Atenção! Senado quer aprovar MP das parcerias público-privadas a toque de caixa

08/09/2016, às 13:05 | Tempo estimado de leitura: 12 min
Nota de entidades da sociedade civil sobre a Medida Provisória 727/2016 que criou o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI).

As organizações abaixo-assinadas vêm a público expressar sua preocupação em relação ao Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) instituído pela Medida Provisória (MPV) no. 727 de 12 de maio de 2016, cujo projeto de lei de conversão (PLC no. 23/2016) deverá ser votado pelo plenário do Senado nesta quinta-feira, 8 de setembro.

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ATUALIZAÇÃO: o Senado aprovou no final da noite de ontem (quinta-feira, 8/9) o projeto de lei de conversão (PLC) 23 criando o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), instituído por meio da MP 727.

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Esta iniciativa, que institui profundas alterações no marco legal sobre as parcerias público-privadas no país, foi apreciada pelo Congresso Nacional em ritmo acelerado, sem a devida transparência e participação da sociedade civil brasileira.

Na Comissão Mista e posteriormente no plenário da Câmara dos Deputados, requerimentos de audiências públicas foram ignorados. Destaques fundamentais para o projeto foram desconsiderados, assim como a possibilidade dos mesmos serem votados separadamente e não em bloco.

O Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) proposto na MPV 727 e agora na forma do PLC 23, se utiliza de um conceito vago, o de “prioridade nacional”, para impor uma disciplina aos projetos de infraestrutura e desestatização despida de garantias efetivas de transparência, participação popular e proteção socioambiental.  A própria criação e tramitação do PPI no Executivo e Legislativo têm comprometido o processo democrático pela falta de envolvimento significativo da sociedade a respeito de seus termos.
Experiências em nível doméstico e internacional demonstram que, apesar de as parcerias entre o setor público e empresas privadas serem apresentadas como solução para todos os gargalos do desenvolvimento, seus resultados frequentemente ficam muito aquém do esperado, tanto em termos de eficiência econômica quanto no tocante à contribuição para o desenvolvimento sustentável.  A maioria dos problemas se inicia, no mais das vezes, da falta de diálogo entre os órgãos de formulação e implementação dos projetos com os grupos e populações interessados, bem como pela ausência de mecanismos eficazes de transparência, prestação de contas e salvaguarda de direitos socioambientais.

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Concretamente, o PPI em análise pelo Congresso apresenta os seguintes problemas graves:

1.  Ausência de participação social: A MP 727 (agora PLC 23) cria o Conselho do Programa de Parcerias de Investimentos da Presidência da República, que conta apenas com representantes dos ministérios e de duas instituições financeiras públicas (Caixa Econômica Federal e BNDES). Não há assento para a sociedade civil e outras partes interessadas; sequer há previsão de que estas possam participar das reuniões que tratem de matérias que lhes afetem ou sejam de seu interesse. Não há previsão de envolvimento das comunidades que poderão ser direta ou indiretamente impactadas pelos projetos inseridos no âmbito do programa em nenhuma das fases de estudos prévios, estruturação dos projetos e execução.

2.  Falta de transparência: A norma contém brechas para que as informações sobre os empreendimentos inseridos no PPI sejam tratadas como sigilosas, dificultando-se o controle social sobre o programa. As exceções vão na contramão da Lei de Acesso à Informação (Lei N° 12.527/2011 – LAI) que trata o sigilo como exceção e a publicidade como regra. Não há obrigação de que qualquer classificação de confidencialidade seja justificada nos termos da LAI.  Além disso, falta clareza sobre os critérios a serem adotados para definir projetos considerados de ‘prioridade nacional’, e como serão garantidos os interesses públicos no planejamento e execução dos mesmos, sobretudo em termos de responsabilidade com o patrimônio público, inclusive nos casos de privatização de ativos de empresas públicas e instituições financeiras federais.

3. Modelo de financiamento: Segundo a MPV 727, o PPI será viabilizado por meio do aporte de recursos públicos de um novo fundo, denominado Fundo de Apoio à Estruturação de Projetos (FAEP).  O Fundo, de natureza privada e patrimônio próprio, orientado à estruturação de infraestrutura de projetos de privatização de ativos públicos, será criado e gerido pelo BNDES, banco que também poderá ofertar crédito subsidiado para a execução dos empreendimentos. Cabe lembrar que o BNDES tem controle acionário da Estruturadora Brasileira de Projetos, uma empresa já existente, com a missão exatamente de desenvolvimento de projetos de grande porte e alta complexidade técnica e financeira.  Portanto, por que um novo fundo com essa nova configuração?  Falta esclarecer como o BNDES terá condições de aportar crédito subsidiado na atual conjuntura de crise econômica e austeridade fiscal.  Ademais, o anuncio de vultuosos investimentos chineses em setores estratégicos da economia brasileira, que ocorreu durante a reunião do G-20 na China nos últimos dias, destaca a necessidade de debate público sobre o papel de investidores privados, nacionais e estrangeiros, no PPI, e sua influência sobre a definição e execução de projetos no âmbito do PPI, sobretudo em termos do patrimônio público e dos direitos socioambientais.

4. Brechas para a corrupção: Conforme lembrado pelo Senador Edilson Lobão em sessão da Comissão Mista criada para examinar a MPV 7271, o PPI segue essencialmente o mesmo modelo de parceria publico-privada utilizado para a construção de grandes hidrelétricas como Santo Antônio, Jirau e Belo Monte.  Entretanto, conforme demonstrado pelas investigações da Operação Lava Jato, tais empreendimentos têm se caracterizado por esquemas milionários de corrupção, facilitados pela falta de transparência de suas parcerias público-privada, onde tipicamente não se aplica instrumentos básicos como a Lei 8.666/93.2

5. Atropelo do licenciamento ambiental e violação de direitos econômicos, sociais e culturais: a Medida Provisória no. 727, em seu artigo 18o, que permaneceu inalterado como o artigo 17o  da PLC no. 23, insta os órgãos administrativos do governo federal, assim como estados e municípios, a procederem à “liberação” dos empreendimentos ‘prioritários’ e institui um dever de que todas as licenças e autorizações socioambientais sejam expedidas de maneira acelerada, criando-se assim um regime novo (e ilegal) para os procedimentos de averiguação da conformidade dos projetos com as leis de proteção aos povos indígenas e ao patrimônio histórico, artístico e cultural.  Emendas que visavam salvaguardar a proteção do meio ambiente e os direitos humanos foram rejeitadas pelo relator da matéria na Comissão Mista. A MPV 727, agora PLC 23, não garante, por exemplo, que os processos de consulta com os povos indígenas sejam realizados de acordo com parâmetros internacionais, a exemplo da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que exigem dos governos a obtenção de consentimento livre, prévio e informado seguindo-se os costumes e tradições dos próprios povos indígenas.

Pelos motivos descritos acima, referentes ao processo atropelado de tramitação e graves problemas de conteúdo, conclamamos aos senadores presentes na sessão plenária do Senado no dia 08 de setembro, a rejeitarem a MPV 727, na forma do PLC no. 23/2016 e, como alternativa, que convoquem um debate democrático, com a participação da sociedade civil, sobre o tema estratégico das parcerias publico-privadas, priorizando os objetivos de resguardar o patrimônio público e o desenvolvimento sustentável, evitando a repetição de graves erros de desperdício de dinheiro público, esquemas de corrupção e violações de direitos socioambientais.

Assinam as seguintes organizações:

1. Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB
2. Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB
3. Via Campesina
4. Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST
5. Movimento Xingu Vivo Para Sempre
6. Mutirão pela Cidadania (PA)
7. FAOR – Fórum da Amazônia Oriental
8. Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Social – FMCJS
9. Associação Floresta Protegida – Mebengôkre/Kayapó
10. Brigadas Populares – Minas Gerais
11. Campanha Nem um Poço a Mais!
12. Centro de Trabalho Indigenista – CTI
13. CIMI – Conselho Indigenista Missionário
14. Coletivo de Mulheres de Altamira
15. Comissão Pró-Índio de São Paulo
16. Conectas Direitos Humanos
17. Conselho Nacional da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica
18. Crescente Fértil
19. Derecho Ambiente y Recursos Naturales – DAR  (Peru)
20. ECOA – Ecologia e Ação
21. FASE – Espirito Santo
22. Greenpeace Brasil
23. Grupo de Pesquisa Energia Renovável Sustentável – GPERS
24. ICV – Instituto Centro de Vida
25. Ingá – Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais
26. Instituto Brasileiro de Educação Integral e Desenvolvimento Social – IBEIDS
27. IEMA – Instituto de Energia e Meio Ambiente –
28. INESC – Instituto de Estudos Socioeconômicos
29. IIEB -Instituto Internacional de Educação do Brasil –
30. Instituto Itiquira, Formosa – GO
31. Instituto MIRA-SERRA
32. International Rivers – Brasil
33. IPAN – Instituto Panamericano do Ambiente e Sustentabilidade –
34. ISA – Instituto Socioambiental
35. Movimento pelas Serras e Águas de Minas – MovSAM
36. Movimento pela Preservação da Serra do Gandarela
37. Política, Economia, Mineração, Ambiente e Sociedade – PoEMAS
38. Rede de Pesquisa sobre Barragens na Amazônia – RBA
39. Sociedade Brasileira de Economia Ecológica – Ecoeco
40. SOS Serra da Piedade
41. Xapuri  Socioambiental Ltda., Formosa-GO,
42. WWF-Brasil

Categoria: Notícia
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