PEC 215: Parlamento disputa competência com Executivo

30/03/2012, às 13:12 | Tempo estimado de leitura: 14 min
A aprovação da PEC nº 215/2000 na Comissão de Constituição de Justiça e de Cidadania preocupou as organizações da sociedade civil. Foram 40 votos e apenas 2 contrários à aprovação da PEC. A PEC pretende retirar a autonomia e competência da União na demarcação de terras indígenas, na criação de unidades de conservação e no reconhecimento de áreas remanescentes de quilombolas, para estabelecer que o Congresso Nacional deva autorizar previamente essas ações.

Por Edélcio Vigna, assessor do Inesc

A Câmara dos Deputados está entrando em um terreno minado ao tentar se apropriar de competências do Governo Federal. Esse avanço foi sinalizado pela aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) N0 215/00, que inclui dentre as competências exclusivas do Congresso Nacional a aprovação de demarcação das terras indígenas e a ratificação das demarcações já homologadas, em prejuízo das atribuições da União.

Representantes de diversos povos indígenas estiveram na sessão da Comissão de Constituição de Justiça e de Cidadania (CCJ) e se manifestaram contrários ao projeto. Mesmo assim, deputados da Bancada Ruralista e outros segmentos conservadores aprovaram a proposta. Situações de força como esta só servem para distanciar o Parlamento da sociedade e gerar descrédito à instituição.

A Constituição Federal de 1988 previa que o governo demarcaria até 1992 todas as terras indígenas, que representa 13% do território nacional. Depois de 19 anos do prazo constitucional, o Instituto Socioambiental (ISA) estima que ainda faltem demarcar 197 (31,4%), das 627 Terras Indígenas existentes.

O Parlamento tem competência para promover audiências públicas e questionar os atos do Executivo, mas alguns parlamentares pressionam para que o Legislativo legisle em última instância sobre uma decisão que é da União.

De acordo com o art. 231 da Constituição Federal, “são reconhecidos aos índios (…) os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”. Mas, a CCJ aprovou a proposta que transfere o poder de demarcação da União ao Congresso e a CCJ é composta por deputados federais conhecedores do direito e de reputação ilibada. Como explicar, então, a aprovação de uma proposição inconstitucional?

Estaria a Comissão contaminada por interesses econômicos e espreitando as riquezas minerais existentes no subsolo das terras indígenas? Por que os ruralistas insistem tanto em incidir sobre a decisão de demarcação de terras indígenas? Será que não há pasto suficiente para albergar a boiada? A ocupação per capita de menos uma cabeça de gado por hectare é risível.

O Parlamento que tem aprovado projetos contrários aos interesses nacionais (como é o caso da Lei de Biossegurança, liberado as sementes transgênicas e do Código Florestal), além de postergar a aprovação do Estatuto do Índio (desde 1992), carece de legitimidade para apreciar de forma terminal projetos de demarcação de terras indígenas, quilombolas e áreas de conservação ambiental.

A Bancada Ruralista está ousando tanto como pode e, neste blefe, envolve a Lei Geral da Copa, o Código Florestal e agora vem atropelando para sequestrar, em nome do Congresso, o poder de determinar de forma exclusiva se um território é ou não indígena. Se fossem madeireiros poder-se-ia dizer: “São muito caras de pau!”.

A Constituição Federal prevê no art. 232 que “os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo”. Este é o procedimento possível que os povos indígenas têm que adotar de imediato.

A PEC 215 está em regime de tramitação especial e a mesa deverá formar uma Comissão Especial. Após a sua apreciação, o projeto será encaminhado ao Plenário da Câmara dos Deputados. Se aprovada será enviada ao Senado Federal para revisão. Caso rejeitado será arquivada.

Tramitação legislativa

De acordo com o Regimento Interno da Câmara dos Deputados (art. 202), a proposta de emenda à Constituição será despachada pelo Presidente da Câmara à Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, que se pronunciará sobre sua admissibilidade, no prazo de cinco sessões. Admitida a proposta, o Presidente designará Comissão Especial para o exame do mérito da proposição, a qual terá o prazo de quarenta sessões, a partir de sua constituição para proferir parecer. Após a publicação do parecer e interstício de duas sessões, a proposta será incluída na Ordem do Dia. A proposta será submetida a dois turnos de discussão e votação, com interstício de cinco sessões. Será aprovada a proposta que obtiver, em ambos os turnos, três quintos dos votos dos membros da Câmara dos Deputados, em votação nominal.

Veja o manifesto divulgado por diversas entidades

Confira abaixo o Relatório de Votação

Relatório de Votação

 

 

Nome do Parlamentar

Votação

Partido

Estado

Abelardo Lupion

Favorável

DEM

PR

Alceu Moreira

Favorável

PMDB

RS

Alexandre Leite

Favorável

DEM

SP

Anthony Garotinho

Contrário

PR

RJ

Arthur Oliveira Maia

Favorável

PMDB

BA

Asdrubal Bentes

Favorável

PMDB

PA

Bernardo Santana de Vasconcellos

Favorável

PR

MG

Bruna Furlan

Favorável

PSDB

RJ

Cesar Colnago

Favorável

PSDB

ES

Danilo Forte

Favorável

PMDB

CE

Eduardo Cunha

Favorável

PMDB

RJ

Eliseu Padilha

Favorável

PMDB

RS

Esperidião Amin

Favorável

PP

SC

Fabio Trad

Favorável

PMDB

MS

Felipe Maia

Favorável

DEM

RN

Felix Mendonça Júnior

Favorável

PDT

BA

Francisco Araújo

Favorável

PSD

RR

Francisco Escórcio

Favorável

PMDB

MA

Jerônimo Goergen

Favorável

PP

RS

João Campos

Favorável

PSDB

GO

João Dado

Favorável

PDT

SP

José Nunes

Favorável

PSD

BA

Leonardo Picciani

Favorável

PMDB

RJ

Lourival Mendes

Favorável

PT DO B

MA

Luiz Carlos

Favorável

PSDB

AP

Luiz Couto

Contrário

PT

PB

Marcos Medrado

Favorável

PDT

BA

Maurício Quintella Lessa

Favorável

PR

AL

Mendonça Filho

Favorável

DEM

PE

Nelson Marchezan Junior

Favorável

PSDB

RS

Onofre Santo Agostini

Favorável

PSDB

SC

Osmar Serraglio

Favorável

PMDB

PR

Paulo Magalhães

Favorável

PSD

BA

Paulo Maluf

Favorável

PP

SP

Reinaldo Azambuja

Favorável

PSDB

MS

Roberto Freire

Favorável

PPS

SP

Ronaldo Fonseca

Favorável

PR

DF

Vicente Arruda

Favorável

PR

CE

Vilson Covatti

Favorável

PP

RS

Zenaldo Coutinho

Favorável

PSDB

PA

Categoria: Artigo
Compartilhe

Conteúdo relacionado

  • A regulação do mercado de carbono no Brasil
    Com a Nota Técnica "A regulação do Sistema…
    leia mais
  • Adaptação na era dos extremos climáticos
    Nesta nota técnica (NT), fazemos uma análise sobre…
    leia mais
  • Foto: Lula Marques/Agência Brasil
    Primeiras reações ao anúncio do Ministério...
      Vê-se que há um esforço por parte…
    leia mais
  • Foto: Freepik
    Alerta de Comércio Tóxico: acordo UE-Merco...
    Mais de 400 organizações da sociedade civil, movimentos…
    leia mais
  • COP 29: hipocrisia e frustração
    Que a vida é injusta, já sabemos. Que…
    leia mais

Cadastre-se e
fique por dentro
das novidades!