Cidadãos reclamam de burocracia, demora e erros nos balcões de repartições

28/08/2017, às 16:51 | Tempo estimado de leitura: 10 min
Servidores apontam dificuldades para o trabalho. Para especialistas, produtividade precisa ser maior.

Por Vera Batista e Marlene Gomes, para o Correio Braziliense.

O corte drástico de orçamento prejudicou várias áreas do serviço público. Da emissão de passaportes, passando pela paralisação de áreas prioritárias, como segurança, saúde, educação e projetos fundamentais para a população de baixa renda.

No Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), o contribuinte,  que arca com pesados impostos, é  prejudicado. Dados da ONG Contas Abertas mostram que o valor pago para o funcionamento das unidades descentralizadas, por meio do programa Previdência Social do Ministério do Trabalho, foi de R$ 70,3 milhões, de janeiro a julho deste ano, o que representa uma queda de 78,7%, na comparação com igual período do ano passado — quando bateu R$ 330 milhões.

Em muitas situações, não se trata apenas de falta de recursos. Especialistas chamam atenção para a necessidade de melhora da produvitividade do setor público, o que é um problema crônico no Brasil devido à dificuldade de punir quem tem desempenho insuficiente. Agora, com os cortes de recursos, a situação se agrava. Há avaliações de que isso esteja sendo usado para justificar, de modo consciente ou não, a ineficiência.  É uma mistura de desalento com falta de dedicação proposital — o que fica difícil de ser combatido no quadro de escassez e de dificuldades generalizadas.

Maria Ines de Souza Alves sabe o que é isso. Foi atualizar o endereço no posto de atendimento da Previdência Social, na Asa Sul. Do Jardim Mangueiral, onde reside, viajou em dois ônibus sob calor intenso. Às 14h30, recebeu a senha no posto. Foi atendida duas horas depois — e quase teve que voltar. O atendente atualizou o endereço com dados errados. “Ele estava muito desatento. Ainda bem que eu prestei atenção para não ter mais transtornos”, desabafa Maria Ines.

Fabíola de Souza Duarte, vai constantemente ao posto da W3 Sul para uma perícia de reabilitação profissional. Ela sofre de uma doença que afeta o formato e a espessura da córnea, provocando a percepção de imagens distorcidas e borradas. Assim, não trabalha há quatro anos. “Em  2015, o INSS negou a minha aposentadoria por causa da idade. E, de seis em seis meses, continuo tendo que comparecer ao posto, porque o serviço de reabilitação profissional não pode ser agendado por telefone”, explicou.

Sindicalistas afirmam que as condições de trabalho são inadequadas. “Falta de tudo: papel para imprimir processo, café, ar-condicionado e segurança nas agências, em um momento perigoso, em que se retiram direitos do trabalhador e o número de agressões a servidores cresce”, afirma Sandro Alex de Oliveira Cezar, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social (CNTSS).

“Raramente se veem filas. Tudo agora é virtual. As pessoas demoram de quatro a cinco meses para agendar um atendimento. Trocaram a fila real pela fila virtual. A população, agora, sofre em casa”, diz Cezar.

A tesourada nem sempre aparece à primeira vista. E, às vezes, o remanejamento de recursos fica mais caro para o governo, que deixar de cumprir a meta.

“O Programa de Fiscalização por Sorteio Público, do Ministério da Transparência e Controle (CGU), que envia auditores a municípios com até 500 mil habitantes para fiscalizar a aplicação de recursos federais, é o mais afetado com a escassez de recursos”, destaca Rudinei Marques, presidente do Sindicato Nacional dos Auditores e Técnicos de Finanças e Controle (Unacon).

“Nos órgãos ambientais, os fiscais não conseguem trabalhar porque não têm gasolina para as viaturas. Mais grave é a situação do combate a endemias.  A consequência pode ser a proliferação de doenças que já estavam erradicadas”, aponta Sérgio Ronaldo da Silva, secretário-geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef).

A Polícia Rodoviária Federal (PRF) já não faz escoltas de cargas estratégicas e rondas. “Só se faz atendimento a acidentes. Os assaltos a ônibus cresceram 550%; a cargas, 107%; e o número de mortes, 4%, entre julho de 2017 e julho de 2017”, conta Deolindo Carniel, presidente da Federação Nacional dos Policiais Rodoviários Federais (FenaPRF).

A fiscalização do trabalho escravo não funciona desde maio e tem apenas R$ 6,6 mil em caixa. “Em 21 de julho, denunciamos à OIT que o Brasil não está respeitando várias convenções de diretrizes de inspeção que ratificou” , conta Carlos Silva, presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait).

As situações se repetem no setor de segurança. “Até os contratos de manutenção de viaturas, passagens e diárias estão prejudicados. O orçamento de 2017 veio 50% inferior ao de 2016. E, em seguida, sofreu contingenciamento de 44%”, argumenta Luis Boudens, presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef).  “Várias missões serão abortadas por ordem da Superintendência, por falta de recursos para pagamento de diárias”, denuncia Éder Fernando da Silva, presidente do SinpecPF, que representa os administrativos da PF.

A economista Grazielle David, do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), destacou que nem sempre o corte nas despesas é aparente. “As consequências dentro dos estados e municípios são graves. Algumas ficam escondidas porque os governadores, ao remanejarem os recursos, tiram sempre da educação e da saúde”, diz Grazielle.

Categoria: Notícia
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