Hub das Pretas promove encontro de mulheres jovens negras em Brasília

17/02/2017, às 16:05 | Tempo estimado de leitura: 9 min
O evento deste fim de semana (17 a 19/2) é autogestionado e faz parte do projeto Mulheres Jovens Negras Fortalecidas na Luta contra o Racismo e o Sexismo.

Sankofa é um símbolo Adinkra em formato de pássaro de duas cabeças. Segundo a mitologia de Gana e região da África ocidental, simboliza uma volta ao passado para resignificar o presente. O pássaro tem uma cabeça voltada para o passado e outra cabeça voltada para o futuro. Uma inspiração perfeita para as atividades promovida pelo Hub das Pretas, que faz parte do projeto ‘Mulheres Jovens Negras Fortalecidas na Luta contra o Racismo e o Sexismo’. A ideia toda do projeto é justamente compreender as demandas de outrora para dialogar com o presente, como um espaço de articulação para aquilombar, ou seja, organizar mulheres negras de forma política. Sankofa!

E vamos aquilombar em Recife, Rio de Janeiro, São Paulo e Distrito Federal, alem do espaço virtual, com a criação de uma rede de cyberativistas negras. Neste fim de semana, é a vez das jovens mulheres negras de Brasília, com a realização do I Encontro Popular de Mulheres Jovens Negras do Distrito Federal e Entorno, um evento autogestionado pelas jovens do Hub das Pretas. O encontro terá a participação da historiadora e professora da Universidade de Brasília (UnB) Joelma Rodrigues e da jornalista Rachel Quintiliano.

Joelma participará de uma roda de conversa sobre ‘mulherismo africana’ e Rachel fará uma oficina sobre trajetórias de vida com as participantes do Hub. Entre uma história de vida e outra, serão realizadas diversas atividades como corporeidade em diáspora, usar o movimento do corpo negro de forma política, religando com sua ancestralidade, slampoetry e lambe, massoterapia, costura e outras oficinas ministradas pelas jovens do projeto.

O evento contará com cobertura online pelo perfil do Hub das Pretas no Twitter —> acompanhe aqui!

“Queremos empretecer e afrocentrar as informações, dentro e fora das novas tecnologias, criando soluções locais e nacionais, frente à violação de direitos das mulheres jovens negras em Brasília”, explica Layla Maryzandra, educadora do Inesc e militante do Fórum de Juventude Negra do DF e Entorno – Fojune.

No Distrito Federal e entorno, o projeto é coordenado pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) e conta com a articulação de 15 coletivos para fortalecer práticas inovadoras de fazer política e incidir contra o racismo e o sexismo que afeta as mulheres negras.

As outras organizações que participam do projeto são Criola, Fase e Ibase, no Rio de Janeiro; Polis, Oxfam Brasil e Ação Educativa, em São Paulo; e Fase, em Recife.

A próxima etapa do projeto é de irradiação, ou seja, criação de estratégias de ação para impactar positivamente a realidade das jovens negras do DF. A longo prazo, o projeto tem como objetivo inspirar e influenciar uma nova geração de líderanças negras femininas que estão empenhadas em combater as causas e os efeitos da discriminação racial e de gênero no Brasil.

Hub, que na linguagem do campo da inovação digital quer dizer espaços/articulações/redes de produção e irradiação de informação (criações, metodologias, produtos etc), foi o formato escolhido para articular os coletivos de forma mais fluida e livre, para que as jovens do projeto possam propor temas para diálogo e pautas políticas de acordo com suas vocações e urgências, como a inclusão econômica. Assuntos como “a solidão da mulher negra” ou “apropriação cultural” também se fazem presentes, na medida em que é usada uma metodologia de educação popular com abordagem afrocentrada para trazer a perspectiva das jovens para o processo de construção.

Em janeiro, o Hub das Pretas recebeu Silvana Bahia, mestre em Cultura e Territorialidades, comunicadora social e coordenadora do Olabi Makerspace, empresa social com foco em incentivar o uso de novas (e velhas) tecnologias para mudança social.

“A vinda da Silvana, abriu um leque de questões em relação a segurança digital, mas o que me chamou a atenção foi perceber que mulher negra e tecnologia não são palavras rivais, ela não apenas acessa a tecnologia como usuária, mas a mulher negra é agente de transformação dentro da tecnologia. É mais uma vez a gente quebrando toda forma de estereótipo ligada a nós”, afirma Layla.

Silvana aproveitou a oportunidade ainda para contar um pouco de sua experiência profissional e ativista às participantes do Hub das Pretas. Explicou como facilitou as oficinas de empoderamento feminino em novas tecnologias durante a Maratona Rodada Hacker, e falou um pouco sobre seu trabalho na coordenação do plano de comunicação do filme KBELA e sua colaboração para a plataforma Afroflix.

Direitos, cidadania e empoderamento

A violação de direitos das mulheres negras tem sido o fio que articula reflexões sobre direitos, cidadania e empoderamento. Em 2015, o Mapa da Violência revelou que, a despeito das melhorias sociais das últimas duas décadas em diversas áreas, os índices de violência contra as mulheres negras havia crescido, 54% entre 2003 (1.864 homicídios) e 2013 (2.875). Enquanto isso, no mesmo período, o número de homicídios de mulheres brancas caiu 9,8%, de 1.747 em 2003 para 1.576 em 2013.

O racismo é uma das barreiras à participação social e política: as mulheres são metade da população brasileira e sua presença no Parlamento não ultrapassa 2%. Se por um lado muitas jovens chegam à universidade por meio de políticas afirmativas, por outro há dificuldades e obstáculos para chegar ao mercado de trabalho – e o racismo tem papel significativo nisso. As mulheres negras também têm seus direitos violados na Saúde: 60% das mães mortas durante partos no SUS são mulheres negras, segundo dados do Dossiê Mulheres Negra, publicado pela Ong Criola.

“As violações de direitos são múltiplas porque o racismo é estruturante das desigualdades no Brasil. O que as jovens trazem para as rodas de conversas são histórias que infelizmente dão vida às estatísticas sobre as mulheres negras no país. Mas elas também trazem em suas falas resistência, estratégias de se colocar no mundo, uma visão política de vanguarda… e muito afeto. ”, afirma Carmela Zigoni, Assessora Política do Inesc e coordenadora do projeto em Brasília.

“Eu sou um oceano negro, vasto e irrequieto,
Indo e vindo contra as marés, eu me levanto.
Deixando para trás noites de terror e medo
Eu me levanto”.

(trecho de poema de Maya Angelou, poeta americana e ativista por direitos civis)

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Categoria: Notícia
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