Nota técnica sobre o PPA 2024-2027

Nesta nota técnica, apresentamos reflexões do Inesc em relação às primeiras informações disponíveis do PPA 2024-2027 para políticas sociais e ambientais que acompanhamos, nas áreas de educação, direito à cidade, meio ambiente, povos indígenas, quilombolas, igualdade racial, mulheres e crianças e adolescentes. Acreditamos que a discussão do PPA com a sociedade pode contribuir para conferir ao Plano uma legitimidade que irá auxiliar na sua implementação e efetividade.

Mais de 100 organizações civis pedem ajustes no Arcabouço Fiscal

A Coalizão Direitos Valem Mais – formada por mais de 100 organizações entre movimentos sociais, sindicatos e universidades, sendo uma delas o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) – acaba de divulgar um manifesto pedindo mudanças no novo Arcabouço Fiscal. Os dois principais ajustes solicitados no documento são:

  • que o orçamento total de saúde, educação e políticas de combate à fome, incluindo o Novo Bolsa Família, sejam exceções ao novo teto de despesas;
  • que haja maior flexibilidade para a definição das bandas de metas de superávit e despesas primárias, sendo estas definidas por lei ordinária e não por lei complementar.

Segundo a Coalizão, desvincular os gastos das áreas da saúde, educação e combate à fome do teto de despesas estipulado pelo arcabouço afastaria não apenas o risco de escassez desses recursos para estas áreas, como também permitiria o refinanciamento de políticas de garantia de direitos humanos que foram desmanteladas nos últimos anos, como as políticas de assistência social, fiscalização ambiental e combate ao trabalho infantil. Já a maior flexibilização na definição das bandas do arcabouço permitiria o orçamento responder com mais facilidade a crises econômicas e sociais, isto é, ter um maior caráter anticíclico.

A atual proposta de Arcabouço Fiscal prevê que as despesas primárias obedeçam a uma banda de crescimento entre 0,6% e 2,5% ao ano, a depender do aumento da receita. Contudo, o cenário mais pessimista (0,6%) mal acomoda o crescimento vegetativo dos benefícios previdenciários, que crescem em torno de 1% ao ano. “O corte de gastos discricionários está implícito, prejudicando o enfrentamento dos desafios e da garantia de direitos, além de dificultar a manutenção de uma política de valorização do salário-mínimo”, afirma Livi Gerbase e Cristiane Ribeiro, porta-vozes do Inesc e da Plataforma Dhesca, também integrante da Coalizão.

Também fazem parte da Coalizão o Conselho Nacional de Direitos Humanos, o Conselho Nacional de Saúde, a Oxfam Brasil, a Frente em Defesa do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) , entre outras organizações.

Plano Plurianual – PPA

A Carta Aberta defende ainda uma conexão urgente entre o Arcabouço Fiscal e o Plano Plurianual (PPA). “Caso não se conectem, haverá o risco de o PPA se transformar em um instrumento vazio, o que criaria disputas na distribuição de orçamento para as diversas instituições públicas”, acrescenta a nota. Além disso, a efetivação de uma reforma tributária progressiva e a revisão de incentivos fiscais também são imprescindíveis para garantir o aumento da arrecadação necessária para o crescimento das despesas.

As propostas de ajustes para o novo Arcabouço Fiscal tomam como base a pesquisa do Made-USP, que realizou projeções para 2030 e apontou uma redução dos gastos correntes em relação ao PIB, em todos os cenários, o que agravaria ainda mais o cenário de 33,1 milhões de pessoas em situação de insegurança alimentar e 9 milhões de desempregados no Brasil.

A Coalizão Direitos Valem Mais acredita que são fundamentais a transparência e a participação social, que promovem a ampliação dos espaços de diálogo entre Estado e Sociedade, com vistas a fortalecer o processo democrático. A Carta conclui: “A discussão sobre os rumos da política fiscal brasileira deve ser realizada de forma ampla, junto com a sociedade, e não de maneira apressada no Congresso Nacional”.

>>> Acesse a íntegra do Manifesto <<<

Inscreva-se no Curso de Cidadania Fiscal

Diante dos debates nacionais pela aprovação da reforma tributária, várias entidades se somaram para disponibilizar formação sobre educação fiscal. O curso é gratuito, composto por 32 aulas organizadas, em quatro módulos, integralmente na modalidade Ensino à Distância (EAD), com tutoria. As inscrições abrem nesta terça-feira (9/5), e as aulas iniciam dia 23 de maio e seguem até 30 de junho. Os inscritos com aproveitamento superior a 70% do conteúdo recebem certificado.

A formação é organizada pelo Sindicato dos Técnicos Tributários do RS – Afocefe Sindicato, Instituto Justiça Fiscal (IJF), Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) e a Rede de Justiça Fiscal da América Latina e Caribe.

Justiça fiscal reduz desigualdades

“Tributos são instrumentos fundamentais para promover igualdade. É um tema de forte impacto na vida das pessoas e quanto mais informação e mobilização mais se pode incidir para promover justiça fiscal”, pontua o presidente do Instituto Justiça Fiscal, Dão Real Pereira dos Santos.

No Brasil, pobres pagam, proporcionalmente, mais impostos que os ricos no país mais desigual do mundo. Altas rendas e grandes patrimônios são isentos ou subtributados.

O que essa estrutura tributária tem a ver com as fontes de financiamento das políticas de Estado e como efetivar o controle social são alguns dos temas do curso “Cidadania Fiscal”.

O primeiro módulo oferece conceitos básicos sobre Estado e políticas públicas; o segundo trata da questão tributária; o terceiro trata dos gastos e o quarto das ferramentas práticas para participação social, como as leis de acesso à informação e os portais orçamentários.

Cada aula tem como base um vídeo com resumo do conteúdo e texto de apoio. Monitores acompanham a turma para tirar dúvidas e estará disponível um fórum de dúvidas e comentários ao final de cada módulo para as manifestações dos participantes.

“Vivemos momentos-chave que definirão os rumos do orçamento público, como a nova âncora fiscal e a reforma tributária. É um direito das pessoas entenderem o que o Estado faz com nossos impostos. Será que estão investindo em políticas públicas garantidoras de direitos? Com o curso, queremos mostrar, sobretudo, que direitos cabem, sim, no orçamento”, destaca a assessora do Inesc, Livi Gerbase.

“Todo cidadão tem o direito de saber onde o Estado aplica os tributos pagos por cada um de nós. Quando estamos mais preparados, a capacidade de atuar em defesa de nossos direitos é ampliada’’, completa o presidente do Afocefe Sindicato, Alexandre Luzzi.

SERVIÇO

O QUÊ: Curso de Cidadania Fiscal

DATA: Abertura das inscrições em 9 de maio

Aulas de 23 de maio a 30 de junho

LOCAL: https://www.escolafocefe.org.br/

“Depois do Desmonte”: relatório traz balanço dos gastos da União entre 2019-2022

O desmonte das políticas públicas em todos os programas sociais e ambientais do Brasil, nos últimos quatro anos, segue custando caro ao País. Passados os 100 primeiros dias do mandato do presidente Lula, ainda é grande a dificuldade para superar o cenário de “terra arrasada” detectado no relatório de transição do governo, a despeito da injeção de recursos com a PEC aprovada no fim do ano passado.

A fim de registrar o impacto dos cortes de gastos em áreas fundamentais de proteção aos direitos humanos em uma gestão que privilegiou o equilíbrio fiscal em detrimento da vida e do bem-estar da população, o Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) apresenta o relatório “Balanço do Orçamento Geral da União 2022”, que nesta edição recebe o título de “Depois do Desmonte”. 

A publicação mostra como foram usados (ou não) os recursos federais nas áreas: saúde, educação, direito à cidade, meio ambiente, povos indígenas, quilombolas, igualdade racial, mulheres e crianças e adolescentes.

Superávit a que preço?

A principal conclusão do documento é de que a política de ajuste fiscal imposta nos últimos 4 anos não só se provou ineficiente para a recuperação da economia, como também aumentou a injustiça social, ambiental, climática, racial e de gênero. Pela primeira vez desde 2013, as contas públicas fecharam em superávit primário em R$ 54,1 bilhões. Mas a que preço? “A estratégia de subfinanciar o Estado, elevar a taxa de juros, ignorar uma tributação progressiva e percorrer regras fiscais restritivas só agravou as desigualdades”, respondem os membros do colegiado do Inesc, Cristiane Ribeiro, José Antônio Moroni e Nathalie Beghin.

Neste contexto, para cada uma das áreas analisadas, esta edição do Balanço aponta as medidas consideradas prioritárias para o governo Lula, começando pela análise das ações vinculadas à PEC de Transição. “A tarefa de reconstruir o Brasil não será fácil, pois o governo é o resultado de uma ampla aliança, que precisa acomodar interesses distintos, por vezes, antagônicos”, pondera Nathalie. “Este relatório servirá de base para o monitoramento da agenda voltada à proteção dos direitos humanos nos próximos anos.”

>>> Acesse a íntegra do Balanço do Orçamento Geral da União 2022 <<<

A seguir, os principais dados das áreas analisadas:

Panorama geral 

  • No último ano do governo Bolsonaro, as contas públicas fecharam com um superávit primário de R$ 54,1 bilhões, o que corresponde a 20 vezes ao valor orçado para o Ministério do Meio Ambiente em 2022 (R$ 2,7 bilhões). Ou seja: uma economia feita à custa do desmatamento e desmonte de políticas de proteção à Amazônia.
  • As emendas de relator (RP9), conhecidas como “orçamento secreto”, alcançaram valores médios anuais de R$ 11,2 bilhões entre 2020 e 2022. O valor corresponde a cerca de 3 vezes o total gasto pelo governo anterior em programas de alimentação escolar. 

Covid-19 

O governo Bolsonaro entrará para um triste capítulo da história brasileira, que soma mais de 700 mil vítimas fatais, devido aos inexplicáveis atrasos no processo de vacinação e o vergonhoso saldo de R$ 159,3 bilhões, que, embora já estivessem autorizados pelo Congresso Nacional, não foram gastos a despeito da fome, do desemprego, fechamento de empresas e falta de estrutura das escolas para se adaptarem ao ensino virtual.

Saúde

Entre 2019 e 2022 o orçamento da função Saúde, retirando os gastos com Covid-19, diminuiu 8% em termos reais, apesar das demandas reprimidas e do aumento da população. É um valor que corresponde a R$ 12 bilhões a menos para a área, que já vinha sofrendo problema crônico de desfinanciamento imposto pelo teto de gastos.

Educação 

  • Os recursos da função Educação caíram de R$ 131 bilhões em 2019 para R$ 127 bilhões em 2022, e a gestão ficou marcada por nenhum centavo direcionado às escolas em virtude do isolamento social decorrente da Covid-19.
  • Os recursos voltados para creches caíram 60% em termos reais entre 2019 e 2022, passando de R$ 470 milhões para R$ 187 milhões, no período, apesar do aumento de 70% entre 2021 e 2022 decorrente do “novo Fundeb”.
  • O orçamento para a Educação de Jovens e Adultos (EJA) não só esteve aquém do necessário, como registrou um comportamento “errático”: de R$ 552 mil em 2019 (apesar de um valor autorizado superior a R$ 35 milhões), os gastos subiram para R$ 15 milhões em 2020 (devido a restos a pagar), voltando a cair para R$ 7,4 milhões em 2021. Em 2022, graças ao “novo Fundeb”, os valores foram de R$ 14,4 milhões, longe de ser suficientes para reduzir os efeitos da migração do ambiente físico para o ensino virtual na pandemia.
  • No ensino superior, os recursos caíram 18% em termos reais, passando de R$ 43,3 bilhões para R$ 35,4 bilhões, entre 2019 e 2022. A queda observada com a execução financeira da Capes é ainda maior: 39% no quadriênio, saindo de R$ 5,4 bilhões em 2019 para R$ 3,3 bilhões em 2022.

Direito à cidade 

  • O déficit habitacional de 5,9 milhões de moradias foi agravado, não apenas pela pandemia, mas pela dificuldade de acesso da população de baixa renda ao Programa Casa Verde Amarela, que substituiu o Minha Casa Minha Vida. A execução financeira da função habitação caiu 37% em termos reais entre 2019 e 2022, passando de R$ 78,7 milhões para R$ 29,7 milhões no período. 
  • Nos 4 anos do governo Bolsonaro, os recursos destinados para o transporte coletivo público caíram 65%, passando de R$ 1,3 bilhão em 2019 para R$ 468 milhões, em 2022. 

Meio Ambiente 

  • Em 2019, a execução financeira foi de R$ 3,3 bilhões, passando para R$ 2,7 bilhões em 2022, uma perda real de 17%.
  • Quem mais perdeu foi o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), com uma queda real de 32% nos quatro anos. 
  • Na administração direta do Ministério, a execução financeira caiu 11,2% entre 2019 e 2022, passando de R$ 244 milhões para R$ 216 milhões, sem contar a destruição do Ibama, que perdeu 8% de seu precário orçamento (de R$ 1,8 bilhão para R$ 1,7 bilhão, em 2022). O desmatamento no governo Bolsonaro foi o maior no período de 15 anos.

Povos indígenas 

  • A Funai se transformou numa verdadeira organização anti-indígena, com uma queda na execução financeira, de R$ 754 milhões para parcos R$ 640 milhões, entre 2019 e 2022, a despeito do crescimento populacional indígena no período. Se em 2010, o orçamento per capita da Funai era R$ 899/indígena, em 2022, esse valor chegou a R$ 400/indígena. 
  • O número de servidores da Funai, para cada mil indígenas, caiu 68% no período.
  • Já os recursos para a Secretaria Especial da Saúde Indígena (Sesai), do Ministério da Saúde, entre 2019 e 2022, caíram 9%, passando de R$ 1,8 bilhões para R$ 1,6 bilhões, o que explica os efeitos nefastos das epidemias, como o genocídio dos Yanomami.

Quilombolas 

  • O racismo institucional do governo Bolsonaro excluiu quilombolas dos grupos prioritários de vacinação, sendo necessária a intervenção do STF, em 2021, para haver um plano específico de enfrentamento à pandemia nessas comunidades. 
  • A regularização fundiária para territórios quilombolas foi desmontada, praticamente nenhum recurso foi gasto, com exceção de 2020 quando foi necessário pagar uma ação judicial.
  • O saneamento rural quilombola aumentou ao longo da gestão Bolsonaro (de R$ 120 milhões executados para R$ 252 milhões, em 2022), grande parte explicada pelos recursos vindos dos restos a pagar, acumulados no quadriênio – R$ 103,8 milhões em 2020, R$ 121 milhões em 2021 e R$ 217,3 milhões em 2022.
  • A distribuição de cestas básicas para quilombolas e outros povos e comunidades tradicionais permaneceu em patamares extremamente baixos (R$ 19 milhões/ano) entre 2019 e 2021. Os gastos com cestas básicas só aumentaram em 2022, com um salto para R$ 298,4 milhões naquele ano.

Igualdade racial 

  • Em 2019, a execução financeira da igualdade racial foi de R$ 18,2 milhões caindo para R$ 3 milhões, em 2020 até chegar a um patamar mínimo de R$ 231,1 mil em 2021. Em 2022, houve um aumento para R$ 6,9 milhões.

Mulheres 

  • Em termos reais, os gastos voltados para as ações de enfrentamento a violência, promoção da igualdade e da autonomia das mulheres em 2019 se manteve no ano de 2022, com valores da ordem de R$ 56,6 milhões. 
  • Além disso, no ano mais grave da pandemia de Covid-19, em 2020, o Ministério só gastou 29,45% dos recursos autorizados.
  • O Ligue 180 teve seus gastos diminuídos em 41% no quadriénio, e a Casa da Mulher Brasileira apresentou: zero de despesas em 2019; R$ 225,2 mil em 2020; R$ 1,2 milhão em 2021; e R$ 21,2 milhões em 2022, grande parte oriundo de restos a pagar de anos anteriores.

Crianças e adolescentes 

  • A execução financeira para assistência a esse público (com recursos vindos do Ministério da Cidadania e do MMFDH) caiu, entre 2019 e 2022, de R$ 568 milhões para R$ 458 milhões, sendo 96% desse montante destinado ao programa Criança Feliz, que recebeu críticas tanto na concepção quanto na execução.
  • Apesar de o trabalho infantil acometer cerca de um milhão e oitocentas mil crianças, o governo Bolsonaro desmontou o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti): em 2019 foram gastos R$ 6,1 milhões e, desde então, nenhum centavo mais. 
  • Ainda que tenha havido transferência de renda a essa faixa etária por meio de programas como Auxilio Brasil ou pela formação de equipes de saúde da família no Ministério da Saúde, os recursos não parecem ter sido suficientes. De acordo com o Unicef, ao menos 32 milhões de meninas e meninos (63% do total) vivem em situação de pobreza.

PEC da Transição

A “PEC da transição” criou um espaço fiscal de R$ 145 bilhões, o que permitiu principalmente a expansão do Bolsa Família. Outras áreas ganharam um “respiro” orçamentário para 2023:

Saúde

O Ministério da Saúde foi agraciado com R$ 22,7 bilhões adicionais com a Emenda Constitucional (EC), originada pela PEC da Transição, o que possibilitará a volta de programas como o Farmácia Popular, o Programa de Saúde Mental, o aumento da cobertura vacinal e a redução de filas de atendimento.

Educação

O Ministério da Educação recebeu R$ 12 bilhões com a EC, voltados às bolsas de graduação e pós-graduação, à recuperação do Programa Nacional de Alimentação Escolar (sem reajuste desde 2016), à infraestrutura de creches e escolas (saindo de apenas R$ 5 milhões reservados pelo Bolsonaro para um total de R$ 356 milhões destinados por Lula à Educação Infantil. Já a ação de infraestrutura nas escolas saiu de R$ 3 milhões para R$ 917 milhões, e o EJA, de R$ 16 milhões propostos por Bolsonaro para R$ 57 milhões. Os programas de valorização da diversidade, o respeito aos direitos humanos e da inclusão, abandonados nos últimos quatro anos, receberam R$ 45 milhões com a EC.

Habitação 

A EC da Transição possibilitou destinar R$ 868 milhões para o Programa Minha Casa Minha Vida em 2023.

Meio Ambiente

  Na gestão de Lula, o ministério passou a se chamar “Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima”, órgão cuja dotação para 2023 alcança R$ 4,1 bilhões. O Ibama teve aumento de recursos de 65% para o combate ao desmatamento e queimadas, passando de R$ 269,5 milhões na LOA de 2023 para R$ 444,5 milhões depois da PEC da transição (EC 126).

Indígenas

O governo Lula criou o Ministério dos Povos Indígenas (MPI) e nomeou para chefiar os órgãos indigenistas, ativistas indígenas: Sônia Guajajara (MPI), Weibe Tapeba (Sesai) e Joênia Wapixana (Funai). Houve recomposição do orçamento da Funai e da Sesai para 2023, e a Funai viu sua dotação inicial aumentar 8%; e a Sesai de 61%.

Quilombolas

O governo Lula acrescentou R$ 68,7 milhões numa rubrica inicialmente zerada para cestas básicas.

Igualdade Racial 

O ministério da Igualdade Racial (MIR) foi recriado tendo uma mulher negra como dirigente da pasta, Anielle Franco. A PLOA 2023 enviada pelo presidente Bolsonaro e aprovada pelo Congresso Nacional não previu recursos para a promoção da igualdade racial, contudo, o novo governo adicionou novos recursos (R$ 4,5 milhões) para a agenda. Também foram anunciados a criação de cotas em cargos de comissão, além da elaboração de diversos programas para o enfrentamento do racismo.

Mulheres

No governo Lula, o Ministério das Mulheres foi recriado sendo liderado por uma feminista, Cida Gonçalves, com recursos adicionais aportados para ações de enfrentamento à violência contra as mulheres (R$ 6,1 milhões), de promoção dos direitos das mulheres (R$ 1,6 milhões), de incentivo à autonomia das mulheres (R$ 1 milhão).

Crianças e Adolescentes

Por ser uma área pulverizada em diferentes ministérios, ainda não está claro quais são os recursos disponíveis para 2023. Sabe-se que houve aumento de 55,2% na dotação inicial para educação infantil em 2023 em relação à 2022 (R$ 357 milhões), além de R$ 11,5 milhões para o sistema socioeducativo, aumento do valor per capita do Programa Bolsa Família (mínimo de R$ 600 por família acrescidos de R$ 150 reais por criança de 0 a 6 anos e R$ 50 por adolescente de 7 a 18 anos e por gestante). Por fim, foi nomeada equipe especializada para a Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (SNDCA) do Ministério dos Direitos Humanos.

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Informações à Imprensa:

Agência Pauta Social

Adriana Silva – (11) 98264-2364 | adriana@pautasocial.org

Camila Aranha – (11) 98995-0732 | camila@pautasocial.org

Depois do Desmonte

A fim de registrar o impacto dos cortes de gastos em áreas fundamentais de proteção aos direitos humanos em uma gestão que privilegiou o equilíbrio fiscal em detrimento da vida e do bem-estar da população, o Inesc apresenta o relatório “Balanço Geral dos Gastos da União – 2019-2022”, que nesta quarta edição recebe o título de “Depois do Desmonte”. 

A publicação mostra como foram usados (ou não) os recursos federais nas áreas: saúde, educação, direito à cidade, meio ambiente, povos indígenas, quilombolas, igualdade racial, mulheres e crianças e adolescentes.

Desigualdades sociais no DF aumentam

O Distrito Federal é um perfeito estudo de caso sobre as gritantes desigualdades no Brasil, em todos os indicadores de políticas públicas:

  • A maior renda per capita é 16 vezes o valor da menor renda;
  • As duas localidades com maior população negra (SCIA e Estrutural, 75,4%) são as que têm menor renda domiciliar – inferior a 2 salários mínimos e a maior taxa de homicídios por 100 mil habitantes – 50,8 (Gráfico 5 e 28);
  • Onde a renda domiciliar é superior a 20 salários mínimos (Lago Sul), a população negra representa menos de um terço do total de habitantes (Gráfico 5);
  • Regiões periféricas de maioria negra somam até 50% da população vivendo em insegurança alimentar nos últimos 3 meses (Gráfico 12);
  • Fercal, a segunda maior concentração de negros no DF (73%), tem a pior infraestrutura de todo o Distrito: menor saneamento básico (20% dos domicílios), menor abastecimento de água (61,4% dos domicílios) e maior quantidade de ruas esburacadas (acima de 70%);
  • O Plano Piloto (área com maioria da população branca) aparece como a região com o maior número de crimes de racismo e injúria racial (Gráficos 29 e 30);

Desigualdade de raça, gênero e classe

Os dados acima fazem parte da 5ª edição do Mapa das Desigualdades, produzido pelo Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos), com apoio da Oxfam Brasil, a partir da última Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios (IBGE/2021), analisando as questões raciais, de gênero e de classe.

Com o intuito não apenas de revelar as discrepâncias de regiões tão próximas geograficamente, mas também de apontar os caminhos para enfrentá-las, o relatório propõe uma reflexão sobre as consequências da construção da capital federal, ignorando a situação socioeconômica das pessoas que ali viviam e das que chegaram, sem recursos, para a construção de Brasília.

A análise parte da situação racial no Distrito Federal, onde 57,4% da população se autodeclara negra. Das 33 Regiões Administrativas (RA) do DF, apenas 9 têm maioria branca. E são apenas esses espaços que dispõem de infraestrutura, cultura, segurança, saúde e educação adequadas. Nas regiões com maioria negra, a realidade é completamente oposta. (Veja quadros no estudo).

Orçamento do DF: falta transparência

O Inesc também avaliou a questão da falta de transparência nos dados do orçamento do Distrito Federal. “Em algumas áreas, as ações citadas nem sequer aparecem no orçamento do ano em vigor, o que sugere falta de prioridade governamental para a redução de desigualdades”, explica Cleo Manhas, assessora política do Instituto.

Na área de habitação, em 2022, houve um gasto de cerca de R$ 2,7 milhões para novas unidades e R$ 1,2 milhão para melhorias. Mas, em 2023, a continuidade dessas duas ações nem sequer aparecem no orçamento. Em relação ao saneamento, em 2023, a única ação que aparece é a regulação de serviços públicos, não havendo informações sobre ações relativas às águas pluviais e limpeza urbana.

Na área de transporte, a maior parte do recurso é destinada para a construção e manutenção da infraestrutura para carros, sem nenhuma execução de recursos para passarelas de pedestres, embora tenha sido gasto R$ 400 mil na construção de estacionamentos. “Na educação, embora haja um aporte em 2022 para novas unidades de educação infantil, a meta do Plano Nacional de Educação para a educação infantil ainda está longe de ser cumprida, especialmente com relação às creches”, completa Cleo.

>>> Acesse o Mapa das Desigualdades do DF 2022 <<<

Mapa das Desigualdades do DF 2022

O Mapa das Desigualdades do Distrito Federal é produzido pelo Inesc (instituto de Estudos Socioeconômicos), com apoio da Oxfam Brasil, a partir da última Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios (IBGE/2021), analisando as questões raciais, de gênero e de classe. Na 5ª edição, o Mapa revela não apenas as discrepâncias de regiões tão próximas geograficamente, mas também aponta os caminhos para enfrentá-las.

 

Seminário discute impactos do Acordo entre a União Europeia e o Mercosul para a Amazônia

Nos dias 6 e 7 de fevereiro ocorrerá, em Brasília (DF), o Seminário Internacional “A retomada da democracia no Brasil: o papel da política externa e do comércio internacional”. Já são presenças confirmadas no evento: o deputado do Parlamento do Mercosul (Parlasul), Ricardo Canese, dos eurodeputados, Ana Cavazzini, Miguel Urban, Michèle Rivasi, além das deputadas brasileiras Fernanda Melchionna e Duda Salabert e do deputado Nilto Tatto. Representantes da sociedade civil, movimentos sociais e de organizações internacionais também estarão no evento.

O objetivo é estabelecer um diálogo democrático entre governo, parlamentares e sociedade civil sobre as ameaças do Acordo entre o Mercosul e a União Europeia, em especial para os povos da Amazônia e os sul-americanos.

Ampliação do debate com a sociedade civil

A Frente Brasileira Contra os Acordos Mercosul-UE e Mercosul-EFTA, promotora da atividade, considera o Acordo de comércio com os países europeus ultrapassado e desigual. Reforça a necessidade de ampliação do debate com a sociedade civil. “Reconhecemos a relevância do estreitamento das relações políticas, comerciais e de cooperação com a União Europeia, mas elas precisam ser pautadas em negociações legítimas, transparentes e com ampla participação da sociedade civil, além de reconhecer os desafios socioeconômicos e climáticos dos tempos atuais”, aponta Maureen Santos, coordenadora do Grupo Nacional de Assessoria da Fase (Solidariedade e Educação).

O Acordo, da forma que está, incentiva a ampliação da produção agropecuária para exportação nos países do Mercosul, acelerando a destruição ambiental e limitando as possibilidades de melhorias sociais e econômicas para pequenos agricultores(as), povos originários e outras comunidades tradicionais. “O Acordo não contém cláusula ambiental compulsória, nem estabelece qual arcabouço legal ou o espaço para litigância em caso de surgirem conflitos, tornando frágil a possibilidade de ações efetivas de reparação para violações de direitos humanos e territoriais”, observa Tatiana Oliveira, assessora política do Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos).

Expansão do agronegócio e conflitos socioambientais

A expansão da produção de soja, milho, carnes e minérios na região nos últimos anos é responsável por graves conflitos socioambientais, os quais podem se intensificar com a redução ou eliminação de tarifas comerciais. O Acordo deve facilitar o aumento da importação de agrotóxicos da Europa que são proibidos nos seus países de origem e de carros a combustão, já produzidos no Brasil.

Do ponto de vista ambiental e climático, o Acordo contribui para o aumento das emissões de gases do efeito estufa e para a devastação da Amazônia, beneficiam de forma desproporcional as empresas transnacionais europeias e aprofundam a desindustrialização no Mercosul. “As negociações de políticas internacionais devem, também, seguir o compromisso do atual governo sobre a retomada da participação social. A Frente defende que novos modelos de comércio, que respondam às necessidades dos povos e ao contexto histórico de hoje, devem ser pautados nos princípios de solidariedade, igualdade, cooperação, sustentabilidade e democracia”, pontua Lúcia Ortiz, da Amigos da Terra Brasil.

Antecede o Seminário uma visita de três dias de campo com parlamentares e jornalistas convidados em Santarém (PA). Na oportunidade, serão realizadas visitas a áreas desmatadas pelo avanço do agronegócio, portos e infraestruturas logísticas para a exportação de commodities, seguidas de rodas de conversas com comunidades tradicionais e rurais da região.

Uma frente em defesa da democracia

A Frente Brasileira Contra os Acordos Mercosul-UE e Mercosul-EFTA foi criada em setembro de 2020 para atuar no enfrentamento aos desmontes e desmandos promovidos na gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro na área de comércio internacional. No período de transição para o novo governo eleito, a Frente atuou, com propostas, nos GTs de Meio Ambiente, Participação Social e Relações Exteriores. Fazem parte da coordenação colegiada da Frente: Fase (Educação e Solidariedade, Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos), Amigos da Terra Brasil, Rebrip (Rede Brasileira pela Integração dos Povos), Internacional dos Serviços Públicos (ISP), Rede Jubileu Sul e Contraf Brasil (Confederação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar). O Seminário conta com o apoio da Misereor e HEKS.

Por uma integração latino-americana participativa

Com Lula presidente o Brasil volta para o cenário global, especialmente para promover a integração latino-americana que, espera-se, seja inclusiva e participativa, possibilitando maior protagonismo da região nas relações de poder internacionais.

No primeiro dia do ano de 2023, Lula foi empossado Presidente do Brasil pela terceira vez, feito inédito na história do país. Uma multidão vermelha tomou conta da capital Brasília, milhares de pessoas foram assistir ao evento cantando e festejando. Havia apreensão no ar, pois dias antes bolsonaristas promoveram atos terroristas violentos, explodindo bombas e incendiando carros e ônibus. Mas nada impediu a alegria do povo, ansioso por dar as boas vindas a quem tinha contribuído para tirar o fascista do Palácio do Planalto.

No mesmo dia foi confirmado o ministério do Lula, 37 integrantes do primeiro escalão, entre nordestinos, mulheres, negros e indígena, composição muito mais diversa da que estávamos acostumados nos últimos anos, majoritariamente integrado por homens brancos. O número de pastas é também sinal de que a complexidade da
sociedade brasileira requer múltiplas interlocuções para a solução efetiva e criativa dos problemas econômicos, sociais, políticos, culturais e ambientais que a sociedade brasileira enfrenta.

VII Cúpula da Comunidade de Estados Latino-americanos e Caribenhos

Foram anunciadas prioridades entre as quais o combate à fome e ao aquecimento global e a retomada da participação social desdenhada pela gestão Bolsonaro. Lula sinalizou ainda a importância que a integração latino-americana irá ocupar na sua agenda internacional. Com efeito, sua primeira viagem além-fronteiras é para participar
da VII Cúpula da Comunidade de Estados Latino-americanos e Caribenhos (Celac), realizada 23 e 24 de janeiro em Buenos Aires, sob a presidência pro-tempore da Argentina. Com essa participação, o Brasil passa a reintegrar a Celac, abandonada por Bolsonaro em 2019. A mudança de postura do governo do maior país da América do
Sul simboliza o retorno do Brasil à sua própria região.

Mecanismos de integração regional são relevantes, pois podem propiciar a conquista de espaços de autonomia e soberania para definição de políticas públicas e opções econômicas próprias. Isto é, uma integração que contribua para o desenvolvimento sustentável dos países e territórios bem como do exercício da soberania democrática dos povos.

Para que tal integração aconteça a participação social é necessária. Os poderes públicos dos Estados-membro precisam escutar as vozes e as demandas dos sujeitos de direito. As experiências brasileira e internacional têm demonstrado que a participação de organizações e movimentos sociais nas decisões dos governos traz muitos ganhos
como o aumento da legitimidade política, o aprimoramento da governança, o melhor desempenho das políticas públicas uma vez que há maior proximidade com as necessidades dos cidadãos e a possibilidade de mediar conflitos.

Os espaços de participação permitem a incorporação de uma pluralidade de atores sociais nos processos decisórios sobre as políticas, não se restringindo apenas aos grupos com influência sobre os tomadores de decisão, aumentando consequentemente a transparência e a prestação de contas. Ademais, a participação social contribui, e muito, para evitar custos elevados decorrentes de corrupção, de paralisações de obras e de processos judiciais de grandes projetos advindos de violações de direitos de povos e territórios impactados.

Espera-se que o presidente Lula não somente crie um Conselho Nacional de Política Externa – o Itamaraty é um dos poucos ministérios que ainda não conta com mecanismo institucional de participação social – como leve para os espaços existentes de integração regional a proposta de implementação de institucionalidades de interação entre Estado e Sociedade. Em relação à Celac, por exemplo, em 2021 mais de 40 organizações da sociedade civil da América Latina e do Caribe apresentaram aos governos da região proposta para a criação da Celac Social.

Há expectativa de inúmeros atores sociais da região de que o Brasil lidere um processo de espraiamento da participação da sociedade em assuntos de interesse público. O país tem experiência e reúne evidências de que trata-se de um mecanismo em que todas as partes ganham. A participação social é necessária para assegurar uma integração regional efetivamente cidadã.

Governo de transição: Inesc contribuiu com GTs e Conselho de Participação Social

Durante o processo de transição do atual governo para o novo mandato de Lula, o Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) contribuiu com os trabalhos dos Grupos Técnicos (GTs) em diversas áreas, e também com o Conselho de Participação Social . Sete integrantes da Instituição, entre assessoras políticas e dirigentes, colaboraram voluntariamente com os GTs de Desenvolvimento Social, Relações Exteriores, Cidades, Povos Originários, e Igualdade Racial. Além destes, Rosali Faria, conselheira do Inesc, foi nomeada como uma das coordenadoras do GT de Mulheres.

Os Grupos Técnicos e o Conselho produziram relatórios com diagnóstico abrangente de cada área, reunindo informações sobre a gestão dos órgãos e entidades que compõem a Administração Pública Federal. Também recomendaram medidas a serem tomadas no início do novo governo. Publicação lançada em abril pelo Inesc, o relatório “A conta do desmonte – Balanço Geral do Orçamento da União 2021“,  serviu de subsídio para constatar o processo de desfinanciamento de políticas públicas que, interrompidas ou prejudicadas pela má gestão de recursos, fizeram o Brasil retroceder no combate às desigualdades e na preservação dos direitos humanos.

Na tarde desta terça (13/12), o presidente eleito Lula da Silva recebeu os relatórios finais, em cerimônia que encerrou os trabalhos dos Grupos Técnicos da transição, em Brasília. Antes, reuniu-se com o Conselho de Participação Social, no qual o integrante do colegiado de gestão do Inesc, José Antônio Moroni, participou ativamente, representando a Plataforma dos Movimentos Sociais por Outro Sistema Político.

“Nossa participação nos GTs e no Conselho é também um reconhecimento do trabalho do Inesc, que, durante os últimos anos, se empenhou em denunciar o desmonte orçamentário e das políticas públicas do governo Bolsonaro e, junto a outras ONGs e movimentos sociais, incidiu para que a população tivesse acesso ao mínimo necessário, mesmo diante do enorme retrocesso de direitos”, relembrou Moroni.  “Esperamos que o novo mandato de Lula siga em diálogo aberto com as organizações da sociedade civil. Só conseguiremos reconstruir esse país com a participação dos que estiveram na linha de frente contra o avanço do conservadorismo e sofrendo as consequências do desmonte ”, concluiu.

Candidaturas Coletivas nas Eleições 2022

Estudo do Inesc, em parceria com o coletivo Common Data, faz uma análise quali-quantitativa das candaturas coletivas que foram às urnas em 2022.  O objetivo é auxiliar na produção de conhecimentos sobre essa alternativa à
política tradicional e constituir evidências que possam embasar estudos futuros mais detalhados.

A partir da análise e tratamento dos dados fornecidos pelo TSE,  pretendemos fundamentar respostas a questões como: quantos são? Em que regiões estão mais concentrados? Em que espectro político são mais expressivos? Quantos cocandidatos reúnem? Quais são os perfis das pessoas que se registram como cabeças de chapa em termos de gênero, raça/cor e faixa etária? São mandatos majoritariamente progressistas, situados no campo da “esquerda”, ou já se pulverizaram para os diferentes partidos e defendem pautas diversas? Têm o potencial de manter-se como alternativa à política tradicional ou correm o risco de ser capturados pela lógica fisiológica predominante na política?

Orçamento secreto é controlado por pequeno grupo de partidos, parlamentares e pessoas externas

O orçamento secreto movimentou entre 2020 e outubro de 2022 R$ 45 bilhões de empenhos e R$ 28 bilhões de pagamentos, considerando compromissos assumidos e pagos em cada ano somados aos pagamentos de valores empenhados desde 2020, os chamados “restos a pagar pagos”.

Tabela 1: Valores do orçamento secreto (valores correntes)

Fonte: Siga Brasil/Senado  (data da extração: 24 de outubro de 2022).
Elaboração: Inesc e Observatório do Clima.

Para 2023 estão previstos no Projeto de Lei Orçamentária (PLOA 2023) mais R$ 19 bilhões. Isto significa, por exemplo, que a cada R$ 100 reais de recursos separados para despesas não obrigatórias – como o combate ao desmatamento, ao abuso e violência sexual contra crianças ou para saneamento urbano, entre tantas outras políticas – pelo menos R$ 15 serão distribuídos seguindo a vontade de um pequeno grupo de deputados e senadores com base em critérios políticos e partidários nada transparentes.

A apuração dos valores executados pelo orçamento secreto, incluindo os pagamentos dos restos a pagar pagos, só é possível porque os dados estão consolidados no portal Siga Brasil/Senado com uma marcação denominada RP9 (Resultado Primário 9), uma forma de classificação da despesa pública utilizada para separar a execução das despesas que tiveram como origem valores indicados pelo parlamentar relator do orçamento de outros gastos que também impactam no chamado Resultado Primário[1].

As emendas de relator estão concentradas na função saúde, que representou 57,4% dos R$ 28,79 bilhões já pagos; seguido da função urbanismo, com 11,53%; da assistência social, com 5%, e da educação com 4,68% (Siga/Senado).

Ainda que gastos mais elevados com saúde sejam de inegável urgência e relevância, os critérios políticos de destinação das emendas de relator representam um desvio inconstitucional e sem precedentes dos critérios estabelecidos para repartição dos recursos públicos destinados a esta política. Desvio semelhante ocorre com os recursos destinados à assistência social e educação. Como já alertou o Tribunal de Contas da União (TCU), estas políticas públicas se sujeitam a um regime jurídico-constitucional que exige critérios objetivos de escolha dos destinatários e repasse de recursos do orçamento da União. Assim, as emendas RP9 não são compatíveis com os princípios, diretrizes e objetivos constitucionais que norteiam o Sistema Único de Saúde (SUS) e o Sistema Único de Assistência Social (Suas) (TC 008.731/2022-5).

Não menos grave é a instrumentalização das demais políticas para a realização de pagamentos a prefeituras, bem como a pessoas jurídicas privadas que resultam no favorecimento de iniciativas ligadas a grupos políticos e partidários.

Exemplo sintomático é a execução da ação ligada ao Ministério da Cidadania, voltada ao desenvolvimento de atividades e apoio a projetos e eventos de esporte, educação, lazer e inclusão social, que deveria atender a todo o país. Esta ação tem sido utilizada para viabilizar a execução de emendas de relator que se concentram em poucos beneficiários e lugares. É o caso da ONG denominada Instituto Carioca de Atividades (ICA), que acumula em 2022 R$ 20 milhões empenhados e R$ 12 milhões pagos. De 2020 a 2022 a mesma ONG recebeu R$ 98 milhões em emendas, principalmente emendas de relator. O cruzamento de dados que apresentamos a seguir permitiu identificar quem indicou os recursos executados em benefício da ONG, são eles, Hugo Leal (PSD), Daniel Silveira (PTB) e Nicodemos de Carvalho Mota, este último sendo ele próprio o diretor administrativo do Instituto Carioca de Atividades, segundo página do Linkedin.

Escolhas metodológicas para o cruzamento de bases de dados

Embora classificado com o marcador RP9, o orçamento continua secreto, porque não existe hoje uma base pública de informação que relacione os valores indicados pelos deputados, senadores e usuários externos com os pagamentos efetivamente realizados. Ou seja, não é possível saber, de maneira oficial, quem indicou os valores pagos pelo Executivo federal.

A partir de 2021, por decisão do Supremo Tribunal Federal  (STF), começaram a ser publicadas no site da Comissão Mista de Orçamento (CMO) listas com os nomes dos parlamentares e suas respectivas indicações  de valores e beneficiários. Em 2022, já foram publicadas 56 listas com o nome de quem indica (deputado, senador e usuário externo, “qualquer pessoa” pode indicar beneficiários), o favorecido indicado (nome e CNPJ), a partir de qual órgão será executada a despesa, e o valor indicado, entre outras informações. Mas estas listas são publicadas uma a uma, em planilhas de Excel, e sequer trazem os partidos dos quais os deputados e senadores fazem parte.

Com o propósito de demonstrar o caráter político da falta de transparência do Executivo e Legislativo, bem como do uso do recurso público, o Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) e o Observatório do Clima elaboraram um levantamento inédito, revelando o que é possível hoje saber sobre a execução deste orçamento entre janeiro e outubro de 2022.

O cruzamento de dados teve como objetivo juntar duas bases diferentes: a lista consolidada de indicações de emendas publicada pela Comissão Mista de Orçamento (Lista CMO) e a base de dados da execução das emendas (RP9) disponibilizada na plataforma Siga Brasil do Senado federal. Os dados foram cruzados a partir dos CNPJs indicados (CMO) e beneficiados (Siga).

>>> Acesse a planilha com as bases e o cruzamento de dados >>>

O levantamento seguiu os seguintes passos:

  • Foram reunidas todas as 56 listas publicadas pela CMO em uma só planilha, e foram acrescidos manualmente os partidos dos deputados e senadores que fizeram indicações de recursos para o ano de 2022.
  • Foi extraído do Portal Siga Brasil a execução das emendas RP9, com o filtro de CNPJs beneficiados por cada pagamento, incluindo os valores empenhados e pagos entre janeiro e outubro de 2022. Desta forma, não foram considerados os valores pagos referentes a restos a pagar pagos.
  • Foi feito o cruzamento de dados utilizando as duas bases a partir do CNPJ. Desta forma, foram correlacionadas as indicações para cada CNPJ com a respectiva execução orçamentária do RP9 para este mesmo CNPJ. O cruzamento utilizou a linguagem de programação (python).

Não foram considerados os valores relativos a restos a pagar pagos em 2022 (R$ 4,3 bilhões) que resultaram de indicações realizadas em anos anteriores, conforme valores apresentados na tabela 2.

No cruzamento que resulta, assim, da junção de duas bases, foram identificadas perda de dados/valores: i) de R$ 1,1 bilhões, em relação ao que foi indicado na lista da CMO; ii) de R$ 572 milhões de empenhos e R$ 129 milhões de pagamentos em relação aos valores da base de execução utilizada (Siga Brasil). As perdas de valores em função do cruzamento são registradas na tabela 2.

Tabela 2: Valores nas bases originais (CMO e Siga), valores capturados pelo cruzamento de dados e perdas de valores (dados de 2022)

Fonte: Siga (extração de dados 24 de outubro de 2022), lista CMO e cruzamento de dados.
Elaboração: Inesc e Observatório do Clima.

A checagem de dados demonstrou que a perda de valores pode ser atribuída, principalmente, ao desencontro de CNPJs entre as duas bases; ou seja, não execução de valores indicados (perda de R$ 1,1 bilhão) ou execução de valores para CNPJs sem correspondente na lista de indicações (perda de R$ 572 milhões em valores empenhados e R$ 189 milhões em valores pagos).

Em relação às perdas de valores empenhados e pagos cabe citar um exemplo. Em 2022 foi feito empenho de R$ 77,35 milhões e pagamento no valor de R$ 15,36 milhões para a empresa Construmaster Construção e Locação de Máquinas LTDA (CNPJ: 12463759000190), localizada no Maranhão, para realização de serviços de pavimentação de rodovias. Esta execução (que pode ser localizada na planilha de dados, na aba “base SIGA”) não foi capturada pelo cruzamento, uma vez que o CNPJ não possui correspondente na lista da CMO, ou seja, não aparece nenhuma indicação para este beneficiário/CNPJ.

O cruzamento demonstrou grande ocorrência de casos em que mais de uma pessoa/deputado/senador de mais de um partido indica um mesmo CNPJ como beneficiário, situação que predomina na execução de recursos da saúde. Nestes casos, os valores da execução por CNPJ beneficiário só podem ser individualizados a partir da atribuição manual de valores entre parlamentares e usuários externos que realizaram a indicação.

Diante disto, que só reforça o caráter secreto do orçamento, optou-se por um tratamento manual da base a fim de atribuir, quando possível, os valores pagos às respectivas indicações, de forma individualizada. Para tanto foram adotados como critérios:

  • Distribuição dos valores pagos entre as indicações nos casos em que a somatória dos valores indicados é igual ou muito próxima ao valor pago e/ou quando a somatória dos valores pagos é superior aos valores indicados;
  • Não distribuição da execução entre indicações quando os valores pagos são inferiores aos valores indicados; onde não há correspondência de valor que permita correlacionar o pagamento a uma ou mais indicações; ou onde um valor pago é igual a um mesmo valor indicado por mais de um parlamentar e/ou usuário externo;
  • Atribuição preferencial de valores de execução a deputados e senadores em detrimento de indicações de usuários externos.

Desta forma, a Coluna D do cruzamento atribui linha a linha os pagamentos efetivamente realizados às respectivas indicações de parlamentares e usuários externos, quando possível. Isto significa que em muitos casos não foi possível atribuir valores, o que resultou na não atribuição de execução no valor de R$ 957 milhões.

O objetivo do presente levantamento foi o de demonstrar o caráter político da falta de transparência das emendas de relator e, também, estimular as pessoas a se apropriarem desta base de dados que, apesar de limitada no tempo, dado que abarca somente recursos pagos de janeiro a 24 de outubro de 2022, é notadamente reveladora do controle do orçamento público por partidos e pessoas.

Os resultados do cruzamento de dados:

No cruzamento foi possível atribuir individualmente emendas pagas no valor de R$ 5,88 bilhões (Coluna D). Como os valores pagos no cruzamento somaram R$ 6,8 bilhões (Coluna C), registra-se que não foi possível atribuir individualmente o valor de R$ 1 bilhão.

Dos R$ 5,88 bilhões de valores atribuídos tem-se que:

  • Seis partidos (PP, PL, PSD, MDB, UNIÃO E REPUBLICANOS) concentram 81% do total executado por indicação de partidos.
  • Usuários externos controlam sozinhos 31,3% dos recursos pagos.

O cruzamento de dados mostrou que a possibilidade de usuários externos realizar indicações de emendas, fato já amplamente noticiado pela imprensa, tem sido intensamente utilizada para mascarar a execução de elevados valores, o que seria factível caso não houvessem padrinhos – partidos e parlamentares – por trás de tais indicações.  Vale notar que consta no presente levantamento as execuções atribuídas, por exemplo, a Roberto Rodrigues uma das pessoas presas na operação quebra ossos.

Tabela 3: Síntese das indicações e execuções por partido (valores indicados e pagos de janeiro a outubro de 2022)

Fonte: Siga (extração de dados 24 de outubro de 2022), lista CMO e cruzamento de dados.
Elaboração: Inesc e Observatório do Clima.

Os maiores executores do orçamento secreto

A planilha que resultou do cruzamento de dados das listas da CMO com os dados orçamentários do Siga também permite a identificação de quais deputados, senadores e usuários externos tiveram os CNPJs por eles indicados beneficiados pela execução orçamentária.

No topo da lista da execução do orçamento secreto aparece o deputado Arthur Lira (PP/AL) que indicou R$ 134,52 milhões em emendas para CNPJs que tiveram uma execução de R$ 127,2 milhões.

Em segundo e quarto lugar na lista de quem mais executa o orçamento secreto estão dois usuários externos cujos nomes já foram identificados pela imprensa por terem indicados valores elevados, sem que se soubesse, contudo, quais os montantes pagos associados às indicações. São eles: Carlos Guilherme Pereira Junior e Dener Bolonha.

Tabela 4 – Os maiores executores do orçamento secreto

Fonte: Siga (extração de dados 24 de outubro de 2022), lista CMO e cruzamento de dados.
Elaboração: Inesc e Observatório do Clima.

Os dados aqui revelados foram produzidos ao longo de três semanas de trabalho, exigiram a utilização de linguagem de programação e um extenso trabalho manual (Coluna D) de atribuição de valores executados às indicações, demonstrando o caráter político e inaceitável da falta de transparência e do destino de uma parcela cada vez maior do orçamento público federal sem o amparo legal.

 

[1] Além do chamado RP 9 existem as despesas primárias obrigatórias (RP1), as despesas primárias discricionárias (RP2), as despesas financeiras (RP0) e outras formas de emenda parlamentar: emendas individuais (RP6), emendas de bancada (RP7) e emendas de comissão (RP8).

Perfil dos eleitos nas Eleições de 2022

Pesquisa realizada pelo Inesc, em parceria com o coletivo Common Data, revela o perfil dos eleitos nas eleições nacionais, estaduais e distritais de 2022, a partir do cruzamento de dados sobre gênero, raça/cor, patrimônio e posição ideológica.  O estudo também quantificou os eleitos que utilizaram nomes de urna com menção a cargos militares, de
 forças de segurança ou religiosos.

 

Orçamento Temático de Acesso a Medicamentos (OTMED 2021)

O Orçamento Temático de Acesso a Medicamentos (OTMED) analisa as despesas com a Assistência Farmacêutica efetuadas pelo Governo Federal. Em 2021, seu gasto cresceu 33% quando comparado com o do ano anterior – aumento impulsionado pela compra de vacinas para o enfrentamento da Covid-19. Contudo, apesar do agravamento da pandemia naquele ano, ao analisarmos o Orçamento da Saúde como um todo, seja considerando a Função Saúde ou o Orçamento do Ministério da Saúde, vemos que o volume de recursos investidos em 2021 foi similar ao de 2020.

Novo estudo mapeia origem do dinheiro do Orçamento Secreto em 2023

Pouco conhecida da opinião pública, a Reserva de Contingência é um mecanismo do orçamento da União que existe desde a década de 60 no Brasil e deveria funcionar como um “fundo de reserva” para resguardar os cofres públicos de eventuais situações inesperadas.

Contudo, nos últimos anos, a Reserva de Contingência se transformou em uma ferramenta de captura de recursos de órgãos e Fundos públicos e, mais recentemente, tem favorecido o crescimento do orçamento secreto, responsável pelo desempenho favorável de muitos partidos para garantir uma vaga nessas eleições para a Câmara e o Senado Federal.

R$ 19 bilhões para o orçamento secreto

Só no ano de 2022, o total de recursos alocados para Reserva de Contingência foi de R$ 58,5 bilhões, cifra que pulou para R$ 80,4 bilhões em 2023, segundo o Projeto de Lei Orçamentária (PLOA) enviado ao Congresso pelo governo do presidente Jair Bolsonaro. Desse total, R$ 19 bilhões já estão reservados para o orçamento secreto, valor que está dentro dos R$ 38,8 bilhões previstos pelo PLOA para todas as emendas de parlamentares (deputados, senadores e relator). Outros R$ 41 bilhões estão aprisionados como reserva financeira, basicamente para garantir o cumprimento do Teto dos Gastos.

Originalmente, a Reserva de Contingência deveria ter um valor mínimo fixado em 0,2% da Receita Corrente Líquida da União, para que o Poder Executivo pudesse abrir créditos suplementares, ao longo do ano, diante da necessidade de gastos não previamente conhecidos e autorizados nas Leis Orçamentárias Anuais. Porém, esse percentual já chega a 7%, funcionando como um verdadeiro cheque em branco do governo federal, que vai sendo “sacado” ao sabor de critérios e prioridades pouco transparentes.

“O orçamento para políticas públicas essenciais para enfrentar problemas sociais, ambientais, urbanos, de segurança pública entre tantos outros será inviabilizado com esta sobreposição dos efeitos do Teto dos Gastos e da Reserva de Contingência capturada pelas emendas de relator”, explica Alessandra Cardoso, assessora política da organização responsável pelo levantamento, o Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos).

De cada R$ 100,  R$ 15 serão gastos pelos que controlam o orçamento secreto

Segundo o estudo, os R$ 19 bilhões destinados às emendas de relator representam nada menos do que 15% de todas as despesas discricionárias da União em 2023 que somam R$ 132,2 bilhões. Ou seja, de cada R$ 100 reais gastos pela União em todo o Brasil e para todas as políticas públicas, pelo menos R$ 15 serão gastos a partir de indicação política do relator do orçamento, juntamente com partidos que controlam o orçamento secreto (PP, PL, PSD, União Brasil e Republicanos).

Ao inflar os números da Reserva de Contingência, o Governo Federal, além de incentivar a falta de transparência no Orçamento da União, também provoca a redução de verbas em áreas de onde esse dinheiro está sendo retirado.

De acordo com o Inesc, desde 2019, diversos fundos especiais públicos, como o Fundo Nacional do Meio Ambiente, estão sendo desmontados da sua essência, que era a de garantir receitas para setores estratégicos para financiar o combate às desigualdades no Brasil. Dos R$ 36 milhões que iriam para o Fundo Nacional do Meio Ambiente, R$ 33 bilhões foram capturados para a tal Reserva. Também não foi poupada uma fonte de recursos criada por uma legislação (Lei nº 7.347/85) voltada à reparação de danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico, paisagístico, por infração à ordem econômica e a outros interesses difusos e coletivos. Dos R$ 498,8 milhões previstos no PLOA 2023 para o Fundo de Defesa de Direitos Difusos, R$ 429 milhões (86%) ficaram aprisionados na Reserva de Contingência.

“É uma sentença de morte para estes Fundos Públicos que nasceram para assegurar recursos para políticas essenciais, mas com baixo poder de disputa dentro do orçamento geral da União”, afirma a assessora política do Inesc, Alessandra Cardoso.

Ela lembra que, apesar de as emendas do relator terem sido explicitamente institucionalizadas no PLOA de 2023, sua constitucionalidade é objeto de três Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs Nº 850, 851 e 854), que tramitam em conjunto no STF. A prática também é alvo do Tribunal de Contas da União (TCU), que enxergou “a falta de critérios de equidade na distribuição de emendas entre os parlamentares têm o potencial de afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais” (TC 008.731/2022-5).

“A LDO e o PLOA 2023 tornaram mais evidente uma relação até então nebulosa entre a Reserva de Contingência e as emendas de relator (RP 9), ao criarem uma reserva específica para atender a tais emendas autorizativas, mas não impositivas, como as emendas individual e de bancada”, frisa o documento do Instituto.

Se até o ano passado, era difícil separar o uso dos recursos para o orçamento secreto, neste Projeto de Lei Orçamentária de 2023, o governo federal foi obrigado a  realizar o detalhamento de cada reserva específica para atender às emendas individuais, às emendas de bancada de execução obrigatória e às emendas de relator (RP9) – o que foi feito por meio dos códigos e títulos: 0Z04, 0Z05, 0Z06, 0Z07, 0Z08. Emendas de relator ganharam o apelido de “Orçamento Secreto”, pelo fato de o autor do texto não precisar se identificar quando autoriza a destinação de um recurso público.

Desta maneira, foi possível identificar, por exemplo, que, além de concentrarem quase a totalidade dos recursos da seguridade social (R$ 21,4 bilhões), as emendas para 2023 também vão se apropriar de recursos de fontes diversas, mas com uma forte concentração, inclusive, de recursos da Educação Básica (no valor de R$ 884 milhões).

Seguridade social em risco

No PLOA 2023, a Reserva específica para todas as emendas parlamentares se apropria de nada menos do que 98% de todo o recurso capturado da Seguridade Social pela Reserva de Contingência. Na prática isto significa tirar da Seguridade Social R$ 21,45 bilhões e colocá-lo a serviço das emendas parlamentares e de relator, seguindo escolhas políticas e prioridades que não dialogam e não respeitam a estrutura de financiamento e execução da política de seguridade social. E, no caso das emendas de relator, já é sabido que estes recursos serão aplicados sem respeitar a Constituição, com evidentes problemas de corrupção e com fortes interesses eleitoreiros.

“É fundamental acompanhar a tramitação do PLOA 2023, dado que a proposta enviada pelo governo ao Congresso Nacional retira expressivos recursos de políticas públicas e contribui para fragilizar fundos setoriais estratégicos,  que vêm tendo, por sucessivos anos, quase todos os seus recursos capturados pela Reserva de Contingência”, finaliza a assessora.

>>> Acesse o levantamento sobre a origem do orçamento secreto em 2023 <<<

Reserva de Contingência: sua ação silenciosa e suas conexões com o “orçamento secreto”

Estudo mapeia origem do dinheiro do Orçamento Secreto em 2023: dinheiro vem de fundos estratégicos para o combate às desigualdades no Brasil, capturados por um mecanismo chamado Reserva de Contingência.

Maioria entre candidatos com nomes de cargos militares e religiosos na urna é homem e de direita

Seja para atrair um grupo de eleitores ou para demonstrar um vínculo com certos valores políticos, algumas candidatas e  candidatos costumam definir o nome que vai para a urna pelo cargo que denota sua profissão. Nas Eleições 2022 não está sendo diferente. 

Pelo menos 2,1 mil postulantes mencionaram nomes de cargos militares e religiosos para definirem suas candidaturas. Candidatos homens e de partido de direita foram maioria entre aqueles que exploraram esses cargos para angariar votos. Entre os cristãos evangélicos, houve destaque para o grupo de “pastores” que se definiram assim. Mais detalhes fazem parte do estudo “Análise sobre a presença de militares e religiosos na urna”, mais um da série do Inesc em parceria com a Commom Data, Perfil do Poder nas Eleições 2022

Militares

Militares, ou de Forças de Segurança, são autorizados pela Lei Eleitoral a concorrer por cargos eletivos. Contudo, a maioria dessas candidaturas que se utilizam do cargo no nome de urna contam com propostas conservadoras para o modelo de segurança brasileiro. Entre os 1359 candidatos militares que usaram seus cargos em nomes de urna, pelo menos 75% fazem parte de partidos de direita e 86% são homens. Ao menos 55,26% disputam para ser deputados estaduais. A média de idade dos candidatos é de 50 anos.  

“Em nome de Deus”

O Estado é laico, mas candidatas e candidatos religiosos usam suas denominações nas igrejas onde pregam ou frequentam para se identificarem com a base eleitoral. É o pensamento de pelo menos 752 candidatas e candidatos que fazem menção a alguma filiação religiosa. 

A maior parte desses postulantes são de partidos de direita (67,95%), 72,47% são homens e 62,77% usam o nome “pastores”. Outras denominações cristãs também são usadas para os nomes da urna: irmãos e irmãs (12,5%) e missionários (9,84%).

 

Quer saber mais? Leia o estudo completo aqui: Análise sobre a presença de militares e religiosos na urna

Análise sobre a presença de militares e religiosos na urna

Esta nota do Inesc, em parceria com o coletivo CommonData, traz uma análise sobre candidaturas que usam cargos militares, de forças de segurança e religiosos no nome de urna – ferramenta utilizada para identificação e criação de vínculo com eleitores. Foram analisadas as 27.958 candidaturas registradas e consideradas aptas até o dia 15/08/2022 – data definida como limite pelo TSE para o registro de candidaturas.

 

Renovação na política: o que diz a distribuição dos recursos?

Mais mulheres no poder, mais pessoas negras, indígenas, LGBTQIAP+ ocupando a política! Seja nos partidos do espectro da direita, do centro ou da esquerda, todos têm se utilizado de algumas ou todas essas e outras bandeiras sociais que reivindicam maior pluralidade e diversidade na política brasileira. Cotas de candidaturas de mulheres e porcentagem de recursos, também para pessoas autodeclaradas negras com prazo definido para repasse do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), são algumas das normativas criadas para que os partidos não só respeitem as regras de distribuição equitativa do Fundo, mas demonstrem vontade política nessa distribuição. Assim como em 2018, faltando tão poucos dias para a decisão das eleições de 2022, tanto candidaturas femininas quando de pessoas negras denunciam que os repasses não foram integralmente repassados pelos partidos. Assistiremos a mais uma anistia?

A distribuição dos recursos públicos dos partidos, bem como as doações, que poderíamos destacar como apoio da sociedade civil, uma vez que só podem ser feitas por pessoas físicas, traduzem essa “vontade política” por mais diversidade e representatividade no poder? Renovação no poder poderia ser definida pela entrada e permanência de pessoas que, historicamente, não atuavam na política institucional até os últimos anos? O que seria elemento fundamental para que a pluralidade das candidaturas refletisse a pluralidade de pessoas efetivamente eleitas e eleitos? Podemos concordar que recurso financeiro é um investimento político importante para que essa realidade se materialize?

Vamos aos recursos!

Há 5 dias das eleições, das 29.555 candidaturas registradas, 7.067, ou 24%, não declararam recebimento de nenhum recurso financeiro público (FEFC) para suas campanhas. No que se refere às doações às campanhas, dos quase de R$ 680 milhões doados por pessoas físicas, apenas 13% ou aproximadamente R$ 89 milhões foram destinados a candidaturas de mulheres, e 4% ou pouco mais de R$ 26 milhões foram destinados a candidaturas pretas. Esse dado só reforça a importância da existência de um fundo público que busque garantir a distribuição mais equitativa dos recursos, também construindo regramentos que incidam no repasse feito pelos partidos políticos.

Alguns números nos ajudam a debater sobre a distância entre o discurso da renovação e a distribuição de recursos financeiros. De acordo com o levantamento da Plataforma 72horas, até 27 de setembro de 2022, enquanto 10.612 candidaturas que pleiteiam a cadeira de deputada(o) estadual declararam o recebimento de pouco mais de R$1 bilhão, as 10.648 candidaturas que disputam as 513 cadeiras da Câmara Federal declararam aproximadamente R$2,5 bilhões.

Considerando então o investimento maior dos partidos nas candidaturas a deputado(a) federal, como a divisão dos recursos vem sendo realizada e como podemos utilizá-la como lente para pensarmos sobre renovação ou manutenção de espaços do poder institucional?

Ainda de acordo com a Plataforma 72 horas, das 10. 628 candidaturas que estão na disputa pela Câmara Federal, 448 disputam a reeleição pelas 513 cadeiras. Ou seja, 4,2% do total de candidaturas são para reeleição, e correspondem a 87,3% das cadeiras. Quando analisamos a distribuição de recursos, as candidaturas a reeleição declararam até o momento o recebimento de R$747.417.252, sendo 61 candidatas e 367 candidatos, que somados às 2 candidatas e 18 candidatos que não declararam recebimento do Fundo Especial, totalizam 448 candidaturas. Numa conta simples, que sabemos não ser assim, significa dizer que cada candidata e candidato à reeleição para a Câmara Federal recebeu em média, até o momento e subtraídas as 20 candidaturas que declararam não terem recebido nada, R$1,7milhão.

Já às candidaturas que não concorrem à reeleição, que totalizam 7.207 dividem o recurso de R$ 1,7 bilhão, o que significaria, também utilizando a divisão igualitária, caso o fosse, uma média de R$ 239 mil.

Consideremos então as candidaturas à reeleição. Antes, é importante destacar que a lente a ser utilizada nesta leitura não pode ser a da igualdade, pois como bem sabemos, a desigualdade estrutural da sociedade brasileira nos convoca a agir de maneira equitativa, quando consideramos a correlação desigual de forças que resultam na permanente ocupação dos lugares sociais e políticos de poder por uma

parcela masculina, branca e cisheteronormativa da sociedade. Sendo assim, quando nos referimos à reeleição, é preciso destacar que a recente história de ocupação de mulheres, pessoas negras, indígenas, LGBTQIAP+ na política institucional não pode, nem de longe, ser considerada “manutenção de poder”, visto que são grupos recém-chegados nesses espaços.

Dito isso, vamos verificar o que os dados nos dizem. Das candidaturas à reeleição, no que se refere à raça/cor, 312 das 428, ou 72,89% das pessoas que receberam recursos, são brancas, 114, ou 26,63%, são  pessoas negras, 01 ou 0,23%, é indígena e 01 ou 0,23% é amarela. No que se refere ao gênero, são 367 homens, ou 86%, e 67 mulheres, ou 14%.

Infelizmente, a luta por maior representatividade na política, ainda se restringe às cotas das candidaturas e não efetivamente ocupação de cadeiras, o que seria um passo fundamental para começarmos a falar de um impacto real rumo a equidade e reparação histórica da sociedade brasileira com os povos originários, com a população negra e com as mulheres no Brasil.

O escandaloso racismo institucional nas Eleições de 2022

“O escandaloso racismo institucional nas Eleições de 2022” foi um texto publicado originalmente no dia 21 de setembro, no Le Monde Diplomatique.

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) determinou que, nas Eleições de 2022, os partidos seriam obrigados a repassar, até o dia 13 de setembro, 100% do recurso da cota de gênero e raça/cor às candidaturas de mulheres e pessoas negras, o que corresponde a 30% do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC). A determinação do TSE ocorreu porque nas Eleições de 2020, o atraso no repasse prejudicou as candidaturas desses grupos sociais.

A regra determina que a prestação de contas parcial deve ser feita ao Sistema de Prestação de Contas Eleitorais (SPCE) em até 72 horas a partir do recebimento do recurso[1]. Considerando o prazo, o cenário ficou da seguinte forma: foi repassado um montante de R$ 4,7 bilhões a todas as candidaturas, sendo R$ 4 bilhões do FEFC, R$ 236,9 milhões do Fundo Partidário e R$ 448,3 milhões de doações. Dos R$ 4 bilhões do FEFC, 30,6% foi repassado a mulheres e 69,4% para homens, e em relação ao recorte racial, o repasse foi de 36% para negros/as (pretos/as + pardos/as) e 62,7% para brancos/as. A determinação do TSE foi, portanto, cumprida.

No entanto, as desigualdades na distribuição dos recursos de campanha ainda são gritantes, revelando o persistente racismo institucional partidário, conforme pudemos checar na Plataforma 72Horas. Avaliando todas as fontes de recursos, as mulheres brancas, pardas e amarelas ficam muito atrás dos homens dentro do seu grupo racial. Às mulheres brancas foi destinado 35,6% do valor recebido por homens da mesma cor, ou seja, enquanto eles foram beneficiados com R$ 2,2 bilhões, elas ficaram com R$ 800,6 milhões. As mulheres pardas receberam R$ 384,3 milhões (52% a menos do que as mulheres brancas) e os homens pardos R$ 866,5 milhões (61,5% a menos que os homens brancos).

Nas candidaturas indígenas, onde há proporção mais equânime de número de candidaturas (94 homens e 77 mulheres), a distribuição do recurso foi mais equitativa: dos R$ 28,7 milhões distribuídos para 133 candidaturas, as mulheres ficaram com R$ 12,9 milhões e os homens com R$ 16,5 milhões. Atenção ao fato de que não foi destinado nenhum recurso para 38 candidaturas indígenas. Faltando duas semanas para o 1º turno das eleições, tal ocorrência pode indicar uma escolha dos partidos em não viabilizar indígenas, de fato, no pleito. No grupo de autodeclarados pretos e pretas, que na distribuição de candidaturas ficou em 55,7% e 44,3% respectivamente, a distribuição do recurso também se deu, até o momento, com maior equidade: a mulheres pretas foram destinados R$ 190,7 milhões (1.361 candidatas) e aos homens pretos R$ 202,7 milhões (1.529 candidatos). Considerando o grupo de candidaturas pretas, 616 homens e 316 mulheres não receberam recurso algum.

Homens brancos receberam 10 vezes mais do que homens pretos

Comparando os homens brancos com os homens pretos, a diferença é enorme. Os primeiros acessaram mais de R$ 2,2 bilhões e os segundos apenas 9% disso, ou R$ 202,7 milhões. Já entre as mulheres, as brancas somaram R$ 880,6 milhões, enquanto as pretas, apenas, R$ 190,7 milhões. Nas candidaturas, para cada preto, existem 4,2 candidatos brancos. Mas, para cada R$ 1,00 do candidato preto, o branco recebe R$ 10,00.

Entre os presidenciáveis, que totalizam 11 candidaturas, os únicos dois que se declaram pretos – Leonardo Péricles (UP) e Vera Lúcia Salgado (PSTU) –, receberam, apenas, R$ 1,2 milhão e R$ 825 mil, respectivamente. Os valores representam 1% do recurso alocado em campanhas presidenciais, que somam R$ 207,6 milhões. Lula, Ciro e Tebet foram beneficiados com R$ 89,8 milhões, R$ 26 milhões e R$ 36,7 milhões, respectivamente. Jair Bolsonaro, publicamente avesso ao fundo público – ainda que esteja enfrentando denúncias de uso de recursos públicos de forma ilegal para sua campanha–, recebeu R$ 25,7 milhões, sendo R$ 846 mil reais do FFEC, R$ 13 milhões do Fundo Partidário e R$ 11 milhões de doações. Os brancos representam 63,6% das candidaturas ao cargo.

Espectro político

Em consideração ao espectro político, o centro (MDB, Solidariedade, PSDB, Avante e PROS) repassou R$ 832,7 milhões para 3.711 candidaturas, sendo R$ 282,6 milhões para 1.304 mulheres e R$ 550 milhões para 2.407 homens, sendo a coligação mais equânime com 35% de candidatas e 34% dos recursos a elas distribuídos. O grupo de partidos formado pela esquerda se saiu bem na cota de candidatas, com 37% de mulheres. Todavia, distribuiu somente 28% do recurso para elas. Dos R$ 1,2 bilhão para 5.898 candidaturas, foram R$ 349,9 milhões para 2.171 mulheres e R$ 877,3 milhões para 3.727 homens (PSOL, PCdoB, PSTU, PT, PCO, PCB, PDT, PSB, UP, PMN, Cidadania, Rede e PV). A direita também apresenta uma injusta distribuição, uma vez que as mulheres receberam somente 27% dos recursos quando são um terço das candidatas. Entre os partidos de direita, dos R$ 1,9 bilhão repassados a 9.197 candidaturas, R$ 531,7 milhões foram repassados a 3.003 mulheres candidatas e R$ 1,4 bilhão para 6.094 homens (PL, União, DEM, PSL, DC, PMB, PRTB, Novo, PP, AGIR, PTB, Podemos, PSC e Patriotas).

Candidaturas a governo do estado também distribuíram mal

Um dos piores dados do processo das Eleições de 2022 foi o de que oito estados, dos 27 da Federação, não lançaram candidatas mulheres para o cargo de governadora. São eles: Alagoas, Amapá, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Maranhão, Rondônia e Santa Catarina. De um total de 206 candidaturas a governador, 83,5% são de homens e 16,3% de mulheres. Os candidatos homens, que somam 170 pessoas, receberam R$ 484,8 milhões, e as 36 candidatas a governadora receberam, juntas, R$ 51,3 milhões. Para as pessoas brancas que pleiteiam esse cargo, o repasse foi de R$ 385,7 milhões, enquanto que para os pardos foi de R$ 130,3 milhões. Já para os pretos, foi de apenas R$ 15,3 milhões. Os dois candidatos que se declararam indígenas receberam R$ 4,6 milhões. Não há candidaturas de autodeclarados amarelos

[1] Acesso 16 de setembro, 12:00, fonte: Plataforma 72 horas. Isso porque (1) os partidos tiveram 72 horas para prestar contas do que gastaram até dia 13/09, e (2) ao mesmo tempo, podem ter prestado contas de gastos dos dias 14 e 15/09.

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