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COP 30 termina com resultado abaixo do necessário, apesar de avanços históricos na participação social

A 30ª Conferência do Clima da ONU (COP 30), realizada em Belém, entre os dias 10 e 21 de novembro, terminou com decisões consideradas insuficientes diante da gravidade da crise climática. Temas centrais como a eliminação dos combustíveis fósseis e o enfrentamento ao desmatamento ficaram de fora dos resultados, enquanto o financiamento climático — elemento crucial para reparação histórica e apoio aos países em desenvolvimento — avançou pouco e segue distante do que seria um compromisso justo, público e acessível.

“As decisões tomadas não respondem com a ambição necessária ao tamanho do desafio climático. Seguiremos defendendo que o financiamento climático deve ser público, justo, acessível e livre de dívida, porque só assim será possível uma transição verdadeiramente equitativa”, destacou Cristiane Ribeiro, do colegiado de gestão do Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos).

A incapacidade de avançar em temas considerados meios de implementação — como regras, instrumentos e prazos para os acordos — mais uma vez foi marcada pela disputa entre os países ricos e os países em desenvolvimento, gerando impasses e dificultando o trabalho da diplomacia brasileira.

O Mutirão Global e os limites do consenso

Ainda nos primeiros dias, a COP30 aprovou sua agenda de trabalho em tempo recorde, mas à custa da retirada de temas sensíveis, enviados para consulta direta com a presidência da conferência. Apenas na segunda semana tornou-se claro como seriam incorporados ao debate, com a divulgação do texto do “Mutirão Global”, iniciativa brasileira para fortalecer a governança climática por meio da mobilização coletiva.

Embora avance na organização do debate global e estabeleça meta de triplicar o financiamento para adaptação até 2035, o documento final não menciona combustíveis fósseis, o que gerou críticas de movimentos e organizações.

Sociedade civil protagoniza mobilização histórica

Se nas negociações formais os avanços foram limitados, fora delas a COP30 registrou conquistas históricas. Após quatro conferências em países com restrições à participação social, Belém se tornou palco de uma mobilização global inédita.

A Cúpula dos Povos reuniu 25 mil pessoas e mais de mil organizações do mundo inteiro em cinco dias de plenárias, debates e articulações na UFPA (Universidade Federal do Pará). A presença indígena também foi marcante: cerca de 3 mil representantes formaram uma grande aldeia na cidade. A Marcha Global pelo Clima levou 70 mil pessoas às ruas sob o lema “A resposta somos nós!”.

“A sociedade civil mostrou sua força e capacidade de articulação. Os movimentos ocuparam Belém e apontaram caminhos concretos para a justiça climática”, avaliou José Moroni, do colegiado de gestão do Inesc. 

Racismo ambiental ganha centralidade histórica

Pela primeira vez na história das COPs, o tema do racismo ambiental ganhou destaque oficial. A presidência brasileira publicou uma declaração conclamando todas as nações a enfrentar as desigualdades que impactam de forma desproporcional pessoas negras, povos indígenas e comunidades tradicionais.

O termo “afrodescendente” apareceu em documentos oficiais relativos à Transição Justa, ao Plano de Ação de Gênero (GAP, na sigla em inglês) e aos Objetivos Globais de Adaptação — um marco sem precedentes. O tema também foi transversal em diversos eixos da Cúpula dos Povos.

Militarização e déficit democrático

Apesar da ampla participação social, organizações e movimentos sociais denunciaram a militarização dos espaços oficiais da ONU após manifestações indígenas, reforçando preocupações sobre o déficit democrático no processo.

Persistem problemas como critérios pouco transparentes de credenciamento e ausência de mecanismos para lidar com conflitos de interesse, especialmente diante do peso crescente de representantes do setor privado nas negociações também foram persistentes. 

Financiamento climático: sinalizações tímidas

O financiamento climático, tema central para países do Sul Global, avançou pouco. O texto não responsabiliza diretamente os maiores emissores históricos – os países do Norte Global – nem estabelece metas claras de aporte financeiro.

Entre os pontos positivos, destaca-se:

  • compromisso de escalar o financiamento para países em desenvolvimento em pelo menos US$ 1,3 trilhão;
  • convocação de uma reunião ministerial de alto nível sobre a Nova Meta Coletiva Quantificada (NCQG);
  • criação de um programa de trabalho de dois anos para alinhamento ao Artigo 9 do Acordo de Paris.

Na Meta Global de Adaptação, o convite para triplicar o financiamento até 2035 — e não mais 2030 — recebeu críticas por falta de compromissos vinculantes.

Indicadores de Adaptação de Belém

Um avanço relevante foi a aprovação dos Indicadores de Adaptação de Belém, conjunto de métricas globais para medir vulnerabilidades e progresso em resiliência climática. Entre eles, está o monitoramento do financiamento para adaptação fornecido por países desenvolvidos.

Plano de Ação de Gênero avança com conquistas inéditas

O Plano de Ação de Gênero 2026-2034 foi aprovado com vitórias importantes após forte incidência de movimentos feministas, negros e latino-americanos. O documento reconhece defensoras ambientais, o trabalho de cuidados, a violência de gênero e, pela primeira vez, mulheres e meninas afrodescendentes como centrais na ação climática.

Apesar dos avanços, o plano não estabelece metas de participação nem prevê recursos específicos para implementação, e o embate sobre o próprio conceito de “gênero” ainda divide países.

Transição justa: inclusão inédita, mas sem ambição suficiente

A criação do Mecanismo de Ação de Belém (BAM) foi celebrada por ampliar a participação de povos indígenas, mulheres, comunidades locais e grupos vulnerabilizados como atores da transição justa.

O texto reconhece a centralidade dos direitos humanos, dos trabalhadores e dos povos indígenas, além da necessidade de ampliar o acesso à energia limpa, especialmente na cocção.

No entanto, expectativas mais ambiciosas foram frustradas: desapareceram do texto final referências a um mapa de saída dos combustíveis fósseis e à eliminação de subsídios ineficientes ao setor.

Entre frustrações e conquistas

Para o Inesc, a COP30 deixa um balanço marcado por contrastes. Houve avanços históricos em temas como justiça de raça e gênero, participação social e transição justa. Mas o resultado final ficou longe da urgência necessária para enfrentar a crise climática, sobretudo na eliminação dos fósseis, no combate ao desmatamento e no financiamento climático.

“As divisões geopolíticas ficaram expostas. O mundo saiu de Belém sabendo que avançou em temas importantes, mas ainda sem a ambição necessária para garantir um futuro seguro e justo. Continuaremos lutando para que a justiça climática seja o centro das decisões internacionais”, concluiu Cristiane.

Último dia de COP 30: Brasil, mostra sua cara!

Depois da surpresa positiva com o governo brasileiro na defesa firme por um mapa do caminho de transição para longe dos combustíveis fósseis, com o esperado protagonismo da Colômbia, e com a adesão de mais de 80 países, o que temos de rascunho do texto final da COP 30, divulgado na madrugada do dia 21 de novembro, é aterrador. 

Às vésperas do fim do maior evento climático do mundo, o mapa se perdeu pelo caminho. Foi suprimida toda e qualquer menção aos combustíveis fósseis.

Contudo, mesmo às portas de um fracasso retumbante dessa COP nesse tema que, todos sabemos, é o centro nervoso da crise climática, não é fácil interpretar o que virá nas próximas horas. A COP 30 ainda não acabou.

Mas como entender o aparente desfecho frustrante do mapa do caminho? É só a mais pura expressão do poder da indústria fóssil e dos países grandes produtores de petróleo? É a morte já anunciada do multilateralismo climático? Ou, pode ser o tiro que sairá pela culatra dos combustíveis fósseis?

A conferência liderada pela Colômbia nesta manhã do dia 21 de novembro, com apoio de vinte e cinco países, pode ser o ponto de virada para a Conferência. “Esta COP não pode terminar sem um mapa claro para a eliminação gradual dos combustíveis fósseis”, disse a ministra do Meio Ambiente colombiana, Irene Velez-Torres. A mensagem é clara, o chamado é forte! 

A adesão e firme atuação do Brasil para que o mapa do caminho para longe dos combustíveis fósseis retorne ao texto é o que esperamos da liderança do governo brasileiro na COP30 na Amazônia.

Não estamos clamando por uma liderança que desconsidere a complexidade da geopolítica global da indústria fóssil, mas sim que coloque no centro do debate que uma transição justa, equitativa, ordenada para longe dos combustíveis fósseis deva ser construída com base em responsabilidades comuns, porém diferenciadas. 

Estamos clamando por uma liderança que, a despeito das complexidades e contradições domésticas, não se furta da responsabilidade e oportunidade histórica de entregar um grande legado latino-americano para as futuras gerações!

Sem participação, não há clima: a COP 30 precisa ouvir as ruas

A 30ª edição da Conferência das Partes (COP) da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima prometeu desde o começo que seria uma COP de ampla participação social. Porém, o que se observou logo nos primeiros dias é que talvez as Nações Unidas não estejam tão preparadas assim para garantir essa  participação de forma efetiva. 

A começar pela  alocação de cotas de credenciais para as organizações observadoras acessarem a Blue Zone, espaço oficial das negociações, que se mostrou um desafio de saída. Por outro lado, lobistas do petróleo conseguiram 1.602 credenciais, a maior presença proporcional deste grupo em relação ao número total de participantes já registrada (dados são da coalizão Kick Big Polluters Out). Apesar disso, os movimentos sociais, organizações, representantes de povos indígenas e de comunidades tradicionais vieram a Belém, com a esperança de fazer dessa a maior conferência de clima dos últimos anos. 

Contudo, em contraste com a prometida participação social, veio a adoção da operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) pelo governo Federal, com a militarização ostensiva do espaço da conferência e da cidade de Belém. 

Diante desse cenário, povos indígenas, povos e comunidades tradicionais, fizeram um protesto dentro da zona azul. Entraram na conferência do clima demandando que suas vozes sejam ouvidas e incluídas nos espaços de negociação. A resposta veio em forma de aumento da presença das tropas do exército na entrada da conferência, garantindo uma suposta segurança aos delegados. E uma maior restrição à entrada em espaços como a zona verde, que tecnicamente era uma zona com entrada livre. 

Ainda assim, as ruas e os diversos espaços comunitários foram tomados pelas vozes dos movimentos e dos diferentes povos que vieram a Belém. Com o objetivo de que as lutas não passassem despercebidas, e que as negociações não deixassem para trás pontos cruciais no debate pela justiça climática. 

Mobilização Global pelo Clima

Bruno Peres/Agência Brasil

A maior expressão desse momento foi a mobilização global pelo clima, que levou mais de 50 mil pessoas às ruas da capital da COP 30, demandando justiça climática, transição justa, combate ao racismo ambiental, demarcação de terras indígenas e o combate aos combustíveis fósseis. 

No início da segunda semana da COP, observou-se um aumento das forças de segurança na entrada do espaço de conferência e uma maior restrição na entrada, evidenciando a falta de “boa vontade” da ONU com processos de participação popular.

Isso ficou ainda mais explícito quando Simon Stiell, secretário executivo da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, enviou uma carta ao presidente Lula demandando que medidas fossem tomadas em relação à segurança e, pasmem, ao calor excessivo e às chuvas em Belém. 

É verdade que o calor excessivo e as chuvas torrenciais – exacerbados pelas mudanças climáticas – foram personagens ilustres da COP 30. Mas não é justamente sobre isso que trata a conferência? Estes fenômenos não escancaram a necessidade de financiamento para a adaptação climática?

É espantoso que a carta classifique como violentos os povos indígenas que fizeram protestos. Essa fala ignora as lutas e as vozes dos povos, e os anos de exclusão desses espaços, além de estigmatizar um povo que já sofre com o racismo. E coloca-os nesse imaginário popular de violência e que, portanto, devem ser reprimidos e controlados, com todo o aparato das forças de violência estatal.

Se tem debate climático, tem mobilização

A sociedade civil pretende entregar uma carta exigindo que Simon Stiell revogue sua declaração anterior, e reconheça que as manifestações são parte fundamental de qualquer processo democrático. As mobilizações são inerentes ao debate climático, sobretudo, porque afeta de forma desigual povos e comunidades tradicionais, mulheres e comunidades periféricas. 

Além disso, Relatores Especiais da ONU emitiram uma declaração criticando a UNFCCC e a Presidência brasileira pelo aumento da segurança armada na COP 30 após os protestos pacíficos da primeira semana, alertando para o fato de que o ambiente de intimidação compromete princípios básicos de participação democrática. 

Se um país democrático foi escolhido para sediar uma conferência, é natural e legítimo que protestos e mobilizações sociais ocorram, principalmente no Brasil, onde a sociedade tradicionalmente vai às ruas quando não está de acordo com uma situação. Olhar para essas manifestações com medo de seu resultado revela que o processo que estamos inseridos nas negociações não têm sido suficientemente participativo ou democrático, e, portanto, não tem sido capaz de  ouvir as demandas daqueles que historicamente protegem mais a natureza e tem alternativas de soluções para a crise climática. 

É urgente transformar as conferências de clima em espaços participativos, com a presença de cada vez mais povos indígenas e povos e comunidades tradicionais que têm o real lugar de fala, e detém o conhecimento das alternativas às questões climáticas. E que as vozes da rua não sejam impedidas de falar. 

 

Unidade global e força popular marcam Cúpula dos Povos

A Cúpula dos Povos, que mobilizou a sociedade civil, movimentos sociais e povos tradicionais entre 12 e 16 de novembro, em Belém, encerrou suas atividades com um saldo inédito de organização e conquistas políticas. Em um contraponto direto ao caráter negocial da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 30), o encontro popular celebrou a unidade global, reunindo cerca de 25 mil pessoas de mais de 65 países, reforçando que a resposta à crise climática brota dos territórios e não dos mercados.

O Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) participou ativamente dos cinco dias de debates, atuando nos seis eixos temáticos propostos pela Cúpula e fortalecendo alianças. 

As vozes que sentem os impactos exigem protagonismo

Foto: Tânia Rêgo / Agência Brasil

As reflexões e propostas levantadas na Cúpula dos Povos destacaram que enfrentar a crise climática é, antes de tudo, defender a democracia e combater as desigualdades históricas.

José Moroni, do colegiado de gestão do Inesc, sublinhou a potência do encontro:

“Foram dias intensos, potentes e cheios de beleza, reunindo organizações, movimentos e povos diretamente impactados por um modelo de desenvolvimento que devasta territórios e vidas. Acreditamos que as soluções reais para a crise climática nascem desses espaços — onde quem mais sente os impactos tem voz, protagonismo e poder de decisão. Sem povo, não há justiça climática, e sem participação popular, não há democracia verdadeira.”

O Inesc e parceiros estiveram presentes e atuantes em diversas atividades, articulando e defendendo agendas cruciais.

Financiamento climático: público, justo e acessível

O debate sobre financiamento climático foi central. Segundo Carolina Alves, assessora política do Inesc, a democratização do financiamento é imperativa. O Inesc denunciou que a maior parte dos recursos globais ainda é dominada por fluxos privados, empréstimos e mecanismos de endividamento que reproduzem a dependência do Sul Global.

“O Inesc defende que o financiamento climático deve ser público, justo e acessível. Isso significa garantir que o dinheiro venha de fontes públicas, não de novos endividamentos; que seja destinado prioritariamente às populações vulneráveis e aos territórios impactados; e que os processos de decisão envolvam participação popular e mecanismos de controle democrático,” defendeu.

Gênero, raça e adaptação climática nos territórios

Em plenárias e oficinas, como a que debateu Gênero e Adaptação Climática, o Inesc reforçou que a adaptação é essencialmente local e deve enfrentar desigualdades de gênero, classe e raça. Carmela Zigoni, assessora política da organização, destacou a importância do conhecimento local:

“Os saberes locais são valiosos e podem trazer soluções verdadeiras para os territórios. Se eles tiverem o devido  apoio governamental, podem ser ajustados a outras realidades locais, replicadas e ganhar escala. Os saberes das mulheres são especialmente importantes para a adaptação climática e o seu papel protagonista tem sido cada vez mais reconhecido.”

Sheilla Dourado, também assessora política do Inesc, defendeu que “a adaptação climática é essencialmente local”, e as desigualdades de gênero, classe e raça precisam ser enfrentadas, com participação ativa de grupos vulneráveis. Ela alerta para o descompasso entre os recursos para adaptação e os destinados à mitigação — muitos chegando a municípios sob a forma de empréstimos, o que limita a ação local.

Transição energética e a luta contra os combustíveis fósseis

O Inesc também levou para o centro dos debates a transição energética justa, destacando a necessidade urgente de abandonar os combustíveis fósseis. Cássio Cardoso Carvalho, assessor político do Instituto, alertou sobre a contradição brasileira: “mesmo com o colapso climático dando sinais severos, o Brasil ainda adota uma política de subsídios que privilegia o petróleo, carvão mineral e o gás natural em detrimento das fontes renováveis.” Ele citou que, em 2024, para cada R$ 1 investido em renováveis, R$ 2,52 foram destinados a fósseis.

Rárison Sampaio complementou, “a transição energética não se resume à descarbonização da matriz. Ela exige enfrentar e erradicar a pobreza energética, garantir direitos humanos nos territórios impactados e assegurar a soberania energética do país.”

Além das atividades autogestionadas e das plenárias gerais, o Inesc também participou da Barqueata, que abriu as atividades da Cúpula, reunindo mais de 200 embarcações transportando cerca de 5 mil pessoas de 62 países. Outro momento marcante da Cúpula dos povos foi a Marcha Global por Justiça Climática. O ato reuniu cerca de 50 mil pessoas que ocuparam as ruas de Belém. 

Carta final: um chamado à ação e solidariedade

O encerramento foi marcado pela entrega ao presidente da COP 30 da Carta Final, um documento contundente elaborado por mais de mil organizações. O texto rejeita veementemente as “falsas soluções de mercado”, como mecanismos de compensação e a financeirização da natureza.

O documento convoca para uma organização global dos povos para enfrentar as estruturas que alimentam as desigualdades e o colapso ambiental, reafirmando que a crise climática é resultado direto do modo de produção capitalista. A principal tarefa política, segundo o documento, é enraizar o internacionalismo em cada território.

Cristiane Ribeiro, do Colegiado de Gestão do Inesc, resumiu os dias de luta:

“Não há justiça climática sem o enfrentamento ao racismo ambiental e às desigualdades raciais, de gênero, de classe e territoriais. É imperativo que o financiamento climático seja público, justo e acessível e com ações que promovam a reparação histórica de injustiças. A COP 30 é uma oportunidade para incorporar a dimensão étnico-racial e reafirmar a dimensão de gênero nas decisões oficiais.”

A Cúpula dos Povos se consolidou como a resposta política à forma como as COPs têm sido conduzidas, priorizando o mercado. O Inesc segue empenhado em lutar por um futuro construído de baixo para cima, onde a participação popular é a chave para a verdadeira justiça climática. 

Para saber mais sobre a Cúpula dos Povos, clique aqui e acesse o site

Jovens das periferias expõem a face da desigualdade no DF em audiência pública

O DF tem uma das maiores desigualdades regionais e raciais dentro do próprio território. O Lago Sul é o bairro com maior renda média do DF e do Brasil e o Itapoã, cidade vizinha, é a região com menor renda média. A primeira tem a maioria da população autodeclarada branca e a segunda negra. Em termos de acesso, a população do Itapoã não tem serviços públicos básicos como creches e hospitais. O transporte é precário e há muitas localidades sem saneamento básico. 

Esses dados e análises, foram coletados durante o projeto Mapa das Desigualdades, trabalho realizado pelo Inesc, apoiado pelo Fundo de Combate a Corrupção, Termo de Fomento No 01/2024, Processo: 00480-00005913/2023-43  junto às juventudes periféricas do DF.  Esses adolescentes e  jovens são sujeitos centrais no enfrentamento e na mobilização pelo combate às desigualdades, por serem grupos fortemente afetados pela falta de direitos, quanto pela energia em prol do ativismo político. 

>>> Confira aqui um resumo informativo com a prévia dos dados

Audiência Pública na CLDF

O ponto alto do projeto de 2025, que reúne jovens de diversas periferias de Brasília para analisar o orçamento e as desigualdades do DF, é a apropriação dos saberes sobre o funcionamento da máquina pública e o incentivo para a luta popular. E uma audiência pública será a oportunidade para apresentarem suas reivindicações.

A audiência acontecerá na terça-feira, dia 18 de novembro, das 18h30 às 21h30, na Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) e compõe a programação da Semana Distrital do Hip Hop. Já a publicação Mapa das Desigualdades, com a sistematização dos dados mais atuais da PDAD (2024), que escancara a manutenção dessas desigualdades, será disponibilizada em 10 de dezembro, data em que celebramos o Dia Internacional dos Direitos Humanos.  

“Escolhemos essa data, pois não há como vivenciar integralmente os direitos humanos, sem a garantia orçamentária para políticas públicas e enfrentamento às  desigualdades”, explica Markão Aborígine, educador social do Inesc. 

O evento também contará com a participação de meninas do projeto Malalas do Cerrado, estudantes do CED 1 do Riacho Fundo 2, jovens ativistas por uma educação antirracista e antisexista.

A audiência será conduzida pelos deputados Max Maciel e Fábio Félix e contará com o protagonismo dos adolescentes e jovens formados pelo projeto, que apresentarão dados, gráficos, poesias e músicas, que traduzem essa reflexão, além de apresentarem propostas e recomendações ao poder público, exigindo, além de propostas concretas para superação das desigualdades, maior transparência.

Programação

18h15: Coquetel e sarau

19h15: Abertura com Deputado Max Maciel

19h25: Apresentação musical com Pajé, Camila MC e Nerd do Gueto

19h30: Deputado Fábio Félix

19h35: Cleo Manhas, assessora política do  Inesc

19h40: Exibição do vídeo Mapa das Desigualdades 2025 e apresentação do projeto e dados com Sara Lisboa (Ceilândia) e Victor Queiróz (Paranoá Parque)

20h00: Inscrições público 

20h10: Convidados poder público

20h25: Inscrições público

20h45: Respostas da Mesa

21h00: Apresentação musical com Medusa, Maju, Micaele Melo e Nayane Cruz

21h05: Considerações finais da mesa 

21h15: Encerramento com poesia de jovens do projeto.

COP 30: “Sem financiamento, não há implementação”, afirma Inesc

Começou nesta segunda-feira (10/11), em Belém (PA),  a COP 30 – um marco na história das Conferências de Clima que,  pela primeira vez, terá a Amazônia como palco. Conhecida como a “COP da Implementação”, o encontro gera expectativas em torno das negociações globais sobre o futuro da humanidade. Contudo, o Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômico) alerta que esta precisa ser também a “COP do Financiamento”, ainda que o tema não tenha entrado na agenda de negociações formais, apenas nas consultas informais. 

“Sem financiamento não é possível implementar as ações e planos climáticos. O financiamento é crucial para garantir que os países possam se adaptar aos efeitos das mudanças climáticas e compensar as perdas e danos àquelas pessoas ou grupos de pessoas afetados pelo clima”, afirma Carolina Alves, assessora política do Inesc. 

O Inesc participa com uma delegação de nove pessoas, que levarão aos espaços de debate uma agenda centrada na justiça climática. As principais pautas são: financiamento climático, adaptação climática e gênero, racismo ambiental, transição justa e democracia.

Financiamento: o coração da implementação climática

O Inesc defende que os países desenvolvidos, principais responsáveis pelas emissões históricas de gases de efeito estufa, cumpram as obrigações do Acordo de Paris e financiem as ações climáticas nos países em desenvolvimento — com recursos públicos, não reembolsáveis e acessíveis.

Além disso, para o Instituto, é urgente transferir investimentos de atividades poluentes, como os incentivos aos combustíveis fósseis, para modelos produtivos sustentáveis e inclusivos, que respeitem os direitos de povos indígenas e comunidades tradicionais.

Outro ponto de atenção é o Fundo de Florestas Tropicais para Sempre (TFFF), lançado pelo governo brasileiro durante a Cúpula de Líderes da COP 30. Embora celebrado por alguns governos e setores privados, o fundo não foi negociado entre as partes da UNFCCC (Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima), o que levanta dúvidas sobre sua legitimidade.

“O TFFF pode reforçar a financeirização da natureza, com baixa participação social e recursos insuficientes para povos indígenas e comunidades tradicionais”, alerta Carolina.

Parte da equipe do Inesc em Belém, na COP 30. Foto: Carolina da Mata

Adaptação climática: prioridade e sobrevivência

A adaptação se tornou uma questão de sobrevivência humana. “Diferente de outras COPs, que a mitigação tinha mais peso, nesta, nós estamos vendo que a adaptação climática assume maior protagonismo”, observa Sheilla Dourado, assessora política do Inesc.

A expectativa é que a COP 30 avance  nas negociações da Meta Global de Adaptação (GGA), com seus indicadores, e dos Planos Nacionais de Adaptação (NAPs). Nesta etapa, o Brasil apresentará o Plano Clima Adaptação, que envolve, também, ações de mitigação..

“A adaptação precisa de mais financiamento para ser executada nos países, principalmente os que já sofrem com situações de vulnerabilidade, passados coloniais e déficit histórico no desenvolvimento, agravado pelas mudanças climáticas”, defende Sheilla. 

A Conferência ainda deve aprovar o novo Plano de Ação de Gênero da UNFCCC, um avanço importante para consolidar a participação das mulheres na agenda climática global.

“Os saberes das mulheres são especialmente importantes para a adaptação climática e o seu papel protagonista tem sido cada vez mais reconhecido pelas políticas climáticas, por mobilização das próprias organizações feministas e de mulheres”, afirma Carmela Zigoni, assessora política do Inesc.. 

Racismo ambiental, transição justa e democracia

A crise climática não é neutra. Seus efeitos se sobrepõem a desigualdades históricas e estruturais, atingindo com mais força povos indígenas, comunidades tradicionais e populações negras e periféricas.

Por isso, o Inesc levará à COP 30 o debate sobre racismo ambiental e democracia, reforçando que não há justiça climática sem justiça e participação social.

“É imperativo, em nível global e doméstico, que o financiamento climático seja público, justo e acessível e com ações de adaptação e de mitigação que promovam a reparação histórica de injustiças e desigualdades entre Norte e Sul global, bem como, reconhecer e enfrentar o racismo ambiental”, sublinha Cristiane Ribeiro, do colegiado de gestão do Inesc. 

Para ela, a COP 30 é uma oportunidade histórica para incorporar a dimensão étnico-racial, assim como reafirmar a dimensão de gênero nas decisões e documentos oficiais da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. 

Outra pauta central é a transição energética justa — que deve enfrentar os subsídios aos combustíveis fósseis e garantir mais recursos para as energias renováveis, sem promover ainda mais desigualdades. 

“O Inesc chega a mais uma COP reforçando a necessidade, cada vez mais urgente, de promover um debate plural e participativo sobre a transição energética, tanto no âmbito global quanto no doméstico”, salienta a assessora política do Inesc Alessandra Cardoso. 

Para saber mais sobre o Inesc na COP 30, clique aqui.  

Reforma da Renda é um avanço, mas a justiça tributária ainda está distante

Ontem (05/11), o Senado Federal aprovou a reforma da Renda, consolidando o texto do Projeto de Lei nº 1087/2025, que agora segue para a sanção presidencial. A proposta recebeu apenas alterações redacionais, o que dispensa nova votação na Câmara dos Deputados. Trata-se de uma vitória da mobilização popular em defesa de um sistema tributário mais justo e progressivo.

O Plebiscito Popular, do qual o Inesc integra a executiva nacional, teve papel decisivo nessa conquista. Em 103 dias de mobilização, o plebiscito coletou mais de 2,1 milhões de votos em todo o país, expressando o amplo apoio popular à tributação dos super-ricos e à construção de um sistema que reduza desigualdades.
Durante o processo, representantes da articulação se reuniram com os presidentes da Câmara e do Senado, com o presidente Lula, com relatores do projeto e outras lideranças políticas, incidindo de forma determinante para o avanço da proposta no Congresso Nacional.

A mobilização popular foi impulsionada por evidências contundentes das distorções do sistema tributário brasileiro. Segundo dados do Ministério da Fazenda (2025), os 0,01% mais ricos do Brasil — pessoas com rendimentos mensais superiores a R$ 5,3 milhões — pagam, em média, apenas 5,67% de Imposto de Renda efetivo sobre sua renda total . Nesse contexto, a criação de uma alíquota mínima de 10% sobre altas rendas representa uma medida relevante em um país onde os mais ricos contribuem proporcionalmente muito menos do que a maioria da população.

Essa conquista é importante não apenas pelo seu conteúdo, mas também pelo processo de mobilização social e de sensibilização popular sobre a urgência da justiça tributária. Ainda assim, há muito a avançar. A tabela progressiva do Imposto de Renda segue desatualizada e depende da vontade política dos governos para ser corrigida. O imposto mínimo sobre os super-ricos é, como o próprio nome indica, um ponto de partida — ainda muito aquém do que seria justo e necessário.

Os mais ricos continuam amplamente beneficiados por isenções e brechas fiscais, como a isenção sobre lucros e dividendos, o tratamento privilegiado de rendimentos do agronegócio e a subtributação de grandes patrimônios. Enquanto isso, a maior parte da população segue arcando com o peso dos impostos sobre o consumo, que são regressivos e penalizam especialmente as famílias de baixa renda.

A luta por justiça tributária precisa continuar. É essencial:

  • Garantir progressividade real, com quem ganha mais contribuindo proporcionalmente mais;
  • Tributar mais a renda e o patrimônio, e menos o consumo;
  • Atualizar periodicamente a tabela do IR;
  • Rever benefícios tributários ineficientes, que concentram renda e favorecem setores altamente lucrativos, inclusive aqueles que geram impactos negativos à saúde pública e à natureza;
  • Incorporar perspectivas de gênero e raça nas políticas tributárias, como parte de uma agenda de reparação histórica.

A Reforma da Renda é um passo importante, fruto da pressão social e de um debate público cada vez mais qualificado e diverso sobre o sistema tributário brasileiro. Ainda assim, a construção de um país mais justo e solidário depende de um sistema em que cada pessoa contribua de forma proporcional à sua capacidade econômica, assegurando que a tributação seja instrumento de redução, e não de reprodução, das desigualdades.

Subsídios aos combustíveis fósseis caem, mas ainda são quase o triplo do destinado às fontes renováveis, aponta Inesc

No ano de 2024, os benefícios fiscais concedidos pelo Governo Federal à indústria de combustíveis fósseis e ao segmento de energia renovável somaram R$ 65,72 bilhões, dos quais R$ 47,06 bilhões (71,6%) foram para petróleo, gás e carvão, enquanto R$ 18,65 bilhões (28,4%) beneficiaram fontes renováveis. Embora esse total tenha diminuído em relação a 2023, quando chegou a R$ 99,83 bilhões, o Brasil ainda mantém uma disparidade na distribuição dos subsídios ao setor de energia: para cada R$ 2,52 destinados às fontes fósseis, apenas R$ 1 é gasto com renováveis.

Os dados fazem parte da 8ª edição do estudo Subsídios às Fontes Fósseis e Renováveis (2023-2024), do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), que acompanha há quase uma década o impacto nos cofres públicos de benefícios como o Repetro, considerado o maior regime especial de tributação do país, que atingiu R$ 13,6 bilhões em 2024. O Repetro foi criado em 1988 para desonerar importações e exportações de bens da indústria de petróleo e gás, quando a Petrobras ainda detinha o monopólio da exploração de petróleo e o pré-sal não havia sido descoberto. Mesmo assim, foi prorrogado até 2040, garantindo vantagens fiscais às petrolíferas, incluindo as estrangeiras.

Alessandra Cardoso, assessora política do Inesc, lembra que a Lei Complementar nº 214/2025 (Reforma Tributária sobre o consumo), aprovada neste ano, trouxe avanços nessa direção, com a criação do Imposto Seletivo e a obrigatoriedade de avaliação a cada 5 anos de todos os regimes especiais de tributação, quanto à eficiência, eficácia e impacto climático e socioambiental. “Essas medidas representam um avanço institucional essencial para corrigir distorções e alinhar a política fiscal à transição energética”, afirma. “A queda dos subsídios aos fósseis acompanhada dessas medidas sinaliza que o Brasil está dando passos na direção da reforma dos subsídios aos fósseis. Tais avanços deveriam encorajar o governo a assumir uma postura mais assertiva na COP 30, pautando iniciativas também no campo do multilateralismo climático”, completou.

Baixo impacto na inflação

Os subsídios ao consumo de combustíveis foram cortados em 84%, passando de R$ 39,8 bilhões para menos de R$ 7 bilhões entre 2023 e 2024. Isso ocorreu devido à volta da cobrança de PIS e Cofins sobre gasolina, diesel e gás de cozinha — o que gerou economia de R$ 33 bilhões aos cofres públicos. Apesar da redução dos incentivos ao setor, os preços não dispararam: a gasolina subiu apenas 10,21%, o diesel 3,41% e o etanol 20,46%, mantendo-se competitivo com um crescimento de 33,4% no consumo.

Pelos dados do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), é possível que o aumento nos preços só não tenha sido menor porque as distribuidoras de combustíveis não repassam integralmente a redução dos preços praticada pelas refinarias. Em outras palavras, o desconto não chega totalmente aos consumidores, pois desde a privatização do setor durante o governo Bolsonaro, essas empresas podem ter priorizado aumentar suas margens de lucro.

Fontes renováveis de energia

A chamada geração distribuída (modelo em que consumidores produzem sua própria energia, principalmente solar, por meio de painéis em residências, comércios ou pequenas usinas) vem crescendo no Brasil, impulsionada por subsídios que saltaram de R$ 7,14 bilhões em 2023 para R$ 11,58 bilhões em 2024.

Para o Inesc, embora essa produção independente seja positiva, ela é custeada por todos os consumidores, já que parte dos custos da rede é paga por quem não possui sistemas fotovoltaicos. Como agravante, o Operador Nacional do Sistema (ONS) não tem controle direto sobre a geração distribuída, o que pode causar desequilíbrios em momentos de sobreoferta e obrigar o desligamento temporário de usinas contratadas — processo conhecido como curtailment.

As compensações pagas às grandes geradoras (como as termoelétricas, por exemplo) acabam onerando novamente o consumidor final. “Isso demonstra o quanto os subsídios são capazes de interferir no planejamento do setor elétrico”, explica Cássio Carvalho, assessor político do Inesc.

Com tarifas residenciais crescendo acima da inflação, o relatório alerta para a importância de todas as políticas de incentivo considerarem a justiça socioambiental e a proteção de famílias de baixa renda de custos indevidos. O Inesc reforça a urgência para a revisão de benefícios às fontes de energia fóssil ou renovável para eliminar os chamados “subsídios ineficientes” — que distorcem o mercado, estimulam o consumo e dificultam o combate às mudanças climáticas.

“Os subsídios aos combustíveis fósseis não podem ser vistos como algo imutável. É possível rever desonerações e redirecionar recursos públicos de modo planejado e equilibrado, fortalecendo as finanças do Estado e impulsionando uma transição energética justa”, conclui o pesquisador.

O relatório completo pode ser acessado no link: inesc.org.br/subsidios-fontes-energeticas-2024

Mulheres negras de baixa renda pagam até oito vezes mais pela energia do que homens brancos de renda alta

Um levantamento inédito do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) expõe a face mais desigual do sistema tarifário brasileiro: o peso desproporcional das bandeiras tarifárias de energia elétrica sobre famílias negras e de baixa renda, especialmente as chefiadas por mulheres. A pesquisa “Energia e interseccionalidade:o impacto das tarifas de energia elétrica no orçamento das famílias brasileiras” mostra que, em cenários de maior encarecimento da conta de luz, esses domicílios podem gastar o dobro — em termos proporcionais à renda — do que famílias brancas de maior poder aquisitivo.

O dado mais emblemático é a comparação entre uma mulher negra de renda média e um homem branco de renda alta. Enquanto a primeira tem seu gasto mensal com energia acrescido em 9,41% sob bandeira vermelha patamar II, chegando a representar 13,09% de sua renda mensal, o segundo sofre aumento de apenas 6,24%, o que equivale a 7,03% da renda. A desigualdade é tão profunda que, embora a conta do homem branco seja maior em termos absolutos, ela pesa muito menos no orçamento.

“O estudo comprova que as bandeiras tarifárias penalizam quem já vive no limite. Mulheres negras, sobretudo de baixa e média renda, têm menor elasticidade de consumo: não conseguem reduzir o uso de energia porque já consomem apenas o essencial. Isso é o que chamamos de injustiça energética”, afirma Cristiane Ribeiro, do Colegiado de Gestão do Inesc.

 

Dados revelam desigualdade

A análise do Inesc cruzou dados de renda, gênero e raça a partir da Pesquisa de Orçamentos Familiares, do IBGE e revelou distorções históricas. Famílias chefiadas por homens brancos de renda alta consomem, em média, 262,72 kWh/mês, 2,5 vezes mais que famílias chefiadas por homens negros de baixa renda (102,84 kWh/mês). Por sua vez, famílias chefiadas por mulheres negras de baixa renda exibem o menor rendimento per capita (R$ 309,08) e comprometem, em média, 11,57% da renda total com energia elétrica; já os homens brancos de alta renda, com renda per capita de R$ 6.772, destinam apenas 1,46% da renda à conta de luz.

Em números absolutos, o contraste também impressiona: famílias de mulheres negras de renda média arcaram juntas, em 2024, com R$ 230,8 milhões em custos adicionais provocados pelas bandeiras tarifárias. Entre os homens brancos de renda alta, esse gasto agregado foi menos da metade: R$ 106,7 milhões.

O estudo estimou que, mesmo diante do aumento na tarifa de eletricidade, famílias de renda média chefiadas por mulheres negras praticamente não conseguem reduzir o consumo, pois já operam no limite do uso essencial. Em contraste, homens brancos de renda alta dispõem de maior margem para ajustar o consumo sem comprometer o bem-estar. “O modelo atual de bandeiras tarifárias parte do pressuposto de que todos os consumidores podem economizar quando a conta aumenta. Mas essa hipótese ignora a realidade de milhões de famílias que já vivem no mínimo vital. Para elas, reduzir o consumo significa abrir mão de comida refrigerada, de banho quente ou de ventilador em dias de calor extremo”, explica Cássio Cardoso Carvalho, assessor político do Inesc.

Assimetria no setor elétrico

A pesquisa também evidencia uma assimetria estrutural no setor elétrico brasileiro: as bandeiras tarifárias incidem apenas sobre os consumidores do Ambiente de Contratação Regulado (ACR), enquanto os do Ambiente de Contratação Livre (ACL) permanecem isentos dessa cobrança. “É um modelo perverso, que vem se agravando em um contexto de migração crescente do mercado regulado para o livre. As bandeiras tarifárias têm sido aplicadas com maior frequência — resultado do próprio planejamento do sistema e da recorrente escassez hídrica —, e o custo acaba sendo repartido entre um grupo cada vez menor de consumidores, enquanto os do ACL seguem isentos’, critica Carvalho.

As comparações revelam desigualdades persistentes: uma mulher negra de renda média, com renda per capita de R$ 1.240 e consumo médio de 140 kWh/mês, pode ver o gasto com energia atingir 13% da renda sob bandeira vermelha patamar II; um homem branco de renda alta, com renda per capita de R$ 6.772 e consumo de 262 kWh/mês, dificilmente ultrapassa 7%. Entre as famílias de baixa renda, uma mulher negra consome, em média, 106,81 kWh/mês e compromete 16% dos gastos com habitação e 11,57% da renda total com energia; um homem branco de baixa renda consome 123,86 kWh/mês e compromete 15,03% da habitação e 9,96% da renda.

O peso das bandeiras

O estudo relembra que o mecanismo das bandeiras tarifárias — criado em 2015 — transfere aos consumidores regulados os custos da geração e do acionamento de termelétricas movidas a combustíveis fósseis, o que se intensifica em períodos de seca e calor extremos. As tarifas adicionais correspondem a R$ 0,01885/kWh na bandeira amarela, R$ 0,04463/kWh na vermelha patamar I e R$ 0,07877/kWh na vermelha patamar II. Em 2024, o arranjo mensal combinou oito meses de bandeira verde, dois de amarela e um mês em cada patamar de vermelha, resultando em forte assimetria de impacto entre os diferentes grupos sociais.

As simulações do Inesc indicam que, quando a bandeira passa de verde para amarela, o aumento percentual no gasto mensal é maior para mulheres negras de renda alta (2,36%) do que para homens brancos da mesma faixa (1,59%); e, no cenário mais severo — vermelha patamar II —, o gasto mensal cresce 9,74% para mulheres negras de renda alta, contra 6,24% entre homens brancos de renda alta. Considerando a renda, os acréscimos relativos também penalizam mais mulheres negras e homens negros de renda média do que os brancos de renda alta, em todos os cenários.

Do ponto de vista de política pública, o Inesc sustenta que a justiça energética precisa orientar a transição. Em síntese, defende a extensão das bandeiras tarifárias ao mercado livre para garantir isonomia; Maior transparência na cobrança das Bandeiras Tarifárias, de modo a possibilitar a análise do perfil dos consumidores — com dados desagregados por gênero, raça e renda — que estão suportando os custos da resiliência do sistema elétrico brasileiro diante das mudanças climáticas e o enquadramento automático e imediato na Tarifa Social de Energia Elétrica para famílias inseridas no CadÚnico.

O objetivo é baratear a tarifa ao longo do tempo e, sobretudo, interromper a transferência regressiva de renda do ACR para grupos privilegiados do ACL, que hoje não participam do rateio das bandeiras mesmo concentrando parcela expressiva do consumo nacional. “O combate à pobreza energética deve ser parte da agenda climática. Não é possível pensar em transição energética justa quando mulheres negras seguem pagando proporcionalmente mais caro pela luz do que homens brancos ricos. É racismo ambiental traduzido em números”, conclui Ribeiro.

Audiência Pública debate desigualdades no impacto das bandeiras tarifárias de energia elétrica

A Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados realizou no dia 21 de outubro, uma Audiência Pública para discutir os impactos das bandeiras tarifárias de energia elétrica na renda das famílias chefiadas por mulheres e pessoas negras. O debate, presidido pelo deputado Pedro Uczai (PT/SC), reuniu representantes do governo federal, de agências reguladoras e da sociedade civil, com o objetivo de subsidiar políticas públicas voltadas à justiça energética e à igualdade social.

Assista:

Audiência Pública debate impacto das bandeiras tarifárias de energia elétrica na renda de mulheres e pessoas negras

O Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) participa, no dia 21 de outubro de 2025, da Audiência Pública sobre o impacto das bandeiras tarifárias de energia elétrica na renda das famílias chefiadas por mulheres e pessoas negras, a ser realizada na Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados, em Brasília. O encontro ocorrerá das 10h às 11h40, no Anexo II, Plenário 03, sob a presidência do Deputado Pedro Uczai (PT/SC).

Na ocasião, o Inesc lançará um estudo inédito que analisa como o atual sistema de bandeiras tarifárias incide de forma desproporcional sobre famílias em situação de vulnerabilidade, especialmente aquelas lideradas por mulheres negras, aprofundando desigualdades de gênero, raça e renda.

O debate reunirá representantes do governo federal, de agências reguladoras e da sociedade civil, entre eles: Anielle Franco (Ministra da Igualdade Racial) – a confirmar, Ísis Dantas Menezes Zornoff Taboas (Ministério das Mulheres), Carla da Costa Lopes Achão (EPE), Paulo Luciano de Carvalho (Aneel), André Luiz Dias de Oliveira (MME), Mónica Benegas (Instituto Pólis) e Michelle Ferret (Instituto Alziras). O assessor político Cássio Cardoso Carvalho, do Inesc, apresentará os principais resultados do estudo “Energia e interseccionalidade: impacto das tarifas de energia elétrica no orçamento das famílias brasileiras”.

A audiência tem como objetivo debater os impactos sociais, econômicos e raciais do sistema de bandeiras tarifárias e subsidiar políticas públicas que promovam justiça energética e igualdade social.

Confira a programação

  1. Abertura institucional e boas-vindas (15 minutos)
  • Deputado Pedro Uczai (PT/SC), Presidente da Mesa (fará a mediação do debate) – saudação inicial, contextualização da pauta, relevância do tema no contexto da transição energética justa e da redução das desigualdades – (Confirmado)
  • Cássio Cardoso Carvalho, Assessor Político do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc): Exposição do estudo “Energia e interseccionalidade: impacto das tarifas de energia elétrica no orçamento das famílias brasileiras”, destacando dados sobre pobreza energética, desigualdades raciais e de gênero, e os efeitos das bandeiras tarifárias – (Confirmado)
  1. Mesa de diálogo (40 minutos)

Cada participante dispõe de 5 a 7 minutos. Convidados(as):

  • Anielle Franco, Ministra de Estado da Igualdade Racial – (a confirmar)
  • Mónica Benegas, Representante do Instituto Pólis – (Confirmada)
  • Carla Achão, Superintendente de Estudos Econômicos e Energéticos da Empresa de PE – (Confirmada)
  • Ísis Dantas Menezes Zornoff Taboas, Assessora Especial do Ministério das Mulheres – (Confirmada)
  • Michelle Ferret, Codiretora e Cofundadora do Instituto Alziras – (Confirmada – online)
  • Paulo Luciano de Carvalho, Superintendente de Inovação e Transição Energética da Aneel – (a confirmar)
  • André Luiz Dias de Oliveira, Diretor do Departamento de Universalização e Políticas Sociais de Energia Elétrica do MME – (a confirmar)
  1. Debate aberto com o público (35 minutos)

Objetivo: permitir que participantes da sociedade civil, assessorias parlamentares e movimentos presentes tragam perguntas, reflexões ou experiências práticas sobre o tema em discussão (intervenções de até 2 minutos)

  1. Ceres Hadich – Coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) –  (Confirmada)
  2. Elisa Mergulhão – Coordenação nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) –  (Confirmada)
  3. Fabíola Antezana – Confederação Nacional dos Urbanitários (CNU) – (Confirmada)
  4. Leonardo Araujo – Frente Nacional dos Consumidores de Energia (Confirmado)

PLOA 2026 expõe compressão do orçamento social e crescimento das despesas financeiras

O Projeto de Lei Orçamentária (PLOA) da União para 2026 reforça tendências preocupantes no desenho das contas públicas. Segundo os dados apresentados, 92% das despesas previstas são obrigatórias e apenas 8% discricionárias — proporção semelhante à dos últimos anos, mas com crescimento desigual: enquanto as obrigatórias aumentaram 9,3% em relação a 2025, as discricionárias cresceram apenas 5,7%.

Esse cenário aprofunda a compressão do espaço para despesas discricionárias em políticas públicas não obrigatórias, como as de meio ambiente e clima, de igualdade racial, e de proteção às mulheres, consequência direta das regras do Novo Arcabouço Fiscal. As despesas discricionárias são aquelas em que o governo tem liberdade de escolher quando e como gastá-las. 

Pressão da dívida e juros elevados

Um dos pontos mais críticos é o peso das despesas financeiras. Para 2026, estão previstos R$ 3,13 trilhões em juros, encargos e refinanciamento da dívida, valor praticamente igual às despesas primárias (R$ 3,2 trilhões), que sustentam áreas como saúde, educação e previdência. Entre 2025 e 2026, a projeção para o serviço da dívida cresceu cerca de  R$ 290 bilhões — quase três vezes mais do que o aumento previsto para a previdência social.

Com a previsão de juros médios ainda mais altos em 2026 (13,11%, frente a 9,61% em 2025), a pressão sobre o orçamento tende a se ampliar, ao mesmo tempo em que o discurso de austeridade continua direcionado aos gastos públicos.

Ganhos e perdas setoriais

Na distribuição entre ministérios, a Educação foi a área com maior reforço, registrando aumento de 16,4% em relação a 2025. Também receberam acréscimos, ainda que modestos, os ministérios do Desenvolvimento Social, Saúde, Esporte, Mulheres, Turismo e Meio Ambiente.

Em contrapartida, o Ministério das Cidades poderá sofrer corte de 26,6% em seu orçamento, comprometendo políticas de habitação, saneamento e mobilidade urbana. Já os ministérios de Direitos Humanos e Igualdade Racial registraram reduções expressivas em seus já limitados recursos, e o orçamento do Ministério dos Povos Indígenas segue praticamente estagnado.

Salário mínimo e prioridades do PPA

A política de valorização do salário mínimo prevê aumento real de 2,5%. Embora represente ganho, o índice fica aquém do crescimento do PIB em 2023 e 2024, indicando limites impostos pelo Arcabouço Fiscal.

Quanto às prioridades elencadas no Plano Plurianual (PPA) 2024-2027, houve maior aporte para combate à fome, saúde, desmatamento e PAC. Entretanto, educação básica e neoindustrialização tiveram reduções em relação a 2025, e não há previsão específica para a educação em tempo integral, ampliando o risco de aprofundamento das desigualdades educacionais.

Emendas parlamentares e fragmentação do orçamento

Um alerta do PLOA 2026 é a previsão de R$ 40,8 bilhões para emendas parlamentares, sendo R$ 26,6 bilhões individuais e R$ 14,2 bilhões de bancada — valor total superior ao de 2025 (R$ 39 bilhões). Durante a tramitação no Congresso, esse montante ainda pode aumentar.

As emendas parlamentares têm sido cada vez mais fragmentadas e direcionadas a interesses locais, sem critérios claros de planejamento ou avaliação de impacto, o que pulveriza recursos e enfraquece o orçamento público como instrumento de planejamento democrático e de longo prazo.

Sinais de alerta

Na mensagem presidencial que acompanha o PLOA 2026, o governo sinaliza medidas para aumentar a arrecadação via tributação, em tentativa de equilibrar as contas sem recorrer apenas a cortes. Ainda assim, o cumprimento das metas fiscais sob o Novo Arcabouço Fiscal pode levar a novos cortes em políticas estruturantes de redução das desigualdades, enquanto privilégios financeiros permanecem intocados.

>> Saiba mais no artigo publicado pelo Diplomatique Brasil: O que esperar do PLOA 2026 <<

Cortes expressivos em ações  de adaptação climática

A análise do Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) 2026 também revelou cortes expressivos em ações  fundamentais para garantir o direito à cidade e enfrentar os desafios da adaptação climática nos centros urbanos. 

O programa Moradia Digna, que inclui o Minha Casa Minha Vida, sofreu redução de quase 50% em sua principal ação, passando de R$ 10,7 bilhões em 2025 para R$ 5,6 bilhões em 2026, uma queda de 48%. O programa Cidades Melhores, voltado a intervenções estruturantes de desenvolvimento urbano sustentável, também foi drasticamente reduzido, de R$ 50 milhões para apenas R$ 400 mil. Em contrapartida, o Periferia Viva dobrou o orçamento para apoiar a regularização fundiária urbana destinada à segurança da posse de famílias de baixa renda. A regularização fundiária é uma das principais demandas dos movimentos populares que consideram essa medida uma política climática básica.

Outros programas estratégicos seguem em situação preocupante. O de Gestão de Riscos e Desastres permanece estagnado, sem investimentos consistentes em prevenção, enquanto o orçamento para Mobilidade Urbana caiu cerca de 20%, mesmo diante do avanço de iniciativas como a Tarifa Zero em quase 140 municípios. 

>> Saiba mais no artigo publicado pelo Brasil de Fato: PLOA 2026: Direito à cidade e adaptação climática 

Orçamento para meio ambiente segue estagnado 

O Novo Plano Clima (2025-2035) representa um avanço frente à fragmentação histórica das políticas climáticas no Brasil, ao estabelecer limites de emissão nacionais e setoriais, organizar estratégias de mitigação e adaptação em alinhamento com a Convenção do Clima e propor articulação entre diversas fontes de financiamento. No entanto, sua efetivação esbarra em um problema estrutural: o orçamento da área ambiental, peça-chave para a execução do Plano, segue estagnado. Embora o PLOA 2026 preveja aumento de 11% em relação a 2025 (de R$ 4,13 bilhões para R$ 4,59 bilhões), a maior parte desse crescimento se deve ao aumento de despesas com pessoal, enquanto os recursos discricionários — que viabilizam ações concretas como fiscalização ambiental e combate a incêndios — permanecem congelados em R$ 1,59 bilhão.

Esse descompasso revela a dificuldade de transformar a ambição do Plano Clima em realidade. Mesmo com a previsão de participação de recursos privados e internacionais, muitas ações são intransferíveis e dependem exclusivamente do orçamento público, que hoje está limitado pelas regras do Novo Arcabouço Fiscal. 

>> Saiba mais no artigo publicado pela Folha de S.Paulo: PLOA 2026: um início frustrante para o Plano Clima  

Avanço limitado na educação 

O PLOA 2026 ainda prevê aumento de 21% nas despesas obrigatórias da educação em relação a 2025, impulsionado pela elevação gradual da complementação da União ao Fundeb, que passará de 10% para 23%. Já as despesas discricionárias tiveram acréscimo de 15%. 

Embora o cenário aponte para mais recursos, especialistas alertam que a pressão das despesas obrigatórias sobre o orçamento, somada ao limite de crescimento imposto pelo Novo Arcabouço Fiscal, pode comprometer programas e ações importantes da área, especialmente em um contexto de crescimento econômico limitado.

Entre os pontos de atenção, está a inclusão do programa Pé-de-Meia no cálculo do mínimo constitucional da educação, medida que, apesar de importante para combater a evasão escolar, pode reduzir os recursos disponíveis para outras iniciativas do MEC. 

Preocupa a queda drástica no orçamento da Educação de Jovens e Adultos, de R$ 335,8 milhões em 2025 para R$ 121,6 milhões em 2026, impactando sobretudo populações negras e de baixa renda nas regiões Norte e Nordeste. 

>> Saiba mais no artigo publicado pela Carta Capital: PLOA e a Educação para 2026 

Aumento no orçamento para Mulheres

O Projeto de Lei Orçamentária de 2026 prevê um aumento de 14,8% nos recursos destinados a políticas públicas voltadas para mulheres, com destaque para a execução mais efetiva dos valores: em 2024, 92% do orçamento foi empenhado pelo Ministério, revertendo o histórico de subfinanciamento. Esse avanço possibilitou a implementação de 32 Casas da Mulher Brasileira em diferentes estados, com previsão de mais quatro inaugurações em 2025, levando serviços essenciais para municípios onde as mulheres vítimas de violência mais precisam de atendimento. O Congresso Nacional, diante desses resultados, deve considerar a efetividade na aplicação dos recursos como critério para ampliar o orçamento da área.

Em relação à Política Nacional de Cuidados, houve uma redução de 13% no PLOA 2026 em relação a 2025, de R$ 25 milhões para R$ 21,7 milhões. Este é o orçamento proposto pelo Executivo para a implementação desta política, que é intersetorial e envolve outras pastas, como assistência social, saúde e educação. Ainda não é possível estimar o montante real que será destinado em 2026, já que o Plano Nacional de Cuidados ainda não foi implementado. 

>>> Saiba mais na reportagem da coluna da Mônica Bergamo na Folha: Orçamento voltado para mulheres receberá R$ 168,7 milhões em 2026, um aumento de 14,8%

Crianças e adolescentes

Parte importante das políticas públicas voltadas à infância e adolescência — que, por lei, deveriam ter prioridade absoluta — está sendo comprimida pelo novo arcabouço fiscal. Um exemplo é o do Programa Orçamentário 5816 — Promoção e Proteção Integral dos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes com Absoluta Prioridade, para o qual o PLOA 2026 aloca R$ 60,8 milhões, um valor 23,4% inferior ao PLOA 2025. 

As ações voltadas à implementação de políticas de atenção integral à saúde da criança e de atenção à saúde do adolescente e do jovem também apresentaram propostas orçamentárias para 2026 bastante inferiores às de 2025: os recursos destinados caíram para R$ 6 milhões e R$ 3,1 milhões, respectivamente, reduções de cerca de 78% em relação ao PLOA anterior, agravadas pela execução lenta do orçamento de 2025. 

A exceção foi a proposta de alocação de recursos para a Rede Alyne, estratégia de reestruturação da Rede Cegonha, voltada ao aprimoramento do cuidado à saúde materna e infantil. Para essa ação, o governo alocou valor 168,2% superior ao previsto no Projeto de Lei Orçamentária de 2025.

>>> Saiba mais no artigo publicado pelo Correio Braziliense: Limite fiscal não condiz com a prioridade absoluta de crianças e adolescentes

Depois de anos de luta, vitória da mobilização popular!

A aprovação do Projeto de Lei 1087/2025, que trata da chamada “reforma da renda”, no plenário da Câmara dos Deputados nesta terça-feira (01/10), representa uma importante vitória da mobilização popular em defesa de um sistema tributário mais justo e progressivo no Brasil.

Sob relatoria do deputado Arthur Lira (PP-AL), a proposta enfrentou sucessivos adiamentos desde agosto, em meio à priorização de pautas como a anistia a golpistas, a PEC da blindagem e as disputas em torno da dosimetria de penas — escolhas que evidenciam a disposição de parte do Congresso Nacional em preservar privilégios e enfraquecer a democracia.

Desde o início das discussões, formou-se um amplo consenso em torno da ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) para rendimentos de até R$ 5 mil mensais. O verdadeiro embate político e ideológico, porém, concentrou-se na criação de um imposto mínimo sobre altas rendas, destinado a quem recebe mais de R$ 600 mil por ano. Essa medida enfrentou forte resistência de setores empresariais e da oposição conservadora. 

Mantida a taxação dos super-ricos

Parlamentares do PL e do Partido Novo usaram uma retórica distorcida e negacionista, tentando minimizar as profundas desigualdades sociais do país e negar a existência de uma elite econômica concentradora de riqueza que deve, sim, ser tributada. Argumentaram que não seriam os ricos os afetados pela medida, mas sim aqueles que “geram empregos” e “fazem o Brasil crescer”, invertendo propositalmente a lógica da justiça fiscal para proteger privilégios. Essa narrativa ignora o papel fundamental dos tributos na redistribuição de renda e no financiamento de políticas públicas essenciais, buscando deslegitimar avanços na progressividade tributária e reforçando um discurso de austeridade que recai, invariavelmente, sobre trabalhadores e trabalhadoras.

A manutenção do imposto mínimo sobre altas rendas no texto aprovado foi fruto direto da pressão popular. Meses de campanhas públicas e articulação com parlamentares, lideradas por movimentos sociais, organizações da sociedade civil, coletivos e sindicatos, uniram forças em torno da justiça fiscal – uma bandeira histórica defendida há muitos anos pela sociedade civil.

Um marco potente dessa mobilização foi a entrega, pouco antes da votação, do resultado parcial do Plebiscito Popular, que reuniu mais de 1,5 milhão de votos favoráveis à taxação dos super-ricos e à ampliação da faixa de isenção até R$ 5 mil. A entrega foi realizada por representantes do plebiscito em reunião com o presidente da Câmara, Hugo Motta, e o presidente Lula.

Retrocessos

Embora o texto final preserve os pontos centrais da proposta original do governo — a ampliação da faixa de isenção do IRPF e a criação do imposto mínimo sobre altas rendas —, o substitutivo aprovado trouxe alterações preocupantes. Inseridas pelo relator Arthur Lira ainda durante as discussões em comissão especial, essas alterações reduzem significativamente o alcance redistributivo da medida.

Entre os principais retrocessos está a exclusão explícita dos rendimentos do agronegócio da base de cálculo do imposto mínimo, preservando privilégios fiscais históricos do setor. Além disso, foram retirados da tributação os lucros e dividendos remetidos ao exterior por fundos de pensão estrangeiros, abrindo brechas para estratégias de elisão fiscal.

A aprovação na Câmara, embora represente um avanço importante, não encerra a luta por justiça fiscal no país. Ao contrário, reforça a necessidade de vigilância constante e mobilização social permanente para garantir que o sistema tributário brasileiro avance rumo à equidade e à sustentabilidade.

Agora é no Senado

É urgente cultivar uma percepção realista dos impostos, condizente com suas funções democráticas. Tributos não são punições, mas ferramentas fundamentais para corrigir desigualdades, financiar políticas públicas essenciais e garantir um Estado que funcione para todos — e não apenas para os privilegiados.

Agora, a proposta segue para o Senado, e a mobilização precisa continuar firme. É fundamental manter a pressão para que o imposto mínimo sobre altas rendas seja preservado na proposta.

A taxação dos super-ricos não é apenas uma compensação fiscal para a isenção até R$ 5 mil — é uma medida de justiça tributária e de combate às desigualdades!

 

Coalizão Reforma Tributária 3S realiza ato no Congresso em defesa da justiça tributária

Na manhã desta terça-feira (24), a Coalizão Reforma Tributária 3S (Solidária, Saudável e Sustentável), da qual o Inesc faz parte, realizou um ato no Salão Verde da Câmara dos Deputados, em Brasília, para defender um sistema tributário que promova saúde, justiça social e proteção ao meio ambiente. O evento reuniu parlamentares e organizações da sociedade civil e marcou o lançamento de um manifesto com propostas e alertas sobre o Projeto de Lei da Reforma do Imposto de Renda (PL 1087/2025), que será votado em plenário no próximo dia 1º de outubro.

Após avanços na Comissão Especial, o texto manteve a isenção do Imposto de Renda para rendas de até R$ 5 mil mensais e a criação de um imposto mínimo de 10% sobre rendas anuais acima de R$ 1,2 milhão. Apesar do progresso, as entidades reforçaram a necessidade de que o texto não seja desidratado antes da votação final.

Manifesto

O manifesto divulgado pela Coalizão defende a aprovação conjunta das medidas.

“Separar essas duas frentes compromete a coerência e o equilíbrio da proposta, favorecendo exclusivamente os setores mais ricos e colocando em risco o financiamento de direitos sociais já sistematicamente ameaçados pelo discurso da austeridade fiscal.”

>>> Acesse a íntegra do manifesto <<<

Mobilização popular foi decisiva

Para Teresa Ruas, assessora política do Inesc, a mobilização social tem sido decisiva para manter a integridade da proposta:

“Se o projeto da reforma da renda não foi descaracterizado até agora, foi por conta da pressão popular. E se entrou em pauta para ser votada na próxima semana, foi por conta do forte recado das ruas ao Congresso Nacional no último domingo”, avaliou. 

 Mas, de acordo com ela, ainda há risco de retrocessos, com a retirada do imposto mínimo sobre altas rendas.

“A taxação dos super-ricos não é apenas uma medida fiscal, é uma medida de justiça tributária, que combate desigualdades de gênero e raça. São as mulheres pretas e pobres as mais prejudicadas pelo atual sistema regressivo”, completou.

Parlamentares presentes também destacaram a relevância da articulação da sociedade civil. O deputado Pastor Henrique Vieira (PSOL/RJ) afirmou:

“Se estamos perto de uma vitória, é preciso reconhecer a importância dessa coalizão, desse manifesto, dessa pressão e da capacidade de articulação no Congresso Nacional. Mas é fundamental garantir que a compensação venha pela taxação dos super-ricos, e não pelo desfinanciamento de políticas públicas.”

Pressão segue até a votação

Também participaram do ato a deputada Jandira Feghali (PCdoB/RJ), o deputado Bohn Gass (PT/RS), o deputado Merlong Solano (PT/PI), a deputada Talíria Petrone (PSOL/RJ), a deputada Sâmia Bomfim (PSOL/SP) e o deputado Reginaldo Lopes (PT/MG).

Além do Inesc, estiveram presentes organizações como ACT Promoção da Saúde, Fian Brasil, Nossas, Sindifisco Nacional e Instituto de Desenvolvimento Sustentável (IDS).

A Coalizão 3S seguirá mobilizada até a votação, pressionando para que o Congresso Nacional aprove uma reforma tributária que reduza desigualdades, fortaleça o financiamento de políticas públicas e assegure avanços na justiça fiscal, social e ambiental.

NOTA DE PESAR – Viva Roseli, Roseli vive!

É com imenso pesar que o Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) recebe a notícia da partida de Roseli Faria.

Mulher negra e militante incansável das causas sociais, do combate ao racismo, ao patriarcado e às injustiças, Roseli integrou o Conselho Diretor do Instituto, contribuindo de forma decisiva para nossa trajetória.

Reconhecida por sua coragem, generosidade e pela luta em defesa de um orçamento garantidor de direitos e da justiça social, tornou-se uma referência na causa do orçamento público sensível a gênero e raça.

O Inesc presta, respeitosamente, suas condolências aos familiares, amigas e amigos de Roseli Faria neste momento de profunda comoção.

Registramos nosso profundo agradecimento por seu compromisso, presença e apoio incessantes.

Viva Roseli, Roseli vive!

A equipe do Inesc agradece e celebra a vida de Roseli Faria.

O Brasil se encontra com a sua história, 46 anos depois

01 de setembro de 2025.

Na terça-feira, 2 de setembro, terá início o julgamento que pode resultar na condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro e de mais sete aliados acusados de tentar dar um golpe de Estado após as Eleições de 2022. A partir das provas abundantes registradas nas 884 páginas do relatório da Polícia Federal, os réus serão julgados pelos crimes de: Organização criminosa armada, Tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, Golpe de Estado, Dano qualificado pela violência e grave ameaça e Deterioração de patrimônio tombado.

Ao lado do ex-capitão do Exército Jair, figuram ex-autoridades importantes:  Alexandre Ramagem (ex-diretor da Abin e ex-delegado da PF), que, devido ao foro privilegiado, foi beneficiado com a suspensão de parte das acusações, respondendo somente a três dos cinco crimes; Almirante de esquadra  Almir Garnier (ex-comandante da Marinha); Anderson Torres (ex-ministro da Justiça ); General do Exército Augusto Heleno (ex-chefe do GSI); General do  Exército Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa); General do Exército Walter Braga Netto (ex-ministro e ex-candidato a vice-presidente); o Tenente Coronel do Exército Mauro Cid (ex-ajudante de ordens de Bolsonaro).

O julgamento é inédito. O Brasil não tem tradição de julgar e punir criminosos pertencentes às camadas mais privilegiadas da sociedade. Pelo contrário, nossa tradição colonialista reserva à população negra e pobre o rigor das leis, enquanto a impunidade reina entre aqueles que concentram mais renda, terras e poder. Também inédito é o acesso da sociedade às informações do processo, como os planos de assassinato do presidente eleito Lula, seu vice Geraldo Alckimin, além de Alexandre de Moraes entre outras autoridades.

A reprodução dos privilégios e a impunidade tem um preço alto para a democracia: há 46 anos atrás, após uma ditadura militar violenta e traumática socialmente, foi promulgada a Lei da Anistia, pelo então presidente militar João Baptista Figueiredo, impedindo a apuração e o julgamento dos crimes cometidos pelo regime durante três décadas no país. Nenhum militar ou civil foi sequer julgado pelo Golpe civil militar de 1964.De lá pra cá, o movimento Tortura Nunca Mais conquistou a Comissão da Verdade, enterrada após impeachment sem crime de responsabilidade da presidenta Dilma Rousseff. Nas palavras da ex-presidenta, e atual chefe do Banco dos BRICS, “A história será implacável com os que hoje se julgam vencedores.” (2016).

E ela estava certa. Grande parcela da sociedade é contra a anistia (entre 51% e 56% da população, de acordo com as pesquisas), pois entende que é necessário investigar e punir agressores da democracia, para que não se repitam novamente eventos como os que vivenciamos desde 2021, com as manifestações  golpista em frente aos quartéis e nas beiras das estradas,, o atentado a bomba no aeroporto de Brasília e o ataque violento à sede da Polícia Federal, também na capital do país, até a invasão da sede dos três poderes em 08 de janeiro de 2023.

No cenário em que se inicia esse importante encontro do Brasil consigo mesmo, abundam escândalos de corrupção envolvendo a cúpula do bolsonarismo, o crime organizado (PCC) e o centro econômico do país, a Faria Lima. O deputado federal Eduardo Bolsonaro, filho de Jair, exerce mandato nos Estados Unidos e, em parceria com o neto do ditador Figueiredo, ameaça delegados da PF, e articula com o governo do golpista Donald Trump sanções contra os ministros do STF e contra a economia do Brasil. Interditam-se os trabalhos da Câmara dos Deputados, utilizando até mesmo um bebê como escudo humano. E esse Parlamento, parece incapaz de reagir, com seu presidente figurativo, Hugo Motta, oscilando entre o bolsonarismo, o silêncio e o cinismo. Com bilhões em emendas nada transparentes, o maior escândalo de corrupção institucionalizado já visto no país, os parlamentares tentam votar legislações que os anistiam antes mesmo de serem processados, como a PEC da Blindagem.

E em meio a tudo isso, a nossa imprensa hegemônica, naturalizando esses absurdos, dando voz para os bandidos defenderem o autoritarismo, a exemplo da entrevista de Flávio Bolsonaro à Folha, onde abertamente defende novo golpe, “Fechar o STF”, caso o presidente eleito em 2026 não conceda indulto ao seu pai, Jair. Aliás, Ciro Nogueira, que agora estampa as manchetes por receber propinas do PCC, em reportagem do ICL Notícias amplamente repercutida, até ontem atuava semanalmente como uma espécie de “comentarista de política” na Globo News. E o candidato das elites, o “bolsonarista moderado” Tarcísio de Freitas, aparece cotidianamente ao lado de golpistas, corruptos e outros tipos suspeitos. Além de Tarcísio, outros políticos disputam o espólio nefasto de um presidente que se negou a comprar vacinas na pandemia de Covid-19, atuando diretamente para a morte de mais de 700 mil cidadãos brasileiros.

A democracia, ainda que frágil, se levanta e busca justiça. E é neste cenário que a Plataforma dos Movimentos Sociais por Outro Sistema Político, composta por mais de 150 movimentos sociais e organizações da sociedade civil organizada, se manifesta publicamente para que a lei seja cumprida, e possamos, como sociedade, passar essa página rumo a uma democracia real, para todos e todas as brasileiras, quilombolas, indígenas, juventudes negras periféricas, LGBTIQAPN+, trabalhadores e trabalhadoras, mulheres, crianças, idosos e idosas, pessoas com deficiência. É o Brasil que subiu a rampa com Lula que precisa respirar, como na pandemia e como hoje, para construir um país verdadeiramente democrático, justo e acessível. E isso só será possível com um julgamento limpo, sem juízes suspeitos, com o devido processo legal, e com a punição efetiva dos envolvidos no crime, sejam eles generais, ex ministros, parlamentares ou o ex-presidente Jair Bolsonaro.

Ditadura nunca mais!
Anistia não!
Fascistas não passarão!

Participação social: Inesc integra comitê de governança climática

O Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) foi nomeado para ocupar uma das cadeiras na Câmara de Participação Social do Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima (CPS-CIM). A suplência ficará com o Instituto Pólis.

Papel da Câmara de Participação Social no CIM

De caráter consultivo, a CPS-CIM reúne organizações e entidades para contribuir na formulação de propostas, acompanhar ações e articular diferentes setores. O Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima é o principal colegiado de governança climática do Brasil, formado por 23 ministérios. Ele coordena ações interministeriais e monitora políticas climáticas, conforme estabelece a Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC).

Representação do Inesc e defesa da justiça climática

Segundo Sheilla Dourado, assessora política do Inesc que representa o Instituto no CIM, é urgente criar políticas climáticas efetivas e representativas que enfrentem desigualdades, protejam territórios e vidas vulnerabilizadas e promovam justiça climática.

“A participação da sociedade civil nesses espaços garante que as vozes de quem mais sofre com as mudanças do clima sejam ouvidas”, destaca Sheilla.

Participação no Plano Clima

O CIM também desempenha um papel importante na elaboração e no acompanhamento do Plano Clima, previsto no Plano Nacional sobre Mudança do Clima. Em maio de 2024, o Inesc enviou contribuições à consulta pública dos Planos Setoriais de Adaptação. Entre as recomendações, o Instituto defendeu que “seja indicada a fonte de recursos com as ações e programas orçamentários e que eles sejam suficientes para a efetiva gestão de riscos e prevenção de desastres”

Cortes no orçamento para gestão de riscos e desastres

Em 2025, ano em que o Brasil preside a COP30, o Congresso Nacional aprovou um corte significativo no orçamento destinado à gestão de riscos e desastres. Dados levantados pelo Inesc, revelaram que Programa 2318, voltado para essa área, perdeu R$ 380 milhões, passando de R$ 1,75 bilhão no PLOA (Projeto de Lei Orçamentária Anual) para R$ 1,37 bilhão na LOA (Lei Orçamentária Anual). Isso após já ter sofrido redução de R$ 200 milhões em relação a 2024.

Sheilla alerta:

“É necessário mais orçamento também para a resposta e recuperação de desastres, considerando o aumento da frequência e da intensidade dos eventos climáticos extremos e a atual dependência de créditos extraordinários”, salienta Sheilla.

Reforma tributária: é preciso avançar!

Coalizão Reforma Tributária 3S: Saudável, Solidária e Sustentável

Posicionamento sobre o relatório de Arthur Lira – PL 1087/2025

As organizações da sociedade civil reunidas na Coalizão Reforma Tributária 3S (Solidária, Saudável, Sustentável) vêm, por meio deste comunicado, se posicionar diante da recente aprovação, em Comissão Especial da Câmara dos Deputados, do parecer do relator, deputado Arthur Lira (PP-AL), sobre o Projeto de Lei da Reforma do Imposto de Renda (PL 1087/2025), originalmente apresentado pelo Ministério da Fazenda.

Esta análise é orientada pelo princípio de justiça tributária, que se realiza com a promoção da progressividade e redução de desigualdades. Defendemos que os impostos desempenham um papel essencial no financiamento adequado de políticas públicas que garantam a efetivação de direitos à população, e que é justo que as maiores rendas contribuam proporcionalmente mais com a arrecadação pública.

Avanços

Nesse sentido, consideramos um avanço a manutenção, no parecer do relator, da isenção proposta pelo governo para rendas mensais de até R$ 5 mil, assim como a redução das alíquotas para a faixa entre R$ 5 mil e R$ 7.350  – medidas importantes para tornar a incidência tributária sobre as trabalhadoras e trabalhadores mais compatível com sua capacidade de contribuição. Também a manutenção de um imposto mínimo de 10% sobre rendas anuais acima de R$ 1,2 milhão é uma medida positiva e bem-vinda como primeiro passo na tributação de grandes fortunas. 

No entanto, o alcance redistributivo da proposta ainda é limitado. Falta um esforço mais comprometido com a justiça tributária, de modo a garantir que os mais ricos contribuam de forma proporcional à sua capacidade contributiva.

Ponto crítico

Um ponto crítico é a permanência no relatório da defasagem na tabela do Imposto de Renda para quem ganha acima de R$ 5 mil por mês, sem correção adequada. Além disso, não houve ampliação do número de faixas de alíquotas do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), que continuam limitadas a 0%, 7,5%, 15%, 22,5% e 27,5%. Essa limitação desvirtua o princípio da progressividade: aplicar a mesma alíquota máxima – de 27,5% – a quem recebe R$ 7 mil ou R$ 40 mil por mês evidencia a injustiça do atual sistema tributário brasileiro. 

A tributação na fonte sobre lucros e dividendos prevista pela proposta do Executivo representa também um avanço relevante, após décadas de isenção. Contudo, a alíquota estabelecida é muito baixa, e lamentamos que a isenção total não tenha sido revogada. A proposta mantém isentos lucros e dividendos de até R$ 50 mil mensais, criando uma distorção inaceitável: enquanto trabalhadoras e trabalhadores com essa renda pagam a alíquota cheia de 27,5%, quem recebe o mesmo valor via distribuição de lucros pode continuar sem contribuir. Essa lógica é regressiva e perpetua privilégios injustificáveis diante das extremas desigualdades brasileiras.

O substitutivo aprovado na Comissão Especial também mantém intactos os benefícios fiscais de setores historicamente privilegiados, como o agronegócio e o mercado financeiro. Fundos imobiliários, Certificados de Depósito Agropecuário (CDA), Letras de Crédito do Agronegócio (LCA) e outros instrumentos de securitização continuam blindados por regimes de isenção. A isenção para fundos de pensão estrangeiros também foi incluída no texto, abrindo brechas para estratégias de elisão fiscal.

Do ponto de vista democrático, lamentamos profundamente que o processo de tramitação do PL 1087/2025 na Comissão Especial tenha excluído a participação efetiva da sociedade civil organizada, com audiências públicas limitadas e sem diversidade de vozes. A ausência de representação de movimentos sociais, organizações populares e especialistas com perspectiva interseccional compromete o debate.

O que defendemos

Neste comunicado, a Coalizão Reforma Tributária 3S defende a possibilidade real de avançar rumo a um sistema tributário mais progressivo, justo e inclusivo, sensível às desigualdades econômicas, que afetam especialmente mulheres e pessoas negras e indígenas. 

Reconhecemos que a proposta atual traz avanços concretos e caminha, ainda que de forma tímida, na direção correta. No entanto, ela está longe de ser suficiente, e o processo de deliberação na Comissão Especial inspira preocupação quanto à manutenção mesmo desses tímidos avanços. Reafirmamos que o caminho não deve ser o do retrocesso ou da desfiguração, mas sim o do aprimoramento constante. A proposta em tramitação deve ser encarada como um ponto de partida, um chão sobre o qual se constrói um sistema mais justo, e não como um teto que limita e encerra o debate.

Com a votação no plenário da Câmara dos Deputados prevista para agosto, entramos em uma fase decisiva da disputa por uma reforma do Imposto de Renda que enfrente as desigualdades e promova justiça fiscal. A Coalizão Reforma Tributária 3S convoca todas as organizações, movimentos e pessoas comprometidas com a democracia e os direitos sociais a se mobilizarem ativamente neste próximo período. Seguiremos pressionando o Congresso para que a proposta final reflita o princípio de solidariedade, um dos pilares fundamentais de um sistema tributário verdadeiramente justo.

Assinam este posicionamento:

Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) Oxfam Brasil, IDS (Instituto Democracia e Sustentabilidade, ACT Promoção da Saúde, Nossas, Gestos, IJF (Instituto de Justiça Fiscal), Plataforma JUSTA, FIAN Brasil, Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, Instituto Eqüit, GI-ESCR

Soberania não se negocia, se exerce!

Tudo está errado no “tarifaço” de Trump: da forma de comunicar ao conteúdo em si,  passando pela recusa em negociar. Uma postura desrespeitosa, agressiva e que fere brutalmente a soberania do Brasil.

No início de julho, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, divulgou na sua própria rede social documento destinado ao presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva. No texto, Trump critica o governo brasileiro, mencionando o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro, acusa o país de atacar as eleições livres e a liberdade de expressão, além de destacar que o Supremo Tribunal Federal censura redes sociais. Ele também afirma que o Brasil mantém relações comerciais injustas, que prejudicam os interesses dos Estados Unidos. Com essas alegações falsas e arbitrárias determinou que passará a cobrar tarifas de 50% sobre as exportações brasileiras. Além disso, desde então, se nega a qualquer diálogo com o Brasil.

A carta, que nunca chegou formalmente às mãos do governo brasileiro, em tom ameaçador, usa as tarifas como instrumento de pressão e chantagem para forçar mudanças internas no Brasil nas esferas política, comercial e regulatória

O governo brasileiro, preocupado com os impactos econômicos da medida, especialmente a diminuição do crescimento e a perda de empregos, vem buscando negociar com os norte-americanos, em âmbito comercial, sem sucesso. Trump assinou o decreto do tarifaço nesta quarta-feira (30/7), e taxa de 50% começa em 7 dias.

Embora a decisão unilateral de Donald Trump apresente a questão política – a iminente prisão de Jair Bolsonaro – como condicionante, o que por si só já representa um grave ataque à soberania brasileira,   há outros interesses em jogo. Entre eles, destacam-se a presença da China na América Latina, o fortalecimento dos Brics como ameaça à hegemonia do dólar, a recente discussão no Supremo Tribunal Federal para regulamentar as Big Techs no Brasil, o Pix que se apresenta como concorrente das empresas estadunidenses de cartão de crédito e o acesso aos minerais críticos – tais como lítio, nióbio, cobre e manganês – essenciais para a fabricação de tecnologias que moldam o futuro, desde carros elétricos e painéis solares até equipamentos militares de ponta e smartphones.

Chantagens e ingerências na ordem jurídica nacional são inadmissíveis. Neste grave momento, em que a soberania do Brasil é atacada de maneira abjeta e indecorosa, precisamos nos unir para defender a integridade das nossas instituições democráticas, a cidadania e os interesses do nosso povo.

Não ao “tarifaço” do Trump!

Soberania não se negocia, se exerce!

Inesc – Instituto de Estudos Socioeconômicos

Plebiscito Popular sobre o fim da escala 6X1 e a taxação dos super-ricos

Organizações da sociedade civil iniciaram a fase de votação do Plebiscito Popular 2025, uma consulta nacional que convida a população a votar voluntariamente em temas centrais para o futuro do país. Estão em pauta a redução da jornada de trabalho sem corte de salários, o fim da escala 6×1 e a taxação dos super-ricos. A mobilização segue até setembro, com a instalação de urnas em todo o território nacional. No site plebiscitopopular.org.br é possível saber como participar, cadastrar urnas e organizar a coleta de votos.

Segundo o Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos), um dos integrantes da coordenação executiva deste processo, a iniciativa foi possível graças à criação de comitês populares e coordenações estaduais para possibilitar que a votação aconteça em todo o país. Encerrada essa etapa, o próximo passo será a entrega dos resultados do plebiscito ao presidente Lula, Congresso Nacional e Supremo Tribunal Federal (STF).

Taxação dos super-ricos e jornada de trabalho

Duas perguntas estarão disponíveis para votação popular em todo o país:

  1. Você é a favor da redução da jornada de trabalho sem redução salarial e pelo fim da escala 6×1?
  2. Você é a favor que quem ganhe mais de 50 mil pague mais imposto, para que quem recebe até 5 mil não pague imposto de renda?

“O Plebiscito Popular 2025 é uma resposta à omissão do Estado diante de temas que afetam diretamente a maioria da população. O Inesc defende um sistema fiscal justo, que financie as políticas públicas e enfrente as desigualdades. É hora de recolocar o povo no centro das decisões que moldam o futuro do país”, afirma José Moroni, membro do colegiado de gestão do Inesc.

Urna do Inesc

 O Inesc já abriu sua urna física — que também permite o voto online.

A urna é itinerante e vai estar nas atividades de formação e atos políticos que a instituição participará nos próximos meses.

>>>Para votar online, basta clicar aqui.

A participação do Inesc neste processo de mobilização social para a taxação dos super ricos e fim da jornada 6 X 1 é mais um exemplo do trabalho de incidência da organização em sua trajetória, em prol do fortalecimento da democracia e da garantia de direitos. Em 2003, o Inesc organizou o seminário PPA no governo Lula: participação e controle social, que resultou no compromisso do governo federal de realizar audiências públicas sobre o orçamento em todo o país. 

Dois anos depois, foi uma das organizações fundadoras da Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político, articulação voltada à construção coletiva de propostas de transformação do sistema político brasileiro. 

Em 2011, participou da elaboração da Proposta de Lei de Iniciativa Popular para a Reforma Política e da mobilização para a coleta de assinaturas. Já em 2014, integrou a organização do Plebiscito Popular por uma Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político, iniciativa que envolveu milhares de pessoas em uma discussão nacional sobre a urgência de uma reforma política profunda.

Sobre o Plesbiscito

 O Plebiscito Popular 2025 é uma iniciativa de movimentos sociais, centrais sindicais, juventudes, artistas, entidades de fé e partidos progressistas para ouvir a população brasileira sobre temas urgentes e pressionar por mudanças fundamentais.

Integram a coordenação executiva da mobilização as seguintes organizações: Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Intersindical – Central da Classe Trabalhadora, Jubileu Sul Brasil (JSB), Comissão Sociotransformadora da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e o Movimento Brasil Popular.

Para saber a localização dos pontos de votação, basta acessar o site oficial do plebiscito, que contém outras informações desta iniciativa: plebiscitopopular.org.br.

Nota de posicionamento – Orçamento público não é moeda de troca

Nos últimos anos, temos assistido à consolidação de um verdadeiro “parlamentarismo orçamentário”, em que o Congresso Nacional tem assumido, na prática, funções que deveriam ser exclusivas do Poder Executivo: o planejamento, a execução e a gestão integrada das políticas públicas.

Este “parlamentarismo” desconfigura o sistema político definido pela Constituinte de 88 e confirmado pelo Plebiscito de 1993, onde mais de 55% votaram pelo presidencialismo e apenas 24,7% pelo parlamentarismo. Este sistema implantado à “margem” da legalidade faz com que tenhamos um parlamento que executa grande parte do orçamento mas sem nenhum mecanismo de controle que o sistema parlamentarista tem.

Em 2024, as emendas parlamentares alcançaram R$ 40,89 bilhões — 27% dos gastos discricionários da União. Um valor que supera, por exemplo, o orçamento de diversos ministérios sociais e compromete a capacidade do Estado em operar com eficiência e planejamento na alocação orçamentária.

Essa captura de recursos fere o espírito da Constituição Federal, que estabelece, nos artigos 165 ao 169, a centralidade do Poder Executivo na elaboração e execução do orçamento, devendo o processo orçamentário conferir coerência entre o Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA), tríade que busca garantir previsibilidade, racionalidade e continuidade nas ações do Estado.

Por isso, a imposição legal de execução obrigatória das emendas parlamentares rompe o equilíbrio entre os poderes, ferindo, frontalmente, os princípios constitucionais que regem o ciclo orçamentário.

Durante a audiência pública realizada no Supremo Tribunal Federal em 27 de junho de 2025, representantes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal buscaram legitimar esse modelo a partir de dois argumentos centrais: o fortalecimento da democracia e a necessidade de atendimento às demandas locais, ignoradas pelo governo federal. Entretanto, os argumentos apresentados não se manifestam na realidade.

  1. “As emendas fortalecem a democracia e a representação”

Essa afirmação ignora o caráter opaco, desigual e pouco participativo do atual sistema de emendas. O que temos visto é o favorecimento de redes clientelistas e de barganhas políticas. A democracia não se fortalece quando o acesso aos recursos públicos é determinado pela proximidade de um deputado ou senador com o poder executivo local ou pela capacidade de mobilização nos períodos eleitorais. Ao contrário: isso enfraquece a democracia, cria desigualdades territoriais e torna a política refém de interesses de curto prazo, fazendo com que os parlamentares municipais e estaduais que atuem como distribuidores de favores e não como agentes de transformação social.

  1. “As emendas atendem demandas locais ignoradas pelo governo federal”

É verdade que muitas demandas locais não recebem a devida atenção, não só do governo federal como dos estaduais e municipais. Mas é falso que o atual modelo de emendas seja a resposta mais justa para esse problema. Em vez de uma alocação fundamentada nas prioridades pactuadas no Plano Plurianual (PPA) e na escuta das comunidades, as emendas seguem alheias a diagnósticos sociais e aos critérios estabelecidos nas peças orçamentárias e nas políticas públicas. As recentes auditorias da Controladoria-Geral da União (CGU) indicam que recursos que poderiam financiar programas estruturantes — como saúde indígena, educação básica, transição energética, igualdade racial ou medidas de mitigação e adaptação às mudanças climáticas  — são fragmentados em obras pontuais e desconectadas de políticas públicas mais amplas.

O Inesc acredita que o orçamento público deve ser regido por princípios constitucionais de eficiência (art. 37), economicidade (art. 70) e planejamento na alocação orçamentária (arts. 165 a 169). Dessa forma, a atual hipertrofia das emendas parlamentares vai na contramão desses princípios, pois corrói a capacidade do Estado de enfrentar desigualdades históricas e rebaixa a política pública a um arranjo de conveniência e sobrevivência política.

Por isso, defendemos:

  • O fortalecimento do PPA, da LDO e da participação social no orçamento, como instrumentos legítimos de construção coletiva das prioridades do país.
  • O reposicionamento do orçamento a serviço do interesse público, não apenas como uma exigência técnica ou contábil mas, sobretudo, como um imperativo democrático, orientado pela efetivação dos direitos humanos e direitos fundamentais.

O Inesc seguirá contribuindo no debate para que o orçamento possa ser ferramenta de realização de direitos e redução das desigualdades, priorizando as populações com maiores vulnerabilidades. Os nossos princípios são financiamento do Estado com justiça social, máximo de recursos para investimentos sociais e ambientais, realização progressiva dos direitos humanos, não discriminação e promoção da igualdade, e participação social.

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