Enquanto os setores econômicos e financeiros aguardam a publicação do primeiro edital do leilão do programa Eco Invest Brasil, organizações sociais alertam para o risco de captura do Fundo Clima pelo programa, que visa atrair capital externo para investimentos produtivos no país.
Uma nota técnica lançada pelo Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) e a Coalizão Energia Limpa, evidenciou que com a entrada em vigor do Eco Invest Brasil, bancos privados poderão utilizar os recursos do Fundo Clima para realizar diversas operações de crédito, que, segundo especialista do Inesc, podem representar riscos à missão principal do programa.
O estudo evidencia que as mudanças produzidas no Fundo Clima a partir do Plano de Transformação Ecológica, aprofundadas com o Eco Invest ampliam o abismo entre a parte não reembolsável gerida pelo MMA e a parte reembolsável. O que resultará na criação de um outro Fundo Clima, que seguirá estratégia, contabilidade, governança e destino próprios.
A partir da análise o estudo aponta riscos, entre eles:
- Risco de priorização do uso de recursos captados pelo governo (que é dívida externa) para apoiar captações privadas (Programa Eco Invest Brasil). Tal priorização pode aprofundar a marginalização de medidas e iniciativas de políticas públicas sociais e ambientais que não são passíveis de apoio pela via das “finanças sustentáveis” e que são essenciais para enfrentar as desigualdades e as mudanças climáticas, inclusive “as perdas e os danos”.
- Risco de que o arranjo entre finanças públicas e privadas, construído no Eco Invest Brasil, seja monopolizado: (I) por grandes corporações e tomadores, ampliando a marginalização de projetos produtivos de interesse e impacto social; (II) por projetos de mitigação, em detrimento de 15 adaptação; e (III) por projetos e atividades mais rentáveis, em detrimento de projetos urgentes e pouco atrativos.
- Riscos associados à perda de transparência e à fragilidade da governança. Como já dito, ao longo de sua história, o Fundo Clima padeceu de lacunas de transparência e governança; em especial, as associadas à segmentação da sua gestão entre as partes reembolsável e não reembolsável, além da falta de direcionamento estratégico dos planos anuais de aplicação e da ausência de critérios de adicionalidade climática. Com a nova configuração em curso, os riscos se avolumam, especialmente se for considerado que uma parte possivelmente importante dos recursos estará sob outra estrutura de governança, o que ampliará os desafios de participação e articulação do destino do Fundo no âmbito do atual Comitê Gestor.
Diante dos alertas acerca das transformações em curso no Fundo Clima, o estudo termina com recomendações ao governo federal, entre as quais:
– que a renda do petróleo seja estrategicamente direcionada ao Fundo Clima sob gestão do MMA;
– que parte dos recursos de novos títulos soberanos deve ser destinada ao Fundo Clima não reembolsável;
– que haja meios legais para garantir que os recursos não reembolsáveis do Fundo Clima não sejam bloqueados pelo Regime Fiscal Sustentável;
“O financiamento público estruturado e permanente é fundamental para que o Brasil alcance uma transição energética justa e uma política nacional de adaptação”, avalia Alessandra Cardoso, assessora política do Inesc, uma das autoras da nota técnica. “A ação do Governo Federal é essencial para priorizar recursos para o Fundo Clima e garantir uma transformação ecológica inclusiva e sustentável”, conclui.