Responsável pela Ficha Limpa, Marlon Reis defende fim do foro privilegiado

31/10/2016, às 12:15 | Tempo estimado de leitura: 12 min
Advogado diz que é possível derrubar resistência de políticos no Congresso e tirar das "autoridades" a prerrogativa de serem julgadas apenas pelo Supremo. Por Patrícia Rodrigues - Especial para o Correio.

Publicado pelo Correio Braziliense.

Conhecido como um dos maiores defensores da transparência e um dos mais influentes advogados eleitoralistas, Marlon Reis, idealizador da Lei da Ficha Limpa, assumiu a campanha pelo fim do foro privilegiado como uma meta particular.

O ex-juiz do interior do Maranhão ganhou notoriedade, em 2002, ao criar o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, o MCCE. Foi esse grupo que elaborou o projeto de lei que ficou conhecido como “Ficha Limpa”.

Nas Eleições de 2012, o ex-juiz se antecipou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e criou um blog que exigia que candidatos de três municípios, que estavam sob sua jurisdição, divulgassem os financiadores das campanhas. Hoje, candidatos do Brasil inteiro são obrigados a prestar contas a cada 72h no site do TSE.

Em relação ao fim do foro privilegiado, o ex-juiz acredita que a Proposta de Emenda Constitucional 470/2005, que tramita no Congresso e propõe o fim do foro de prerrogativa de função para deputados e senadores, pode ajudar a desafogar os processos que tramitam no Supremo Tribunal Federal. “Muitos diziam que o fim do voto secreto era matéria impossível. Agora, ultrapassada essa conquista, a próxima é esta, o fim do foro privilegiado”, disse em entrevista ao Correio.

Marlon acredita no fim do foro privilegiado da forma que existe atualmente. Na concepção dele, apenas chefes de poderes, como presidente da República, vice-presidente e presidentes da Câmara e Senado devem continuar com o foro de prerrogativa. “Ministros de Estado, por exemplo, devem ser julgados pela justiça comum.”

Para o ex-juiz, uma vara especial, proposta pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barro seria ideal para julgar as autoridades com foro. “É razoável que uma pessoa em mandato tenha um âmbito próprio onde corra a causa proposta contra ele. É possível aceitar uma discussão sobre como seria essa regra de competência, embora reconheçamos que não precisa ser igual à de qualquer cidadão. Pode, sim, haver algumas especificações.”

Qual é o principal problema com o foro privilegiado atualmente?

Os tribunais não estão devidamente aparelhados para realizar matérias de atividades que são próprias de processos judiciais. Especialmente, em atos instrutórios, que envolvem realização de audiências, às vezes com centenas de testemunhas, e a produção de outros meios de provas técnicas. Além disso, há um abarrotamento de atividades nos tribunais, especialmente nos tribunais superiores, que faz com que haja pautas, muitas vezes extremamente relevantes, e que, com razão, ajudam a colocar em segundo plano alguns processos movidos contra autoridades. Realmente, os tribunais não têm aptidão para realizar, eles próprios, esses atos de organização processual.

O foro deveria acabar para todos?

Penso que os chefes de poder como presidente da República, vice-presidente da República e presidentes da Câmara e Senado, no exercício do cargo, devem continuar por causa da prerrogativa do cargo. Sou a favor de que ministros de Estado percam o direito também. Ministros devem ser julgados pela justiça comum. Penso que, assim, o processo seria mais justo. Facilitaria também os processos e desafogaria os tribunais superiores.

Como está a tramitação da Proposta de Emenda Constitucional 470/2005?

Ela não está bem. É importante que esse assunto seja considerado prioritário e ingresse imediatamente na pauta do Congresso Nacional. A PEC precisa, portanto, ultrapassar os diversos momentos do processo legislativo para que seja votada, o que está longe, no momento, de acontecer. É preciso que o Senado dê a devida dirigência a essa matéria. Eu acredito que ela é possível de ser aprovada. Lutamos por anos contra o voto secreto no Congresso, muitos diziam que era uma matéria impossível de se vencer porque os próprios parlamentares tinham interesse no voto secreto, mas conseguimos. O efeito positivo do voto aberto do Congresso fica evidente para a sociedade, na transparência que promoveu. Agora, ultrapassada essa conquista, a próxima é esta, o fim do foro privilegiado.

A PEC fala somente sobre a extinção do foro para parlamentares. Atualmente, 22 mil pessoas possuem o direito. Retirar apenas os parlamentares seria o ideal?

Como a PEC não fala sobre a extinção de foro para outras autoridades, penso que se deve fazer textos substitutivos para a proposta. Isso deve ser discutido.

Como seria o fim do foro privilegiado?

Quando eu falo sobre o fim do foro privilegiado, eu me refiro sobre como hoje ele é. Privilégio de foro acontece sempre que estabelece uma regra de competência específica para uma autoridade. E isso precisa continuar acontecendo. Nós não nos referimos à necessidade de que os processos sejam distribuídos para qualquer autoridade como acontece com qualquer pessoa. É razoável que uma pessoa em mandato tenha um âmbito próprio onde corra a causa proposta contra ele. É possível aceitar uma discussão sobre como seria essa regra de competência, embora reconheçamos que não precisa ser igual à de qualquer cidadão. Pode sim haver algumas especificações.

Refere-se à vara especial?

Sim, sou a favor de uma vara especial no Distrito Federal para que aprecie todos os feitos de competência do Supremo Tribunal Federal e que aprecie os processos que, hoje, estão sobre competência do Superior Tribunal de Justiça. Essa semana assumi um compromisso pessoal de me envolver com esse tema, como uma questão central. Agora vou começar contatos com organizações e movimentos com a finalidade de chamar atenção para a urgência dessa pauta.

Categoria: Notícia
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