesa dos direitos da criança e do adolescente vem sendo progressivamente desmantelada. No PPA 2020-2023, a palavra adolescente sequer aparece e o programa voltado para o público em questão foi excluído. O único programa direcionado a esses sujeitos de direitos é o de Atenção Integral à Primeira Infância, que contém ações na área da assistência social para crianças desde a gestação até os 6 anos de idade. A proposta do orçamento do ano que vem apresenta valores inferiores aos disponíveis atualmente: o PLOA 2021 prevê R$ 448 milhões para este programa, 13% inferior ao previsto na PLOA 2020 e 7% a menos da dotação atual do programa.

Algumas outras ações direcionadas a crianças e adolescentes estão inseridas no programa Proteção à Vida, Fortalecimento da Família, Promoção e Defesa dos Direitos Humanos para Todos. A única ação orçamentária específica é a Construção, Reforma, Equipagem e Ampliação de Unidades de Atendimento Socioeducativo que tem alocação no PLOA 2021 de R$ 1,6 milhões, bem maior que a PLOA 2020, que tinha previsto apenas R$ 450 mil. Contudo, esse valor é 79% menor do que a dotação atual. Quanto ao Funcionamento do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, diferentemente do observado nas demais iniciativas, o valor previsto na PLOA 2021 é bem maior do que a PLOA 2020 e do que a dotação atual, R$450 mil, uma diferença de quase 90%.

O Projeto de Lei Orçamentária para 2021 aloca R$ 279 milhões para a Educação Infantil, 68,79% a mais do que a PLOA 2020. Deve-se garantir que esse valor seja aprovado pelo Congresso Nacional, pois o déficit de creches e de escolas de educação infantil é expressivo no Brasil. Por fim, em relação ao enfrentamento do trabalho infantil, o PLOA 2021 prevê um aumento de 60% em seus recursos. A execução dessas políticas em 2020, porém, está muito baixa. Urge, portanto, monitorar se os recursos prometidos de fato serão gastos para o combate ao trabalho infantil.

Confira o resumo dos principais pontos da análise.

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Nota técnica do Inesc é utilizada em documento apresentado ao STF

Em agosto, o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) divulgou a Nota Técnica “Orçamento Público voltado para as comunidades quilombolas no contexto da pandemia Covid-19”. Elaborada por Carmela Zigoni, a Nota apresenta os dados do Orçamento Geral da União destinados ao financiamento de políticas públicas voltadas para comunidades quilombolas em 2020 e informações dos anos anteriores.

A ausência de recursos alocados em políticas públicas de desenvolvimento sustentável e regularização fundiária, e a não execução desses recursos (quando existentes) são algumas conclusões da Nota, que ainda chama atenção para a importância do auxílio emergencial. Os quilombolas atendem os critérios do programa, contudo, a maioria não foi incluída como beneficiária da transferência de renda por ter sua realidade de vida desconsiderada pelo governo federal.

Luta quilombola

A Nota Técnica do Inesc foi utilizada para a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 742  (ADPF/ 742) apresentada pela Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) ao Supremo Tribunal Federal nesta semana. Resumidamente, a ADPF pode ser entendida como uma ação destinada a combater o desrespeito aos conteúdos mais importantes da Constituição, como os direitos fundamentais.

O documento destaca como a Covid-19 afetou distintos setores da população brasileira de formas diferentes. Fatores como racismo estrutural e institucional colocaram as comunidades quilombolas em maior grau de vulnerabilidade aos efeitos da pandemia. De acordo com o levantamento autônomo da Conaq, até quarta-feira (09/09), o novo coronavírus havia infectado 4.541 pessoas e feito 157 vítimas entre os quilombolas. A taxa de letalidade desse grupo é de 3,6%, enquanto a da população em geral é de 3,1%.

Das várias informações contidas na Nota, a Conaq destacou a ausência de  políticas públicas específicas para comunidades quilombolas no Plano Plurianual (PPA) 2020-2023 e de políticas públicas de saúde específicas, incluídas no orçamento geral do Sistema Único de Saúde (cujo subfinanciamento foi de R$ 20 bilhões em 2020).

Outros dados relevantes apontados pelo Inesc também integraram a ADPF/ 742. Apesar da autorização de R$ 3,2 milhões da Ação Orçamentária para Reconhecimento e Indenização de Territórios Quilombolas, a ser executada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), nenhum recurso tinha sido pago até o fechamento da Nota. O mesmo aconteceu com os recursos destinados para a promoção da igualdade racial – mesmo em meio à crise de saúde.

Para Carmela Zigoni, o fato de a Nota Técnica denunciar o fim das políticas de igualdade racial no Brasil com o governo Bolsonaro é algo tão relevante que integrou a ADPF/ 742. “Além disso, a baixa execução de programas fundamentais para proteger os quilombolas, no meio de uma pandemia, revela o racismo institucional do governo, e a incapacidade de cuidar dos mais vulneráveis, aqueles com quem o Brasil tem uma dívida histórica”, diz Carmela.

Orçamento público voltado para as comunidade quilombolas no contexto da pandemia da Covid-19

A Nota Técnica apresenta os dados do Orçamento Geral da União destinados ao financiamento de políticas públicas voltadas para comunidades quilombolas em 2020, bem como a série histórica dos anos anteriores, com o objetivo de visibilizar a situação precária das ações de enfrentamento à Covid-19 que protejam e promovam os direitos destas comunidades. É preciso iniciar dizendo que não existem mais políticas públicas específicas para comunidades quilombolas no Plano Plurianual (PPA) 2020-2023. Isso significa que não há planejamento para implementação destas políticas públicas, nem programas orçamentários específicos para promoção dos direitos dos quilombolas, gerando os seguintes efeitos:

Para ler o orçamento

Quando falamos de orçamento, são muitos os nomes e siglas que podem acabar dificultando nossa leitura e entendimento de materiais muito importantes para nos apropriarmos do orçamento público. Para ajudar nossas leitoras e leitores, apresentamos um resumo dos principais termos orçamentários adotados em nossas análises.

PPA, LDO e LOA

PPA é o Plano Plurianual. Ele é o responsável por definir estratégias, diretrizes e metas da administração pública para os próximos 4 anos. O PPA tem vigência do segundo ano de um mandato presidencial até o final do primeiro ano do mandato seguinte.

Anualmente, o Poder Legislativo precisa aprovar o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA). A Lei Orçamentária Anual (LOA) estima as receitas e programa as despesas de cada ano, e é regida pelo PPA e pela LDO.

PLOA e PPA são entregues juntos e ambos precisam ser aprovados pelo Legislativo até o dia 22 de dezembro..

LDO é a Lei de Diretrizes Orçamentárias, que traz regras para elaborar e executar o orçamento do ano seguinte, definindo prioridades e metas do governo.

 

Gostou? Se você quiser se aprofundar mais um pouco, acesse nossa metodologia Orçamento & Direitos, e nossa aula sobre orçamento público no Youtube.

Democracia Vive! discute os perigos que a democracia brasileira enfrenta

A live Democracia Vive! acontecerá no domingo, 13 de setembro, a partir das 15h. Organizada em palco virtual, é mais uma ação da campanha Brasil pela Democracia, da qual o Inesc faz parte. A proposta é falar com toda a população sobre  por que e como a democracia brasileira está em risco. Expor que desigualdade, desemprego, racismo, machismo, homofobia, desmatamento, fake news, violência, ataque às instituições formam o caldo que ameaça a democracia brasileira.

Alcione e Marcelo D2 cantarão juntos. Elza Soares e Flavio Renegado, também. Felipe Neto e Patrícia Campos Mello irão de prosa. Samuel Rosa e Djamila Ribeiro, de prosa e música. Lideranças de torcidas organizadas rivais estarão juntas em um bate-papo. Representantes da OAB, Centrais Sindicais, ABI, Ethos, MST e mais de 70 entidades, organizações e movimentos sociais vão dar a letra em três jograis. Terá todo tipo de som, de Lulu Santos a Odair José. Terá a palavra de quem cresceu na luta, como Preto Zezé ou se engajou nela pelo esporte, como Joanna Maranhão.

Todos e todas vão falar sobre democracia e vida, assunto que pulsa hoje nesse país que enterrou mais de 120 mil homens e mulheres vítimas de COVID-19, em cinco meses de pandemia; que tem 55 milhões de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza (com R$ 406/mês), 13 milhões de desempregados e 5,7 milhões de desalentados.

Brasil pela Democracia

A campanha é uma ampla rede da sociedade civil unida na defesa da democracia – ameaçada por incessantes ataques às instituições e aos princípios e valores da convivência democrática – e da vida – em risco pela irresponsabilidade e ineficiência no combate ao coronavírus.

Lançada em 29 de junho por 80 entidades e movimentos, tem coordenado ações virtuais e offline em todo o País. Em 13 de setembro, pensadores, artistas, pesquisadores, gente do povo e suas histórias se somarão aos demais atores que participaram de ações anteriores, como a Virada da Democracia, realizada em julho. Confira.

Programação da live

Apresentam
Roberta Estrela D’alva
China

Cantam
Lulu Santos
Odair José
Aíla
Salgadinho
Francisco El Hombre
Nanda Costa e Lan Lahn
Maciel Salú
Raul Ellwanger
Luna Vitrolira e Vinícius Terra

Falam
Danilo Pássaro, coordenador nacional do Movimento Somos Democracia e membro da Gaviões da Fiel)
Marcos Gama, fundador do Porcomunas e conselheiro do Palmeiras
Felipe Neto e Patrícia Campos Melo
Preto Zezé e Nilce Moretto
Célia Xakriabá e Joanna Maranhão
Paulo Galo e Eduardo Moreira
Ailton Krenak e Alice Braga

Encontros musicais
Alcione e Marcelo D2
Elza Soares e Flavio Renegado

Cantam e falam
Samuel Rosa e Djamila Ribeiro
B Negão e Maria Bopp
Kiara Felippe e Augusto Arruda de Botelho
Aíla e Paulo Vieira

Depoimentos
Lilia Schwarcz
Leonardo Sakamoto

A Palavra de quem criou a Campanha #BDV
Os presidentes e líderes das entidades que compõem a campanha darão a letra conjuntamente (ver a lista abaixo) em três jograis.

Saiba Mais

Live Democracia Vive
Organização – Campanha Brasil pela Democracia
13 de setembro, domingo
A partir das 15h
Onde: https://www.youtube.com/brasilpelademocracia

Site: www.brasilpelademocracia.org.br
Facebook: https://www.facebook.com/brasilpelademocracia
Twitter: https://twitter.com/bra_democracia
Instagram: https://www.instagram.com/brasilpelademocracia_

Nota técnica aponta medidas para País superar as consequências político-sociais da Covid-19

A nota técnica “Recuperação ou reconstrução econômica? As opções do Brasil diante de uma crise sem igual e de soluções globais assimétricas”, de Antonio Lassance, é o resultado de reflexões sobre a crise mundial provocada pela pandemia da Covid-19. No texto, o doutor em Ciência Política pela Universidade de Brasília (UnB) e associado do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), adverte sobre o impacto econômico ser apenas a ponta do iceberg de uma grande crise humanitária que pode se prolongar por várias décadas.

Publicada em setembro de 2020, a nota deixa uma série de provocações relevantes para pensar não só o caso brasileiro, mas de todo o mundo. De acordo com o autor, “a grande pergunta que se coloca, no entanto, não é o que a pandemia e a recessão que a acompanha farão dos países por elas afetados. A grande pergunta é o que as sociedades e seus governos farão para superar o atual desastre”.

O alastramento pandêmico das contaminações e mortes em decorrência da Covid-19 é um problema de longo prazo que exigirá não apenas recuperação, mas reconstrução de vários empreendimentos. Uma solução que parece ser efetiva, com avanços significativos, é aplicar um plano que reforce inserção internacional soberana do país.

Para tal projeto, Lassance indica três passos: reatar os laços multilaterais com os parceiros continentais da América do Sul; desenhar uma política ampla e integrada de reconstrução econômica (revisando o Plano Plurianual); e criar uma nova arquitetura das finanças públicas, com a introdução de requisitos de progressividade tributária.

Analogia do Plano Marshall

O cenário atual leva a uma inevitável comparação às medidas aplicadas pelo Plano Marshall, programa de ajuda econômica dos Estado Unidos aos países da Europa Ocidental após a II Guerra Mundial, entretanto, o associado do Inesc aconselha cuidado com essa analogia.

“Qualquer programa de reconstrução econômica com a envergadura que a atual crise demanda para o Brasil exigirá uma sustentabilidade de longo prazo pouco compatível com reformas que estejam atinentes apenas às variáveis de gasto público. As características da crise impõem expansionismo de gastos e, eventualmente, da base monetária do país, e sobretudo expansão das fontes e do volume de receita. Na ausência desses fatores, qualquer alusão genérica ao Plano Marshall é descabida e tímida a uma tarefa de reconstrução”, opina Lassance.

Recomendações

O documento ainda traz outras recomendações, como prioridade à conclusão de projetos já iniciados; reforço do papel de coordenação e cooperação técnica dos órgãos

Federais; garantia da sustentabilidade fiscal do setor público; e aplicação de soluções transparentes; consistentes e baseadas em evidências. Dessa maneira, Antonio Lassance acredita que é possível evitar que o esforço de reconstrução seja “capturado por grupos predatórios, interessados em vantagens restritas e ineficientes”.

Lassance também aponta a importância em definir prioridades de médio e longo prazo com uso do método de coordenação aberta, que consiste em fixar objetivos bem definidos e metas gerais no âmbito da política, sem deixar de lado os programas e as propostas de entrega.

“Transpondo esse desafio para atual crise da Covid-19, torna-se necessária a prorrogação dos auxílios emergenciais às famílias, enquanto persistir a pandemia e suas consequências econômicas, e a facilitação do crédito às empresas”, observa Lassance, que sugere políticas de recuperação em programas adaptados às dinâmicas econômicas regionais e locais, incorporando estados, municípios e Distrito Federal como proponentes.

 

Recuperação ou reconstrução econômica? As opções do Brasil diante de uma crise sem igual e de soluções globais assimétricas

A nota técnica “Recuperação ou reconstrução econômica? As opções do Brasil diante de uma crise sem igual e de soluções globais assimétricas”, de Antonio Lassance, é o resultado de reflexões sobre a crise mundial provocada pela pandemia da Covid-19. No texto, o doutor em Ciência Política pela Universidade de Brasília (UnB) e associado do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), adverte sobre o impacto econômico ser apenas a ponta do iceberg de uma grande crise humanitária que pode se prolongar por várias décadas.

 

Nota de pesar: Edelcio Vigna, presente!

Foi com muita tristeza que recebemos a notícia da morte de Edelcio Vigna, a quem chamávamos carinhosamente pelo apelido de “Del”.

Edelcio começou a trabalhar no Inesc em 1988, quando ajudou a consolidar a Instituição, no período da abertura democrática, como importante mediadora entre a sociedade civil organizada e os parlamentares. Esteve conosco até 2013, deixando sua marca de dedicação, alegria e companheirismo.

O compromisso de Edelcio com as pautas e reivindicações dos movimentos sociais, especialmente os movimentos camponeses que lutam por reforma agrária, além de sua participação ativa na Assembleia Constituinte, fez com que seu trabalho fosse reconhecido em diversas ocasiões por importantes atores da sociedade civil.

Lamentamos profundamente a perda de mais uma vida para a Covid-19 e estendemos nossas condolências e solidariedade aos familiares e amigos neste momento tão difícil.

Cuidado com a pegadinha do governo sobre renda básica permanente!

O governo brasileiro e o Congresso Nacional estão dando todos os sinais de que pretendem instituir uma Renda Básica permanente no Brasil. Mas tem uma pegadinha: a equipe econômica tem falado de uma política tímida, em valores muito baixos, e que na prática eliminaria outros programas sociais para substituí-los por um pior e que atende menos gente. Não podemos deixar isso acontecer!

Por isso, as 270 organizações e redes que compõem a campanha Renda Básica Que Queremos elaboraram um documento com critérios a serem considerados pelos parlamentares na criação de uma política que atenda de fato a busca por equidade e direitos de cidadania.

É importante reconhecer e fortalecer o sistema de proteção social construído desde o processo constituinte de 1988. Vários sistemas e políticas públicas foram criados, que mesmo com limites, possibilitaram avanços significativos na construção de uma sociedade mais igualitária e justa. Citamos o SUS, SUAS, universalização da educação, políticas de fortalecimento da agricultura familiar e segurança alimentar e de enfrentamento à fome, além do próprio Programa Bolsa Família. Portanto uma Renda Básica Permanente deve ser implementada sem prejuízo de outras políticas de proteção social já implementadas.

>>> Leia o documento aqui

A lei da Renda Básica emergencial foi aprovada no Congresso em março, após uma grande campanha da sociedade civil, proposta por cinco organizações, entre elas o Inesc. Saiba mais sobre a campanha em www.rendabasica.org.br

Entidades pedem que Bolsonaro vete proposta que transfere dinheiro do Fundo Social do Pré-Sal para gasodutos

O Congresso Nacional aprovou, no último dia 13, proposta que prevê a transferência de recursos do Fundo Social do Pré-Sal para expandir rede de gasodutos do País. Um conjunto de 12 organizações sociais, entre elas o Inesc, publicou nota onde pede que o presidente Jair Bolsonaro vete a proposta.

Entre os argumentos utilizados pelas entidades está o respeito à legislação relativa ao Fundo Social, que determina que parte dos recursos provenientes das empresas que exploram as áreas do Pré-Sal seja usada para programas nas áreas de combate à pobreza, como educação e saúde pública – ainda mais essenciais em um contexto de crise econômica e social decorrente da pandemia do novo coronavírus.

Outro argumento utilizado foi o de que a medida cria um novo subsídio aos combustíveis fósseis que poderá estimular distorções no setor. “Vale lembrar que o setor de petróleo e gás já é extremamente subsidiado: somente o Regime Aduaneiro Especial de Exportação e de Importação de Bens Destinados às Atividades de Pesquisa e de Lavra das Jazidas de Petróleo e de Gás Natural (REPETRO), durante o período de 2015 a 2019, apresenta renúncias próximas à R$ 74 bilhões”, afirma a nota. Desde 2018, o Inesc publica estudos sobre os impactos climáticos, sociais e ambientais dos subsídios aos combustíveis fósseis no Brasil.

Confira a íntegra da nota e as instituições signatárias abaixo:

Brasduto: Tirar recursos da saúde e educação para subsidiar projetos de transporte de gás natural é apostar contra o Brasil

A possibilidade de transferência de recursos do Fundo Social do Pré-Sal para financiar a construção de gasodutos precisa ser vetada pela Presidência da República na sanção do Projeto de Lei do Senado 3.975, de 2019, como acordado na negociação do Executivo com o Senado. O projeto, que foi aprovado no dia 13 de agosto, prevê que o Fundo de Expansão dos Gasodutos de Transporte e de Escoamento da Produção (Brasduto) receba 20% dos recursos do Fundo Social.

Criada em 2010, a legislação relativa ao Fundo Social determina que parte dos recursos provenientes do petróleo e gás natural que a União recebe das empresas que exploram as áreas do Pré-Sal seja usada para programas nas áreas de combate à pobreza, como educação e saúde pública. Estimativas do governo indicam que o Fundo perderia R$ 97 bilhões no período de 2020 a 2040 com a criação do Brasduto[1].

A crise causada pela pandemia de Covid-19 reforça a importância dos investimentos em atividades que contribuam com o desenvolvimento humano e, consequentemente, a recuperação da economia. Não é criando distorções de mercado, subsidiando fontes fósseis de energia e retirando recursos de educação e saúde que será possível atingir isso.

A criação do Brasduto também vai em direção contrária às propostas liberalizantes defendidas pelo próprio setor de gás natural em legislação sobre o assunto que tramita no Congresso Nacional, como detalhado a seguir:

 

  • Os recursos do Fundo Social são fundamentais diante das condições socioeconômicas do país, tornando-se ainda mais relevante neste momento de grave crise econômica e social devida aos impactos da pandemia.
  • A possibilidade de uso dos recursos para construção de gasodutos contraria a legislação de criação do Fundo Social, que determina que a política de investimentos dos recursos tem por objetivo buscar a rentabilidade, a segurança e a liquidez de suas aplicações e assegurar sua sustentabilidade econômica e financeira para o devido cumprimento de suas finalidades. Importante frisar que, pela lei do Brasduto, as empresas só teriam de devolver o dinheiro quando os gasodutos se tornarem economicamente viáveis, o que abre a possibilidade de que sejam aplicados a fundo perdido e nunca devolvidos aos consumidores.
  • A iniciativa estimula a expansão do setor de combustíveis fósseis, que é a principal causa das mudanças climáticas. Está na contramão, portanto, da tendência de governos e iniciativa privada trabalharem em favor do desenvolvimento das fontes renováveis de energia.
  • A medida cria um novo subsídio que poderá estimular distorções no setor, favorecendo a construção de gasodutos que não necessariamente possuem viabilidade econômica e que poderão se tornar verdadeiros elefantes brancos inclusive por risco de faltar gás para transportar. Vale lembrar que o setor de petróleo e gás já é extremamente subsidiado: somente o Regime Aduaneiro Especial de Exportação e de Importação de Bens Destinados às Atividades de Pesquisa e de Lavra das Jazidas de Petróleo e de Gás Natural (REPETRO), durante o período de 2015 a 2019, apresenta renúncias próximas à R$ 74 bilhões[2].
  • Os gastos com saúde e a educação já vêm sofrendo graves cortes no orçamento, que se acentuaram após o Teto dos Gastos. Entre 2014 e 2019 a função “educação” sofreu uma perda de R$ 20 bilhões de execução orçamentária. Já o orçamento do Ministério da Saúde em 2019 apresentou o mesmo patamar, em valores reais, do orçamento de 2014, mostrando a estagnação de recursos para uma área prioritária. Precisamos inverter essa lógica, pois investimentos em saúde e educação são a base para o desenvolvimento de qualquer sociedade. No caso da saúde, isso foi evidenciado pela pandemia da Covid-19. Quanto à educação, vale lembrar que esse foi o caminho adotado por todas as nações que deram saltos de desenvolvimento nas últimas décadas.

A proposta é um contrassenso diante da perspectiva de liberalização do setor viabilizada pela nova Lei do Gás, em discussão no Congresso Nacional. Seguindo a lógica desse projeto de lei, os projetos de gasodutos devem ser estruturados de modo a atrair investidores privados interessados no segmento, por meio do mercado de capitais, como acontece em segmentos semelhantes de infraestrutura, como linhas de transmissão.

Pelos motivos narrados, as organizações da sociedade civil brasileira abaixo listadas pedem  o veto presidencial a esse dispositivo do PLS 3975/2019.

 

ENTIDADES SIGNATÁRIAS:

Associação Alternativa Terrazul

ECOA – Ecologia e Ação

Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Socioambiental

ICS – Instituto Clima e Sociedade

IDEC – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor

IEMA – Instituto de Energia e Meio Ambiente

INESC – Instituto de Estudos Socioeconômicos

International Rivers

ISA – Instituto Socioambiental

PSA – Projeto Saúde e Alegria

Uma Gota no Oceano

WWF-Brasil

[1] https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,congresso-retira-r-242-bi-de-saude-e-educacao-e-passa-a-estados-e-gasoduto,70003400226 

[2] https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2020/08/regularizacao-de-plataformas-e-cambio-elevam-a-r-28-bi-beneficio-fiscal-do-petroleo-em-2019.shtml

 

Em audiência na Câmara dos Deputados, Inesc denuncia descaso com a população negra e quilombola

Na tarde de quarta-feira (26/08), a assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Carmela Zigoni, participou da audiência pública virtual Impacto da Covid-19 nas populações negras e quilombolas, promovida pela comissão externa da Câmara dos Deputados.

Participaram da audiência parlamentares, especialistas e representantes da sociedade civil, entre eles, Carmela Zigoni, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).

Carmela apresentou dados do relatório Brasil com Baixa Imunidade, lançado em abril, que apontou o corte de 80% dos recursos do programa Enfrentamento ao Racismo e Promoção da Igualdade Racial, entre os anos de 2014 e 2019; e as consequências da extinção do Programa 2034 no novo Plano Plurianual 2020-2023. Além da ausência de recursos, exclui-se todas as menções aos públicos negro e quilombola, bem como ao racismo, do PPA.

Responsável por mulheres, idosos, indígenas, crianças e adolescentes, entre outras populações vulneráveis, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos também sofreu corte de recursos. O relatório comprova uma redução de 75%, entre 2014 e 2019, e a utilização de apenas 13% (R$ 77 milhões) dos R$ 575 milhões disponíveis atualmente.

Desmonte da política pública

O desmonte das políticas para quilombolas é nítido e foi destaque na apresentação de Carmela. Desde 2017, não há recurso disponível para regularização fundiária (Ação 210Y) e, desde 2018, acontece o mesmo em relação ao recurso para apoio ao desenvolvimento sustentável (Ação 210Z). A Fundação Palmares teve autorizado um recurso de R$ 21,3 milhões, contudo, não há rubrica específica para a população quilombola; e, dos R$ 115 mil autorizados para o Ministério (a serem utilizados com os quilombolas), até a terça-feira (25/08), nada tinha sido pago.

A assessora política do Inesc ainda relembrou que a maior parte dos infectados e das vítimas de Covid-19 são negros e pobres, afetados também com as consequências do Teto de Gastos em áreas como a saúde, que perdeu R$ 20 bilhões, e Urbanismo, que teve corte de 20% do orçamento desde o início da política de austeridade, e cujos recursos deveriam ser gastos com saneamento, mobilidade urbana e moradia.

“Dos 500 bilhões autorizados pelo Congresso Nacional para enfrentamento da Covid-19, 61% foram executados até agora. Em junho, como o Inesc denunciou, esse percentual era de apenas 30%. Os números melhoraram desde então, mas muito pouco”, comentou Carmela, que ainda ressaltou a importância da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2021: “Fazemos um apelo que seja observado pelo Congresso Federal: a pandemia não vai acabar dia 31 de dezembro de 2020”.

Todos os anos, a Lei de Diretrizes Orçamentárias define o destino dos recursos públicos do ano seguinte. Em um cenário de pandemia, tais recursos e sua destinação se tornam ainda mais relevantes, sobretudo, para a população negra e quilombola.

Também participaram da audiência: Luciana Valéria Pinheiro Gonçalves (Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos); Angela Pires Terto (ONU); Anatalina Lourenço (Central Única dos Trabalhadores); Valdecir Nascimento (Fórum Permanente de Igualdade Racial/Articulação de Organizações de Mulheres Negras Brasileiras); Selma Dealdina (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas); Douglas Belchior (Coalizão Negra por Direitos) e Marcia Alves (grupo temático Racismo e Saúde da Associação Brasileira de Saúde Coletiva).

Entre os parlamentares presentes, estiveram as deputadas Áurea Carolina (PSOL/MG), Jandira Feghali (PCdoB/RJ) e Erika Kokay (PT/DF); e os deputados Bira do Pindaré,  (PSB/MA), Alexandre Padilha (PT/SP) e Marcelo Freixo (PSOL/RJ). Freixo frisou a ausência de um Ministro da Saúde há 102 dias e a importância da manutenção do valor do auxílio emergencial, além da ampliação do mesmo para a população que ainda não foi contemplada.

Confira a íntegra da audiência pública:

 

 

 

Livro analisa as relações entre desigualdades sociais e orçamento público

O livro “Gênero e raça no orçamento público brasileiro”, organizado por Elaine de Melo Xavier, já está disponível para download. Resultado de uma série de estudos que abordam a relação de mulheres, negras e negros com o Orçamento Geral da União (OGU), a obra evidencia os fatores que limitam a presença e atuação desses grupos no orçamento público.

De acordo com Roseli Faria, presidente da Assecor (Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Planejamento e Orçamento), responsável pela publicação, o livro é uma reflexão sobre orçamento público e desigualdades sociais e “um chamado para a ação e transformação do país em uma sociedade mais justa e solidária”.

“Gênero e raça no orçamento público brasileiro” pode ser obtido gratuitamente nos sites da ARCA  (Articulação Nacional de Carreiras Públicas)  e da Assecor.

Branquitude, racismo institucional e machitude

“Branquitude e racismo institucional no planejamento e orçamento governamental”, de Elton de Melo, abre o livro com reflexões sobre as características da branquitude na gestão das finanças públicas. Os impactos do racismo institucional no orçamento público também aparecem em “A questão do racismo no orçamento público”, de Carmela Zigoni, assessora política do Inesc.

Carmela coloca luz no orçamento público e em sua conexão com as questões raciais no Brasil, considerando a metodologia Orçamento & Direitos desenvolvida pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc). Dessa maneira, a assessora política do Inesc analisa a evolução do orçamento entre os anos 2015 a 2019, considerando o marco das políticas públicas voltadas para a população negra no Brasil, partindo da Constituição Federal de 1988, e perpassando as conquistas de direitos alcançadas por meio de legislações específicas e espaços de participação social institucionais.

Ao longo do artigo, dados comprovam como o orçamento público federal é uma importante evidência do racismo institucional brasileiro e como a  promoção da igualdade racial não foi priorizada nos anos analisados.

“Pudemos observar casos de desmonte da política pública de igualdade racial e superação do racismo incipientemente montada no Brasil. Além de representarem uma parte ínfima dos orçamentos autorizados, as políticas existentes tiveram baixa execução e não contaram com um esforço de Estado para se estruturarem em outras esferas de governo, como estados e municípios”, constata Carmela ao final do texto.

A questão de gênero aparece com mais  intensidade nos capítulos seguintes “Machitude no planejamento governamental”, “Mulheres e orçamento público: uma análise da participação feminina na Comissão Mista de Orçamento do Congresso Nacional entre 1990 e 2019” e “O impacto do teto dos gastos sobre as mulheres: subsídios à reflexão”, de Otávio Ventura, Júlia Rodrigues e Eliane Xavier, respectivamente.

O artigo de Eduardo Gomor, “O outro lado do orçamento público: sistema tributário e racismo estrutural” completa o livro com análises sobre a arrecadação de recursos públicos no país. Tal arrecadação é feita a partir da renda do trabalho e por meio dos impostos sobre o consumo de bens e serviços, medida que acaba penalizando a população mais pobre no Brasil.

Semana de Orçamento e Direitos debateu prioridades do orçamento público em série de lives

Entre os dias 17 e 22 de agosto, o Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) promoveu a Semana de Orçamento e Direitos com o intuito de facilitar o entendimento do orçamento público para todos e todas. Além de mostrar que não é necessário um diploma de economista para compreender o tema, o evento destacou como o orçamento público é fundamental para promover e fortalecer a cidadania.

O Curso para Jornalistas: Entendendo o Orçamento Público, com Livi Gerbase e Luiza Pinheiro, assessoras políticas do Inesc, abriu a série de atividades da Semana. Durante duas horas, jornalistas de todo país ouviram sobre os principais conceitos do orçamento público; conheceram a metodologia de Orçamento e Direitos do Inesc; e aprenderam como pesquisar nos principais portais de orçamento do governo, como Portal da Transparência, Siga Brasil e Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento do Governo Federal (Siop). Não conseguiu acompanhar? Confira:

Na sequência, o vídeo sobre Participação popular e orçamento público promoveu uma conversa entre José Antônio Moroni, co-diretor do Inesc, e Eloiza de Souza (14 anos) e Vitor Batista (13 anos), adolescentes do Projeto Onda, iniciativa do Inesc que leva o tema dos direitos humanos e do orçamento público para escolas públicas do Distrito Federal.

O co-diretor do Inesc respondeu algumas questões, entre elas,  como as pessoas podem participar das elaboração das leis orçamentárias e influenciar demandas que considerem prioritárias. “Quando falamos sobre incidência, queremos dizer que isso é o direito que o povo tem de ir até aos governantes e apresentar sua demandas, fazer com que elas sejam consideradas e atendidas. As pessoas têm o direito de participar das decisões”, explicou Moroni. Assista:

Preto Zezé, presidente global da Central Única das Favelas (CUFA); Thallita Oliveira, educadora do Inesc; e Fábio Pereira, participante do projeto Juventudes nas Cidades/DF participaram da live Como o orçamento público chega nos jovens da periferia, com a mediação de Markão Aborígine, educador do Inesc.

Fábio Pereira falou sobre as dificuldades diárias dos jovens de periferias, principalmente negras e negros, e do impacto da falta de orçamento na vida delas e deles. Ele também apontou a urgência na mobilização das juventudes, periféricas, negras, indígenas, quilombolas, LGBTQIA+ para que, juntas e juntos, consigam mobilizar a criação de um orçamento público na defesa de seus direitos.

Thallita ressaltou a importância de construir um conhecimento em torno do orçamento público para que seja possível repassá-lo para as comunidades e, assim, construir um diálogo transformador, que seja capaz de resistir às violências diárias.

Na mesma linha, Preto Zezé destacou o porquê de “traduzir a política e o orçamento para o ‘favelês’”. “Dinheiro não é do político, não é do gestor, é da gente. Tem que ir lá nas assembleias e nos políticos e perguntar onde está o dinheiro!”, disse.

O palestrante também apontou para a recorrência de pessoas negras na “agenda de reparação” dos governos, como secretaria com recorte de gênero e raça, porém, ausentes nas áreas de desenvolvimento econômico. “Não queremos misericórdia. Nós queremos divisão de poder e liberdade real por inteiro, não pela metade. Temos que entender que orçamento público passa pela disputa de poder real”, finalizou. Assista a íntegra da live:

Por um Brasil sem desigualdades

No dia em que comemorou 41 anos de atividades, o Inesc transmitiu para o público a live Como o orçamento público ajuda a combater as desigualdades com Iara Pietricovsky, co-diretora do Inesc, e Jefferson Nascimento, coordenador de Pesquisa e Incidência em Justiça Social e Econômica da Oxfam Brasil.

Há anos, Inesc e Oxfam têm trabalhado juntas pensando em estratégias para o fim de injustiças sociais e das desigualdades de raça, gênero e classe.

Iara chamou atenção para o valor da informação e de sua disseminação. “O Brasil é um país tão desigual que algumas pessoas acham que isso é natural. Precisamos fornecer ferramentas pra mostrar que não é bem assim”, disse a co-diretora do Inesc, que ainda fez uma fala otimista sobre o cenário brasileiro.

“O dia que o brasileiro entender o que significa estar na estrutura desigual que estamos hoje, aí conseguiremos partir para uma luta radical. Eu me recuso a ter uma visão pessimista do futuro”.

Assista ao vídeo da conversa:

O papel do orçamento público no combate às desigualdades continuou na live Como o orçamento público pode ajudar na luta antirracista, que encerrou a Semana de Orçamento e Direitos, com Felipe Rodrigues, integrante da Rede de Economistas Pretas e Pretos; Dyarley Vianna, assessora técnica do Inesc; e Carmela Zigoni, assessora política do Inesc (moderação).

Carmela trouxe a dimensão orçamentária na área dos direitos humanos e alguns dados sobre desigualdade racial no Brasil. Mestre em economia pela Universidade Federal Fluminense, Felipe abordou as consequências negativas da austeridade fiscal na vida de pessoas negras.

Como mulher, educadora, periférica e militante, Dyarley apontou como o teto de gastos influencia as pessoas negras, principalmente, as mulheres. “Essa disputa entre economia e vida não é nova no Brasil. Nosso país tem muita dificuldade de reconhecer humanidades”, frisou Dyarley. Confira a íntegra do debate:

Em cinco dias de eventos, mais de 1.500 pessoas assistiram as lives da Semana de Orçamento e Direitos. Os vídeos seguem disponíveis no canal do Inesc no Youtube.

A live De que lado a corda arrebenta? Os recursos da mineração e a desigualdade em tempos de pandemia marcada para o dia 18 de agosto não aconteceu na data prevista por problemas técnicos. Ela será transmitida no dia 1º de setembro, às 17h, no canal do Inesc no Youtube.

41 anos em defesa dos direitos humanos

No dia 20 de agosto, o Instituto de Estudos Socioeconômicos completou 41 anos de luta pelos direitos humanos e pela democracia no Brasil e no mundo. Fundado por Maria José Jaime, a Bizeh (1941- 2007), o Inesc esteve presente em vários momentos históricos do país, entre eles: nas demandas de movimentos sociais para a Constituição Federal (década de 1980); na criação do Estatuto da Criança e do Adolescente (1990); e na organização de um seminário inédito (2003) sobre o Plano Plurianual da União, que influenciou a realização de diversas audiências públicas em todo Brasil para falar de orçamento público – o principal tema de trabalho da instituição até hoje.

Em 2019, o Festival “Mais direitos, mais democracia” celebrou as quatro décadas do Instituto com shows, feira de artesanato e Banquinha dos Direitos Humanos, em que funcionárias e funcionários do Inesc explicaram de forma lúdica os principais temas da instituição: direitos humanos, democracia e orçamento público.

Mesmo com pandemia, governo gastou menos com saúde indígena em comparação a igual período de 2019

A chegada da pandemia nos territórios indígenas encontrou a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas já deteriorada, após os cortes sucessivos em nome do cumprimento do teto de gastos públicos estabelecido pelo governo. O que ninguém esperava é que, mesmo em situação precária, o governo federal gastasse menos verba neste primeiro semestre para proteger os índios do coronavírus, em comparação a igual período de 2019.

Considerando o valor autorizado da ação “Promoção, Proteção e Recuperação da Saúde Indígena”, houve uma queda de 9% (R$ 1,54 bilhão para R$ 1,39 bi), entre 2019 e 2020. Em todo o período da gestão Bolsonaro, a redução chega a 14% entre 2018 e 2020, conforme o gráfico abaixo:

Os números pertencem a uma nota técnica elaborada pelo Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) e a pedido do Conselho Nacional de Direitos Humanos, com o intuito de sensibilizar os senadores a rever os vetos feitos pelo presidente Jair Bolsonaro ao PL 1142/2020. Originado na Câmara, o Projeto de Lei havia proposto medidas de proteção social para prevenção do contágio e da disseminação da Covid-19 entre os povos indígenas, as comunidades quilombolas e demais comunidades tradicionais.

Contudo, quando o documento chegou ao Poder Executivo, diversos pontos de apoio a essas populações foram vetados como, por exemplo, a obrigatoriedade do fornecimento de acesso à água potável, a distribuição gratuita de materiais de higiene, limpeza e de desinfecção para as aldeias indígenas, a liberação de verba emergencial para a saúde indígena e a instalação de internet naquelas regiões.

“Apesar da chegada do novo coronavírus, não houve recomposição orçamentária nem mesmo por créditos extraordinários, o que seria tanto justificado pela vulnerabilidade indígena diante da pandemia como autorizado pelo regime fiscal especial decorrente da emergência sanitária”, explica Leila Saraiva, assessora política do Inesc.

Segundo ela, os investimentos em Saúde Indígena ainda continuam em queda neste ano. “É um contrassenso diante dos efeitos devastadores na pandemia entre povos indígenas”, lamenta a assessora.

A pesquisa do Inesc também apontou que, nos meses em que a pandemia já estava instaurada nos territórios indígenas, os valores liquidados foram significativamente menores que os liquidados em igual período de 2019. Em abril e maio, a queda chega à casa dos R$ 100 milhões. Somente em junho esse quadro se reverte, o que indica a demora para a efetivação de uma atuação robusta para conter o vírus.

Como exemplo da redução dos gastos, o Inesc trouxe o caso de dois Distritos Sanitários Especiais Indígenas mais afetados pela pandemia: DSEI Leste-RR e DSEI- Rio Tapajós. Constatou-se que não houve aumento significativo de gastos em itens essenciais para o enfrentamento do novo coronavírus nos meses em que a pandemia já estava instaurada nas comunidades. Os gastos com táxi-aéreo, utilizados para transporte de paciente no âmbito do DSEI -Rio Tapajós, foram mais altos no começo do ano do que quando a pandemia já estava instaurada.

A justificativa dada pelo secretário de Saúde Indígena, Robson Santos da Silva, diante dos números apresentados pelo Inesc em reunião da Comissão Externa do Coronavírus da Câmara dos Deputados, não condiz com os dados orçamentários. Silva afirmou que a queda dos valores liquidados se explicava pela paralisação das obras.

No entanto, a Nota Técnica demonstra que o Plano Orçamentário referente às obras é pouco relevante nos gastos da Sesai e a queda orçamentária se deu mesmo nas atividades que dizem respeito ao atendimento à população indígena.

Leia a íntegra da Nota Técnica “Execução orçamentária da Saúde Indígena diante da pandemia do novo coronavírus”

Execução orçamentária da saúde indígena diante da pandemia do novo coronavírus

A nota levanta questões acerca da atuação federal no enfrentamento do novo coronavírus entre as populações indígenas, a partir de uma análise detalhada da execução orçamentária da ação “20YP – Proteção, Promoção e Recuperação da Saúde Indígena”. Detalhar esses gastos nos permite elaborar tanto uma visão global da política de saúde indígena diante da pandemia, como também entender seus desdobramentos nos distintos territórios

Governo federal dá ao Ministério da Defesa 84% de parte dos recursos recuperados pela Lava Jato

O governo federal entregou ao Ministério da Defesa 84% de parte dos recursos recuperados pela Lava Jato, que tinham como destino financiar ações na Amazônia Legal voltadas à prevenção, fiscalização e combate aos incêndios florestais. Esse percentual equivale a um montante de R$ 530 milhões para os militares de um total de R$ 630 milhões recebidos pela União, segundo informações do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).

Para entender o caso, é preciso voltar a setembro de 2019, quando foi homologado o acordo anticorrupção vinculado à operação Lava Jato (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF 568[i]) no qual coube à Petrobrás o pagamento de R$ 2,6 bilhões.

Na repartição do recurso coube à Amazônia Legal o valor de R$ 1,06 bilhão[ii] com base no entendimento consensual do Supremo Tribunal Federal acerca da relevância de despesas decorrentes de situações extraordinárias e urgentes que exigem ações imediatas do Estado brasileiro na Amazônia. O acordo previa a distribuição do recurso destinado à Amazônia Legal em duas partes:

A primeira parte, um total de R$ 430 milhões, foi enviada aos estados da Amazônia Legal, com a distribuição calculada levando em consideração vários critérios: área do estado, focos de queimada, área desmatada, população, PIB per capita. A princípio, a cifra seria inteiramente distribuída aos órgãos ligados ao meio ambiente, tais como Ibama (R$ 230 milhões), MAPA (R$ 60 milhões) e Incra (R$ 140 milhões). Contudo, a pandemia vinda em 2020 fez com que boa parte da quantia fosse redirecionada ao combate ao Covid na região, com autorização judicial.

a segunda parcela da verba, de R$ 630 milhões, teve como principal destinatário o Ministério da Defesa, que abocanhou R$ 530 milhões, ou 84% do total, conforme tabela abaixo:

Orçamento para a Garantia da Lei e da Ordem (GLO)

Na avaliação das assessoras políticas responsáveis pelo estudo no Inesc, o que também chama atenção é o fato de os recursos estarem sendo remanejados para a Defesa por meio de uma operação conhecida como GLO (Garantia da Lei e da Ordem (GLO). As GLOs foram criadas pela Lei Complementar Nª 97 de 1990, para uso de caráter episódico e ser realizada em área previamente estabelecida e por tempo limitado. Além disto, uma operação desse porte somente deveria ser acionada após esgotados os instrumentos destinados à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, relacionados no art. 144 da Constituição Federal.

O ano de 2018 foi o primeiro em que operações de GLO receberam dotação explícita no Orçamento Público da União, na forma de uma ação orçamentária, que supõe permanência e existência do instrumento como parte de uma Política Pública. Na ocasião, foram decretadas cinco operações de GLO, quatro sucessivas para o estado de Roraima (crise migratória venezuelana) e uma em função da greve dos caminhoneiros.

Já em 2019 surgiram mais operações de GLO. No primeiro semestre, houve 01 para segurança da XI Cúpula do BRICS, 02 para segurança de penitenciárias federais, em Porto Velho e no Rio Grande do Norte. Em agosto, veio a terceira operação, desta vez, na Amazônia. Implantada em 24 de agosto, por meio do Decreto Nº 9.985/2019, o decreto teve seu prazo de validade ampliado, e hoje essa GLO perdura até o próximo dia 06 de novembro.

Em síntese, o texto dos decretos estabelece autorização para o emprego das Forças Armadas na GLO e em ações subsidiárias[i], na faixa de fronteira, nas terras indígenas, nas unidades federais de conservação ambiental e em outras áreas federais nos Estados da Amazônia Legal em caso de requerimento do Governador do respectivo Estado ao Presidente da República.

As ações previstas neste escopo incluem “ações preventivas e repressivas contra delitos ambientais, direcionada ao desmatamento ilegal; e o combate a focos de incêndio”, a serem executadas sob a coordenação dos comandos designados pelo Ministério da Defesa. Adicionalmente, os Decretos deixam explícito que as iniciativas dos órgãos e as entidades públicas federais de proteção ambiental deverão ser submetidas à coordenação dos Comandos.

Hoje, a coordenação das operações de GLO na Amazônia está sob a responsabilidade do Vice-Presidência da República, que também passou a presidir o Conselho da Amazônia, recriado pelo Decreto Nª 10.239 em fevereiro de 2020 com a competência de coordenar e acompanhar a implementação das políticas públicas relacionadas à Amazônia Legal.

Orçamento favorece militarização na Amazônia

A análise orçamentária do Inesc conclui que a destinação de elevados montantes de recursos públicos se dá em detrimento à melhor estruturação dos órgãos e das políticas já existentes que sempre se mostraram eficientes para combater o desmatamento. Ao recorrer às operações de GLO, o governo federal quer fortalecer a militarização na Amazônia, simulando uma situação inverídica de “esgotamento dos instrumentos destinados à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio”, como preconiza uma GLO.

Além do seu caráter “espetacular”, essas operações têm sido equivocadas para resolver o problema do desmatamento, assim como constata-se a inação das forças armadas para deter o garimpo ilegal em Terras Indígenas que atenta frontalmente contra a ordem pública, a incolumidade das pessoas indígenas e o patrimônio da própria União.

“A escolha pela não destinação de recursos da Lava Jato para a Funai para ação de fiscalização das Terras Indígenas, reforça, ainda mais o desmonte do órgão e o aparelhamento do Estado para uma estratégia de abertura das Terras indígenas a todas as formas de exploração econômica – garimpo, hidrelétricas, mineração e todas suas infraestruturas”, afirma o relatório do Inesc.

Este contraste evidencia a política em voga para a região, para quem os povos indígenas e comunidades tradicionais representam um atraso ao desenvolvimento econômico do país e que vê na atuação militar o motor para povoar o que eles chamam de “deserto verde”.

Teses dessa natureza mantêm um profundo enraizamento nas forças armadas, sendo reiteradamente afirmadas nos sucessivos Planos Nacionais de Defesa (PND) e Estratégia Nacional de Defesa (END). Nos últimos dois anos, sob a égide do Governo Bolsonaro, a visão de mundo e da Amazônia dos militares voltou a adquirir contornos mais explícitos na atuação do Estado[ii]. A revisão do Plano e da Estratégia da Defesa submetida à apreciação do Congresso Nacional em 22 de julho de 2020[iii] revela exatamente esse propósito:

A defesa da região amazônica será encarada, na atual fase da História, como o foco de concentração das diretrizes resumidas sob o rótulo dos imperativos de monitoramento/controle e de mobilidade. Não exige qualquer exceção a tais diretrizes e reforça as razões para segui-las. As adaptações necessárias serão as requeridas pela natureza daquela região em conflito: a intensificação das tecnologias e dos dispositivos de monitoramento a partir do espaço, do ar e da terra; a primazia da transformação da brigada em uma força com atributos tecnológicos e operacionais; os meios logísticos e aéreos para apoiar unidades de fronteira isoladas em áreas remotas, exigentes e vulneráveis; e a formação de um combatente detentor de qualificação e de rusticidade necessárias à proficiência de um combatente de selva. O desenvolvimento sustentável da região amazônica passará a ser visto, também, como instrumento da defesa nacional: só ele pode consolidar as condições para assegurar a soberania nacional sobre aquela região. Dentro dos planos para o desenvolvimento sustentável da Amazônia, caberá papel primordial à regularização fundiária. Para defender a Amazônia, será preciso ampliar a segurança jurídica e reduzir os conflitos decorrentes dos problemas fundiários ainda existentes”. (PND-END,2020,p.81 e 82)

Por fim, o documento do Inesc aponta uma intenção do governo federal de sinalizar aos doadores internacionais para uma retomada do Fundo Amazônia. Isso porque, com o fim dos recursos da Lava Jato, as doações do Fundo Amazônia poderiam dar continuidade à mesma estratégia militar. “E a que preço?”, questiona o estudo.

>>> Leia também a reportagem do Estadão sobre o estudo do Inesc.

[i] Como será melhor pontuado adiante, as ações subsidiárias previstas no decreto encontram suporte financeiro dentro da ação orçamentária 21BT.

[ii] Vale lembrar que logo no início do atual governo houve a tentativa de emplacar, por decreto, o “Projeto Barão do Rio Branco” com o objetivo de implementar grandes empreendimentos na região conhecida por “Calha Norte” e atrair forças econômicas para a região, além de escoar a produção agrícola.

[iii]https://www.gov.br/defesa/pt-br/assuntos/copy_of_estado-e-defesa/estrategia-nacional-de-defesa

[i] http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/adpf568homolog.pdf

[ii] À educação foram destinados R$ 1.601.941.554,97 sendo: R$ 1.001.941.554,97 para educação infantil; R$ 250.000.000,00 para o Programa “Criança Feliz”; R$ 250.000.000,00 para o MCTI – SÍRIUS; R$ 100.000.000,00 para Ministério Família (ações socioeducativas).

 

Recursos anticorrupção e militarização da política socioambiental na Amazônia

Muito tem sido dito sobre “militarização” da política socioambiental na Amazônia brasileira. Em linhas gerais, ela tem sido entendida como uma estratégia de reordenamento da presença do governo federal na Amazônia a partir de uma centralidade pensada e operada desde o Ministério da Defesa. A presente publicação tem como propósito evidenciar a decisão política do governo de alocar 84% dos recursos da Lava Jato destinados ao combate ao desmatamento na Amazônia no ministério da Defesa, a serviço de tal estratégia.

Trata-se, como será mostrado, da centralização na Defesa de recurso orçamentário “extraordinário”, em detrimento do seu uso para reforçar a atuação do Ibama, do ICMBio e da Funai, órgãos que, com mandatos distintos e com suporte da Polícia Federal, compartilham do papel de fiscalização ambiental com base em capacidades e estratégias que se mostraram eficazes na história recente de combate ao desmatamento.

O conjunto dos dados orçamentários reunidos neste estudo, oriundos da Petrobras e destinados à Amazônia, traz elementos que nos parecem relevantes para uma melhor compreensão da recente estratégia de militarização da política socioambiental na região e suas múltiplas consequências

Em meio à pandemia, governo federal mantém isenções a petróleo e gás

Dados inéditos da Receita Federal, solicitados pelo Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI), demonstram que o Repetro (Regime Aduaneiro Especial de Exportação e de Importação de Bens Destinados às Atividades de Pesquisa e de Lavra das Jazidas de Petróleo e de Gás Natural), representou uma renúncia para os cofres públicos de R$ 28,02 bilhões em 2019.

Esse valor é maior em R$ 4 bilhões do que o total de incentivos fiscais estimados à toda a Zona Franca de Manaus e Áreas de Livre Comércio em 2019.

É necessário ter cuidado com a comparação dos anos dessa renúncia fiscal. Desde de 2018, os produtos amparados por pelo Repetro vêm se adaptando ao novo  regime tributário especial para o setor de petróleo, o Repetro Sped – o que impossibilita  a comparação total da evolução do valor das isenções nos últimos dois anos.

Os produtos que estão se adaptando ao Repetro Sped se misturam com o valor renunciado a partir da aquisição de novos  bens em 2018 e 2019. “De qualquer forma, ao abrir mão desse valor e, em 2017, aumentar o escopo do Repetro por meio do Repetro Sped, o Governo Federal diminui ainda mais a capacidade arrecadatória em meio a um cenário de crise”, afirma Livi Gerbase, assessora política do Inesc.

Juntos, o Repetro e o Repetro-Sped reduzem o custo de produção do setor de petróleo e gás desde 1999 e completaram este ano duas décadas de existência. Em 2019, o incentivo fiscal para o setor foi estendido por mais 20 anos, até 2040.

A renúncia fiscal concedida ao setor de produção de petróleo e gás não é exclusiva à Petrobras. A participação da Petrobras na produção tem diminuído continuamente com a intensificação da participação de petroleiras estrangeiras. Em 2019, operaram 63 empresas, todas beneficiárias deste Regime Especial de tributação.

“Se ano passado tivéssemos recolhido esse valor, hoje poderíamos pagar o auxílio emergencial a mais pessoas.”

Segundo o Inesc, os R$ 28 bilhões poderiam aumentar o número de beneficiados pelo auxílio emergencial de R$600 em 15 milhões de pessoas durante 3 meses. Cabe lembrar que a renda básica destinada aos brasileiros em situação de vulnerabilidade social durante a pandemia foi uma conquista da campanha Renda Básica Que Queremos, liderada por cinco organizações da sociedade civil, entre elas o Inesc. A cifra também é próxima do valor anual do Bolsa Família (R$ 30 bilhões).

O Repetro

O Repetro é um regime aduaneiro de exportação e importação de bens que se destina às atividades de pesquisa e de lavra das jazidas de petróleo e gás natural. O regime engloba a suspensão de cobrança de uma série de impostos[1] às modalidades: (i) exportação ficta (sem que ocorra a saída do bem do território aduaneiro); (ii) admissões temporárias; (iii) importação de matérias-primas sob o regime de Drawback, produtos semi-elaborados ou acabados e partes ou peças, para a produção de bens a serem exportados sem saída do território aduaneiro.

No final de 2017, a criação do Repetro-Sped a partir da Lei 13.586 possibilitou a suspensão total de tributos federais relativos a bens cuja permanência no país seja definitiva, além de aumentar o número de bens e fornecedores que podem se beneficiar do incentivo.

De acordo com estudo do Inesc, o Repetro é a maior renúncia fiscal concedida à produção de combustíveis fósseis no Brasil. Apesar disso, este regime não possui a mesma transparência de outros regimes tributários brasileiros, como o Simples Nacional, ao não ser estimado anualmente pela Receita Federal na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).

O Repetro é avaliado, em artigo da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como um recurso desnecessário para garantir a lucratividade do setor, pois alguns campos do Pré-Sal seriam rentáveis sem quaisquer subsídios. A existência do Repetro se converte, nesse sentido, em lucros extraordinários para as empresas petroleiras e em redução da participação do governo na renda oriunda da exploração do petróleo.

“Essa isenção ainda retira recursos que financiam políticas públicas sociais”, explica a assessora. “O PIS e o Cofins, por exemplo, são impostos destinados, entre outras políticas sociais, à  Previdência. Com o benefício às petroleiras, esse recurso diminui.”

A questão ambiental

Muitos governos pelo mundo estão se comprometendo em reduzir subsídios aos combustíveis fósseis e estimular a economia e a energia verde como parte da estratégia de combate à crise econômica provocada pela pandemia do novo coronavírus – no que está sendo apelidado de Green New Deal.

Deste modo, o governo brasileiro segue na contramão desse acordo ao  expandir o Repetro e ignorar a necessidade urgente de revisão dos subsídios federais. “Este é um momento de toda a sociedade brasileira repensar como, para que e para quem o governo deve fornecer incentivos fiscais”, conclui Livi.

O Brasil é um dos maiores produtores de petróleo do mundo, com uma produção de petróleo e gás crescente e lucrativa, o que reflete em uma ascendente emissão de CO2.

>>> Leia reportagem da Folha de S.Paulo sobre estes dados levantados pelo Inesc

[1] Imposto de Importação, Imposto sobre os Produtos Industrializados, PIS/COFINS e Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante.

Pandemia escancara dura realidade de usuárias (os) do Transporte Público Urbano

O acesso ao transporte público – fundamental para o deslocamento de parte da população que ficou ainda mais vulnerável nesse momento de profunda crise – está entre os vários problemas sociais escancarados pela pandemia.

Os movimentos sociais por tarifa zero e pela mobilidade urbana sempre questionaram o modelo de oferta do serviço, que hoje acontece por meio da tarifa, calculada por passageiro e não pelo custo da operação, provocando superlotação e, em momentos de baixa circulação, falta de recursos para as empresas, que em tempos normais, lucram em cima da falta de qualidade.

Apenas em Brasília e São Paulo há recursos extratarifários, por meio dos orçamentos públicos locais. No entanto, como os contratos e licitações são sempre mais ao gosto das empresas do que da população, além de não haver fiscalização por parte do governo junto aos empresários, o subsídio não garante passagens acessíveis, ao contrário, Brasília tem uma das tarifas mais altas do Brasil.

Queda na utilização do TPU

Com a pandemia, houve uma queda no número de usuários do sistema, fazendo com que, em vários lugares, as empresas recorressem aos governos para terem um aporte de recursos que as permita continuarem atuando. Como o Transporte Público Urbano (TPU) é fundamental, não se espera que no pós-pandemia se tenha de enfrentar, entre tantas mazelas, a ausência desse serviço. Então, o aporte governamental é necessário, mas critérios de oferta do serviço, com qualidade e segurança para usuárias (os), precisam ser assegurados.

Além disso, tem-se que pensar em longo prazo, pois a crise instalada reforça a necessidade de repensar o sistema, fazendo dele uma política de fato pública, tal qual estabelecido no artigo 6º da Constituição Federal, que diz ser o transporte um direito social, ao lado de políticas como saúde, educação, moradia etc. E se é direito, precisa ser regulamentado para que a população o acesse com todas as premissas necessárias, como qualidade, acessibilidade, segurança, modicidade de tarifas, ou tarifa zero, como já está previsto na Política Nacional de Mobilidade Urbana.

Relevante dizer que em meio à pandemia, as frotas em várias cidades brasileiras foram reduzidas sem que fosse feito estudo para saber onde há maior demanda, que, em geral, são nas periferias, cujos moradores continuaram trabalhando e superlotando o TPU, com todos os riscos de contaminação, tanto de passageiros, quanto de motoristas. Pesquisa da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) mostra que motoristas de ônibus têm 70% mais chances de se infectarem que outros trabalhadores, há registros de contágio, com alto índice de mortes, em todas as cidades brasileiras com sistema de transporte público. Entre os passageiros, a população periférica e negra é a mais afetada com a impossibilidade de cumprimento das regras impostas pela Organização Mundial de Saúde em transporte abarrotado de pessoas.

Várias pesquisas têm sido realizadas e há uma tendência da população a restringir o uso do transporte público por medo de contágio. Muitos dizem querer trocar por transporte individual motorizado. Caso a demanda por TPU reduza ainda mais, com o consequente aumento dos automóveis individuais motorizados nas vias públicas, as cidades, especialmente as maiores, ficarão inviáveis, pois muitas já estão com capacidade máxima de veículos em suas ruas.  As externalidades provocadas por tal processo vão além de tempo perdido, são mais acidentes, maior demanda para o Sistema Único de Saúde, mais poluição, maior emissão de gases de efeito estufa, agravando ainda mais o aquecimento do planeta.

Levando em consideração que nos últimos anos o TPU já vinha perdendo passageiros por inúmeras razões, como tarifas muito altas, falta de infraestrutura dedicada, superlotação, congestionamentos causados, principalmente, pelos automóveis, não é ocioso repetir que o modelo de lucro por passageiro exige, segundo a Associação Nacional de Empresa de Transportes (NTU), seis passageiros por metro quadrado. O que já era inviável em tempos normais, imagine em tempos de pandemia. Falta transparência sobre as operações, quem comanda todo o processo são os empresários, que certamente almejam as maiores taxas de lucro, a despeito do que é oferecido à população.

Fundo de financiamento do TPU

O que se propõe, então, é que o sistema seja repensado integralmente e não mais remunerado por tarifa, mas sim por fretamento de empresas, ou por empresas públicas, remunerando pelo custo da operação, com veículos suficientes para usuárias (os) trafegarem sentadas (os). Com segurança, tanto para trabalhadores, quanto para os passageiros, especialmente mulheres, que além de utilizarem transporte sem qualidade, ainda são alvo de assédios.

Para tanto, a criação de um fundo de financiamento do TPU é emergencial, a pandemia acelerou a necessidade de repensar a política e atender ao direito social por mobilidade com conforto e segurança, especialmente para a população periférica, que mais utiliza os modais públicos. E os usuários do transporte individual motorizado precisam contribuir para esse fundo, afinal, a maior parte da infraestrutura urbana, construída com recursos dos impostos de todas as pessoas, proprietárias de automóveis, ou não, é utilizada por veículos individuais. O TPU precisa disputar as vias com inúmeros carros particulares, sem que tenha infraestrutura própria, pois os corredores individuais não são regra, mas sim exceção.

O TPU é instrumento que contribui para a efetivação do direito à cidade para todas as pessoas. Sem mobilidade, esse direito não se realiza. E quando se pensa em transporte de qualidade, pensa-se em linhas para todas as localidades, com veículos suficientes, limpos e confortáveis, em todos os dias da semana e em diversos horários – não apenas para que se possa ir ao trabalho, como ocorre em vários lugares do país, em que o racismo institucional opera em todos os níveis, transformando o TPU em verdadeiros navios negreiros, citando um membro do Movimento Passe Livre- DF.

 

Organizações pedem liberação de R$ 2 bi de fundos socioambientais para combater os efeitos da pandemia

Cinquenta organizações da sociedade civil divulgam hoje uma Carta Aberta ao BNDES para cobrar da instituição a liberação dos recursos de mais de R$ 2 bilhões parados no Fundo Amazônia, Fundo Clima e Fundo Social. Pedem, ainda, novas medidas para o Banco do Estado bloquear o financiamento a projetos em áreas com desmatamento ilegal e maior rigor no empréstimo a negócios que causam impacto social e ambiental.

O pedido ocorre em meio à pandemia, quando uma instituição criada para o desenvolvimento social é fundamental para a recuperação econômica. “No entanto, o destino desses investimentos precisa considerar o compromisso da empresa ou do setor com a sustentabilidade”, explica Alessandra Cardoso, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).

A carta será apresentada durante evento conjunto da Frente Parlamentar Ambientalista, Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas e Frente Parlamentar dos ODS Frente Parlamentar Ambientalista que ocorre hoje, às 15 horas.

O evento contará com as presenças do Sr. Luciano Coutinho, presidente do BNDES no período de maio de 2007 a maio de 2016, e do Sr. Arthur Koblitz, presidente da Associação dos Funcionários do BNDES.

Para as organizações, nas últimas décadas, o BNDES vinha adotando um padrão de investimento que reforçava as desigualdades sociais, violava direitos de comunidades e explorava ecossistemas de forma insustentável, como foi visto nos empréstimos concedidos às obras de Usinas Hidrelétricas na Amazônia.

“Diante da pandemia, o País assiste à incapacidade do governo federal no enfrentamento da crise sanitária, aos Estados e municípios aprofundando seu endividamento e às políticas públicas fragilizadas pela falta de recursos. (…) E essa escassez exige um Banco de Estado a serviço do gigantesco desafio de mudar o paradigma do próprio desenvolvimento, superando modelos ultrapassados de crescimento econômico, que ignoram impactos sociais e ambientais, afetando especialmente os grupos mais vulneráveis”, diz a Carta Aberta.

O documento acrescenta que, neste momento, há uma grande oportunidade de fazer diferente. “Milhões de pessoas estão sendo jogadas na pobreza e extrema pobreza; com a população negra sendo proporcionalmente ainda mais afetada; centenas de negócios cuja base é a única fonte de rendadas famílias estão deixando de existir e junto deles milhares de ocupações e empregos”.

A carta é assinada por mais de cinquenta organizações, entre elas o Instituto de Estudos Socioeconômicos, Conectas Direitos Humanos, International Rivers, Instituto Sociedade, População e Natureza, Instituto de Defesa do Consumidor, Observatório do Clima, Instituto Socioambiental.

O documento conclui que, neste momento, é fundamental que o BNDES promova o desenvolvimento social, de fato. “Existe uma rica economia de base local e comunitária, com forte conteúdo identitário e criativo – feminista, indígena, preta, jovem, periférica – que precisa ser estimulada e fortalecida”, reforça o texto.

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Os Fundos do BNDES

Valor administrado pelo banco, voltado a investimentos socioambientais

NomePatrimônioCaracterísticaInvestimentos em 2019
 

Fundo Amazônia

 

Mais de R$ 2 bilhões

Preservação ambiental, combate ao desmatamento.Nenhum novo projeto aprovado desde 2019, desembolsos dos contratos já assinados em ritmo lento.
 

Fundo Social

 

O BNDES não disponibilizou essa informação

Apoio não-reembolsável a projetos de geração de emprego e renda e ao desenvolvimento social.

 

 

Sem novas chamadas desde 2018

 

 

 

 

Fundo Clima (Fundo Nacional de Mudança Climática)

 

 

 

R$ 250 milhões*

 

Apoio reembolsável, mediante empréstimo do BNDES ou apoio não-reembolsável a projetos de mitigação da mudança do clima ou à adaptação das pessoas a esses efeitos, sob responsabilidade do MMA.

 

 

Sem chamadas em 2019 e, para 2020, também não houve aprovação do Plano Anual de Aplicação de Recursos pelo Ministério do Meio Ambiente.

(*)Esse total poderia ser maior se o governo realizasse as transferências autorizadas na lei orçamentária de 2020, equivalentes a R$ 232,84 milhões.

 

Informações à Imprensa:

 

Adriana Souza Silva – adriana@original123.com.br

(11) 98264-2364 (whastapp)

Assessoria de Comunicação do INESC

www.original123.com.br

As ações urgentes demandadas na Carta Aberta:

  1. Utilização massiva e imediata de recursos do Fundo Social
  2. Retomada operações do Fundo Amazônia, reativação da estrutura anterior do Comitê Orientador do Fundo Amazônia (COFA) e suspensão das novas regras que dificultam o cadastramento.
  3. Execução dos recursos do Fundo Clima e maior transparência, fim dos gargalos operacionais.

4.Novos critérios para as operações diretas e indiretas de crédito agropecuário, com o uso do CAR para detectar áreas irregulares, a exigência da adesão ao Programa de Regularização Ambiental (PRA), o maior controle das empresas sobre suas cadeias produtivas e outros.

  1. Audiência pública para discutir a reconstrução da economia pós COVID-19 sob uma ótica de sustentabilidade ambiental, justiça social e combate ao racismo.

 

As demandas de aperfeiçoamento das políticas de transparência e salvaguardas socioambientais:

  1. Exigência de Consultas Livres Prévias e Informadas, nos termos da Convenção 169 da OIT, incluindo eventuais protocolos de consulta dos povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais.
  2. Participação das comunidades no processo de construção e supervisão dos projetos.
  3. Transparência ativa e passiva de informações essenciais sobre operações e projetos em análise, com a construção de um comitê de especialistas, externo e isento, para orientar ações da instituição.
  4. Novo sistema para resolver eventuais controvérsias, considerando a atual ineficiência da figura Ombudsman.
  5. Revisão da Política Socioambiental para o Setor de Mineração.
  6. Revisão do Guia Socioambiental de Pecuária Bovina de Corte, com novas diretrizes para as condições de trabalho diante dos impactos da Covid-19, nos frigoríficos e a partir deles.
  7. Abertura de diálogo com organizações da sociedade civil sobre o desenho do Plano de Implementação da versão atualizada da PRSA, aprovada pelo Conselho de Administração em novembro de 2019, considerando que o Plano de Implementação vigente alcança o período de 2018-2020.

 

A Carta é aberta à sociedade e endereçada a:

Paulo Roberto Nunes Guedes – Ministro da Economia; Rodrigo Felinto Ibarra Epitácio Maia – Presidente da Câmara dos Deputados; David Samuel Alcolumbre Tobelem – Presidente do Senado Federal; Luís Roberto Barroso – Ministro do Supremo Tribunal Federal; Rosa Weber – Ministro do Supremo Tribunal Federal; Gustavo Montezano – Presidente do BNDES; Ricardo Barros – Diretor de Operações; Bianca Nasser – Diretora de Finanças; Bruno Laskowsky – Diretor de Participações, Mercado de Capitais e crédito Indireto; Petrônio Cançado – Diretor de Crédito e Garantia; Pedro Moes Iootty de Paiva – Superintendente de Planejamento Estratégico; Júlio Costa Leite – Superintendente da Área de Gestão Pública e Socioambiental; Nabil Moura Kadri – Chefe do Departamento Socioambiental.

 

 

Assinam a Carta as seguintes Organizações:

 

350.org Brasil; Accountability Counsel; Amigos da Terra – Amazônia Brasileira; Articulação Nacional de Luta Contra a Aids; Articulação dos Povos Indígenas do Brasil; Ecossistemas Costeiros; Article 19; Asibama-DF; Associação Interamericana para a Defesa do Ambiente; Bank Information Center; Buliisa Initiative for Rural Development Organisation; Center for International Environmental Law; Centro de Pesquisa e Extensão em Direito Socioambiental; Centro de Trabalho Indigenista; Coalizão No-Fracking Brasil pelo Clima, Água e Vida; Conectas Direitos Humanos; Derecho Ambiente y Recursos Naturales; Ecologia e Ação; Fase – Federação de Órgãos para a Assistência Social e Educacional; Federação das Comunidades Quilombolas do Estado de Minas Gerais N’golo; Fórum das Ong Aids do estado de São Paulo; Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Socioambiental; Fórum ONG Aids RS; Friends with Environment in Development Uganda; Fundação Avina; Fundação Grupo Esquel Brasil; Gender Action; Gestos – Soropositividade, Comunicação e Gênero; Grupo de Trabalho da Sociedade Civil para a Agenda 2030; Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas; Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor; Instituto de Desenvolvimento e Direitos Humanos; Instituto de Energia e Meio Ambiente; Instituto de Estudos Socioeconômicos; Instituto de Pesquisa e Educação Ambiental; Instituto Democracia e Sustentabilidade; Instituto Internacional de Educação do Brasil; Instituto Internacional Arayara; Instituto Socioambiental; Instituto Sociedade, População e Natureza; International Accountability Project; International Rivers – Brasil; Inversiones Sustentables China-América Latina; Jamaa Resource Initiatives; Movimento pela Soberania Popular na Mineração; Movimentos dos Atingidos por Barragens; Observatório de Protocolos Comunitários de Consulta e Consentimento Livre, Prévio e Informado; OCM Observatório do Carvão Mineral; Observatório do Clima; Observatório do Petróleo e Gás; Rede de Mulheres Produtoras do Cerrado e Pantanal; Rede de Organizações Não Governamentais da Mata Atlântica; Rede Pantanal.

 

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