Inesc participa da Audiência sobre Orçamento da Criança, Adolescente e Jovem na CLDF

No dia 4 de novembro, às 19h, acontece a Audiência sobre Orçamento da Criança, Adolescente e Jovem, proposta pelos jovens à Frente Parlamentar Mista de Promoção e Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF). A sessão será transmitida ao vivo pelo canal do Youtube e pelo Facebook da CLDF.

Cinco jovens dos projetos Onda – Adolescentes em Movimento pelos Direitos e Corre – Juventudes na Cidade, ambos coordenados pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), participam da audiência que também tem a presença dos deputados (as) Fábio Félix, Leandro Grass e Arlete Sampaio, que compõem a Frente  Parlamentar em questão; de Coracy Coelho Chavante, presidente do Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente; e de secretários (as) de diversas pastas do Governo do Distrito Federal (GDF).

Na ocasião, o Inesc apresenta as informações da Nota Técnica sobre a proposta de orçamento do GDF para 2021, na qual constam cortes nos setores de educação e cultura. O documento, que tem o objetivo de auxiliar os jovens na audiência, destaca a importância da participação e transparência das informações e aponta propostas de emendas ao Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) do DF.

Protagonismo juvenil

Fábio William da Silva Pereira, 25 anos, diz que depois que ingressou no Corre – Juventudes na Cidade, percebeu que a famosa expressão “política não se discute”, já não faz tanto sentido.

“Essa audiência está sendo construída de forma que nós jovens tenhamos protagonismo. Claro que, no começo, achamos um pouco complicado palavras como ‘orçamento público’ e ‘políticas públicas’. Elas são desconhecidas e, em certa medida, parecem ser de difícil acesso propositalmente”, conta Fábio. “Somos fonte de atuação movidos por coragem. Somos homens e mulheres de diversas orientações sexuais, identidades de gênero, de várias cores, indígenas, quilombolas e temos esperança, foco e vontade de mudar o mundo, de  ser voz e resistência. Vontade de ser feliz”, completa.

Cortes na Educação e na Cultura

A Nota Técnica mostra que o PLOA 2021 do Governo do Distrito Federal prevê R$ 8,22 bilhões para a educação, 4,1% a menos do que o PLOA 2020, e que os recursos previstos para o ensino médio são consideravelmente menores do que para o ensino fundamental, com 70,4% de diferença. O nível médio é justamente o nível de ensino no qual se observa o maior abandono escolar no DF e onde se encontra um público mais vulnerabilizado no que tange o acesso às políticas públicas.

Os cortes orçamentários na educação preocupam ainda mais em virtude da pandemia da covid-19. Thallita lembra que a nova realidade na qual vivemos exige inovação para garantir educação com qualidade para todas as crianças, adolescentes e jovens, mesmo que em casa. “A disponibilização de equipamentos, assistência financeira e mais profissionais para garantir o vínculo e o diálogo com os estudantes tornaram-se investimentos essenciais”, comenta.

Investimentos também são necessários no caso do retorno das aulas presenciais. Nesse cenário, é preciso garantir condições seguras de acesso e permanência nas escolas, com infraestrutura adaptada, mais espaço para evitar aglomerações e mais equipamentos e insumos que deem segurança para os estudantes, professores e professoras.

Sobre o setor cultural, o documento ressalta que, apesar da cultura nas periferias do Distrito Federal ser forte e diversa, quase nenhuma região periférica tem sala de teatro ou cinema. Cenário semelhante acontece com centros culturais, que são poucos e têm mínima visibilidade. “A cultura em forma de política pública precisa ser descentralizada e o orçamento público pode contribuir com essa descentralização prevendo ações também para as regionais periféricas”, diz Thallita,

Por fim, a Nota Técnica sugere aumento de recursos para escolas do ensino médio e EJA, priorizando as regiões com maior defasagem escolar e menos acesso à educação; construção de Centros Culturais nas periferias do DF; e apoio financeiro para adolescentes e jovens periféricos, negros, mulheres, LGBTQIA+ que produzem arte e cultura, de modo a dar visibilidade ao trabalho, entre outros itens, como propostas de emendas ao Projeto de Lei Orçamentária Anual do DF.

Projeto Onda debate direitos humanos e orçamento público com jovens do DF

Há mais de 10 anos, o Onda: Adolescentes em Movimento pelos Direitos atua na formação em direitos humanos, cidadania e orçamento público com jovens de escolas públicas do Distrito Federal. Iniciativa do Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos), o projeto já atendeu 223 adolescentes do Itapoã, do Paranoá, e da Unidade de Internação de Santa Maria, todas regiões da periferia do DF.

O Onda é formado por oficinas semanais com temas gerais que, posteriormente, são trabalhados especificamente a partir das demandas de cada grupo. Atualmente, o foco das atividades tem sido o enfrentamento das violências, considerando como chave o enfrentamento dos problemas estruturais (racismo, sexismo, machismo e homofobia, entre outras) e do não acesso às políticas públicas. O projeto também prevê campanhas de conscientização da comunidade escolar com temas propostos pelo próprios adolescentes.

Além das atividades na escola,  foram realizadas 17 ações de integração comunidade-escola e 58 atividades de incidências, sendo 18 delas acatadas pelos poderes públicos.

“O projeto Onda é importante por vários motivos, entre eles, porque contribui junto às crianças e adolescentes para sua concepção de que são sujeitos com direitos. A partir dessa concepção, eles passam a se envolver ativamente nos processos de cidadania e de deliberação e elaboração de políticas públicas. Os integrantes do projeto passam a se compreender como parte da sua escola e comunidade querendo, assim, transformá-las de forma a ser um espaço acolhedor e alegre”, comenta Thallita de Oliveira Silva, educadora do Inesc.

Números e prêmios

O reflexo do sucesso do projeto também aparece em porcentagens e em prêmios. Em 2017, o Onda Adolescente Protagonista venceu o Prêmio Itaú-Unicef na categoria “Parceria em Ação” – Seleção local e, no ano seguinte, foi o vencedor do Prêmio Itaú-Unicef na mesma categoria.

Além disso, após a realização de uma pesquisa com a metodologia de grupo focal, foi constatado que:

– 94,4% dos adolescentes afirmaram que o Onda ajudou a entender o que são Direitos Humanos;

– 88,7% dos adolescentes afirmaram que o Onda ajudou a entender sobre a importância de combater todas as formas de violência;

– 100% dos integrantes do grupo focal analisado responderam que o Onda contribui com a formação e o desenvolvimento dos(as) adolescentes em diferentes aspectos.

Webert da Cruz, educador do Inesc, observa de perto a transformação das crianças e adolescentes. De acordo com ele, as atividades do Onda abrem caminho para que os envolvidos e envolvidas no projeto desenvolvam o autoconhecimento e conhecimento do mundo a partir de outras perspectivas. “Eles passam a conhecer mais os próprios direitos e se conectam com outras referências, marcadas pela diversidade. Isso cria um espaço livre e seguro para que cada um e cada uma possa se expressar de maneira mais atenta. A gente percebe que, agora, os adolescentes têm mais consciência sobre suas trajetórias e sobre a história de suas famílias, comunidades e territórios”, diz Webert.

“O projeto Onda humaniza as relações e faz com que todos e todas meninos e meninas se sintam importantes, potentes para criar e transformar. As crianças e adolescentes vivenciam violências estruturais que impactam de sobremaneira sua autoestima e sua possibilidade de criação e de reflexão. O projeto contribui para que elas entendam a violência às quais sofrem e que pensem juntas formas de enfrentamento às mesmas”, completa Thallita.

 

 

 

Campanha defende representatividade nas eleições municipais

As eleições municipais no Brasil se aproximam e, a cada dia, emergem informações sobre a persistência, entre as candidaturas para os postos de vereança e para as prefeituras, da sub-representação política de determinados setores: pessoas que têm menos chances de ser eleitas pelo racismo, pelo sexismo, pela discriminação religiosa e pela discrepância na distribuição de recursos para campanhas.

Para sensibilizar a sociedade brasileira sobre a sub-representação de mulheres, negros, indígenas, quilombolas, povos tradicionais de matriz africana, jovens e LGBTIQ+ nos cargos públicos eletivos durante as Eleições 2020, visando que a política institucional seja mais representativa dos diferentes grupos sociais do país, a Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político lança nesta sexta-feira (16) a campanha #QueroMeVerNoPoder.

A ideia é promover, ao longo do processo eleitoral que termina em 29 de novembro, ações de comunicação – voltadas a partidos políticos, movimentos sociais, mídia e sociedade – sobre a importância da mudança do modelo de representação vigente com vistas ao exercício da democracia plena no Brasil.

Embora a participação de segmentos sub-representados da sociedade brasileira tenha aumentado em termos absolutos no pleito de 2020, nas maiores cidades do país a disputa pelas prefeituras será dominada por homens brancos. De acordo com a Justiça Eleitoral, 8 em cada 10 candidatos a prefeito em cidades com mais de 200 mil eleitores são homens, e 70% são brancos.

Um estudo feito pelo Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) aponta que as eleições de 2020 contarão com 88.555 mulheres negras, mas destas, apenas 2,7% disputarão os executivos municipais. Das 706 mulheres indígenas que se candidataram, apenas 111 pleiteiam cargos de prefeita e vice-prefeita.

A campanha pretende, portanto, ampliar a discussão sobre a ausência de representatividade nos espaços de poder institucionais eletivos e suas consequências para os grupos sub-representados. De forma transversal, vai abordar assuntos ligados à violência política, desinformação (fake news) e segurança na internet – cujas principais vítimas são os grupos sub-representados na política.

Propostas

Além de apontar os problemas relacionados à sub-representação na política institucional e sensibilizar eleitores para que elejam candidaturas que representem esses segmentos, a Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político quer também apresentar suas propostas para a democratização efetiva do poder institucional.

No âmbito da representação, a rede defende a realização do voto em listas pré-ordenadas, organizadas de forma democrática pelos partidos políticos, garantindo a alternância de sexo e a participação de setores sub-representados nas legendas. Além disso, reforça que o financiamento das campanhas eleitorais deve ter critérios de partilha no interior dos partidos.

“A garantia de reserva de verbas para candidaturas negras foi uma conquista bastante importante no sentido de buscar mais equidade na disputa eleitoral, mas sabemos que haverá muita resistência dentro dos partidos em fazer a definição ser efetivada – como aconteceu com a cota para mulheres. Além disso, é preciso olhar para outros segmentos que também sofrem com a falta de democracia interna nos partidos, como indígenas, LGBTQIs, jovens e povos de terreiro”, pontua o documento da Plataforma lançado nesta semana.

Em relação aos mecanismos de garantia da democracia participativa, as organizações da Plataforma defendem o fortalecimento dos espaços de participação para o controle das políticas e de recursos públicos – como conselhos e conferências –, garantindo mecanismos, inclusive financeiros, para o efetivo compartilhamento do poder de decisão. Quanto às formas de exercício de soberania popular expressas na Constituição Federal (plebiscito, referendo e iniciativa popular), a Plataforma sugere, por exemplo, que propostas de iniciativa popular sejam aceitas com o mesmo número de assinaturas exigido para se criar um partido político (o equivalente a 0,5% dos votos válidos para deputado federal na eleição anterior) – e não com 1% do eleitorado, como é hoje, e a coleta de assinaturas deve ser permitida de forma digital ou eletrônica. Além disso, defende que plebiscitos e referendos devem ocorrer sobre questões-chave, como acordos comerciais internacionais, grandes projetos de infraestrutura e outros elementos da política econômica.

Assista ao vídeo de lançamento da campanha:

>>> Acesse e baixe os cards de lançamento no site da Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político

>>> Leia também: Busca por representatividade nas Eleições 2020

Inesc participa da revisão do processo de salvaguardas do BID

No início de 2020, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) abriu o processo de consulta para atualizar suas Políticas de Salvaguardas Operacionais ambientais e sociais. Após meses de reuniões, o Conselho de Administração do BID aprovou a Estrutura de Política Ambiental e Social (ESPF), acatando as sugestões da sociedade civil.

Entre as principais recomendações incorporadas no ESPF estão o fortalecimento na capacidade institucional, sistemas de governança ambiental e social dos países; a maximização dos benefícios do desenvolvimento sustentável; e o fornecimento de informações em formatos acessíveis para diferentes necessidades físicas, sensoriais e/ou cognitivas, além do desenvolvimento de mecanismos de reclamação acessíveis.

Organizações de todo mundo participaram do processo de revisão de salvaguardas. Além do Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos), o grupo brasileiro  contou com Conectas Direitos Humanos, ECOA, International Rivers – Brasil e International Accountability Project – Brasil. Também estiveram presentes Oxfam (Global), Proceso de Comunidades Negras (Colombia) e Centro Mexicano de Derecho Ambiental (Mexico), entre outras.

Papel do Inesc

O Inesc tem participação histórica em negociações com instituições financeiras internacionais, com o objetivo de lutar para que essas instituições caminhem rumo à garantia de direitos humanos e socioambientais. “Nesse processo, o Inesc fortaleceu a participação brasileira, colocando pontos fundamentais para a sociedade civil do nosso país, como a elaboração de uma lista de exclusão e o fortalecimento da linguagem em prol da implementação das salvaguardas pelos clientes do Banco, e de duras respostas quando da não implementação”, comentou Livi Gerbase, assessora política do Inesc, que esteve presente no processo de revisão das salvaguardas.

A Lista de Exclusão Ambiental e Social tira do rol de projetos financiados pela instituição atividades que não atendam aos compromissos do BID  relacionados ao combate à mudança climática. “A lista de exclusão representa uma vitória significativa, pois incentivamos os Bancos Multilaterais de Desenvolvimento a pararem de financiar projetos que apoiem ​​os combustíveis fósseis ou promovam o desmatamento e, em vez disso, investirem em energias renováveis ​​que fomentem a descarbonização na região”, comemorou Livi

Ao final, o BID afirmou que espera continuar com o processo de salvaguardas por meio de consultas. Esse sistema integrado permite a implementação efetiva da Estrutura de Política Ambiental e Social e evita a criação de lacunas, julgamentos irresponsáveis ​​ou ações arbitrárias.

É possível acompanhar quais foram as demandas da sociedade civil no processo por meio deste site.

O impacto da mineração no Pará é tema da série “Mulheres Amazônidas”

De julho a outubro de 2020, o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) promoveu quatro encontros virtuais com mulheres do sudeste do Pará. Com o objetivo de cartografar as experiências de luta e resistência na região, o projeto apresentou o impacto da mineração a um público amplo, abordando aspectos que vão para além dos seus efeitos mensuráveis, captando as questões psicológicas e subjetivas do cotidiano das participantes.

Ao longo de todo o circuito, 12 convidadas trouxeram diferentes experiências sobre a luta pela manutenção e preservação da vida e das comunidades onde vivem no conturbado contexto de uma pandemia global. Abaixo, é possível acessar todas as lives na íntegra e sumários detalhados das discussões:

1ª LIVE 

21/07

Mulheres Amazônidas: a defesa dos territórios em tempos de crise

Assista no Youtube

Leia sobre as discussões

2ª LIVE

01/09

De que lado a corda arrebenta? Os recursos da mineração e a desigualdade em tempos de pandemia

Assista no Youtube

Leia sobre as discussões

3ª LIVE

22/09

Territórios camponeses frente à mineração: olhares sobre a questão fundiária

Assista no Youtube

Leia sobre as discussões

4ª LIVE

13/10

Corpos-territórios e a luta no sudeste do Pará

Assista no Youtube

Leia sobre as discussões

A partir das lives e dos diálogos com outras reflexões advindas de diferentes correntes do feminismo, até o fim do ano será lançada a publicação “Mulheres Amazônidas: corpos-territórios e a luta no sudeste do Pará”.

 

Te Segura na Rede: uma campanha de segurança da informação com sotaque paraense

Desenvolvida para ser distribuída no Whatsapp, a campanha “Te Segura na Rede” traz um conteúdo didático sobre cuidados digitais para lideranças, campesinos e ribeirinhos do interior do estado do Pará. A ação foi pensada para acontecer sem a figura de um mediador e de encontros presenciais. Ela será inteiramente virtual, a partir da distribuição de cards, áudios, vídeos, stickers e gifs.

O projeto nasceu a partir de um diálogo com as organizações parceiras  do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc). Para Tatiana Oliveira, assessora política do Inesc, a campanha foi uma exigência do tempo em que vivemos. “Com o isolamento social e o aumento das trocas de informações por via eletrônica, em um contexto político conturbado, de pressão e perseguição a defensores de direitos humanos, entender de que maneira podemos nos proteger em relação à troca de dados e informações sigilosas se tornou prioridade”, conta.

A campanha cobre seis temas principais: o uso seguro do Whatsapp; a desinformação (fake news); a exposição em redes sociais; os ataques on-line; aplicativos seguros; e a importância das senhas fortes. Allan Gomes, integrante do Coletivo Proteja Amazônia –coprodutor dos conteúdos –, compara a importância da segurança digital à da fechadura da casa.

“Todo mundo está se conectando e se comunicando por celular, mensagens e vídeos, mas não houve uma educação de como essas ferramentas precisam de cuidados no dia a dia. Você não sai de casa sem fechar a porta, então, você deveria pensar a mesma coisa para seus equipamentos digitais”, destaca Allan.

O sotaque paraense

Embora tenha crescido o interesse pelo tema da segurança digital tanto por parte dos usuários comuns, como das organizações de direitos humanos, muitas das referências e softwares alternativos ligados aos cuidados digitais estão em inglês.

Um dos principais desafios para a produção da campanha “Te Segura na Rede” foi fazer a ponte entre esse conhecimento e as referências culturais paraenses: “costuramos temas que, às vezes, são distantes e técnicos, com temas locais do Pará, com humor e uso da linguagem memes”, explica Allan.

Inaugurada hoje, a campanha será divulgada para o público via Whatsapp e ficará disponível no site do Inesc para organizações e grupos interessados no tema.

Um passo à frente, dez passos para trás – a volta da fome

O Dia Mundial da Alimentação é celebrado todo 16 de outubro desde 1981. Esta data corresponde ao dia de criação da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), em 1945. A FAO, que este ano celebra seu 75º aniversário, foi fundada logo após o término da IIª Guerra Mundial, com o objetivo primordial de erradicar a fome, a desnutrição e a insegurança alimentar e nutricional ao redor do mundo.

Este ano, o lema do Dia Mundial da Alimentação é “Crescer, Nutrir, Sustentar. Juntos”. E como estamos no Brasil?

Não estamos bem, não havendo nada para celebrar, muito pelo contrário. Apesar do nosso agronegócio dito pujante e chamado de “pop”, não só a fome aumentou como pioraram as condições de sustentabilidade ambiental e climática da produção de alimentos.

A fome, uma mazela que pensávamos resolvida, nos ronda novamente. Segundo os dados mais recentes do IBGE, em 2017/2018, 85 milhões de brasileiros habitavam em domicílios com algum grau de insegurança alimentar e nutricional, dos quais 10 milhões sofriam de Insegurança Alimentar Grave (IAG). Isso equivale a toda a população de Portugal.

Insegurança Alimentar Grave é a expressão da fome vivenciada no domicilio, que corresponde a uma ruptura nos padrões de alimentação resultante da falta de alimentos entre todos os moradores, incluindo as crianças. Como pode ser observado no Gráfico 1, entre 2004 e 2013, o número de pessoas em IAG caiu pela metade, passando de 14,9 milhões para 7,2 milhões no período. Contudo, a partir de 2013, a situação vem piorando e em 2017/2018 o número de pessoas com fome aumentou para 10,2 milhões. Isso foi antes da pandemia da Covid-19, agora o quadro deve ser muito pior devido à crise econômica que resultou na perda de milhões de empregos e de diminuição da renda, especialmente dos mais pobres, associada ao pouco caso que o governo federal vem dando ao tema.

A fome tem endereço, cor e sexo

Como não poderia deixar de ser em um país eminentemente racista e sexista, a fome tem endereço, cor e sexo. Com efeito, ela está proporcionalmente mais presente nas áreas rurais, no Nordeste e em famílias chefiadas por mulheres ou negros. Assim, por exemplo, 74% dos domicílios com Insegurança Alimentar Grave têm como referência uma pessoa negra.

Diante desse quadro, qual a resposta do governo federal? Acabar com a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, que, até então, gozava de reconhecimento internacional devido aos expressivos resultados que vinha apresentando, especialmente com a diminuição da fome no Brasil. Esse foi um dos primeiros atos do governo Bolsonaro, em janeiro de 2019.

Piso mínimo emergencial para combater a fome

É para se contrapor a esse absurdo que 200 organizações da sociedade civil, entre elas o Inesc, articuladas na Coalização Direitos Valem Mais, apresentaram ao Congresso Nacional propostas concretas de um piso mínimo emergencial destinado a serviços essenciais para o Orçamento da União de 2021, dentre os quais, os de combate à fome.

Como se não bastasse desarticular a agricultura familiar e a agroecologia, o governo Bolsonaro desmontou as políticas socioambientais, desconsiderou os acordos de clima e incentivou o avanço da agropecuária, especialmente na Amazônia, contribuindo para o aumento das queimadas e do desmatamento. No Brasil do presidente Bolsonaro, fome, destruição do meio ambiente e aumento das emissões de gazes de efeito estufa andam juntos formando uma perfeita tempestade.

Se é verdade que o auxílio emergencial contribuiu para evitar o pior, a diminuição do valor pela metade a partir de outubro e sua interrupção no final do ano irão resultar em crise alimentar grave. Não seremos capazes de cumprir nenhum dos itens do bordão do Dia Mundial da Alimentação: não iremos crescer, não iremos nutrir, nem sustentar e muito menos juntos, uma vez que, tanto o governo quanto nossas elites que o sustentam, se preocupam mais com a diminuição dos gastos para atender o mercado do que com a fome de seu povo.

Circuito “Mulheres Amazônidas” chega à última edição

A última live do circuito “Mulheres Amazônidas” trouxe para o público uma outra face do processo de reflexão coletivo: as formulações teóricas que caminharam lado a lado à escuta ativa das 15 participantes.

No quarto e último encontro, três das organizadoras do circuito foram para o centro do debate: Rose Bezerra, educadora e socióloga; Margarida Negreiros, socióloga e professora da Faculdade de Educação do Campo – UNIFESSPA; e Tatiana Oliveira, assessora política do Inesc. Além delas, a educadora e pesquisadora militante Joana Emmerick e Gracinha Donato, artista popular e militante do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), foram convidadas.

O diferencial desse processo de reflexão coletiva foi não apenas trazer as experiências de mulheres de diferentes territórios, mas também pensar a mineração, a pandemia, a política e a economia, a partir das dinâmicas do cotidiano, das questões subjetivas e dos afetos.

Como lembrou Rose Bezerra ao comentar os processos de remoção de famílias em função dos projetos de mineração que acompanhou por 11 anos: “nada daquilo que a gente definia era capaz de expressar a dimensão da violência daquele processo que estava em curso”. Portanto, para Rose, o circuito de lives abriu uma perspectiva que vai além de apenas complementar uma análise objetiva dos impactos da mineração e do agronegócio.

“A minha fala não é partindo de uma ideia complementar, mas de uma nova chave para entender essas outras dimensões dos impactos que, muitas das vezes, passam invisibilizadas e que acabam sendo extremamente violentas, considerando a sua sinergia na vida das mulheres”, pontuou Rose.

>>> Leia: Territórios camponeses frente à mineração: olhares sobre a questão fundiária

Do ecofeminismo ao corpo-território

“O circuito Mulheres Amazônidas começou com a intenção de trazer o ecofeminismo para a análise da realidade das mulheres paraenses, mas ao longo dos encontros, a noção de corpo-território passou a fazer mais sentido”, contou Tatiana Oliveira, assessora política do Inesc.

O conceito nasceu em um contexto do acirramento das lutas territoriais na América Latina e no Brasil e tem como um dos marcos o lema “nossos corpos, nossos territórios”, levado pelas mulheres da Guatemala em 2003 no Fórum Social das Américas, detalhou Joana Emerick, que estuda as várias apropriações latino-americanas da categoria.

Para ela, a ideia de corpo-território traz em seu cerne a vivência em comunidade, o espaço coletivo em que as mulheres são as principais responsáveis pela sua defesa. Na tentativa de protegê-los dos processos de privatização, essas mulheres estabelecem com os territórios uma relação de interdependência. “O que tem acontecido é um processo de perda territorial enorme e o principal território afetado foi o da existência política das mulheres, da existência coletiva”, explica Joana.

Na prática, essa relação pode ser observada no papel que muitas mulheres desempenham na garantia da alimentação, por exemplo. “Em um contexto onde a gente tem uma intensificação do monocultivo do gado e da mineração, a resistência das mulheres no sentido de produzir comida saudável é uma questão extremamente fundamental para garantir a permanência e a vida nesses territórios”, disse Rose.

O conceito de corpo-território também evoca a sobrevivência no seu sentido simbólico e ancestral. Margarida, resgatando as falas das companheiras das lives anteriores, aterrissa a discussão no contexto da mineração.

“A mineração significa a cerca, a fazenda que se estabelece ali. As mulheres tiveram que puxar a cerca com as duas mãos para que a cabeça, o machado e o cofo, que são os instrumentos que elas usam para extrair o babaçu, pudessem passar. Olha a agressividade que isso significou para elas! Antes não tinha cerca de arame farpado, elas tiveram que adentrar a cerca com esse corpo, corpo que procura formas de sobrevivência aprendidas com as avós e pais”.

>>> Leia: De que lado a corda arrebenta? Os recursos da mineração e a desigualdade em tempos de pandemia

Violências

O tema corpo e território também envolve a violência. Tatiana chamou a atenção para o fato de que, geralmente, quando se fala de mulheres e violência, as discussões são sobre violência doméstica. Por isso, as lives abarcaram a violência em suas múltiplas dimensões. “A gente veio discutindo as tramas econômico-financeiras da violência contra as mulheres, que é um slogan que vem aparecendo para falar da violência do Estado, da violência corporativa”, explicou.

Os efeitos que o desmonte da vida comunitária tem na precarização do trabalho das mulheres nos territórios foi tema da fala de Rose: “É um processo  violento que, ao fim, recai sobre a vida e os ombros dessas mulheres. Se a gente considera essa multiplicidade de papéis que as mulheres cumprem no tecido social e se esse tecido se esfacela e é desmontado, tudo acaba incidindo com mais força e com mais pressão sobre essas mulheres”.

Outra dimensão da violência discutida nas lives pelas mulheres do sudeste paraense foi a psíquica, ao recordarem os entes queridos assassinados nas lutas por seus territórios, as experiências de despejo e o barulho da ferrovia Carajás. “É acumulado de violências que são relatadas. Elas vão da possibilidade do acesso à água até respirar um ar limpo e saudável ou até a soberania alimentar, existe uma sensação de aprisionamento dentro dos territórios”, resumiu Tatiana.

Margarida ainda acrescentou a criminalização: “a estigmatização e a judicialização criam um pensamento social de negação nessas mulheres. Desqualificam suas formas de vida, seus territórios e suas maneiras de viver e de falar”.

>>> Leia: Mulheres amazônidas e a defesa dos territórios em tempos de Covid-19

Solidariedade e pertencimento

Falar em corpo-território também é reconhecer as relações de solidariedade que sustentam as comunidades, relações estas que por si só são um contraponto ao abismo visibilizado pela pandemia.

Tatiana resumiu bem essa questão ao colocar que “é impossível pensar a pandemia sem pensar a crise de reprodução social e dos cuidados que a gente vive hoje, tanto do ponto de vista da solidão dos sujeitos, como do jeito que a gente se organiza para viver em comunidade”.

Para ela, a limitação dos serviços públicos levou à exaustão generalizada, que traz a necessidade do afeto e do amor como amparo. “Para além de pensar o corpo conectado ao território, é também pensá-lo como primeiro território”, pontuou.

Neste sentido, as convidadas das lives marcaram ao longo dos debates a importância da solidariedade como estratégia de sobrevivência. O trabalho coletivo das quebradeiras de coco, realizado com muita cantoria, como homenageou Gracinha, talvez seja a imagem perfeita desta dimensão. “Penso na solidariedade, como algo que é forte entre as mulheres camponesas”, refletiu Margarida.

 

Busca por representatividade nas Eleições 2020

A assessora política do Inesc, Carmela Zigoni, publicou artigo nesta terça-feira (13) no jornal Estado de Minas em que traça um perfil das candidaturas aos cargos de prefeitura e vereança nas Eleições de 2020. A partir do cruzamento de dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com recortes de raça, gênero e patrimônio, o texto revela a busca por maior representatividade na política, materializada no aumento de candidaturas de mulheres negras, indígenas e pessoas trans.

Os dados apresentados no artigo foram levantados pelo Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos), em parceria com o coletivo científico Common Data.

Ainda que com desigualdades profundas, as Eleições 2020 contarão com 88.555 mulheres negras disputando diferentes cargos. Destas, apenas 2,7% disputarão prefeituras. Adicionalmente, serão 706 mulheres indígenas, sendo que 111 disputarão os cargos de prefeita e vice-prefeita. Em um cenário de destruição do meio ambiente, avanço de ideias fundamentalistas e racistas, é fundamental reafirmar a necessidade de superar a sub-representação de grupos historicamente discriminados. Agora, cabe aos eleitores compreender a importância da diversidade no poder”, afirmou a assessora política do Inesc, que também é doutora em antropologia social.

>>> Leia a íntegra do artigo publicado no Estado de Minas aqui

Veja abaixo os principais números do levantamento:

Qual o perfil médio das candidaturas?

De forma geral e sem distinção de cargo, os candidatos são majoritariamente negros (pretos + pardos, que representam 49,93% do total de registros), do sexo masculino (66,76% do total de registros), com idade entre 36 e 45 anos (30,58% do total de registros). Eles são em sua maioria agricultores (6,82% do total de registros), servidores públicos municipais (6,3%) e comerciantes (5,2%), e com valor do patrimônio declarado entre R$ 100 mil e 500 mil reais (21,58% do total de registros).

Porém, a proporção de candidaturas de mulheres cresceu de 31,9% para 33,2%  em relação ao pleito de 2016, e de 14,7% para 16,1% no caso de mulheres negras (pretas + pardas). As candidaturas indígenas, embora ainda bastante minoritárias, aumentaram de 0,35% em 2016 (1.712) para 0,39% (2.172) em 2020, em todas as regiões do Brasil.

Pessoas transexuais também estão no páreo. Apesar do nome social ter sido aceito pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) apenas em 2018, nessas eleições já são 162 candidaturas registradas com o nome social (pessoas trans que já fizeram a mudança no registro de nascimento não aparecem neste dado, o que sinaliza para um número ainda maior).

Mulheres candidatas continuam com pouco espaço

As mulheres, por sua vez, representam 33,2% dos 550.340 pedidos de registro de candidaturas apresentados ao TSE, para todos os cargos.  Contudo, esse percentual deve expressar as cotas partidárias e não um verdadeiro engajamento de mulheres na vida política.  E mais: as candidaturas femininas ainda seguem concentradas nos cargos de menor prestígio e poder de decisão: elas representam apenas 13,1% das candidaturas para prefeituras, 21% para vice-prefeituras e 34,4% para vereança.

Dentre todos os partidos políticos, somente o PCO não cumpriu a cota mínima de 30% de candidaturas do sexo feminino, tendo solicitado o registro de apenas 21 mulheres, o que representa 21,9% dos pedidos de registro do partido; o Unidade Popular (UP), contrariamente, é o partido com maior proporção de registros de mulheres, 43,6%, seguido do PSTU com 39,7% e do PSOL com 36,2%. Os demais partidos ficaram na média de 33%.

As as mulheres negras estão mais presentes nos partidos UP (30,1%), PC do B (21,7%) e PSOL (21,4%), sendo que o partido que mais apresentou candidaturas de mulheres negras à prefeitura foi o PSTU, com 22,5% de candidatas a prefeita. Por outro lado, o partido com a menor proporção de mulheres negras concorrendo às eleições de 2020 são o PCO (4,2%) e o NOVO (4,8%).

A proporção de homens e mulheres concorrendo (33,2% mulheres e 66,8% homens) pode ser um efeito da EC 97/2017, que exigiu que cada partido indicasse, individualmente, o mínimo de 30% de mulheres filiadas. Como apresentado acima, poucos partidos registraram mais do que o mínimo exigido por lei de candidaturas de mulheres.

Na análise de gênero e raça/cor, observamos o equilíbrio entre candidaturas de mulheres brancas (49,4%) e de mulheres negras (48,4%), mas considerando todas as categorias raciais, as mulheres brancas são maioria em todos os cargos, e para as prefeituras chegam a ser quase o dobro de mulheres negras: 1.600 candidatas brancas, 726 candidatas pardas e 130 candidatas pretas. As mulheres indígenas somam 706 candidaturas.

As jovens negras candidatas representam 22.193 candidaturas a vereadora, 94 a prefeita e 266 a vice-prefeita (18 a 35 anos).

Ocupação: candidatas donas de casa, funcionárias públicas e agricultoras

Sobre o perfil das mulheres candidatas, as ocupações mais frequentes entre as mulheres são dona de casa (11,7%), servidora pública municipal (7,1%), agricultora[1] (5,1%) e professora da rede pública municipal (4,3%); e entre as mulheres negras, ser dona de casa é 13,4% mais frequente do que entre as mulheres brancas.

Partidos dificultam candidaturas negras para as prefeituras

 As candidaturas de pessoas negras representam 49,9% contra 47,9% de pessoas brancas, sendo, em números absolutos, as candidaturas negras estão mais concentradas no Nordeste (103.150 candidaturas) e no Sudeste (87.204), e são proporcionalmente maiores para o cargo de vereador. Para os cargos de prefeito e vice prefeito, os candidatos brancos seguem sendo maioria (63,4% e 59,2% respectivamente).

Quando desagregados os valores de candidaturas negras em pretas e pardas, vemos que predominam as candidaturas de pardos e que há maior proximidade proporcional de pessoas pretas entre os gêneros masculino e feminino do que na categoria de pessoas pardas.

– 48,4% das mulheres se identificam como negras. Dessas, 37,7% são
pardas e 10,7% pretas.

– 50,7% dos homens se identificam como negros. Desses, 40,3% são pardos e 10,4% são pretos.

Os partidos que mais apresentaram pedidos de registro de candidaturas de pessoas negras foram UP (69,9%), PCdoB (66,2%) e PSOL (60,2%), e os que mais apresentaram candidaturas indígenas foram PSTU (3,4%), REDE (1,63%) e PCO (1%). Já os partidos com menos negros são o PCO (16,76%) e o NOVO (18,6%) e com menos indígenas são o PCB, que não apresentou nenhuma candidatura indígena, e o PMB (0,07%).

Há diferenças no perfil das candidaturas a depender do cargo: dentre as candidaturas à prefeitura, predominam os homens brancos, de 46 a 55 anos, com ensino superior completo (totalizando 1.659 registros); já entre vereadores predominam homens pardos, com idade entre 36 e 45 anos e ensino médio completo (19.533 registros).

Coordenação e análise: Inesc
Tratamendo da base de dados: Common Data

[1] Só declaradas agricultoras. Trabalhadoras rurais são 1,28%; produtora agropecuária 0,2% e pecuaristas 0,07%.

Inesc é um dos organizadores do Fórum Permanente “Amazônia em Transe”

Nos dias 21 e 22 de outubro, a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) promove o Fórum Permanente: Amazônia em Transe: Estratégias, Impactos e Impasses para o Século 21. O Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) é um dos organizadores do evento que vai discutir a intensificação da exploração econômica dos recursos naturais nas áreas amazônicas da América do Sul, as consequências e os impactos para suas populações e territórios, bem como propor novas articulações e alianças tendo em vista a discussão e defesa de um desenvolvimento econômico alicerçado em sua diversidade socioambiental e sua integridade étnico-cultural-territorial. É gratuito, on-line e as inscrições podem ser feitas aqui.

Alessandra Cardoso, doutora em Desenvolvimento Econômico pelo IE/UNICAMP e assessora política do Inesc participa como debatedora da mesa “Amazônia Sul-Americana: Geopolítica, Infraestrutura e Mineração”, ao lado de Thais Virga (IE/UNICAMP). “Este evento marca a intenção do Inesc de ampliar diálogos e alianças e pensar estratégias para o enfrentamento dos problemas que marcam a Amazônia no presente século.  Acadêmicos, ativistas e organizações não governamentais, com diferentes leituras e abordagens, estarão reunidos para pensarem juntos os muitos impasses colocados à preservação da região”, explica  a assessora política do Inesc.

A programação também conta com a presença dos professores Wanderley Messias da Costa e Edna Castro; da estudante e liderança Indígena, Auricélia Arapiun; e da doutora em Sociologia, Maristella Svampa (Escuela de Altos Estudios en Ciencias Sociales). A programação completa pode ser conferida no site do evento.

Nota coletiva: Meio Ambiente e o PLOA 2021

Esta Nota Coletiva partiu de informações produzidas pelo (Inesc)  Instituto de Estudos Socioeconômicos. Para ler mais, acesse a Nota Técnica PLOA 2021 e o Meio ambiente.

Assinam essa nota:

Instituto de Estudos Socioeconômicos – INESC

Instituto Talanoa

Centro Brasil no Clima

Clímax Brasil

Instituto Sociedade, População e Natureza – ISPN

Instituto Democracia e Sustentabilidade

Fundação Avina

Fundação Grupo Esquel Brasil – FGEB

FBOMS – Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para Meio Ambiente e Desenvolvimento

Gestos (soropositividade, comunicação, gênero)

Grupo de Trabalho da Sociedade Civil para a Agenda 2030 (GTSC A2030)

Associação Alternativa Terrazul

Teia Carta da Terra Brasil

Instituto Internacional Arayara

Observatório do Clima

Toxisphera Associação de Saúde Ambiental

AMAR Associação de Defesa do Meio Ambiente de Araucária

Cidades Afetivas

Nota técnica: Meio ambiente e o PLOA 2021

Muito tem sido dito sobre o que denominamos desmonte da política socioambiental brasileira por meio de mudanças deliberadas sob o comando do Executivo federal. O quadro geral que resulta deste desmonte está intimamente relacionado com o aumento do desmatamento, com a pressão de agentes econômicos para o avanço ilegal e legal sobre áreas de floresta protegidas, com o aumento da grilagem e da violência no campo. Tal quadro configura, também, um severo risco de descumprimento pelo Brasil de normas constitucionais, leis nacionais, acordos internacionais e políticas vinculadas a todo este arcabouço de proteção ambiental e de direitos territoriais, reconhecido nacional e internacionalmente como avançado.

Para complementar e contribuir para esta visão multidimensional do desmonte da política socioambiental brasileira, o Inesc traz na presente Nota Técnica uma análise do orçamento do meio ambiente, com um olhar para o PLOA 2021, em tramitação no Congresso Nacional desde o dia 31 de agosto de 2020.

Modelo de Referência para Publicação de Dados Abertos é lançado para o público

O Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) é uma das entidades que participaram na elaboração do Modelo de Referência para Publicação de Dados Abertos. Lançado no início de outubro, o documento visa integrar, capacitar e sensibilizar a sociedade e as três esferas de governo no contexto da abertura de dados públicos. Dessa maneira, espera-se orientar quanto à importância, ao uso, à publicação e ao monitoramento de Dados Abertos nos seus respectivos campos de atuação.

O Modelo de Referência consolida o trabalho dos órgãos e entidades responsáveis pela execução do Compromisso 2 – Ecossistema de Dados Abertos – do 4º Plano de Ação do Brasil no âmbito da Parceria para Governo Aberto. Formada por oito países, entre eles o Brasil, a Parceria é uma iniciativa internacional que incentiva práticas governamentais relacionadas à transparência dos governos, ao acesso à informação pública e à participação social.

“O Inesc colaborou ativamente na elaboração do documento. Fazemos parte de um grupo que acompanha o Compromisso 2 e fomos uma das organizações que ajudaram a elaborar o conteúdo que contribui na agenda de Dados Abertos”, explica Carmela Zigoni, assessora política do Inesc.

De acordo com Carmela, o Modelo de Referência para Publicação de Dados Abertos é extremamente importante porque quando os dados forem abertos em todas esferas, eles poderão ser dialogáveis. “Ele também auxilia o trabalho dos gestores municipais e estaduais. Apesar da Lei de Acesso à Informação ter quase 10 anos, ainda há várias dúvidas sobre como abrir e divulgar os dados”, comenta.

Também fizeram parte da criação do Modelo de Referência: Controladoria-Geral da União (CGU), Fundação Getúlio Vargas – por meio da Diretoria de Análise de Políticas Públicas (FGV/DAPP) –, Centro de Estudos sobre Tecnologias Web (Ceweb.br) do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) e Open Knowledge Brasil (OKBr).

Uso de dados abertos

Existem diversas maneiras de promover o uso de dados abertos, entre elas, alguns aplicativos.  O “CoronApp78”, por exemplo, utiliza geolocalização para informar casos de contaminação pelo novo coronavírus em localidades ao redor do celular e indica hospitais, farmácias e supermercados mais próximos. O “Coronavírus SUS79”, criado pelo Ministério da Saúde, traz informações sobre a Covid-19 e mostra as unidades de saúde próximas à localização do usuário, entre outras funções.

Leia o Modelo de Referência para Publicação de Dados Abertos na íntegra.

Territórios camponeses frente à mineração: olhares sobre a questão fundiária

O sudeste paraense é uma região marcada pela presença de assentamentos rurais constituídos em um contexto de ocupação das terras pelo agronegócio e, mais recentemente, por mineradoras. “Temos uma região fortemente marcada pela territorialização camponesa. São mais de 500 projetos de assentamentos com milhares de famílias que lutam pela terra ainda hoje”, explicou Rose Bezerra, educadora e mediadora do debate.

Participaram como convidadas da live: Liliane Guimarães, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) de Canaã dos Carajás; Andréia Silvério, advogada da Comissão Pastoral da Terra (CPT) de Marabá; e Lucilei Oliveira, docente da Universidade do Estado do Pará (UEPA). O evento contou, ainda, com as intervenções poéticas de Gracinha Donato, artista popular e militante do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM) e com a contribuição de Tatiana Oliveira, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).

A luta pela terra e a queda de braço com a mineração

“Como fazer reforma agrária em um território que 70% dele é da Vale?”. Com esta pergunta Liliane Guimarães abriu sua fala e resumiu suas preocupações como militante pela reforma agrária. Ela é moradora do assentamento Eduardo Galeano, no município de Canaã dos Carajás e vizinho do Projeto Ferro Carajás.

Embora reconheça que seu assentamento não concentra uma grande quantidade  de conflitos como outros, o contexto em que vive é permeado por assédios, principalmente da mineradora Vale. “A gente vai vivendo, mas não é fácil. Quase todos os dias temos drones nos acampamentos e helicópteros sobrevoando. Hoje, foi um desses dias aqui”, relatou.

A dependência da mineração 

Militante do MST, Liliane ressaltou a dificuldade de construir a luta pela terra em um município originalmente agrário e hoje dominado pela mineração. “A Vale está na educação, na saúde e na cultura”, disse, traduzindo a sensação que é viver em uma cidade dominada social, cultural e economicamente pela empresa mineradora. “Para nós camponeses, até a liberdade de falar foi levada pelo capitalismo”, desabafou.

De forma complementar às reflexões de Liliane, Andréia Silvério, advogada da CPT, fez um panorama geral da luta pela terra na região entre Canaã dos Carajás e Parauapebas, onde há cinco projetos de mineração em operação.

“Isso gera, em certa medida, uma dependência do ponto de vista econômico, do município com relação à mineração. Sob o discurso de  enxergar que a mineração é a vocação do município, os próprios gestores municipais não investem em outras políticas econômicas e acabam abandonando alguns setores, como é o caso do que aconteceu com a agricultura familiar no município de Canaã dos Carajás”, pontuou.

A judicialização dos conflitos 

Para Andréia, há um crescimento assustador da demanda de assessoria jurídica por parte dos agricultores no processo de enfrentamento das mineradoras, em especial, a Vale. “Hoje, a assessoria jurídica da Comissão Pastoral da Terra faz o acompanhamento de pelo menos 40 ações possessórias no município de Canaã dos Carajás. Elas são referentes a cinco acampamentos localizados em áreas que também são reivindicadas pela mineradora Vale”. Esses cinco acampamentos abrigam 600 famílias.

A judicialização dos casos vem sendo provocada pela própria mineradora, que ingressou com pedidos de reintegração de posse das áreas ocupadas. “Então, em um primeiro momento, a atuação da CPT se dá na frente jurídica, para garantir, por meio da defesa dessas famílias, que não ocorressem despejo”, conta a advogada. A esse processo soma-se a criminalização das lideranças pela Vale, prática comum em outras partes do Brasi”l, denunciou Andreia. Em resposta, os agricultores têm investido em uma frente jurídica.

A apropriação de terras federais

Se em alguns casos a estratégia da Vale é comprar individualmente as terras dos agricultores, minando as possibilidades de articulação coletiva para a defesa de seus direitos, em outros, a estratégia é se apropriar das terras federais. “A Vale não compra apenas as terras em que se sabe da existência de um título, na verdade, a Vale acaba também se apropriando de áreas públicas federais, de áreas pertencentes a projetos de assentamentos, como é o caso do projeto Carajás 2 e 3”, relatou Andréia.

A CPT, juntamente com os agricultores, vem apresentando denúncias ao Instituto de Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) sobre tais casos. Atualmente, está em processo um acordo entre o Incra e a Vale para realizar a compensação dessas áreas que foram apropriadas indevidamente pela mineradora e que são reivindicadas por agricultores.

Ambientalização do discurso da Vale

Andréia chamou atenção, ainda, para a ambientalização do discurso da Vale, que vende uma imagem de empresa preocupada com o meio ambiente e com o desenvolvimento sustentável. Para ela, esse discurso esconde uma atuação nos territórios que é predatória e prejudicial, não só à natureza, mas também aos trabalhadores rurais.

A advogada analisa que, junto com a judicialização dos conflitos sociais e com a criminalização dos movimentos, a ambientalização da imagem forma o tripé das estratégias da Vale na região.

Remoção forçada e o assédio das mineradoras 

Se por um lado está a dificuldade de conquista da terra em um contexto de apropriação do território pelas mineradoras e em especial pela Vale (como é o caso de Canaã dos Carajás), por outro está a remoção forçada de agricultores que já possuem os títulos de suas terras.

Em Ourilândia do Norte, o caso do projeto Onça Puma é emblemático nesta estratégia de remoção forçada das famílias com a finalidade de instalar projetos de mineração. Inicialmente de propriedade da empresa canadense Canico, hoje o projeto está nas mãos da Vale. Ele surgiu em 2000, em um contexto de diversificação da produção minerária no sul e sudeste do Pará, com o mapeamento do níquel, cobre, ouro e ferro em novas regiões.

A Canico começa o processo de prospecção mineral adentrando nos lotes dos agricultores do Projeto de Assentamento Campos Altos e abrindo uma frente de conflitos, relata a professora Lucilei Oliveira da UEPA. Mesmo com 240 famílias vivendo no assentamento, a mineradora iniciou um processo no Incra para alteração da finalidade do terreno de agricultura familiar para mineração. Ao mesmo tempo, comprou individualmente as terras dos agricultores.

Enquanto o Incra, em Brasília, descobriu uma série de irregularidades cometidas pela Canico, a empresa comprou individualmente 85 lotes (o restante, foi negociado coletivamente). Juntos, os trabalhadores rurais pedem na justiça a anulação das vendas que haviam ocorrido em 2003 e a reparação das famílias por danos socioambientais ambientais.

“O que a gente pode perceber com isso? Que a mineração é incompatível com o campesinato, é uma realidade que não consegue conciliar com os agricultores que estão no entorno, até porque, os danos ambientais são terríveis: aterramento de nascentes, contaminação das águas, contaminação do solo”, declara Luciei.

O projeto Onça Puma também atinge diretamente os índios Xikrin com a contaminação das águas do rio Caetés. “Os Xikrin, os Kayapó e tantas outras etnias… É o segmento que sem dúvida, desde o início dos anos 1980, tem sido sistematicamente violentado, e também resistindo”, apontou Rose.

Em resumo, “o cenário que a gente tem é o de uma mineração que quando se instala nos territórios, produz uma situação de zonas de sacrifício. Regiões que são destinadas à exploração econômica estritamente, sem considerar processos associativos, dinâmicas socioterritoriais, todo um processo de produção cultural e simbólica na relação entre seres humanos e natureza” conclui Tatiana, ao final do evento.

Acompanhe o circuito de lives e escute as mulheres amazônidas

Para saber mais sobre o sudeste do Pará, o contexto de mineração e as estratégias desenvolvidas pelas mulheres amazônidas para sobreviver a esse modelo econômico e à crise da covid-19, acompanhe o circuito de lives pelo site e pelo YouTube do Inesc.

A primeira live, “Mulheres amazônidas: a defesa dos territórios em tempos de crise” teve como tema a luta e a resistência das mulheres no contexto da pandemia e a mudança nas rotinas das atividades sociais e políticas. Já o segundo, De que lado a corda arrebenta? Os recursos da mineração e a desigualdade em tempos de pandemia, trouxe para o centro do debate a questão econômica, a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), o impacto econômico da mineração e a desigualdade. A próxima e última live acontece dia 13 de outubro.

Assista ao resumo da transmissão! O vídeo completo você pode conferir aqui.

No Brasil, clima e floresta tornaram-se questão de polícia

No apagar das luzes de agosto, o governo enviou ao Congresso o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA), que detalha as expectativas de despesa para 2021. O documento reforça as especulações que vinham sendo feitas desde 18 de agosto, quando uma versão do documento vazou à imprensa. De um lado, a peça revela a estratégia agressiva dos militares a fim de garantir recursos para as suas áreas. De outro lado, mostra que o governo cedeu à pressão e optou por proteger recursos para o Ministério da Defesa.

A imprensa havia divulgado a informação de que militares pressionaram o governo para ampliar a fatia de recursos “ressalvados”, ou seja, aqueles sobre os quais o Legislativo tem baixo poder de veto. Relatou-se, ainda, que a equipe econômica pretendia abrir ampla negociação a respeito das ações subordinadas à aprovação do Legislativo. No entanto, uma série de atropelos e um suposto acordo entre militares e a Junta de Execução Orçamentária, aparentemente sem o conhecimento do Ministério da Economia, teria garantido a proteção dos recursos para Defesa em 2021.

Mas essa não foi a única polêmica envolvendo o orçamento público e os militares no governo durante o mês de agosto. No dia 21, a Defesa anunciou que gastaria R$145 milhões com a compra de microssatélites, sob a alegação de que os novos equipamentos seriam mais eficazes para o monitoramento do desmatamento e das queimadas na Amazônia. A aquisição favorece o Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia (Censipam), vinculado à Defesa. O Inpe, que vem sendo desacreditado e sucateado, afirmou não ter sido consultado sobre esta aquisição. O órgão também questionou a compra, alegando que não há vantagem em relação aos instrumentos que já se encontram em uso.

Quem tem poder no governo Bolsonaro?

Tais notícias deixam dúvidas sobre quem terá o poder para direcionar a prioridade dos gastos no governo Bolsonaro, se o Ministério da Economia ou os militares. Além disso, no contexto da pandemia da Covid-19 e da piora significativa da qualidade de vida dos brasileiros (enlutados, doentes e desempregados), parece inapropriado insistir que os gastos com o equipamento da Defesa definam a prioridade orçamentária do governo. Mas o que diz o projeto de lei orçamentária para o próximo ano?

Na comparação com 2020, o PLOA para 2021 aumenta os recursos destinados à Defesa. A comparação foi feita entre os projetos de lei orçamentária de ambos os anos. Os dados foram extraídos do Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento (SIOP). Para 2021, a Defesa terá R$ 110,8 bilhões. Isto representa R$ 5,1 bilhões extras em comparação com o previsto na proposta orçamentária anterior (R$ 105,7 bilhões). Também é necessário considerar que, no correr do ano orçamentário, recursos podem ser adicionados (ou subtraídos) desta previsão inicial.

Em relação a outros ministérios, a tendência foi de recuo: Saúde, Educação, Infraestrutura e Meio Ambiente tiveram perdas reais. Educação, crianças e adolescentes e saúde sofreram cortes. Na saúde, a perda foi de cerca de R$ 40 bilhões. Na Infraestrutura, a aposta do governo são concessões, privatizações, finanças mistas e títulos verdes. Embora trate-se de um setor que se beneficia, comumente, pela concessão de créditos suplementares, a redução do orçamento antecipa o desejo do governo em experimentar novas modalidades de financiamento disponíveis no mercado.

Militares disputam recursos do Meio Ambiente

O Meio Ambiente parece levar para o próximo ano a grave crise que corrói suas capacidades. Na comparação com o PLOA de 2020, a pasta, cujo orçamento já vinha caindo de forma dramática, perdeu 35%. O Programa de Prevenção e Controle do Desmatamento e dos Incêndios nos Biomas (6014) não aparece nesta proposta. A Funai teve leve aumento no orçamento. Mas os novos recursos não são suficientes para repor as perdas dos últimos anos.

Com a criação do Conselho Nacional da Amazônia, o ministério passou a concentrar recursos e funções de órgãos com mandato legal para administrar a política ambiental. Em 2020, créditos suplementares garantiram a entrada dos militares na disputa pelo meio ambiente. Para 2021, o grupo se esforçou para garantir, no projeto de lei, os recursos para implementação das suas políticas.

Por tudo isso, é possível dizer que o clima e a gestão das florestas, no Brasil, tornaram-se questão de polícia. Além disso, a articulação dos militares para apropriação crescente de recursos e a opção por proteger uma agenda de gastos fútil, no cenário de pandemia e de crise social, parece um enorme equívoco. O desinvestimento em áreas fundamentais para garantir direitos cobra o seu preço climático, social e econômico.

>>> Leia também: Governo federal dá ao Ministério da Defesa 84% de parte dos recursos recuperados pela Lava Jato

Sociedade Civil apresenta propostas para leis orçamentárias de 2021

A Coalizão Direitos Valem Mais, que agrega cerca de 200 organizações da sociedade civil, lança hoje (30/11) nota técnica destinada ao Congresso Nacional e à sociedade brasileira com um conjunto de propostas que visam fortalecer a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA) 2021 como instrumentos para o enfrentamento da pandemia e de suas consequências nas condições de vida da população.

>>> Acesse a nota técnica na íntegra.

As propostas da nota técnica preveem o estabelecimento de um piso mínimo emergencial para as áreas de saúde, educação, assistência social e segurança alimentar que interrompa a deterioração orçamentária acelerada dessas políticas desde 2015 – com base no princípio constitucional de vedação de retrocessos em direitos fundamentais, reafirmado pelo STF na decisão ARE-639337/2011 – e garanta condições para o enfrentamento do rápido crescimento do desemprego, da miséria e da fome no país, acirrado pela COVID-19.

Para Livi Gerbase, assessora política do Inesc, a iniciativa da Coalizão mostra que a sociedade civil tem propostas concretas para a garantia dos direitos e o enfrentamento à pandemia. “Nós temos números para mostrar o quanto precisamos para garantir uma recuperação econômica e social para a superação da pandemia e da crise política, social e econômica que estamos enfrentando no Brasil há anos”.

O relatório Brasil com Baixa imunidade, publicado pelo Inesc em abril, mostra como a austeridade fiscal, que asfixiou o orçamento de programas sociais importantes, deixou o país despreparado para enfrentar a pandemia do novo coronavírus. Já a Pesquisa de Orçamento Familiar do IBGE divulgada neste mês evidenciou o avanço da insegurança alimentar grave, ou fome, que passou a alcançar 10,28 milhões de pessoas, atingindo mais fortemente lares chefiados por mulheres negras, fazendo com que o Brasil apresentasse o pior patamar desde 2004. O desemprego durante a pandemia deu um salto: somente entre maio a agosto de 2020, cresceu de 10,1 milhões para 12,9 milhões de desempregados.

A proposta contida na nota técnica de piso mínimo emergencial no Projeto de Lei Orçamentária Anual – PLOA 2021, para suprir a necessidade dos direitos à saúde, educação, assistência social e segurança alimentar e nutricional para 2021, totaliza o valor de R$ 665 bilhões. O valor previsto no PLOA 2021, apresentado pelo governo federal para essas áreas, totaliza R$ 374,5 bilhões, um valor que corresponde apenas a 58% do piso mínimo emergencial para a garantia desses direitos essenciais.

O que o Piso Mínimo Emergencial viabilizará?

Com o piso mínimo emergencial dos serviços sociais, será possível interromper o processo de desfinanciamento acelerado e garantir condições melhores para que:

  • O Sistema Único de Saúde (SUS) enfrente o contexto da pandemia e do pós-pandemia, com a aquisição de medicamentos e vacinas; que considere os efeitos crônicos de saúde gerados pela Covid-19; responda à demanda reprimida por saúde de 2020, decorrente do adiamento de cirurgias eletivas e exames de maior complexidade, bem como da interrupção no tratamento de doenças crônicas.
  • A política de educação se organize para a retomada das escolas com menor número de alunos por turma (segundo a OCDE, o Brasil é um dos países com o maior numero de estudantes por turma), maior número de profissionais de educação, adequação das escolas para o cumprimento de protocolos de segurança e proteção, ampliação da cobertura de acesso à internet de banda larga para os estudantes da educação básica e ensino superior no país, retomada dos programas de assistência e permanência estudantil na educação básica e no ensino superior. Na elaboração da nota, considerou-se também o aumento da complementação da União ao Fundeb de 10% para 12% prevista da Emenda Constitucional 108, aprovada pelo Congresso Nacional em agosto, o aumento do montante destinado ao PDDE – Programa Dinheiro Direito na Escola para adequação das escolas às medidas de segurança e a migração de estudantes de escolas privadas para a educação pública, decorrente da perda de poder aquisitivo das famílias de classe média diante do aumento do desemprego e da crise econômica.
  • Retomada das condições de manutenção dos serviços e a ampliação da cobertura do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) para atender a demanda gerada pela pandemia, aumento do desemprego e de diversas violações de direitos, bem como garantir maior efetividade do programa Bolsa Família por meio de uma rede de serviços integrados. O desfinanciamento progressivo e a insegurança nos repasses federais de recursos ordinários ao SUAS comprometem o atendimento de mais 40 milhões de famílias referenciadas e os mais de 21 milhões de atendimento realizados anualmente, nos Centros de Referência da Assistência Social (CRAS) de pessoas e famílias afetadas pelo desemprego, fome, fragilidade nos vínculos familiares e iminência de violência doméstica; diminuição dos atendimentos a pessoas em situação de rua, migrantes e idosos; e a drástica redução do atendimento a crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil ou em exploração sexual nos serviços especializados.
  • Enfrentamento do crescimento acelerado da fome e da desnutrição no país por meio da retomada das condições de financiamento do Programa Aquisição de Alimentos (PAA), que fornece alimentos saudáveis por meio da agricultura familiar, beneficiando aproximadamente 185 mil famílias de agricultores familiares e milhões de famílias em situação de vulnerabilidade social que recebem esses alimentos por meio de uma rede de 24 mil organizações socioassistenciais; do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) que atende cerca de 41 milhões de estudantes no país; da ampliação do acesso à água para abastecimento humano e produção de alimentos com cisternas no semiárido brasileiro para uma população de 1,8 milhão de famílias; de recursos federais para a manutenção de 152 restaurantes populares no país, que fornecem alimentação para famílias de alta vulnerabilidade social. Atualmente, o país possui uma rede de restaurantes populares construída pelo governo federal que se encontra subutilizada em decorrência da falta de recursos municipais para a sua manutenção.

A Rejeição à PEC 188 e o fim do Teto de Gastos

Na Nota Técnica, a Coalizão Direitos Valem Mais alerta parlamentares, gestoras e gestores públicos e candidatos às eleições municipais deste ano para o grande risco ao país imposto pela PEC do Pacto Federativo. A PEC 188/2019, também relatada pelo Senador Márcio Bittar, responsável pela relatoria da Lei Orçamentária Anual 2021, representa o efetivo desmonte da capacidade do Estado brasileiro de garantir direitos, proteger a população e enfrentar nossas profundas desigualdades sociais. Caso tal PEC seja aprovada, os resultados práticos serão a implosão do pacto federativo brasileiro, com o fim da solidariedade fiscal entre os entes da federação e uma radical e acelerada precarização da oferta de serviços públicos com aumento das desigualdades regionais.

No documento, a Coalizão retoma sua defesa do fim do Teto de Gastos e a necessidade urgente de adoção de medidas fiscais de segunda geração no Brasil como realizada por muitos países; a importância de uma reforma tributária progressiva – solidária, justa e sustentável socioambientalmente –  com a tributação emergencial dos setores mais ricos para ampliação das condições de financiamento das políticas públicas e garantia da renda básica permanente, como propõe a Campanha Renda Básica que Queremos e mudanças nas lei de responsabilidade fiscal.

Sobre a Coalizão Direitos Valem Mais

Criada em 2018, a Coalizão é um esforço intersetorial que atua por uma nova economia comprometida com os direitos humanos, com a sustentabilidade socioambiental e com a superação das profundas desigualdades do país e por isso defende o fim do Teto de Gastos, aprovado em dezembro de 2016 pelo Congresso como Emenda Constitucional 95. A EC 95 é definida pela ONU como a medida econômica mais drástica contra direitos sociais do planeta. Atualmente, duas propostas de emenda revogatória da EC 95 tramitam no Congresso Nacional: a PEC 54/2019 e a PEC 36/2020.

Conheça a Coalizão: www.direitosvalemmais.org.br

 

[1] Valor para ASPS – ações e serviços públicos em saúde, excluídos os royalties do petróleo.

[2] O piso emergencial de Segurança Alimentar contempla os programas nacionais: Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), Programa de Cisternas e Programa de Restaurantes Populares, sendo que o último não aparece no PLOA 2021.

Levantamento do Inesc que comprova queda de recursos para saúde indígena ganha tradução para o Munduruku

Os gastos com saúde indígena apresentam queda desde o início do governo Bolsonaro. Dados organizados pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) mostram que o orçamento autorizado para 2020 foi 14% menor do que em 2018. Além disso, entre janeiro e julho de 2020, foi registrado um gasto ínfimo com a compra de Equipamentos de Proteção Individual e um aumento não significativo na contratação e horas-vôo nos meses em que a pandemia estava instaurada.

“Isso demonstra a lentidão do governo em tomar medidas básicas de contenção da pandemia”, aponta Leila Saraiva, assessora política do Inesc e responsável pelo levantamento dos dados.

Munduruku

Todas as informações foram traduzidas para o Munduruku. De acordo com Tatiana Oliveira, assessora política do Inesc, a tradução permite aproximação com esse povo e é uma maneira de apoiar a luta e a resistência contra o extermínio indígena comandado pelo governo Bolsonaro e reforçado pela situação da pandemia.

Espera-se que as informações circulem nas Terras Indígenas Munduruku, chegando até o Alto Tapajós, onde está a maioria dos que não falam português.

“O documento foi traduzido porque o Estado brasileiro ainda tem muita dificuldade de enxergar a sua multiculturalidade. Então, além do orçamento baixo e mal investido, houve, desde o início da pandemia, muita dificuldade para ter acesso a dados sobre a saúde indígena. Se não fossem organizações como a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), estaríamos em absoluta ignorância. São informações que os próprios indígenas precisam conhecer para se organizarem e pressionar o governo por seus direitos de povos originários”, destaca Tatiana.

Acesse o documento em português e em Munduruku nos downloads abaixo:

 

 

 

 

Webinar discute as consequências dos benefícios fiscais para produtos nocivos à saúde

Na tarde de quarta-feira (16/09), Livi Gerbase, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), participou do webinar “Benefícios fiscais para produtos nocivos à saúde: faz sentido?”.

O debate propôs uma reflexão sobre os efeitos dos incentivos fiscais para empresas de combustíveis fósseis, agrotóxicos e bebidas açucaradas (refrigerantes, energéticos e isotônicos, etc).

Livi iniciou a fala comemorando um painel totalmente feminino. “Isso mostra que muita mulher está pensando os incentivos fiscais”, disse. Na sequência, explicou que os benefícios fiscais são concedidos pelo próprio governo e são feitos a partir de decretos, as famosas “canetadas”. Esses incentivos têm muito mais opacidades do que as políticas públicas normais e podem fazer com que o governo deixe de arrecadar cifras na casa dos bilhões – valores bem maiores do que aqueles destinados às áreas de saúde e educação, por exemplo.

“Incentivos fiscais que não são transparentes e revisados podem ser chamados de privilégios, ao invés de incentivos”, comentou a assessora política, que ainda lembrou que o problema dos benefícios não acontece apenas no Brasil, mas em todo mundo. O Inesc, por exemplo, faz parte do Projeto Lateral, que reúne organizações latino-americanas  articuladas em prol da transparência dos gastos tributários e pela eliminação dos privilégios fiscais na América Latina.

Livi Gerbase, assessora política do Inesc.

A apresentação de Livi destacou os subsídios aos combustíveis fósseis, os impactos deles na saúde da população brasileira, os lucros extraordinários que os recursos de petróleo e gás acumulam e as consequências de investir grandes valores apenas no setor fóssil. Do outro lado da balança, fica o setor de energia renovável, com bem menos investimento.

Desde 2018, o Inesc monitora anualmente os valores dos subsídios aos combustíveis fósseis. A estimativa é feita partir de dados oficiais com metodologia própria do Instituto. O relatório do ano passado aponta que os combustíveis fósseis ganharam R$ 85 bilhões em subsídios em 2018 – número que representa quase três vezes o orçamento do Bolsa Família. O relatório de 2019 deve sair nas próximas semanas.

Realizado pela organização não governamental ACT – Promoção de Saúde e com apoio do Inesc e da organização de direitos humanos Terra de Direitos, o webinar ainda contou com a participação de Joana Indjaian Cruz (ACT – Promoção de Saúde) e da moderadora Grazielle David (É da sua conta).

Campanha por transparência

Em 2018, o Inesc lançou a campanha #SóAcreditoVendo, que pede transparência no processo de concessão de incentivos fiscais. Todos os anos, o Brasil perde bilhões de reais com gastos tributários que o governo federal concede para empresas, instituições ou pessoas físicas.

Em maio do ano seguinte, o Senado Federal aprovou o Projeto de lei complementar 188/2014, que obriga a Receita Federal a divulgar as empresas beneficiadas por isenções de impostos e contribuições. Agora, o projeto tramita na Câmara dos Deputados.

Confira a íntegra do webinar.

Os impactos do PLOA 2021 na política indigenista

Um rápido olhar para o Projeto de Lei Orçamentária (PLOA) 2021 parece trazer boas notícias para a política indigenista. O projeto de lei prevê R$11,49 milhões a mais para o principal órgão indigenista, a Fundação Nacional do Índio (Funai) e R$6,1 milhões a mais que a dotação atual do órgão no ano em curso. É importante, no entanto, que façamos duas observações.

Em primeiro lugar, esse pequeno acréscimo está longe de remediar os impactos de anos de estrangulamento. Os R$648,6 milhões atribuídos para a Funai em 2021 estão, por exemplo, muito distantes dos R$870 milhões atribuídos à fundação em 2013. A queda orçamentária contínua é aliada da reorientação do atual executivo para política indigenista, marcada por um retorno ao viés militarizado e assimilacionista do órgão.

Em segundo lugar, boa parte dos recursos apontados no PLOA 2021 estão sujeitos à aprovação legislativa, devido ao sufocamento orçamentário fruto da regra de ouro: dos R$648,6 milhões atribuídos para a Funai em 2021, R$ 338,6 mi estão sujeitos à aprovação do congresso. Desses, boa parte é para gastos com a já precária estrutura do órgão: são R$230,2 milhões condicionados destinados a pessoal e encargos sociais.

>>> Quer ajuda para entender os termos orçamentários? Acesse nosso manual!

É importante ressaltar esse alto índice de recursos condicionados à aprovação legislativa, mesmo que nos últimos dois anos o governo tenha sido autorizado pelo congresso a quebrar a regra de ouro. Isso porque os 52% dos recursos condicionados no PLOA 2021 para Funai contrastam com os 20% na mesma situação no PLOA 2020.  O quadro levanta ainda mais suspeitas se considerarmos que, mesmo com os valores condicionados de 2020 aprovados pelo Congresso, até agora nada deste recurso foi executado pela Funai no ano em curso.  Parece até mesmo que estamos diante de uma diretriz tácita, seguida pela chefia da Funai, de seguir reduzindo os gastos do órgão para aproximá-lo mais do orçamento não condicionado – o que basicamente impossibilitaria a atuação indigenista no ano que vem.

Por fim, é bom retomarmos a situação da Funai em 2020 para termos a dimensão real da gravidade da situação. Mesmo diante do violento impacto do novo coronavírus nos territórios indígenas, os gastos executados pelo órgão indigenistas seguem a passos lentos.  Até o início de setembro, apenas 58% da dotação atual da Funai foi efetivamente pago (R$376,9 milhões). O quadro torna-se ainda mais dramático quando analisamos as ações finalísticas do órgão. Apenas 30% dos recursos destinados para regularização, demarcação e fiscalização das terras indígenas e para proteção dos povos indígenas em isolamento voluntário (ação orçamentária 20UF) foram executados, (R$6,3 milhões). Já a ação que passou a reunir todos os demais direitos indígenas (direitos sociais, gestão ambiental e territorial, preservação cultural etc.) teve apenas 14% dos seus recursos efetivamente pagos até agora (R$6,5 milhões).  Mesmo a ação orçamentária criada a partir da atribuição de recursos extraordinários para contenção da pandemia teve apenas 50% de seu orçamento executado (R$9,2 milhões). Ou seja, até o nono mês de um ano dramático, apenas R$22 milhões foram gastos em ações finalísticas pelo órgão indigenista.

Simultaneamente, crescem as ameaças de toda sorte aos territórios: além do avanço da Covid-19, também abundam invasões, perseguição de lideranças, projetos de altos impactos para as comunidades e destruição dos biomas por elas ocupados. Como nunca deixou dúvidas o atual mandatário do governo federal, a crise da política indigenista não é crise, é projeto.

Leia também: Orçamento de 2021 mantém equilíbrio fiscal acima das necessidades da população.

Baixe o infográfico que resume os principais pontos do PLOA 2021 e a política indigenista.

De que lado a corda arrebenta? Os recursos da mineração e a desigualdade em tempos de pandemia

A segunda live do circuito de diálogos promovidos pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) sobre as estratégias comunitárias para o enfrentamento da covid-19 colocou em foco os territórios afetados pela mineração no sudeste do Pará. Mulheres de diferentes municípios compartilharam suas vivências sobre as contradições da atividade mineral, a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM) e o agravamento das desigualdades. 

“Hoje vamos mostrar como é possível fazer um debate sobre a economia que traz o cotidiano da vida para o centro das preocupações, sem deixar de debater os grandes números com os quais a ciência econômica gosta de trabalhar”, explicou Tatiana Oliveira, assessora política do Inesc na abertura.

Com o tema “De que lado a corda arrebenta? Os recursos da mineração e a desigualdade em tempos de pandemia”, o bate-papo contou com a presença de Cristiane Jardim do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (STTR); Maria Lindalva do Projeto de Desenvolvimento Sustentável Porto Seguro; Rebeca de Souza do Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM); e Larissa Alves, economista e pesquisadora da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa). Mediou o debate Rose Bezerra, educadora e socióloga da região, que também organiza do circuito de lives. Margarida Negreiros, docente da Unifesspa, fez a mediação poética. 

>>> Leia também: Mulheres amazônidas e a defesa dos territórios em tempos de Covid-19

A vivência no território de mineração

É difícil discutir qualquer tema no sudeste do Pará sem levar em conta a atividade minerária e as proporções dos territórios que ela ocupa. Canaã dos Carajás é um município de 3.470.00 km², 35% já foi destinado para lavra de mineração. E as áreas de pesquisa, direito minerário, já ultrapassam de 60% de Canaã”, denunciou Cristiane Jardim, moradora do município.

As participantes ainda denunciaram poluição sonora gerada pela estrada de ferro e o fato de que a mineração, considerada pelo governo brasileiro como atividade essencial, não parou durante a pandemia. “A Vale é uma das principais propagadora  dos vírus da covid-19”, resumiu Cristiane.

As mulheres no contexto da mineração

Para além dos impactos gerados pela mineração na população, a atividade afeta as mulheres de forma específica. Vendida, muitas vezes, como atividade geradora de empregos, o lugar destinado às mulheres nos serviços da mineração é inferior aos postos ofertados aos homens. “As poucas vagas para as mulheres não são bem propícias”, pontuou Cristiane.

Rebeca trouxe dois outros elementos sobre esta questão. Falou sobre a prostituição, impulsionada pela grande quantidade de trabalhadores que chegam aos municípios, e sobre a organização da divisão sexual do trabalho no seu entorno. “O homem da mineração chega em casa e vai dormir. A mulher chega, arruma a casa e faz comida. Esse é um debate que precisa ser mais amadurecido pelas próprias mulheres da mineração”. 

Apesar do machismo e do sexismo, há protagonismo feminino na conquista da terra e na construção de alternativas à mineração. Lindalva destaca que no Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS) é formado, em sua maioria, por mulheres, que comandam o projeto. Além disso, são elas que têm participação mais ativa nas questões relacionadas ao efeito da mineração.

“Nós somos as primeiras a visualizar os impactos na região; a verificar a falta de vagas nas escolas; a enfrentar filas nos hospitais”, explica Cristiane.

Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM)

Como os recursos minerários pertencem à União, as mineradoras são obrigadas a pagarem uma compensação para os cofres públicos, chamada CFEM. De acordo com Larissa Alves, economista da Unifesspa e pesquisadora do tema, a CFEM não é um recurso pago por impacto ambiental ou social. Ela é uma compensação pelo uso do recurso dos minérios que são propriedade da União. 

Marabá, Canaã dos Carajás e Parauapebas, municípios onde moram as participantes da live e que realizam exploração mineral recebem a CFEM. Para a live, Larissa selecionou alguns dados a fim de mostrar o quanto este montante é significativo na receita dos municípios:

Apresentação da pesquisadora Larissa Alves para a live.

As informações são do projeto De Olho do CFEM, com o qual Larissa contribui. A iniciativa surgiu diante da pouca transparência no uso do dinheiro e de um contexto em que não se percebe uma melhoria na qualidade de vida das populações afetadas. 

A análise realizada sobre os três municípios aponta aumento da pobreza e crescimento da arrecadação. “À medida que eles se tornam mais ricos economicamente, pela receita das prefeituras, PIB e saldo das importações, a população pobre se torna mais vulnerável”, resume a economista.

O exemplo do município de Canaã dos Carajás, que mais arrecada CFEM no estado do Pará, é esclarecedor:

Apresentação da pesquisadora Larissa Alves para a live.

Entre 2012 a 2016, houve a redução do número de pessoas extremamente pobres, porém, a partir em 2016, essa vulnerabilidade voltou a crescer. Hoje, 42% da população de Canaã dos Carajás estão na linha da extrema pobreza ou na pobreza.

Saídas da mineração e da Covid-19

As reflexões trazidas pelas mulheres paraenses nessas lives deixa nítido que em contextos vulneráveis, como é o caso dos territórios vizinhos da mineração no sudeste do Pará, a covid-19 agudizou problemas já existentes. “Quando chegou esse tempo de pandemia, ficou claro que a gente não conseguiu a acompanhar o desenvolvimento [da mineração]. Os imóveis aumentam os preços e as pessoas que vieram das roças não conseguem comprar uma casa boa na cidade”, relatou Cristiane

É nesse contexto que essas mulheres, junto aos seus coletivos, têm experimentado alternativas que passam pela por processos de comercialização justas e comunitárias. “Começamos com pouco e hoje temos uma feira ecológica”, conta com satisfação Lindalva. Durante a pandemia, em conjunto com a Comissão Pastoral da Terra, elas ainda criaram uma feira delivery.

A permanência no campo e o modo de vida possível a partir da terra também contribuíram para o isolamento social de parte desta população durante a quarentena. “As pessoas estando na roça, em seus lugares do trabalho, não contraíram o vírus”, conta Cristiane. 

Essas experiências “mostram os sinais que fazer enfrentamento à mineração é fortalecer a atuação no povo na terra”, comentou Rose durante a live. Rebeca ainda destacou a experiência do Quintal Cultural em Parauapebas, dirigida por mulheres e que comercializa artesanato e alimentos, entre outros produtos. “Uma super iniciativa que confronta o modelo garimpeiro. Temos que reinventar na pandemia!”. 

Os planos pessoais não são menos importantes que as experiências coletivas de produção e de geração de renda. Lindalva, que trouxe para live o sonho e a realização de um assentamento que desenvolve experiências de sustentabilidade, conta que agora é tempo de se cuidar. Cristiane, que já quis fugir da atmosfera garimpeira, hoje vê alternativas: “eu, por um tempo, tinha muita vontade de ir embora. Hoje, considero que sou filha de Parauapebas. Ela é uma cidade que eu gosto”.

Veja um resumo da live.

 

Acompanhe o circuito de lives e escute as mulheres amazônidas

Para saber mais sobre o sudeste do Pará, o contexto de mineração e as estratégias desenvolvidas pelas mulheres amazônidas para sobreviver a esse modelo econômico e à crise da Covid-19, acompanhe o circuito de lives pelo site e pelo YouTube do Inesc.

A primeira live, “Mulheres amazônidas: a defesa dos territórios em tempos de crise” teve como tema a luta e a resistência das mulheres no contexto da pandemia e a mudança nas rotinas das atividades sociais. Já o segundo encontro trouxe para o centro do debate a questão econômica, a CFEM, o impacto econômico da mineração e a desigualdade. O próximo encontro, “Territórios camponeses frente à mineração: olhares sobre a questão fundiária, acontece dia 22 de setembro, às 17h, e discute o conflito fundiário, a disputa da mineração pelas terras da população local. 

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