Segurança Pública como direito fundamental

Orçamento Público e Desigualdades: Debatendo Experiências e Metodologias de Monitoramento

Nunca Antes Na história desse País…? Um Balanço das Políticas do Governo Lula

Estudo sobre o Pronasci

Reflexões sobre a MP n° 535 que cria programas para o enfrentamento à extrema pobreza rural

27 de outubro de 2011

Está na pauta de votação do Congresso Nacional a Medida Provisória N° 535 que institui dois Programas vinculados ao Plano Brasil sem Miséria: o Programa de Apoio à Conservação Ambiental e o Programa de Fomento às Atividades Produtivas Rurais. Esta MP altera, também, de três para cinco o número de crianças com idade de 0 a 15 anos aptas a receber o benefício variável que compõe o Bolsa Família.

Embora o “Plano Brasil sem Miséria” estabeleça como linha de extrema pobreza uma renda familiar mensal per capita de até R$ 70, a MP joga para regulamento a definição do conceito de família em situação de extrema pobreza que orientará o enquadramento dos beneficiários nos dois Programas. Vale ressaltar que é essa linha que serviu à identificação, com base no Censo Demográfico de 2010, das 16,2 milhões de pessoas no Brasil que vivem na extrema pobreza. Destas, 47% ou 7,5 milhões encontram-se em áreas rurais, e se concentram no Norte e no Nordeste, regiões nas quais as áreas rurais possuem respectivamente 56% e 52% da sua população vivendo em condição de extrema pobreza.

Há, contudo, críticas muito pertinentes ao conceito de extrema pobreza rural focalizado exclusivamente na renda familiar, em detrimento de abordagens que focam a “unidade  produtiva rural” tratada pelo conceito de “estabelecimento agropecuário” utilizado pelo  Censo Agropecuário.

Esta opção de abordar o “estabelecimento” e não a renda para qualificação da pobreza rural e seus determinantes tem sido defendida e aprofundada por Franscisco de Assis Costa, Professor da Universidade Federal do Pará e atualmente diretor de Estudos e Políticas Regionais, Urbanas e Ambientais (Dirur) do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA.

Uma maior qualificação da condição de pobreza e extrema pobreza rurais é fundamental para se avançar no desenho de políticas públicas focadas na superação desta condição.

Na chamada economia camponesa a insufi ciência da renda é uma dimensão que precisa  ser relativizada em função de variáveis como produção para auto-consumo, diversificação da produção, relações sociais e de solidariedade que extrapolam a lógica mercantil. Enfim, o fato é que o “estado da arte” do diagnóstico da situação de extrema pobreza rural mostra o quanto estamos ainda distantes de uma compreensão mais aprofundada do que é ser pobre e extremamente pobre no campo e nas florestas
brasileiras.

Desafio similar procede no caso dos povos indígenas. Existe hoje uma frágil compreensão das condições de vida e pobreza em territórios indígenas. Por sinal, a pesquisa que ainda serve de base para compreensão, inclusive pelo governo, da situação de segurança alimentar dos povos foi realizada entre 1994/1995 pelo Instituto de  Estudos Socioeconômicos (Inesc). Essa pesquisa – Mapa da Fome Entre Povos Indígenas do Brasil I e II – construiu um conceito pertinente sobre como abordar o tema da pobreza e da fome nesse segmento da população brasileira.Uma primeira questão que se apresenta, portanto, é se tais programas conseguirão focalizar e tratar devidamente a problemática da extrema pobreza rural, a despeito da fragilidade da compreensão dessa condição e, portanto, do seu próprio público-alvo.

Esta Nota objetiva facilitar o entendimento sobre o “Programa de Apoio à Conservação Ambiental” e o “Programa de Fomento às Atividades Produtivas Rurais” e provocar reflexões iniciais sobre seus potenciais e seus limites. Trata-se de dois programas que embora mirem públicos similares – famílias rurais em situação de extrema pobreza – buscam focalizar com medidas diferentes famílias ou grupos sociais que se relacionam de forma distinta com os recursos naturais de que dispõem. Vejamos.

1 – Programa de Apóio à Conservação Ambiental

Seu público alvo é caracterizado por famílias ou comunidades que não têm a atividade agrícola como atividade dominante para garantir seus meios de vida. Basicamente: i) famílias extrativistas que residem em áreas protegidas por lei federal (Florestas Nacionais, Reservas Extrativistas Federais e Reservas de Desenvolvimento Sustentável Federais); ii) famílias ou comunidades envolvidas em projetos instituídos pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) nas categorias de assentamento florestal, desenvolvimento sustentável ou de assentamento agroextrativista.

Este público seria atendido pelo Programa por meio da chamada “Bolsa Verde”, uma bolsa de R$ 300,00 trimestrais a cada família, por um período de até dois anos que
poderá ser prorrogado. Famílias enquadradas no Programa teriam, portanto, em tese, R$ 100,00 mensais de “Bolsa Verde” que estariam condicionados à realização de atividades de conservação. Esses valores se somam aos recebidos por intermédio do “Programa Bolsa Família”.

Que atividades são essas? Ficará a cargo do Ministério do Meio Ambiente, gestor do programa, definir. E como esta condicionalidade seria monitorada? Por auditorias amostrais ou outras formas ainda a serem criadas por regulamento. Podemos dizer que o “Bolsa Verde” caracteriza o chamado “Pagamento por Serviços Ambientais”?

Se a real intencionalidade do Programa está bem expressa na sua formulação diríamos que não. Seu foco é o combate à extrema pobreza por meio de uma renda adicional provisória que, teoricamente, deverá dar suporte e lugar a uma condição estável de melhoria das qualidades de vida e renda das famílias. Tal condição supõe, conforme formulação do Programa, uma mudança na capacidade de uso sustentável dos recursos florestais que estas famílias dispõem.

Mas, contraditoriamente, se formos apreender o Programa pelo que ele traz de ação concreta, é notório a ausência na sua formulação de instrumentos para ampliar o potencial de uso sustentável da floresta por estas famílias. Isto é relativamente distinto, como veremos, da formulação do Programa de Fomento às atividades produtivas rurais.

Aqui, assistência técnica adequada, projeto de manejo sustentável, crédito orientado são temas que estão ainda mais distantes de aparecem como iniciativas ou medidas
vinculadas à transferência de renda.Desta forma, o que fica marcante nesse Programa é a “Bolsa Verde” condicionada à conservação dos ecossistemas. Embora não seja um “Pagamento por Serviço Ambiental” assumido é, evidentemente, uma tentativa de dar um “verniz” enquanto tal.

Se esta opção é meramente cosmética, reflexo da intenção política de apresentar ações objetivas no contexto da Rio +20, ou, ainda, expressão da falta de clareza de quais iniciativas e instrumentos são necessários para uma inclusão produtiva apoiada no uso sustentável de recursos florestais, são todas questões a considerar.

Pensando pela ótica da ampliação da renda, como os benefícios do “Bolsa Família” e do
“Bolsa Verde” podem ser cumulativos, uma vez aprovada esta MP, uma família extrativista que vive em situação de extrema pobreza em uma Reserva de Desenvolvimento Sustentável Federal, por exemplo, passaria a ser público alvo dos dois Programas. A título de exemplo, e a depender das dotações orçamentárias, se esta família têm cinco crianças de 0 a 15 anos e mais dois adolescentes de 15 a 17 anos ela estaria apta a receber do governo federal uma bolsa cumulativa de R$ 406,00 em média por mês, num horizonte de dois anos: R$ 100,00 de Bolsa Verde + R$ 70,00 de Bolsa Família + R$ 32,00 para cada uma das cinco crianças e + R$ 38,00 para cada um dos dois adolescentes. A ampliação potencial do benefício, para este público alvo em específico é, portanto, de R$ 164,00: R$100,00 do “Bolsa Verde” e mais R$ 64,00 do
pagamento variável de duas crianças extras de 0 a 15 anos. Para famílias que vivem em
extrema pobreza isto representa uma ampliação importante de rendimentos.

Mas, de novo, qual a contribuição que um programa desta natureza poderá dar na direção de superação da condição de extrema pobreza para famílias que têm no  extrativismo e na boa convivência com a natureza uma forma e um meio de vida? Ao longo destes dois anos de “Bolsa Verde” serão criadas as condições para que estas famílias consigam superar a “ situação de extrema pobreza” e, ao mesmo tempo, darem continuidade ao seu papel socioambiental de proteção e conservação ambiental?

Idealmente, a mensagem que acompanha o Programa cita políticas que estariam vinculadas ao cumprimento dos objetivos traçados para este Programa. A mensagem cita explicitamente: a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT), o Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA); o Plano Nacional de Promoção das Cadeias dos Produtos da Sociobiodiversidade (PNPSB) e o Programa Federal de Manejo Florestal e Comunitário (PMCF).

Mas, basta ver a dotação de recursos orçamentários para as ações que compõem estes
Planos e Políticas e sua quase sempre sofrível execução para duvidar, senão da capacidade, da efetiva prioridade dada à construção de saídas ambientalmente adequadas e socialmente justas para garantir a melhora das condições de vida dos chamados povos da floresta.

Neste contexto, fica difícil ver um futuro promissor para o Programa de Apóio à Conservação Ambiental.

Por fim, cabe a pergunta: povos indígenas e comunidades quilombolas serão públicoalvo deste Programa? Embora a redação da MP não estabeleça isto claramente, jogando para regulamento a possibilidade de defi nição de outras áreas rurais como áreas prioritárias, o desenho e objetivos do Programa indicam que sim.

Algumas das 77 emendas apresentadas à MP já pretendem deixar claro essa ampliação do público-alvo, o que estaria ancorado na própria Mensagem enviada ao Congresso.  Nesta, é enfatizado que 76% das áreas de fl oresta públicas comunitárias estão ocupadas por Terras Indígenas. Além disso, as áreas tituladas em favor de comunidades remanescentes de quilombos são igualmente reconhecidas como áreas prioritárias para um Programa que busca aliar combate à pobreza com preservação ambiental.

2 – Programa de Fomento às Atividades Produtivas Rurais.

Seu público alvo é o que poderíamos chamar de famílias camponesas em situação de extrema pobreza. Com a previsão de destinar até R$ 2.400,00 por um período de até dois anos para cada família, o benefício se equivaleria ao “Bolsa Verde” com um pagamento médio de R$ 100,00 mensais por dois anos.

Mas, diferentemente do “Bolsa Verde”, cuja condicionalidade é a preservação ambiental, o benefício previsto tem como objetivo contribuir para estruturar a unidade produtiva familiar, entendendo por estruturar ampliar a capacidade de produzir alimentos inclusive para auto-consumo e gerar ocupação e renda dentro da própria unidade familiar. Dentro desta lógica, é condição para acessar o benefício do Programa a apresentação e execução de um projeto de estruturação da unidade produtiva familiar, com especifi cação das etapas de sua implantação. A liberação do benefício, cujas parcelas serão definidas em regulamento pelos órgãos gestores (Ministério do Desenvolvimento Agrário – MDA e Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome – MDS), estará condicionada à execução do projeto apresentado.

Por isso, e de forma distinta do Programa de Apoio à Conservação Ambiental, o componente assistência técnica individualizada e continuada é dito ser um instrumento do próprio programa, juntamente com o benefício monetário. Embora não esteja explicito na MP, o “Plano Brasil sem Miséria” anuncia o atendimento, até 2014, de 250 mil famílias dentro da iniciativa chamada de fomento na qual se enquadra este Programa. Além disto, prevê o atendimento a 253 mil famílias com assistência técnica  individualizada e continuada, juntamente com a ampliação de 66 mil para 255 mil famílias extremamente pobres que participam do “Programa de Aquisição de Alimentos ( PAA)”.

Ou seja, o universo esperado de benefi ciários do “Programa de Fomento às Atividades Produtivas”, que teoricamente também serão atingidos por outros programas com  objetivo similar, fica em torno de 250 mil famílias.

E o que dizer deste Programa? É inegável que é positiva sua intenção de aliar uma ação emergencial com ações estruturantes que visam à mudança nas condições de inserção destas famílias no mercado, seja institucional ou privado.

Mas, uma vez superado o desafi o da melhor identifi cação das famílias em condição de extrema pobreza, resta o desafio de fazer com que este conjunto de políticas públicas – água, insumos, luz, educação, saneamento, assistência técnica, etc – chegue de fato e de forma articulada e integrada a estas famílias. A experiência do “Programa Bolsa Família” tem mostrado que a transferência de renda diretamente as famílias é mais fácil. O difícil – do ponto de vista orçamentário e de gestão – é fazer chegar todas as demais políticas.

Por fim, vale registrar que também para este Programa, além do público potencial compreendido no conceito de Agricultura Familiar conforme especifica a Lei n 11.326 de 2006, são aventados como público potencial povos indígenas e remanescentes de quilombos. Não poderia ser diferente dado, de novo, a natureza do Programa. Este enquadramento, contudo, fica como no Programa de Apoio à Conservação Ambiental, dependendo de  regulamento.

A decisão de remeter para regulamento a inclusão ou não de comunidades quilombolas nos dois programas pode indicar, contudo, a fragilidade da compreensão das condições de vida e necessidades específicas das famílias e comunidades que vivem hoje em territórios remanescentes de quilombo. Ou, ainda, pode ser um reflexo da mera insuficiência de dotação orçamentária. Justificativas injustificáveis!

A aprovação de emendas que garantem a inclusão de povos remanescentes de quilombos como público-alvo explícito nesses programas é, portanto, uma medida positiva e necessária. No caso dos povos indígenas, talvez valesse as mesmas indagações, em especial para o Programa de Apoio à Conservação.

Votação do Código Florestal revela o conservadorismo do Congresso

25 de Novembro de 2011

A votação na Comissão Meio Ambiente do texto-base que substituirá o atual Código Florestal mostrou a hegemonia da força conservadora que se instalou no Congresso Nacional. Não é mais uma questão localizada na Bancada Ruralista, mas é uma visão de mundo retrógrada que se instalou de forma confortável e sem culpa no espírito da maioria dos parlamentares. A esquerda brasileira, ou qualquer nome que se queira dar a este segmento político, não perdeu somente a referência partidária, mas os antigos aliados.

O movimento sociossindical acreditou, até o último momento, que em dado momento do processo legislativo sairia um texto equilibrado entre as forças que dividem o espaço político. Desde a votação na Câmara dos Deputados as lideranças sociais se reconheciam como minoria e, portanto, não alimentavam esperanças de um texto que se identificassem plenamente.

Lutavam por um projeto que, mesmo recepcionando interesses do agronegócio, protegesse as florestas, os biomas e os recursos naturais. Porém, a dedicação sincera dos setores socioambientais aos saberes e fazeres naturais, não pode ser compreendido pelo pensamento pragmático, mercadológico e financista que impera no Congresso Nacional.

De quantas derrotas precisam os setores sociais progressistas para despertar do sonho da conquista do poder? Por acaso o poder permitiria que dele se apoderassem quem poderia destruí-lo? A política não permite sentimentos de frustração, desânimo ou derrota. Portanto, é necessário buscar na realidade do processo legislativo os fatores que levaram as lideranças a acreditar que podiam ter um texto que visasse à preservação das florestas e do meio ambiente.

Tudo demonstrava o contrário. Em uma reunião no Ministério do Meio Ambiente, uma das lideranças sociais se referiu que “ali estavam reunidos os perdedores”. Houve reação a esta fala carregada de significado real. Não se compreendeu, no momento, que a frase não remete à derrota, mas provoca a adoção de uma nova postura para vencer.

Gostaria de analisar o mérito do texto-base que irá substituir o Código Florestal, de apontar suas fragilidades, suas forças e suas perspectivas de futuro. Comecei a fazer esse exercício, mas como imprimir uma análise de futuro em um documento escrito pelo conservadorismo? O que apontar de bom para as florestas, para os biomas ou para o meio ambiente em uma proposta encomendada pelos setores agropecuários, cujos propósitos são expandir suas áreas de lavoura, pecuária e mineração?

Não foi por acaso que as últimas grandes derrotas sofridas pelos setores progressistas foram entregues às mãos de aliados da esquerda. A maior perda do movimento sociossindical é a perda de aliados e a desconfiança que contamina as relações das representações de classe.

Foi comovente assistir o empenho dos senadores Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) e Lindemberg Farias (PT-RJ), da senadora Marinor Brito (PSOL-PA) em tentar alterar o substitutivo. Eram os congressistas dotados dos mais fortes argumentos, mas inúteis contra a blindagem conservadora. É lamentável e compreensível por que nenhuma de suas emendas ou destaques foi aprovado. Ao lado da resistência parlamentar os estudantes fizeram a sua parte, levantaram cartazes e a bandeira nacional, enfrentaram os seguranças. Ambos, parlamentares e estudantes, deram ao debate um colorido que este não merecia.

O governo não foi omisso no processo, pois participou em todas as negociações com os ruralistas e com os movimentos sociossindicais. Porém, a diferença de influência política entre esses dois atores determinaram a tomada de posição do governo. O Ministério do Meio Ambiente realizou diversas reuniões com a sociedade civil organizada, mas foi um ator inexpressivo no jogo político. Os senadores ruralistas garantiram a vitória de suas propostas em uma negociação à noite com o governo, às vésperas da votação na Comissão. Essa reunião foi denunciada diversas vezes pelo senador Lindemberg Farias e não foi contestada pelo relator- senador Jorge Viana (PT-AC).

Na votação, que virá a seguir, em plenário do Senado Federal, o que vamos constatar será a reafirmação da força do conservadorismo parlamentar. Os senadores ruralistas já solicitaram urgência na tramitação do projeto de Código Florestal. Assim, a proposta ganha rapidez ao saltar algumas exigências do processo legislativo.

A importância da votação em plenário para as organizações e movimentos sociais e sindicais, e seu reenvio para a revisão da Câmara dos Deputados, não está na realimentação de uma possível reviravolta no texto, mas poder saber e divulgar os nomes dos senadores que votarão nominalmente contra o meio ambiente, as florestas e os recursos naturais do Brasil.

A copa FIFA 2014 e a dignidade dos brasileiros e brasileiras

29 de setembro de 2011

A Copa do Mundo de 2014 trouxe grandes promessas ao povo brasileiro que em grande parte não serão mais que ilusões. Muitos não percebem porque estão embriagados pelo marketing patriótico. O sentimento que o povo brasileiro nutre pelo futebol esconde negócios bilionários e lucros distribuídos de forma desigual. Igualmente, ao povo, serão distribuídos somente o direito de consumir a Copa-TV, a Copa-publicidade e a Copa-bugiganga.

Sim. Muitos empregos serão gerados pela a movimentação financeira que virá com a COPA do Mundo. Mas, qual é o percentual sustentável de empregos? Em que medida esses empregos acelerarão nosso processo civilizatório?

Outra pergunta intrigante é por que nunca houve semelhante “esforço de guerra” para oferecer saneamento básico universal à população brasileira? Pesquisa mostra que 2/3 do esgoto no Brasil não é tratado. Se os R$ 5 bilhões gastos com estádios fossem investidos no ensino infantil e fundamental também gerariam empregos, qualificação, civilidade e efetivariam direitos. Infelizmente nossos indicadores sociais não colocam o Brasil numa posição de desenvolvimento neste início do século XXI.

Muita riqueza será criada, é verdade. Mas até que ponto essa riqueza será justamente distribuída? A FIFA é uma entidade privada que visa lucros – a despeito do culto quase religioso – que o futebol possuiu. A FIFA lucrou US$ 631 milhões (de dólares) entre 2007 e 2010 segundo ela mesma anunciou (conforme reportagem da Folha de São Paulo de 04/03/2011). De acordo com a mesma fonte, a FIFA diz ter uma reserva de US$ 1,280 bilhão (R$ 2,1 bilhões). Se fosse uma pessoa física a FIFA estaria entre as pessoas mais ricas do mundo (no caso da Confederação Brasileira de Futebol- CBF, essa afirmação estaria distante da realidade?)

Por mencionar a entidade brasileira, a CBF teve lucro de R$ 72 milhões em 2009 (reais) publicados no jornal Monitor Mercantil. Então, não vamos deixar que usem nosso sentimento de brasilidade. Se não temos o poder de impedir que o poder público financie obras privadas, a despeito das promessas que fizeram, a sociedade tem o direito de saber com detalhes quais são as fontes de financiamento destas grandes obras. Não há uma prestação de contas que identifique os impostos direcionados para financiar as obras da Copa e o prejuízo que o Tesouro Nacional terá com a capitalização do BNDES. Lembremos que os mais pobres comprometem cerca da metade da sua renda com impostos. Já a FIFA, a CBF e outras confederações tiveram isenções tributárias amplas, gerais e irrestritas (Lei n.º 12.350, de 20 de dezembro de 2010).

Pessoas afetadas pelas obras
O Congresso Nacional e a sociedade brasileira não podem deixar de ouvir com atenção as denúncias de remoção de famílias para construção das obras e péssimas condições de trabalho nas obras da Copa. Cabe a pergunta se as greves daqueles que trabalham na construção dos estádios não seriam sintomas da imposição das piores formas de relações de trabalho, do desrespeito à dignidade humana e do lucro desproporcional.

Fica o temor de que pressionados pela escassez dos prazos e pelo apelo midiático, a sociedade feche seus os olhos para possíveis abusos que podem lembrar condições análogas a escravidão em pleno século XXI. A Câmara dos Deputados não deveria convocar uma Comissão Geral para ouvir os afetados e também as lideranças dos trabalhadores envolvidos nas obras da Copa de diferentes regiões do país? Esse país não deve acobertar outro exemplo de obtenção de riqueza por meio do desrespeito da dignidade humana – a história desse país já viu um modo de produção econômica escravizar milhões de índios e pessoas trazidas da África. Até hoje, seus descendentes não tiveram uma reparação. Portanto, é a exploração do passado e omissão do presente que explica nossa condição de 3° país mais desigual do mundo. É por isso que o Brasil não mais deve aceitar a violação da dignidade humana em nome do mero crescimento econômico.

A fiscalização das obras
Se os organizadores da COPA gostam de invocar o patriotismo dos brasileiros, é legítimo lembrar outras referências culturais. Como dizia o poeta Cazuza “Brasil, mostra a sua cara!”. Também podemos reformular essa frase para: “Copa FIFA, mostra sua cara!”

A transparência dos dados é importante porque as previsões de gastos só aumentam. Não há dúvidas de que essa subida acelerada dos custos guarda relação com a flexibilização daslicitações para obras da Copa. Segundo a ótima comparação realizada pelo consultor do Senado Alexandre Sidnei Guimarães, intitulada “O aumento oficial dos custos das obras da Copa do Mundo FIFA 2014”, houve uma elevação de R$ 6,83 bilhões (em termos percentuais, 28,7%) num período de oito meses. A comparação entre o “1º Balanço das Obras da Copa do Mundo FIFA 2014” e o 2º balanço mostra que o custo das obras em janeiro de 2011 era aproximadamente de R$ 23,83 bilhões. Em setembro, elevou-se para R$ 30,66 bilhões. Seguem as tabelas retiradas do trabalho do consultor do Senado.

Os estádios da Copa tiveram uma variação de custo de R$ 1,02 bilhões. O custo estava previsto em R$ 4,9 bilhões em janeiro contra R$ 6,04 bilhões em setembro. Os resultados refletem o atraso, a falta de transparência e o Regime Diferenciado de Contratação (a flexibilização da Lei de Licitações).

 

Quadro I

 

A diferença entre os custos das obras da COPA em Belo Horizonte foi de R$ 3,34 bilhões. Saltou de R$ 2,55 bilhões para R$ 5,9 bilhões. Uma variação de 130%!

quadro II

Em consulta ao site do Tribunal de Contas da União (TCU) realizada no sai 27/09, foi possível verificar que site possuiu alguns gráficos defasados e que vários relatórios são antigos, o que deve refletir o atraso das obras (http://portal2.tcu.gov.br/portal/page/portal/TCU/copa2014/fiscaliza_tcu).

O site da Controladoria Geral da União (CGU) – http://www.portaldatransparencia.gov.br/copa2014/ – também mostra o ritmo das obras. É possível visualizar o que está sendo priorizado e o que vai se tornar só ornamentação dos projetos – isto é, obras que nunca sairão do papel.

Percebe-se que são aquelas obras que beneficiam um número muito maior da população que estão mais atrasadas ou não saíram do papel. Sejamos sinceros: a população pobre não assistirá aos futuros shows de artistas internacionais que ocorrerão nos elefantes brancos que estão sendo erguidos. Por outro lado, até os pobres estão pagando dos seus bolsos pela construção dos estádios e, muitos casos, pagarão pela suas manutenções.

Seguem tabelas anexas com uma seleção de obras disponibilizadas no site da Controladoria Geral da União- CGU. Se houver, paciência para uma analise detalhada dos dados, será possível perceber que as obras mais atrasadas são justamente aquelas com benefícios a longo prazo para a população. Ou será que só foram colocadas propositalmente no planejamento inicial para justificar a relevância do evento da FIFA?

Clique e veja a tabela da seleção de obras da Copa de acordo com o portal da transparência da Copa da CGU

A Lei da Ficha Limpa encontra-se numa encruzilhada

29 de setembro de 2011

A aprovação da lei da Ficha Limpa fez 1 ano. O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), do qual fazem parte diversas organizações da sociedade civil, incluído o Inesc, participou de uma comemoração no auditório Nereu Ramos da Câmara dos Deputados. A mesa do evento foi composta pela a Deputada Luiza Erundina (PSB-SP; o Deputado Francisco Praciano (PT-AM), presidente da Frente Parlamentar de Combate à Corrupção; o Dep. Chico Alencar (PSOL-RJ); o Dep. Ivan Valente (PSOL-SP); o Dep. Índio da Costa (PDS-RJ); o senador Pedro Simon (PMDB-RS); por um representante da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e por Jovita Rosa, representando o MCCE. Alunos de escolas públicas e outras organizações estiveram presentes para fortalecer o coro dos apoiadores da Ficha Limpa.

A celebração não foi um mero evento festivo. Teve o propósito político aberto de defender a validade da Lei e por tabela a própria democracia brasileira, já que a Lei da Ficha Limpa foi aprovada a partir do mecanismo de iniciativa popular, um instrumento legislativo direto por meio do qual o povo se manifesta a respeito da vida política do país. Foram mais de 1,5 milhões de assinaturas coletadas em pouco mais de 1 ano.

O princípio da anualidade, que tinha motivado o primeiro questionamento à legislação, já vigora. A partir de agora, a Lei da Ficha Limpa está em pleno vigor para quaisquer eleições futuras. No entanto, esse esforço que mobilizou o país e que tem inspirado leis semelhantes em diversos Estados para diversos outros cargos corre o risco de ser declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

O Juiz Eleitoral do Maranhão, Marlón Reis, integrante do MCCE, alerta que os Ministros do Supremo estão divididos a respeito da constitucionalidade da Lei – isto é, se ela agride ou não o princípio constitucional da presunção de inocência, que determina que ninguém deve ser declarado culpado se não houver condenação em última instância – também conhecida como trânsito em julgado.

Mas os defensores da Lei possuem um argumento jurídico forte em favor desta legislação. Os movimentos afirmam que Lei não ofende o princípio da presunção da inocência porque ela estabelece apenas uma pré-condição para as pessoas serem candidatos/as. A vida pregressa ilibada está prevista na Constituição, no artigo 14, parágrafo 9º . A Lei da Ficha Limpa fixou a necessidade não haver condenações em instâncias colegiadas para quem quiser ser candidato. Portanto, o que a Lei fortaleceu foram critérios de inelegibilidade já previsto na Constituição Federal. E esses critérios já são cobrados para outros cargos públicos. A vida pregressa é utilizada como critério de seleção para diversos cargos públicos, concursos etc.

A sociedade está atenta para não haver retrocessos. É preciso que os Ministros do Supremo decidam em sintonia com a mobilização popular contra a corrupção que vive a sociedade. Posto que os parlamentares são os titulares do poder Legislativo e os Ministros do Supremo são seus equivalentes do Poder Judiciário, o STF deveria julgar a Lei como se fosse aplicá-la para si mesmo. Ou STF aceitaria ministros fichas sujas no seu corpo?

O Poder Executivo também tem um papel relevante nesse debate. Se o STF está dividido sobre a constitucionalidade da Lei, está nas mãos de Dilma escolher um perfil para a vaga deixada por Ellen Greice em sintonia com o momento histórico que passa o Brasil: intolerância à corrupção. Não vamos resolver todas a nossas mazelas com a Lei da Ficha Limpa, mas ela é um caso exemplar de como a população pode exercer o poder em favor da República.

Intersetorialidade de políticas públicas: Desafio aos 20 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente

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Financiamento e Megaprojetos: Uma interpretação da dinâmica regional Sul-Americana

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O jogo das águas transfronteiriças no contexto da integração regional

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