Busca por representatividade nas Eleições 2020

A assessora política do Inesc, Carmela Zigoni, publicou artigo nesta terça-feira (13) no jornal Estado de Minas em que traça um perfil das candidaturas aos cargos de prefeitura e vereança nas Eleições de 2020. A partir do cruzamento de dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com recortes de raça, gênero e patrimônio, o texto revela a busca por maior representatividade na política, materializada no aumento de candidaturas de mulheres negras, indígenas e pessoas trans.

Os dados apresentados no artigo foram levantados pelo Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos), em parceria com o coletivo científico Common Data.

Ainda que com desigualdades profundas, as Eleições 2020 contarão com 88.555 mulheres negras disputando diferentes cargos. Destas, apenas 2,7% disputarão prefeituras. Adicionalmente, serão 706 mulheres indígenas, sendo que 111 disputarão os cargos de prefeita e vice-prefeita. Em um cenário de destruição do meio ambiente, avanço de ideias fundamentalistas e racistas, é fundamental reafirmar a necessidade de superar a sub-representação de grupos historicamente discriminados. Agora, cabe aos eleitores compreender a importância da diversidade no poder”, afirmou a assessora política do Inesc, que também é doutora em antropologia social.

>>> Leia a íntegra do artigo publicado no Estado de Minas aqui

Veja abaixo os principais números do levantamento:

Qual o perfil médio das candidaturas?

De forma geral e sem distinção de cargo, os candidatos são majoritariamente negros (pretos + pardos, que representam 49,93% do total de registros), do sexo masculino (66,76% do total de registros), com idade entre 36 e 45 anos (30,58% do total de registros). Eles são em sua maioria agricultores (6,82% do total de registros), servidores públicos municipais (6,3%) e comerciantes (5,2%), e com valor do patrimônio declarado entre R$ 100 mil e 500 mil reais (21,58% do total de registros).

Porém, a proporção de candidaturas de mulheres cresceu de 31,9% para 33,2%  em relação ao pleito de 2016, e de 14,7% para 16,1% no caso de mulheres negras (pretas + pardas). As candidaturas indígenas, embora ainda bastante minoritárias, aumentaram de 0,35% em 2016 (1.712) para 0,39% (2.172) em 2020, em todas as regiões do Brasil.

Pessoas transexuais também estão no páreo. Apesar do nome social ter sido aceito pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) apenas em 2018, nessas eleições já são 162 candidaturas registradas com o nome social (pessoas trans que já fizeram a mudança no registro de nascimento não aparecem neste dado, o que sinaliza para um número ainda maior).

Mulheres candidatas continuam com pouco espaço

As mulheres, por sua vez, representam 33,2% dos 550.340 pedidos de registro de candidaturas apresentados ao TSE, para todos os cargos.  Contudo, esse percentual deve expressar as cotas partidárias e não um verdadeiro engajamento de mulheres na vida política.  E mais: as candidaturas femininas ainda seguem concentradas nos cargos de menor prestígio e poder de decisão: elas representam apenas 13,1% das candidaturas para prefeituras, 21% para vice-prefeituras e 34,4% para vereança.

Dentre todos os partidos políticos, somente o PCO não cumpriu a cota mínima de 30% de candidaturas do sexo feminino, tendo solicitado o registro de apenas 21 mulheres, o que representa 21,9% dos pedidos de registro do partido; o Unidade Popular (UP), contrariamente, é o partido com maior proporção de registros de mulheres, 43,6%, seguido do PSTU com 39,7% e do PSOL com 36,2%. Os demais partidos ficaram na média de 33%.

As as mulheres negras estão mais presentes nos partidos UP (30,1%), PC do B (21,7%) e PSOL (21,4%), sendo que o partido que mais apresentou candidaturas de mulheres negras à prefeitura foi o PSTU, com 22,5% de candidatas a prefeita. Por outro lado, o partido com a menor proporção de mulheres negras concorrendo às eleições de 2020 são o PCO (4,2%) e o NOVO (4,8%).

A proporção de homens e mulheres concorrendo (33,2% mulheres e 66,8% homens) pode ser um efeito da EC 97/2017, que exigiu que cada partido indicasse, individualmente, o mínimo de 30% de mulheres filiadas. Como apresentado acima, poucos partidos registraram mais do que o mínimo exigido por lei de candidaturas de mulheres.

Na análise de gênero e raça/cor, observamos o equilíbrio entre candidaturas de mulheres brancas (49,4%) e de mulheres negras (48,4%), mas considerando todas as categorias raciais, as mulheres brancas são maioria em todos os cargos, e para as prefeituras chegam a ser quase o dobro de mulheres negras: 1.600 candidatas brancas, 726 candidatas pardas e 130 candidatas pretas. As mulheres indígenas somam 706 candidaturas.

As jovens negras candidatas representam 22.193 candidaturas a vereadora, 94 a prefeita e 266 a vice-prefeita (18 a 35 anos).

Ocupação: candidatas donas de casa, funcionárias públicas e agricultoras

Sobre o perfil das mulheres candidatas, as ocupações mais frequentes entre as mulheres são dona de casa (11,7%), servidora pública municipal (7,1%), agricultora[1] (5,1%) e professora da rede pública municipal (4,3%); e entre as mulheres negras, ser dona de casa é 13,4% mais frequente do que entre as mulheres brancas.

Partidos dificultam candidaturas negras para as prefeituras

 As candidaturas de pessoas negras representam 49,9% contra 47,9% de pessoas brancas, sendo, em números absolutos, as candidaturas negras estão mais concentradas no Nordeste (103.150 candidaturas) e no Sudeste (87.204), e são proporcionalmente maiores para o cargo de vereador. Para os cargos de prefeito e vice prefeito, os candidatos brancos seguem sendo maioria (63,4% e 59,2% respectivamente).

Quando desagregados os valores de candidaturas negras em pretas e pardas, vemos que predominam as candidaturas de pardos e que há maior proximidade proporcional de pessoas pretas entre os gêneros masculino e feminino do que na categoria de pessoas pardas.

– 48,4% das mulheres se identificam como negras. Dessas, 37,7% são
pardas e 10,7% pretas.

– 50,7% dos homens se identificam como negros. Desses, 40,3% são pardos e 10,4% são pretos.

Os partidos que mais apresentaram pedidos de registro de candidaturas de pessoas negras foram UP (69,9%), PCdoB (66,2%) e PSOL (60,2%), e os que mais apresentaram candidaturas indígenas foram PSTU (3,4%), REDE (1,63%) e PCO (1%). Já os partidos com menos negros são o PCO (16,76%) e o NOVO (18,6%) e com menos indígenas são o PCB, que não apresentou nenhuma candidatura indígena, e o PMB (0,07%).

Há diferenças no perfil das candidaturas a depender do cargo: dentre as candidaturas à prefeitura, predominam os homens brancos, de 46 a 55 anos, com ensino superior completo (totalizando 1.659 registros); já entre vereadores predominam homens pardos, com idade entre 36 e 45 anos e ensino médio completo (19.533 registros).

Coordenação e análise: Inesc
Tratamendo da base de dados: Common Data

[1] Só declaradas agricultoras. Trabalhadoras rurais são 1,28%; produtora agropecuária 0,2% e pecuaristas 0,07%.

Inesc é um dos organizadores do Fórum Permanente “Amazônia em Transe”

Nos dias 21 e 22 de outubro, a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) promove o Fórum Permanente: Amazônia em Transe: Estratégias, Impactos e Impasses para o Século 21. O Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) é um dos organizadores do evento que vai discutir a intensificação da exploração econômica dos recursos naturais nas áreas amazônicas da América do Sul, as consequências e os impactos para suas populações e territórios, bem como propor novas articulações e alianças tendo em vista a discussão e defesa de um desenvolvimento econômico alicerçado em sua diversidade socioambiental e sua integridade étnico-cultural-territorial. É gratuito, on-line e as inscrições podem ser feitas aqui.

Alessandra Cardoso, doutora em Desenvolvimento Econômico pelo IE/UNICAMP e assessora política do Inesc participa como debatedora da mesa “Amazônia Sul-Americana: Geopolítica, Infraestrutura e Mineração”, ao lado de Thais Virga (IE/UNICAMP). “Este evento marca a intenção do Inesc de ampliar diálogos e alianças e pensar estratégias para o enfrentamento dos problemas que marcam a Amazônia no presente século.  Acadêmicos, ativistas e organizações não governamentais, com diferentes leituras e abordagens, estarão reunidos para pensarem juntos os muitos impasses colocados à preservação da região”, explica  a assessora política do Inesc.

A programação também conta com a presença dos professores Wanderley Messias da Costa e Edna Castro; da estudante e liderança Indígena, Auricélia Arapiun; e da doutora em Sociologia, Maristella Svampa (Escuela de Altos Estudios en Ciencias Sociales). A programação completa pode ser conferida no site do evento.

Modelo de Referência para Publicação de Dados Abertos é lançado para o público

O Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) é uma das entidades que participaram na elaboração do Modelo de Referência para Publicação de Dados Abertos. Lançado no início de outubro, o documento visa integrar, capacitar e sensibilizar a sociedade e as três esferas de governo no contexto da abertura de dados públicos. Dessa maneira, espera-se orientar quanto à importância, ao uso, à publicação e ao monitoramento de Dados Abertos nos seus respectivos campos de atuação.

O Modelo de Referência consolida o trabalho dos órgãos e entidades responsáveis pela execução do Compromisso 2 – Ecossistema de Dados Abertos – do 4º Plano de Ação do Brasil no âmbito da Parceria para Governo Aberto. Formada por oito países, entre eles o Brasil, a Parceria é uma iniciativa internacional que incentiva práticas governamentais relacionadas à transparência dos governos, ao acesso à informação pública e à participação social.

“O Inesc colaborou ativamente na elaboração do documento. Fazemos parte de um grupo que acompanha o Compromisso 2 e fomos uma das organizações que ajudaram a elaborar o conteúdo que contribui na agenda de Dados Abertos”, explica Carmela Zigoni, assessora política do Inesc.

De acordo com Carmela, o Modelo de Referência para Publicação de Dados Abertos é extremamente importante porque quando os dados forem abertos em todas esferas, eles poderão ser dialogáveis. “Ele também auxilia o trabalho dos gestores municipais e estaduais. Apesar da Lei de Acesso à Informação ter quase 10 anos, ainda há várias dúvidas sobre como abrir e divulgar os dados”, comenta.

Também fizeram parte da criação do Modelo de Referência: Controladoria-Geral da União (CGU), Fundação Getúlio Vargas – por meio da Diretoria de Análise de Políticas Públicas (FGV/DAPP) –, Centro de Estudos sobre Tecnologias Web (Ceweb.br) do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) e Open Knowledge Brasil (OKBr).

Uso de dados abertos

Existem diversas maneiras de promover o uso de dados abertos, entre elas, alguns aplicativos.  O “CoronApp78”, por exemplo, utiliza geolocalização para informar casos de contaminação pelo novo coronavírus em localidades ao redor do celular e indica hospitais, farmácias e supermercados mais próximos. O “Coronavírus SUS79”, criado pelo Ministério da Saúde, traz informações sobre a Covid-19 e mostra as unidades de saúde próximas à localização do usuário, entre outras funções.

Leia o Modelo de Referência para Publicação de Dados Abertos na íntegra.

Territórios camponeses frente à mineração: olhares sobre a questão fundiária

O sudeste paraense é uma região marcada pela presença de assentamentos rurais constituídos em um contexto de ocupação das terras pelo agronegócio e, mais recentemente, por mineradoras. “Temos uma região fortemente marcada pela territorialização camponesa. São mais de 500 projetos de assentamentos com milhares de famílias que lutam pela terra ainda hoje”, explicou Rose Bezerra, educadora e mediadora do debate.

Participaram como convidadas da live: Liliane Guimarães, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) de Canaã dos Carajás; Andréia Silvério, advogada da Comissão Pastoral da Terra (CPT) de Marabá; e Lucilei Oliveira, docente da Universidade do Estado do Pará (UEPA). O evento contou, ainda, com as intervenções poéticas de Gracinha Donato, artista popular e militante do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM) e com a contribuição de Tatiana Oliveira, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).

A luta pela terra e a queda de braço com a mineração

“Como fazer reforma agrária em um território que 70% dele é da Vale?”. Com esta pergunta Liliane Guimarães abriu sua fala e resumiu suas preocupações como militante pela reforma agrária. Ela é moradora do assentamento Eduardo Galeano, no município de Canaã dos Carajás e vizinho do Projeto Ferro Carajás.

Embora reconheça que seu assentamento não concentra uma grande quantidade  de conflitos como outros, o contexto em que vive é permeado por assédios, principalmente da mineradora Vale. “A gente vai vivendo, mas não é fácil. Quase todos os dias temos drones nos acampamentos e helicópteros sobrevoando. Hoje, foi um desses dias aqui”, relatou.

A dependência da mineração 

Militante do MST, Liliane ressaltou a dificuldade de construir a luta pela terra em um município originalmente agrário e hoje dominado pela mineração. “A Vale está na educação, na saúde e na cultura”, disse, traduzindo a sensação que é viver em uma cidade dominada social, cultural e economicamente pela empresa mineradora. “Para nós camponeses, até a liberdade de falar foi levada pelo capitalismo”, desabafou.

De forma complementar às reflexões de Liliane, Andréia Silvério, advogada da CPT, fez um panorama geral da luta pela terra na região entre Canaã dos Carajás e Parauapebas, onde há cinco projetos de mineração em operação.

“Isso gera, em certa medida, uma dependência do ponto de vista econômico, do município com relação à mineração. Sob o discurso de  enxergar que a mineração é a vocação do município, os próprios gestores municipais não investem em outras políticas econômicas e acabam abandonando alguns setores, como é o caso do que aconteceu com a agricultura familiar no município de Canaã dos Carajás”, pontuou.

A judicialização dos conflitos 

Para Andréia, há um crescimento assustador da demanda de assessoria jurídica por parte dos agricultores no processo de enfrentamento das mineradoras, em especial, a Vale. “Hoje, a assessoria jurídica da Comissão Pastoral da Terra faz o acompanhamento de pelo menos 40 ações possessórias no município de Canaã dos Carajás. Elas são referentes a cinco acampamentos localizados em áreas que também são reivindicadas pela mineradora Vale”. Esses cinco acampamentos abrigam 600 famílias.

A judicialização dos casos vem sendo provocada pela própria mineradora, que ingressou com pedidos de reintegração de posse das áreas ocupadas. “Então, em um primeiro momento, a atuação da CPT se dá na frente jurídica, para garantir, por meio da defesa dessas famílias, que não ocorressem despejo”, conta a advogada. A esse processo soma-se a criminalização das lideranças pela Vale, prática comum em outras partes do Brasi”l, denunciou Andreia. Em resposta, os agricultores têm investido em uma frente jurídica.

A apropriação de terras federais

Se em alguns casos a estratégia da Vale é comprar individualmente as terras dos agricultores, minando as possibilidades de articulação coletiva para a defesa de seus direitos, em outros, a estratégia é se apropriar das terras federais. “A Vale não compra apenas as terras em que se sabe da existência de um título, na verdade, a Vale acaba também se apropriando de áreas públicas federais, de áreas pertencentes a projetos de assentamentos, como é o caso do projeto Carajás 2 e 3”, relatou Andréia.

A CPT, juntamente com os agricultores, vem apresentando denúncias ao Instituto de Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) sobre tais casos. Atualmente, está em processo um acordo entre o Incra e a Vale para realizar a compensação dessas áreas que foram apropriadas indevidamente pela mineradora e que são reivindicadas por agricultores.

Ambientalização do discurso da Vale

Andréia chamou atenção, ainda, para a ambientalização do discurso da Vale, que vende uma imagem de empresa preocupada com o meio ambiente e com o desenvolvimento sustentável. Para ela, esse discurso esconde uma atuação nos territórios que é predatória e prejudicial, não só à natureza, mas também aos trabalhadores rurais.

A advogada analisa que, junto com a judicialização dos conflitos sociais e com a criminalização dos movimentos, a ambientalização da imagem forma o tripé das estratégias da Vale na região.

Remoção forçada e o assédio das mineradoras 

Se por um lado está a dificuldade de conquista da terra em um contexto de apropriação do território pelas mineradoras e em especial pela Vale (como é o caso de Canaã dos Carajás), por outro está a remoção forçada de agricultores que já possuem os títulos de suas terras.

Em Ourilândia do Norte, o caso do projeto Onça Puma é emblemático nesta estratégia de remoção forçada das famílias com a finalidade de instalar projetos de mineração. Inicialmente de propriedade da empresa canadense Canico, hoje o projeto está nas mãos da Vale. Ele surgiu em 2000, em um contexto de diversificação da produção minerária no sul e sudeste do Pará, com o mapeamento do níquel, cobre, ouro e ferro em novas regiões.

A Canico começa o processo de prospecção mineral adentrando nos lotes dos agricultores do Projeto de Assentamento Campos Altos e abrindo uma frente de conflitos, relata a professora Lucilei Oliveira da UEPA. Mesmo com 240 famílias vivendo no assentamento, a mineradora iniciou um processo no Incra para alteração da finalidade do terreno de agricultura familiar para mineração. Ao mesmo tempo, comprou individualmente as terras dos agricultores.

Enquanto o Incra, em Brasília, descobriu uma série de irregularidades cometidas pela Canico, a empresa comprou individualmente 85 lotes (o restante, foi negociado coletivamente). Juntos, os trabalhadores rurais pedem na justiça a anulação das vendas que haviam ocorrido em 2003 e a reparação das famílias por danos socioambientais ambientais.

“O que a gente pode perceber com isso? Que a mineração é incompatível com o campesinato, é uma realidade que não consegue conciliar com os agricultores que estão no entorno, até porque, os danos ambientais são terríveis: aterramento de nascentes, contaminação das águas, contaminação do solo”, declara Luciei.

O projeto Onça Puma também atinge diretamente os índios Xikrin com a contaminação das águas do rio Caetés. “Os Xikrin, os Kayapó e tantas outras etnias… É o segmento que sem dúvida, desde o início dos anos 1980, tem sido sistematicamente violentado, e também resistindo”, apontou Rose.

Em resumo, “o cenário que a gente tem é o de uma mineração que quando se instala nos territórios, produz uma situação de zonas de sacrifício. Regiões que são destinadas à exploração econômica estritamente, sem considerar processos associativos, dinâmicas socioterritoriais, todo um processo de produção cultural e simbólica na relação entre seres humanos e natureza” conclui Tatiana, ao final do evento.

Acompanhe o circuito de lives e escute as mulheres amazônidas

Para saber mais sobre o sudeste do Pará, o contexto de mineração e as estratégias desenvolvidas pelas mulheres amazônidas para sobreviver a esse modelo econômico e à crise da covid-19, acompanhe o circuito de lives pelo site e pelo YouTube do Inesc.

A primeira live, “Mulheres amazônidas: a defesa dos territórios em tempos de crise” teve como tema a luta e a resistência das mulheres no contexto da pandemia e a mudança nas rotinas das atividades sociais e políticas. Já o segundo, De que lado a corda arrebenta? Os recursos da mineração e a desigualdade em tempos de pandemia, trouxe para o centro do debate a questão econômica, a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), o impacto econômico da mineração e a desigualdade. A próxima e última live acontece dia 13 de outubro.

Assista ao resumo da transmissão! O vídeo completo você pode conferir aqui.

Sociedade Civil apresenta propostas para leis orçamentárias de 2021

A Coalizão Direitos Valem Mais, que agrega cerca de 200 organizações da sociedade civil, lança hoje (30/11) nota técnica destinada ao Congresso Nacional e à sociedade brasileira com um conjunto de propostas que visam fortalecer a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA) 2021 como instrumentos para o enfrentamento da pandemia e de suas consequências nas condições de vida da população.

>>> Acesse a nota técnica na íntegra.

As propostas da nota técnica preveem o estabelecimento de um piso mínimo emergencial para as áreas de saúde, educação, assistência social e segurança alimentar que interrompa a deterioração orçamentária acelerada dessas políticas desde 2015 – com base no princípio constitucional de vedação de retrocessos em direitos fundamentais, reafirmado pelo STF na decisão ARE-639337/2011 – e garanta condições para o enfrentamento do rápido crescimento do desemprego, da miséria e da fome no país, acirrado pela COVID-19.

Para Livi Gerbase, assessora política do Inesc, a iniciativa da Coalizão mostra que a sociedade civil tem propostas concretas para a garantia dos direitos e o enfrentamento à pandemia. “Nós temos números para mostrar o quanto precisamos para garantir uma recuperação econômica e social para a superação da pandemia e da crise política, social e econômica que estamos enfrentando no Brasil há anos”.

O relatório Brasil com Baixa imunidade, publicado pelo Inesc em abril, mostra como a austeridade fiscal, que asfixiou o orçamento de programas sociais importantes, deixou o país despreparado para enfrentar a pandemia do novo coronavírus. Já a Pesquisa de Orçamento Familiar do IBGE divulgada neste mês evidenciou o avanço da insegurança alimentar grave, ou fome, que passou a alcançar 10,28 milhões de pessoas, atingindo mais fortemente lares chefiados por mulheres negras, fazendo com que o Brasil apresentasse o pior patamar desde 2004. O desemprego durante a pandemia deu um salto: somente entre maio a agosto de 2020, cresceu de 10,1 milhões para 12,9 milhões de desempregados.

A proposta contida na nota técnica de piso mínimo emergencial no Projeto de Lei Orçamentária Anual – PLOA 2021, para suprir a necessidade dos direitos à saúde, educação, assistência social e segurança alimentar e nutricional para 2021, totaliza o valor de R$ 665 bilhões. O valor previsto no PLOA 2021, apresentado pelo governo federal para essas áreas, totaliza R$ 374,5 bilhões, um valor que corresponde apenas a 58% do piso mínimo emergencial para a garantia desses direitos essenciais.

O que o Piso Mínimo Emergencial viabilizará?

Com o piso mínimo emergencial dos serviços sociais, será possível interromper o processo de desfinanciamento acelerado e garantir condições melhores para que:

  • O Sistema Único de Saúde (SUS) enfrente o contexto da pandemia e do pós-pandemia, com a aquisição de medicamentos e vacinas; que considere os efeitos crônicos de saúde gerados pela Covid-19; responda à demanda reprimida por saúde de 2020, decorrente do adiamento de cirurgias eletivas e exames de maior complexidade, bem como da interrupção no tratamento de doenças crônicas.
  • A política de educação se organize para a retomada das escolas com menor número de alunos por turma (segundo a OCDE, o Brasil é um dos países com o maior numero de estudantes por turma), maior número de profissionais de educação, adequação das escolas para o cumprimento de protocolos de segurança e proteção, ampliação da cobertura de acesso à internet de banda larga para os estudantes da educação básica e ensino superior no país, retomada dos programas de assistência e permanência estudantil na educação básica e no ensino superior. Na elaboração da nota, considerou-se também o aumento da complementação da União ao Fundeb de 10% para 12% prevista da Emenda Constitucional 108, aprovada pelo Congresso Nacional em agosto, o aumento do montante destinado ao PDDE – Programa Dinheiro Direito na Escola para adequação das escolas às medidas de segurança e a migração de estudantes de escolas privadas para a educação pública, decorrente da perda de poder aquisitivo das famílias de classe média diante do aumento do desemprego e da crise econômica.
  • Retomada das condições de manutenção dos serviços e a ampliação da cobertura do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) para atender a demanda gerada pela pandemia, aumento do desemprego e de diversas violações de direitos, bem como garantir maior efetividade do programa Bolsa Família por meio de uma rede de serviços integrados. O desfinanciamento progressivo e a insegurança nos repasses federais de recursos ordinários ao SUAS comprometem o atendimento de mais 40 milhões de famílias referenciadas e os mais de 21 milhões de atendimento realizados anualmente, nos Centros de Referência da Assistência Social (CRAS) de pessoas e famílias afetadas pelo desemprego, fome, fragilidade nos vínculos familiares e iminência de violência doméstica; diminuição dos atendimentos a pessoas em situação de rua, migrantes e idosos; e a drástica redução do atendimento a crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil ou em exploração sexual nos serviços especializados.
  • Enfrentamento do crescimento acelerado da fome e da desnutrição no país por meio da retomada das condições de financiamento do Programa Aquisição de Alimentos (PAA), que fornece alimentos saudáveis por meio da agricultura familiar, beneficiando aproximadamente 185 mil famílias de agricultores familiares e milhões de famílias em situação de vulnerabilidade social que recebem esses alimentos por meio de uma rede de 24 mil organizações socioassistenciais; do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) que atende cerca de 41 milhões de estudantes no país; da ampliação do acesso à água para abastecimento humano e produção de alimentos com cisternas no semiárido brasileiro para uma população de 1,8 milhão de famílias; de recursos federais para a manutenção de 152 restaurantes populares no país, que fornecem alimentação para famílias de alta vulnerabilidade social. Atualmente, o país possui uma rede de restaurantes populares construída pelo governo federal que se encontra subutilizada em decorrência da falta de recursos municipais para a sua manutenção.

A Rejeição à PEC 188 e o fim do Teto de Gastos

Na Nota Técnica, a Coalizão Direitos Valem Mais alerta parlamentares, gestoras e gestores públicos e candidatos às eleições municipais deste ano para o grande risco ao país imposto pela PEC do Pacto Federativo. A PEC 188/2019, também relatada pelo Senador Márcio Bittar, responsável pela relatoria da Lei Orçamentária Anual 2021, representa o efetivo desmonte da capacidade do Estado brasileiro de garantir direitos, proteger a população e enfrentar nossas profundas desigualdades sociais. Caso tal PEC seja aprovada, os resultados práticos serão a implosão do pacto federativo brasileiro, com o fim da solidariedade fiscal entre os entes da federação e uma radical e acelerada precarização da oferta de serviços públicos com aumento das desigualdades regionais.

No documento, a Coalizão retoma sua defesa do fim do Teto de Gastos e a necessidade urgente de adoção de medidas fiscais de segunda geração no Brasil como realizada por muitos países; a importância de uma reforma tributária progressiva – solidária, justa e sustentável socioambientalmente –  com a tributação emergencial dos setores mais ricos para ampliação das condições de financiamento das políticas públicas e garantia da renda básica permanente, como propõe a Campanha Renda Básica que Queremos e mudanças nas lei de responsabilidade fiscal.

Sobre a Coalizão Direitos Valem Mais

Criada em 2018, a Coalizão é um esforço intersetorial que atua por uma nova economia comprometida com os direitos humanos, com a sustentabilidade socioambiental e com a superação das profundas desigualdades do país e por isso defende o fim do Teto de Gastos, aprovado em dezembro de 2016 pelo Congresso como Emenda Constitucional 95. A EC 95 é definida pela ONU como a medida econômica mais drástica contra direitos sociais do planeta. Atualmente, duas propostas de emenda revogatória da EC 95 tramitam no Congresso Nacional: a PEC 54/2019 e a PEC 36/2020.

Conheça a Coalizão: www.direitosvalemmais.org.br

 

[1] Valor para ASPS – ações e serviços públicos em saúde, excluídos os royalties do petróleo.

[2] O piso emergencial de Segurança Alimentar contempla os programas nacionais: Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), Programa de Cisternas e Programa de Restaurantes Populares, sendo que o último não aparece no PLOA 2021.

Levantamento do Inesc que comprova queda de recursos para saúde indígena ganha tradução para o Munduruku

Os gastos com saúde indígena apresentam queda desde o início do governo Bolsonaro. Dados organizados pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) mostram que o orçamento autorizado para 2020 foi 14% menor do que em 2018. Além disso, entre janeiro e julho de 2020, foi registrado um gasto ínfimo com a compra de Equipamentos de Proteção Individual e um aumento não significativo na contratação e horas-vôo nos meses em que a pandemia estava instaurada.

“Isso demonstra a lentidão do governo em tomar medidas básicas de contenção da pandemia”, aponta Leila Saraiva, assessora política do Inesc e responsável pelo levantamento dos dados.

Munduruku

Todas as informações foram traduzidas para o Munduruku. De acordo com Tatiana Oliveira, assessora política do Inesc, a tradução permite aproximação com esse povo e é uma maneira de apoiar a luta e a resistência contra o extermínio indígena comandado pelo governo Bolsonaro e reforçado pela situação da pandemia.

Espera-se que as informações circulem nas Terras Indígenas Munduruku, chegando até o Alto Tapajós, onde está a maioria dos que não falam português.

“O documento foi traduzido porque o Estado brasileiro ainda tem muita dificuldade de enxergar a sua multiculturalidade. Então, além do orçamento baixo e mal investido, houve, desde o início da pandemia, muita dificuldade para ter acesso a dados sobre a saúde indígena. Se não fossem organizações como a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), estaríamos em absoluta ignorância. São informações que os próprios indígenas precisam conhecer para se organizarem e pressionar o governo por seus direitos de povos originários”, destaca Tatiana.

Acesse o documento em português e em Munduruku nos downloads abaixo:

 

 

 

 

Webinar discute as consequências dos benefícios fiscais para produtos nocivos à saúde

Na tarde de quarta-feira (16/09), Livi Gerbase, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), participou do webinar “Benefícios fiscais para produtos nocivos à saúde: faz sentido?”.

O debate propôs uma reflexão sobre os efeitos dos incentivos fiscais para empresas de combustíveis fósseis, agrotóxicos e bebidas açucaradas (refrigerantes, energéticos e isotônicos, etc).

Livi iniciou a fala comemorando um painel totalmente feminino. “Isso mostra que muita mulher está pensando os incentivos fiscais”, disse. Na sequência, explicou que os benefícios fiscais são concedidos pelo próprio governo e são feitos a partir de decretos, as famosas “canetadas”. Esses incentivos têm muito mais opacidades do que as políticas públicas normais e podem fazer com que o governo deixe de arrecadar cifras na casa dos bilhões – valores bem maiores do que aqueles destinados às áreas de saúde e educação, por exemplo.

“Incentivos fiscais que não são transparentes e revisados podem ser chamados de privilégios, ao invés de incentivos”, comentou a assessora política, que ainda lembrou que o problema dos benefícios não acontece apenas no Brasil, mas em todo mundo. O Inesc, por exemplo, faz parte do Projeto Lateral, que reúne organizações latino-americanas  articuladas em prol da transparência dos gastos tributários e pela eliminação dos privilégios fiscais na América Latina.

Livi Gerbase, assessora política do Inesc.

A apresentação de Livi destacou os subsídios aos combustíveis fósseis, os impactos deles na saúde da população brasileira, os lucros extraordinários que os recursos de petróleo e gás acumulam e as consequências de investir grandes valores apenas no setor fóssil. Do outro lado da balança, fica o setor de energia renovável, com bem menos investimento.

Desde 2018, o Inesc monitora anualmente os valores dos subsídios aos combustíveis fósseis. A estimativa é feita partir de dados oficiais com metodologia própria do Instituto. O relatório do ano passado aponta que os combustíveis fósseis ganharam R$ 85 bilhões em subsídios em 2018 – número que representa quase três vezes o orçamento do Bolsa Família. O relatório de 2019 deve sair nas próximas semanas.

Realizado pela organização não governamental ACT – Promoção de Saúde e com apoio do Inesc e da organização de direitos humanos Terra de Direitos, o webinar ainda contou com a participação de Joana Indjaian Cruz (ACT – Promoção de Saúde) e da moderadora Grazielle David (É da sua conta).

Campanha por transparência

Em 2018, o Inesc lançou a campanha #SóAcreditoVendo, que pede transparência no processo de concessão de incentivos fiscais. Todos os anos, o Brasil perde bilhões de reais com gastos tributários que o governo federal concede para empresas, instituições ou pessoas físicas.

Em maio do ano seguinte, o Senado Federal aprovou o Projeto de lei complementar 188/2014, que obriga a Receita Federal a divulgar as empresas beneficiadas por isenções de impostos e contribuições. Agora, o projeto tramita na Câmara dos Deputados.

Confira a íntegra do webinar.

De que lado a corda arrebenta? Os recursos da mineração e a desigualdade em tempos de pandemia

A segunda live do circuito de diálogos promovidos pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) sobre as estratégias comunitárias para o enfrentamento da covid-19 colocou em foco os territórios afetados pela mineração no sudeste do Pará. Mulheres de diferentes municípios compartilharam suas vivências sobre as contradições da atividade mineral, a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM) e o agravamento das desigualdades. 

“Hoje vamos mostrar como é possível fazer um debate sobre a economia que traz o cotidiano da vida para o centro das preocupações, sem deixar de debater os grandes números com os quais a ciência econômica gosta de trabalhar”, explicou Tatiana Oliveira, assessora política do Inesc na abertura.

Com o tema “De que lado a corda arrebenta? Os recursos da mineração e a desigualdade em tempos de pandemia”, o bate-papo contou com a presença de Cristiane Jardim do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (STTR); Maria Lindalva do Projeto de Desenvolvimento Sustentável Porto Seguro; Rebeca de Souza do Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM); e Larissa Alves, economista e pesquisadora da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa). Mediou o debate Rose Bezerra, educadora e socióloga da região, que também organiza do circuito de lives. Margarida Negreiros, docente da Unifesspa, fez a mediação poética. 

>>> Leia também: Mulheres amazônidas e a defesa dos territórios em tempos de Covid-19

A vivência no território de mineração

É difícil discutir qualquer tema no sudeste do Pará sem levar em conta a atividade minerária e as proporções dos territórios que ela ocupa. Canaã dos Carajás é um município de 3.470.00 km², 35% já foi destinado para lavra de mineração. E as áreas de pesquisa, direito minerário, já ultrapassam de 60% de Canaã”, denunciou Cristiane Jardim, moradora do município.

As participantes ainda denunciaram poluição sonora gerada pela estrada de ferro e o fato de que a mineração, considerada pelo governo brasileiro como atividade essencial, não parou durante a pandemia. “A Vale é uma das principais propagadora  dos vírus da covid-19”, resumiu Cristiane.

As mulheres no contexto da mineração

Para além dos impactos gerados pela mineração na população, a atividade afeta as mulheres de forma específica. Vendida, muitas vezes, como atividade geradora de empregos, o lugar destinado às mulheres nos serviços da mineração é inferior aos postos ofertados aos homens. “As poucas vagas para as mulheres não são bem propícias”, pontuou Cristiane.

Rebeca trouxe dois outros elementos sobre esta questão. Falou sobre a prostituição, impulsionada pela grande quantidade de trabalhadores que chegam aos municípios, e sobre a organização da divisão sexual do trabalho no seu entorno. “O homem da mineração chega em casa e vai dormir. A mulher chega, arruma a casa e faz comida. Esse é um debate que precisa ser mais amadurecido pelas próprias mulheres da mineração”. 

Apesar do machismo e do sexismo, há protagonismo feminino na conquista da terra e na construção de alternativas à mineração. Lindalva destaca que no Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS) é formado, em sua maioria, por mulheres, que comandam o projeto. Além disso, são elas que têm participação mais ativa nas questões relacionadas ao efeito da mineração.

“Nós somos as primeiras a visualizar os impactos na região; a verificar a falta de vagas nas escolas; a enfrentar filas nos hospitais”, explica Cristiane.

Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM)

Como os recursos minerários pertencem à União, as mineradoras são obrigadas a pagarem uma compensação para os cofres públicos, chamada CFEM. De acordo com Larissa Alves, economista da Unifesspa e pesquisadora do tema, a CFEM não é um recurso pago por impacto ambiental ou social. Ela é uma compensação pelo uso do recurso dos minérios que são propriedade da União. 

Marabá, Canaã dos Carajás e Parauapebas, municípios onde moram as participantes da live e que realizam exploração mineral recebem a CFEM. Para a live, Larissa selecionou alguns dados a fim de mostrar o quanto este montante é significativo na receita dos municípios:

Apresentação da pesquisadora Larissa Alves para a live.

As informações são do projeto De Olho do CFEM, com o qual Larissa contribui. A iniciativa surgiu diante da pouca transparência no uso do dinheiro e de um contexto em que não se percebe uma melhoria na qualidade de vida das populações afetadas. 

A análise realizada sobre os três municípios aponta aumento da pobreza e crescimento da arrecadação. “À medida que eles se tornam mais ricos economicamente, pela receita das prefeituras, PIB e saldo das importações, a população pobre se torna mais vulnerável”, resume a economista.

O exemplo do município de Canaã dos Carajás, que mais arrecada CFEM no estado do Pará, é esclarecedor:

Apresentação da pesquisadora Larissa Alves para a live.

Entre 2012 a 2016, houve a redução do número de pessoas extremamente pobres, porém, a partir em 2016, essa vulnerabilidade voltou a crescer. Hoje, 42% da população de Canaã dos Carajás estão na linha da extrema pobreza ou na pobreza.

Saídas da mineração e da Covid-19

As reflexões trazidas pelas mulheres paraenses nessas lives deixa nítido que em contextos vulneráveis, como é o caso dos territórios vizinhos da mineração no sudeste do Pará, a covid-19 agudizou problemas já existentes. “Quando chegou esse tempo de pandemia, ficou claro que a gente não conseguiu a acompanhar o desenvolvimento [da mineração]. Os imóveis aumentam os preços e as pessoas que vieram das roças não conseguem comprar uma casa boa na cidade”, relatou Cristiane

É nesse contexto que essas mulheres, junto aos seus coletivos, têm experimentado alternativas que passam pela por processos de comercialização justas e comunitárias. “Começamos com pouco e hoje temos uma feira ecológica”, conta com satisfação Lindalva. Durante a pandemia, em conjunto com a Comissão Pastoral da Terra, elas ainda criaram uma feira delivery.

A permanência no campo e o modo de vida possível a partir da terra também contribuíram para o isolamento social de parte desta população durante a quarentena. “As pessoas estando na roça, em seus lugares do trabalho, não contraíram o vírus”, conta Cristiane. 

Essas experiências “mostram os sinais que fazer enfrentamento à mineração é fortalecer a atuação no povo na terra”, comentou Rose durante a live. Rebeca ainda destacou a experiência do Quintal Cultural em Parauapebas, dirigida por mulheres e que comercializa artesanato e alimentos, entre outros produtos. “Uma super iniciativa que confronta o modelo garimpeiro. Temos que reinventar na pandemia!”. 

Os planos pessoais não são menos importantes que as experiências coletivas de produção e de geração de renda. Lindalva, que trouxe para live o sonho e a realização de um assentamento que desenvolve experiências de sustentabilidade, conta que agora é tempo de se cuidar. Cristiane, que já quis fugir da atmosfera garimpeira, hoje vê alternativas: “eu, por um tempo, tinha muita vontade de ir embora. Hoje, considero que sou filha de Parauapebas. Ela é uma cidade que eu gosto”.

Veja um resumo da live.

 

Acompanhe o circuito de lives e escute as mulheres amazônidas

Para saber mais sobre o sudeste do Pará, o contexto de mineração e as estratégias desenvolvidas pelas mulheres amazônidas para sobreviver a esse modelo econômico e à crise da Covid-19, acompanhe o circuito de lives pelo site e pelo YouTube do Inesc.

A primeira live, “Mulheres amazônidas: a defesa dos territórios em tempos de crise” teve como tema a luta e a resistência das mulheres no contexto da pandemia e a mudança nas rotinas das atividades sociais. Já o segundo encontro trouxe para o centro do debate a questão econômica, a CFEM, o impacto econômico da mineração e a desigualdade. O próximo encontro, “Territórios camponeses frente à mineração: olhares sobre a questão fundiária, acontece dia 22 de setembro, às 17h, e discute o conflito fundiário, a disputa da mineração pelas terras da população local. 

Nota técnica do Inesc é utilizada em documento apresentado ao STF

Em agosto, o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) divulgou a Nota Técnica “Orçamento Público voltado para as comunidades quilombolas no contexto da pandemia Covid-19”. Elaborada por Carmela Zigoni, a Nota apresenta os dados do Orçamento Geral da União destinados ao financiamento de políticas públicas voltadas para comunidades quilombolas em 2020 e informações dos anos anteriores.

A ausência de recursos alocados em políticas públicas de desenvolvimento sustentável e regularização fundiária, e a não execução desses recursos (quando existentes) são algumas conclusões da Nota, que ainda chama atenção para a importância do auxílio emergencial. Os quilombolas atendem os critérios do programa, contudo, a maioria não foi incluída como beneficiária da transferência de renda por ter sua realidade de vida desconsiderada pelo governo federal.

Luta quilombola

A Nota Técnica do Inesc foi utilizada para a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 742  (ADPF/ 742) apresentada pela Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) ao Supremo Tribunal Federal nesta semana. Resumidamente, a ADPF pode ser entendida como uma ação destinada a combater o desrespeito aos conteúdos mais importantes da Constituição, como os direitos fundamentais.

O documento destaca como a Covid-19 afetou distintos setores da população brasileira de formas diferentes. Fatores como racismo estrutural e institucional colocaram as comunidades quilombolas em maior grau de vulnerabilidade aos efeitos da pandemia. De acordo com o levantamento autônomo da Conaq, até quarta-feira (09/09), o novo coronavírus havia infectado 4.541 pessoas e feito 157 vítimas entre os quilombolas. A taxa de letalidade desse grupo é de 3,6%, enquanto a da população em geral é de 3,1%.

Das várias informações contidas na Nota, a Conaq destacou a ausência de  políticas públicas específicas para comunidades quilombolas no Plano Plurianual (PPA) 2020-2023 e de políticas públicas de saúde específicas, incluídas no orçamento geral do Sistema Único de Saúde (cujo subfinanciamento foi de R$ 20 bilhões em 2020).

Outros dados relevantes apontados pelo Inesc também integraram a ADPF/ 742. Apesar da autorização de R$ 3,2 milhões da Ação Orçamentária para Reconhecimento e Indenização de Territórios Quilombolas, a ser executada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), nenhum recurso tinha sido pago até o fechamento da Nota. O mesmo aconteceu com os recursos destinados para a promoção da igualdade racial – mesmo em meio à crise de saúde.

Para Carmela Zigoni, o fato de a Nota Técnica denunciar o fim das políticas de igualdade racial no Brasil com o governo Bolsonaro é algo tão relevante que integrou a ADPF/ 742. “Além disso, a baixa execução de programas fundamentais para proteger os quilombolas, no meio de uma pandemia, revela o racismo institucional do governo, e a incapacidade de cuidar dos mais vulneráveis, aqueles com quem o Brasil tem uma dívida histórica”, diz Carmela.

Para ler o orçamento

Quando falamos de orçamento, são muitos os nomes e siglas que podem acabar dificultando nossa leitura e entendimento de materiais muito importantes para nos apropriarmos do orçamento público. Para ajudar nossas leitoras e leitores, apresentamos um resumo dos principais termos orçamentários adotados em nossas análises.

PPA, LDO e LOA

PPA é o Plano Plurianual. Ele é o responsável por definir estratégias, diretrizes e metas da administração pública para os próximos 4 anos. O PPA tem vigência do segundo ano de um mandato presidencial até o final do primeiro ano do mandato seguinte.

Anualmente, o Poder Legislativo precisa aprovar o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA). A Lei Orçamentária Anual (LOA) estima as receitas e programa as despesas de cada ano, e é regida pelo PPA e pela LDO.

PLOA e PPA são entregues juntos e ambos precisam ser aprovados pelo Legislativo até o dia 22 de dezembro..

LDO é a Lei de Diretrizes Orçamentárias, que traz regras para elaborar e executar o orçamento do ano seguinte, definindo prioridades e metas do governo.

 

Gostou? Se você quiser se aprofundar mais um pouco, acesse nossa metodologia Orçamento & Direitos, e nossa aula sobre orçamento público no Youtube.

Democracia Vive! discute os perigos que a democracia brasileira enfrenta

A live Democracia Vive! acontecerá no domingo, 13 de setembro, a partir das 15h. Organizada em palco virtual, é mais uma ação da campanha Brasil pela Democracia, da qual o Inesc faz parte. A proposta é falar com toda a população sobre  por que e como a democracia brasileira está em risco. Expor que desigualdade, desemprego, racismo, machismo, homofobia, desmatamento, fake news, violência, ataque às instituições formam o caldo que ameaça a democracia brasileira.

Alcione e Marcelo D2 cantarão juntos. Elza Soares e Flavio Renegado, também. Felipe Neto e Patrícia Campos Mello irão de prosa. Samuel Rosa e Djamila Ribeiro, de prosa e música. Lideranças de torcidas organizadas rivais estarão juntas em um bate-papo. Representantes da OAB, Centrais Sindicais, ABI, Ethos, MST e mais de 70 entidades, organizações e movimentos sociais vão dar a letra em três jograis. Terá todo tipo de som, de Lulu Santos a Odair José. Terá a palavra de quem cresceu na luta, como Preto Zezé ou se engajou nela pelo esporte, como Joanna Maranhão.

Todos e todas vão falar sobre democracia e vida, assunto que pulsa hoje nesse país que enterrou mais de 120 mil homens e mulheres vítimas de COVID-19, em cinco meses de pandemia; que tem 55 milhões de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza (com R$ 406/mês), 13 milhões de desempregados e 5,7 milhões de desalentados.

Brasil pela Democracia

A campanha é uma ampla rede da sociedade civil unida na defesa da democracia – ameaçada por incessantes ataques às instituições e aos princípios e valores da convivência democrática – e da vida – em risco pela irresponsabilidade e ineficiência no combate ao coronavírus.

Lançada em 29 de junho por 80 entidades e movimentos, tem coordenado ações virtuais e offline em todo o País. Em 13 de setembro, pensadores, artistas, pesquisadores, gente do povo e suas histórias se somarão aos demais atores que participaram de ações anteriores, como a Virada da Democracia, realizada em julho. Confira.

Programação da live

Apresentam
Roberta Estrela D’alva
China

Cantam
Lulu Santos
Odair José
Aíla
Salgadinho
Francisco El Hombre
Nanda Costa e Lan Lahn
Maciel Salú
Raul Ellwanger
Luna Vitrolira e Vinícius Terra

Falam
Danilo Pássaro, coordenador nacional do Movimento Somos Democracia e membro da Gaviões da Fiel)
Marcos Gama, fundador do Porcomunas e conselheiro do Palmeiras
Felipe Neto e Patrícia Campos Melo
Preto Zezé e Nilce Moretto
Célia Xakriabá e Joanna Maranhão
Paulo Galo e Eduardo Moreira
Ailton Krenak e Alice Braga

Encontros musicais
Alcione e Marcelo D2
Elza Soares e Flavio Renegado

Cantam e falam
Samuel Rosa e Djamila Ribeiro
B Negão e Maria Bopp
Kiara Felippe e Augusto Arruda de Botelho
Aíla e Paulo Vieira

Depoimentos
Lilia Schwarcz
Leonardo Sakamoto

A Palavra de quem criou a Campanha #BDV
Os presidentes e líderes das entidades que compõem a campanha darão a letra conjuntamente (ver a lista abaixo) em três jograis.

Saiba Mais

Live Democracia Vive
Organização – Campanha Brasil pela Democracia
13 de setembro, domingo
A partir das 15h
Onde: https://www.youtube.com/brasilpelademocracia

Site: www.brasilpelademocracia.org.br
Facebook: https://www.facebook.com/brasilpelademocracia
Twitter: https://twitter.com/bra_democracia
Instagram: https://www.instagram.com/brasilpelademocracia_

Nota técnica aponta medidas para País superar as consequências político-sociais da Covid-19

A nota técnica “Recuperação ou reconstrução econômica? As opções do Brasil diante de uma crise sem igual e de soluções globais assimétricas”, de Antonio Lassance, é o resultado de reflexões sobre a crise mundial provocada pela pandemia da Covid-19. No texto, o doutor em Ciência Política pela Universidade de Brasília (UnB) e associado do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), adverte sobre o impacto econômico ser apenas a ponta do iceberg de uma grande crise humanitária que pode se prolongar por várias décadas.

Publicada em setembro de 2020, a nota deixa uma série de provocações relevantes para pensar não só o caso brasileiro, mas de todo o mundo. De acordo com o autor, “a grande pergunta que se coloca, no entanto, não é o que a pandemia e a recessão que a acompanha farão dos países por elas afetados. A grande pergunta é o que as sociedades e seus governos farão para superar o atual desastre”.

O alastramento pandêmico das contaminações e mortes em decorrência da Covid-19 é um problema de longo prazo que exigirá não apenas recuperação, mas reconstrução de vários empreendimentos. Uma solução que parece ser efetiva, com avanços significativos, é aplicar um plano que reforce inserção internacional soberana do país.

Para tal projeto, Lassance indica três passos: reatar os laços multilaterais com os parceiros continentais da América do Sul; desenhar uma política ampla e integrada de reconstrução econômica (revisando o Plano Plurianual); e criar uma nova arquitetura das finanças públicas, com a introdução de requisitos de progressividade tributária.

Analogia do Plano Marshall

O cenário atual leva a uma inevitável comparação às medidas aplicadas pelo Plano Marshall, programa de ajuda econômica dos Estado Unidos aos países da Europa Ocidental após a II Guerra Mundial, entretanto, o associado do Inesc aconselha cuidado com essa analogia.

“Qualquer programa de reconstrução econômica com a envergadura que a atual crise demanda para o Brasil exigirá uma sustentabilidade de longo prazo pouco compatível com reformas que estejam atinentes apenas às variáveis de gasto público. As características da crise impõem expansionismo de gastos e, eventualmente, da base monetária do país, e sobretudo expansão das fontes e do volume de receita. Na ausência desses fatores, qualquer alusão genérica ao Plano Marshall é descabida e tímida a uma tarefa de reconstrução”, opina Lassance.

Recomendações

O documento ainda traz outras recomendações, como prioridade à conclusão de projetos já iniciados; reforço do papel de coordenação e cooperação técnica dos órgãos

Federais; garantia da sustentabilidade fiscal do setor público; e aplicação de soluções transparentes; consistentes e baseadas em evidências. Dessa maneira, Antonio Lassance acredita que é possível evitar que o esforço de reconstrução seja “capturado por grupos predatórios, interessados em vantagens restritas e ineficientes”.

Lassance também aponta a importância em definir prioridades de médio e longo prazo com uso do método de coordenação aberta, que consiste em fixar objetivos bem definidos e metas gerais no âmbito da política, sem deixar de lado os programas e as propostas de entrega.

“Transpondo esse desafio para atual crise da Covid-19, torna-se necessária a prorrogação dos auxílios emergenciais às famílias, enquanto persistir a pandemia e suas consequências econômicas, e a facilitação do crédito às empresas”, observa Lassance, que sugere políticas de recuperação em programas adaptados às dinâmicas econômicas regionais e locais, incorporando estados, municípios e Distrito Federal como proponentes.

 

Nota de pesar: Edelcio Vigna, presente!

Foi com muita tristeza que recebemos a notícia da morte de Edelcio Vigna, a quem chamávamos carinhosamente pelo apelido de “Del”.

Edelcio começou a trabalhar no Inesc em 1988, quando ajudou a consolidar a Instituição, no período da abertura democrática, como importante mediadora entre a sociedade civil organizada e os parlamentares. Esteve conosco até 2013, deixando sua marca de dedicação, alegria e companheirismo.

O compromisso de Edelcio com as pautas e reivindicações dos movimentos sociais, especialmente os movimentos camponeses que lutam por reforma agrária, além de sua participação ativa na Assembleia Constituinte, fez com que seu trabalho fosse reconhecido em diversas ocasiões por importantes atores da sociedade civil.

Lamentamos profundamente a perda de mais uma vida para a Covid-19 e estendemos nossas condolências e solidariedade aos familiares e amigos neste momento tão difícil.

Cuidado com a pegadinha do governo sobre renda básica permanente!

O governo brasileiro e o Congresso Nacional estão dando todos os sinais de que pretendem instituir uma Renda Básica permanente no Brasil. Mas tem uma pegadinha: a equipe econômica tem falado de uma política tímida, em valores muito baixos, e que na prática eliminaria outros programas sociais para substituí-los por um pior e que atende menos gente. Não podemos deixar isso acontecer!

Por isso, as 270 organizações e redes que compõem a campanha Renda Básica Que Queremos elaboraram um documento com critérios a serem considerados pelos parlamentares na criação de uma política que atenda de fato a busca por equidade e direitos de cidadania.

É importante reconhecer e fortalecer o sistema de proteção social construído desde o processo constituinte de 1988. Vários sistemas e políticas públicas foram criados, que mesmo com limites, possibilitaram avanços significativos na construção de uma sociedade mais igualitária e justa. Citamos o SUS, SUAS, universalização da educação, políticas de fortalecimento da agricultura familiar e segurança alimentar e de enfrentamento à fome, além do próprio Programa Bolsa Família. Portanto uma Renda Básica Permanente deve ser implementada sem prejuízo de outras políticas de proteção social já implementadas.

>>> Leia o documento aqui

A lei da Renda Básica emergencial foi aprovada no Congresso em março, após uma grande campanha da sociedade civil, proposta por cinco organizações, entre elas o Inesc. Saiba mais sobre a campanha em www.rendabasica.org.br

Entidades pedem que Bolsonaro vete proposta que transfere dinheiro do Fundo Social do Pré-Sal para gasodutos

O Congresso Nacional aprovou, no último dia 13, proposta que prevê a transferência de recursos do Fundo Social do Pré-Sal para expandir rede de gasodutos do País. Um conjunto de 12 organizações sociais, entre elas o Inesc, publicou nota onde pede que o presidente Jair Bolsonaro vete a proposta.

Entre os argumentos utilizados pelas entidades está o respeito à legislação relativa ao Fundo Social, que determina que parte dos recursos provenientes das empresas que exploram as áreas do Pré-Sal seja usada para programas nas áreas de combate à pobreza, como educação e saúde pública – ainda mais essenciais em um contexto de crise econômica e social decorrente da pandemia do novo coronavírus.

Outro argumento utilizado foi o de que a medida cria um novo subsídio aos combustíveis fósseis que poderá estimular distorções no setor. “Vale lembrar que o setor de petróleo e gás já é extremamente subsidiado: somente o Regime Aduaneiro Especial de Exportação e de Importação de Bens Destinados às Atividades de Pesquisa e de Lavra das Jazidas de Petróleo e de Gás Natural (REPETRO), durante o período de 2015 a 2019, apresenta renúncias próximas à R$ 74 bilhões”, afirma a nota. Desde 2018, o Inesc publica estudos sobre os impactos climáticos, sociais e ambientais dos subsídios aos combustíveis fósseis no Brasil.

Confira a íntegra da nota e as instituições signatárias abaixo:

Brasduto: Tirar recursos da saúde e educação para subsidiar projetos de transporte de gás natural é apostar contra o Brasil

A possibilidade de transferência de recursos do Fundo Social do Pré-Sal para financiar a construção de gasodutos precisa ser vetada pela Presidência da República na sanção do Projeto de Lei do Senado 3.975, de 2019, como acordado na negociação do Executivo com o Senado. O projeto, que foi aprovado no dia 13 de agosto, prevê que o Fundo de Expansão dos Gasodutos de Transporte e de Escoamento da Produção (Brasduto) receba 20% dos recursos do Fundo Social.

Criada em 2010, a legislação relativa ao Fundo Social determina que parte dos recursos provenientes do petróleo e gás natural que a União recebe das empresas que exploram as áreas do Pré-Sal seja usada para programas nas áreas de combate à pobreza, como educação e saúde pública. Estimativas do governo indicam que o Fundo perderia R$ 97 bilhões no período de 2020 a 2040 com a criação do Brasduto[1].

A crise causada pela pandemia de Covid-19 reforça a importância dos investimentos em atividades que contribuam com o desenvolvimento humano e, consequentemente, a recuperação da economia. Não é criando distorções de mercado, subsidiando fontes fósseis de energia e retirando recursos de educação e saúde que será possível atingir isso.

A criação do Brasduto também vai em direção contrária às propostas liberalizantes defendidas pelo próprio setor de gás natural em legislação sobre o assunto que tramita no Congresso Nacional, como detalhado a seguir:

 

  • Os recursos do Fundo Social são fundamentais diante das condições socioeconômicas do país, tornando-se ainda mais relevante neste momento de grave crise econômica e social devida aos impactos da pandemia.
  • A possibilidade de uso dos recursos para construção de gasodutos contraria a legislação de criação do Fundo Social, que determina que a política de investimentos dos recursos tem por objetivo buscar a rentabilidade, a segurança e a liquidez de suas aplicações e assegurar sua sustentabilidade econômica e financeira para o devido cumprimento de suas finalidades. Importante frisar que, pela lei do Brasduto, as empresas só teriam de devolver o dinheiro quando os gasodutos se tornarem economicamente viáveis, o que abre a possibilidade de que sejam aplicados a fundo perdido e nunca devolvidos aos consumidores.
  • A iniciativa estimula a expansão do setor de combustíveis fósseis, que é a principal causa das mudanças climáticas. Está na contramão, portanto, da tendência de governos e iniciativa privada trabalharem em favor do desenvolvimento das fontes renováveis de energia.
  • A medida cria um novo subsídio que poderá estimular distorções no setor, favorecendo a construção de gasodutos que não necessariamente possuem viabilidade econômica e que poderão se tornar verdadeiros elefantes brancos inclusive por risco de faltar gás para transportar. Vale lembrar que o setor de petróleo e gás já é extremamente subsidiado: somente o Regime Aduaneiro Especial de Exportação e de Importação de Bens Destinados às Atividades de Pesquisa e de Lavra das Jazidas de Petróleo e de Gás Natural (REPETRO), durante o período de 2015 a 2019, apresenta renúncias próximas à R$ 74 bilhões[2].
  • Os gastos com saúde e a educação já vêm sofrendo graves cortes no orçamento, que se acentuaram após o Teto dos Gastos. Entre 2014 e 2019 a função “educação” sofreu uma perda de R$ 20 bilhões de execução orçamentária. Já o orçamento do Ministério da Saúde em 2019 apresentou o mesmo patamar, em valores reais, do orçamento de 2014, mostrando a estagnação de recursos para uma área prioritária. Precisamos inverter essa lógica, pois investimentos em saúde e educação são a base para o desenvolvimento de qualquer sociedade. No caso da saúde, isso foi evidenciado pela pandemia da Covid-19. Quanto à educação, vale lembrar que esse foi o caminho adotado por todas as nações que deram saltos de desenvolvimento nas últimas décadas.

A proposta é um contrassenso diante da perspectiva de liberalização do setor viabilizada pela nova Lei do Gás, em discussão no Congresso Nacional. Seguindo a lógica desse projeto de lei, os projetos de gasodutos devem ser estruturados de modo a atrair investidores privados interessados no segmento, por meio do mercado de capitais, como acontece em segmentos semelhantes de infraestrutura, como linhas de transmissão.

Pelos motivos narrados, as organizações da sociedade civil brasileira abaixo listadas pedem  o veto presidencial a esse dispositivo do PLS 3975/2019.

 

ENTIDADES SIGNATÁRIAS:

Associação Alternativa Terrazul

ECOA – Ecologia e Ação

Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Socioambiental

ICS – Instituto Clima e Sociedade

IDEC – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor

IEMA – Instituto de Energia e Meio Ambiente

INESC – Instituto de Estudos Socioeconômicos

International Rivers

ISA – Instituto Socioambiental

PSA – Projeto Saúde e Alegria

Uma Gota no Oceano

WWF-Brasil

[1] https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,congresso-retira-r-242-bi-de-saude-e-educacao-e-passa-a-estados-e-gasoduto,70003400226 

[2] https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2020/08/regularizacao-de-plataformas-e-cambio-elevam-a-r-28-bi-beneficio-fiscal-do-petroleo-em-2019.shtml

 

Em audiência na Câmara dos Deputados, Inesc denuncia descaso com a população negra e quilombola

Na tarde de quarta-feira (26/08), a assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Carmela Zigoni, participou da audiência pública virtual Impacto da Covid-19 nas populações negras e quilombolas, promovida pela comissão externa da Câmara dos Deputados.

Participaram da audiência parlamentares, especialistas e representantes da sociedade civil, entre eles, Carmela Zigoni, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).

Carmela apresentou dados do relatório Brasil com Baixa Imunidade, lançado em abril, que apontou o corte de 80% dos recursos do programa Enfrentamento ao Racismo e Promoção da Igualdade Racial, entre os anos de 2014 e 2019; e as consequências da extinção do Programa 2034 no novo Plano Plurianual 2020-2023. Além da ausência de recursos, exclui-se todas as menções aos públicos negro e quilombola, bem como ao racismo, do PPA.

Responsável por mulheres, idosos, indígenas, crianças e adolescentes, entre outras populações vulneráveis, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos também sofreu corte de recursos. O relatório comprova uma redução de 75%, entre 2014 e 2019, e a utilização de apenas 13% (R$ 77 milhões) dos R$ 575 milhões disponíveis atualmente.

Desmonte da política pública

O desmonte das políticas para quilombolas é nítido e foi destaque na apresentação de Carmela. Desde 2017, não há recurso disponível para regularização fundiária (Ação 210Y) e, desde 2018, acontece o mesmo em relação ao recurso para apoio ao desenvolvimento sustentável (Ação 210Z). A Fundação Palmares teve autorizado um recurso de R$ 21,3 milhões, contudo, não há rubrica específica para a população quilombola; e, dos R$ 115 mil autorizados para o Ministério (a serem utilizados com os quilombolas), até a terça-feira (25/08), nada tinha sido pago.

A assessora política do Inesc ainda relembrou que a maior parte dos infectados e das vítimas de Covid-19 são negros e pobres, afetados também com as consequências do Teto de Gastos em áreas como a saúde, que perdeu R$ 20 bilhões, e Urbanismo, que teve corte de 20% do orçamento desde o início da política de austeridade, e cujos recursos deveriam ser gastos com saneamento, mobilidade urbana e moradia.

“Dos 500 bilhões autorizados pelo Congresso Nacional para enfrentamento da Covid-19, 61% foram executados até agora. Em junho, como o Inesc denunciou, esse percentual era de apenas 30%. Os números melhoraram desde então, mas muito pouco”, comentou Carmela, que ainda ressaltou a importância da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2021: “Fazemos um apelo que seja observado pelo Congresso Federal: a pandemia não vai acabar dia 31 de dezembro de 2020”.

Todos os anos, a Lei de Diretrizes Orçamentárias define o destino dos recursos públicos do ano seguinte. Em um cenário de pandemia, tais recursos e sua destinação se tornam ainda mais relevantes, sobretudo, para a população negra e quilombola.

Também participaram da audiência: Luciana Valéria Pinheiro Gonçalves (Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos); Angela Pires Terto (ONU); Anatalina Lourenço (Central Única dos Trabalhadores); Valdecir Nascimento (Fórum Permanente de Igualdade Racial/Articulação de Organizações de Mulheres Negras Brasileiras); Selma Dealdina (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas); Douglas Belchior (Coalizão Negra por Direitos) e Marcia Alves (grupo temático Racismo e Saúde da Associação Brasileira de Saúde Coletiva).

Entre os parlamentares presentes, estiveram as deputadas Áurea Carolina (PSOL/MG), Jandira Feghali (PCdoB/RJ) e Erika Kokay (PT/DF); e os deputados Bira do Pindaré,  (PSB/MA), Alexandre Padilha (PT/SP) e Marcelo Freixo (PSOL/RJ). Freixo frisou a ausência de um Ministro da Saúde há 102 dias e a importância da manutenção do valor do auxílio emergencial, além da ampliação do mesmo para a população que ainda não foi contemplada.

Confira a íntegra da audiência pública:

 

 

 

Livro analisa as relações entre desigualdades sociais e orçamento público

O livro “Gênero e raça no orçamento público brasileiro”, organizado por Elaine de Melo Xavier, já está disponível para download. Resultado de uma série de estudos que abordam a relação de mulheres, negras e negros com o Orçamento Geral da União (OGU), a obra evidencia os fatores que limitam a presença e atuação desses grupos no orçamento público.

De acordo com Roseli Faria, presidente da Assecor (Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Planejamento e Orçamento), responsável pela publicação, o livro é uma reflexão sobre orçamento público e desigualdades sociais e “um chamado para a ação e transformação do país em uma sociedade mais justa e solidária”.

“Gênero e raça no orçamento público brasileiro” pode ser obtido gratuitamente nos sites da ARCA  (Articulação Nacional de Carreiras Públicas)  e da Assecor.

Branquitude, racismo institucional e machitude

“Branquitude e racismo institucional no planejamento e orçamento governamental”, de Elton de Melo, abre o livro com reflexões sobre as características da branquitude na gestão das finanças públicas. Os impactos do racismo institucional no orçamento público também aparecem em “A questão do racismo no orçamento público”, de Carmela Zigoni, assessora política do Inesc.

Carmela coloca luz no orçamento público e em sua conexão com as questões raciais no Brasil, considerando a metodologia Orçamento & Direitos desenvolvida pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc). Dessa maneira, a assessora política do Inesc analisa a evolução do orçamento entre os anos 2015 a 2019, considerando o marco das políticas públicas voltadas para a população negra no Brasil, partindo da Constituição Federal de 1988, e perpassando as conquistas de direitos alcançadas por meio de legislações específicas e espaços de participação social institucionais.

Ao longo do artigo, dados comprovam como o orçamento público federal é uma importante evidência do racismo institucional brasileiro e como a  promoção da igualdade racial não foi priorizada nos anos analisados.

“Pudemos observar casos de desmonte da política pública de igualdade racial e superação do racismo incipientemente montada no Brasil. Além de representarem uma parte ínfima dos orçamentos autorizados, as políticas existentes tiveram baixa execução e não contaram com um esforço de Estado para se estruturarem em outras esferas de governo, como estados e municípios”, constata Carmela ao final do texto.

A questão de gênero aparece com mais  intensidade nos capítulos seguintes “Machitude no planejamento governamental”, “Mulheres e orçamento público: uma análise da participação feminina na Comissão Mista de Orçamento do Congresso Nacional entre 1990 e 2019” e “O impacto do teto dos gastos sobre as mulheres: subsídios à reflexão”, de Otávio Ventura, Júlia Rodrigues e Eliane Xavier, respectivamente.

O artigo de Eduardo Gomor, “O outro lado do orçamento público: sistema tributário e racismo estrutural” completa o livro com análises sobre a arrecadação de recursos públicos no país. Tal arrecadação é feita a partir da renda do trabalho e por meio dos impostos sobre o consumo de bens e serviços, medida que acaba penalizando a população mais pobre no Brasil.

Semana de Orçamento e Direitos debateu prioridades do orçamento público em série de lives

Entre os dias 17 e 22 de agosto, o Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) promoveu a Semana de Orçamento e Direitos com o intuito de facilitar o entendimento do orçamento público para todos e todas. Além de mostrar que não é necessário um diploma de economista para compreender o tema, o evento destacou como o orçamento público é fundamental para promover e fortalecer a cidadania.

O Curso para Jornalistas: Entendendo o Orçamento Público, com Livi Gerbase e Luiza Pinheiro, assessoras políticas do Inesc, abriu a série de atividades da Semana. Durante duas horas, jornalistas de todo país ouviram sobre os principais conceitos do orçamento público; conheceram a metodologia de Orçamento e Direitos do Inesc; e aprenderam como pesquisar nos principais portais de orçamento do governo, como Portal da Transparência, Siga Brasil e Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento do Governo Federal (Siop). Não conseguiu acompanhar? Confira:

Na sequência, o vídeo sobre Participação popular e orçamento público promoveu uma conversa entre José Antônio Moroni, co-diretor do Inesc, e Eloiza de Souza (14 anos) e Vitor Batista (13 anos), adolescentes do Projeto Onda, iniciativa do Inesc que leva o tema dos direitos humanos e do orçamento público para escolas públicas do Distrito Federal.

O co-diretor do Inesc respondeu algumas questões, entre elas,  como as pessoas podem participar das elaboração das leis orçamentárias e influenciar demandas que considerem prioritárias. “Quando falamos sobre incidência, queremos dizer que isso é o direito que o povo tem de ir até aos governantes e apresentar sua demandas, fazer com que elas sejam consideradas e atendidas. As pessoas têm o direito de participar das decisões”, explicou Moroni. Assista:

Preto Zezé, presidente global da Central Única das Favelas (CUFA); Thallita Oliveira, educadora do Inesc; e Fábio Pereira, participante do projeto Juventudes nas Cidades/DF participaram da live Como o orçamento público chega nos jovens da periferia, com a mediação de Markão Aborígine, educador do Inesc.

Fábio Pereira falou sobre as dificuldades diárias dos jovens de periferias, principalmente negras e negros, e do impacto da falta de orçamento na vida delas e deles. Ele também apontou a urgência na mobilização das juventudes, periféricas, negras, indígenas, quilombolas, LGBTQIA+ para que, juntas e juntos, consigam mobilizar a criação de um orçamento público na defesa de seus direitos.

Thallita ressaltou a importância de construir um conhecimento em torno do orçamento público para que seja possível repassá-lo para as comunidades e, assim, construir um diálogo transformador, que seja capaz de resistir às violências diárias.

Na mesma linha, Preto Zezé destacou o porquê de “traduzir a política e o orçamento para o ‘favelês’”. “Dinheiro não é do político, não é do gestor, é da gente. Tem que ir lá nas assembleias e nos políticos e perguntar onde está o dinheiro!”, disse.

O palestrante também apontou para a recorrência de pessoas negras na “agenda de reparação” dos governos, como secretaria com recorte de gênero e raça, porém, ausentes nas áreas de desenvolvimento econômico. “Não queremos misericórdia. Nós queremos divisão de poder e liberdade real por inteiro, não pela metade. Temos que entender que orçamento público passa pela disputa de poder real”, finalizou. Assista a íntegra da live:

Por um Brasil sem desigualdades

No dia em que comemorou 41 anos de atividades, o Inesc transmitiu para o público a live Como o orçamento público ajuda a combater as desigualdades com Iara Pietricovsky, co-diretora do Inesc, e Jefferson Nascimento, coordenador de Pesquisa e Incidência em Justiça Social e Econômica da Oxfam Brasil.

Há anos, Inesc e Oxfam têm trabalhado juntas pensando em estratégias para o fim de injustiças sociais e das desigualdades de raça, gênero e classe.

Iara chamou atenção para o valor da informação e de sua disseminação. “O Brasil é um país tão desigual que algumas pessoas acham que isso é natural. Precisamos fornecer ferramentas pra mostrar que não é bem assim”, disse a co-diretora do Inesc, que ainda fez uma fala otimista sobre o cenário brasileiro.

“O dia que o brasileiro entender o que significa estar na estrutura desigual que estamos hoje, aí conseguiremos partir para uma luta radical. Eu me recuso a ter uma visão pessimista do futuro”.

Assista ao vídeo da conversa:

O papel do orçamento público no combate às desigualdades continuou na live Como o orçamento público pode ajudar na luta antirracista, que encerrou a Semana de Orçamento e Direitos, com Felipe Rodrigues, integrante da Rede de Economistas Pretas e Pretos; Dyarley Vianna, assessora técnica do Inesc; e Carmela Zigoni, assessora política do Inesc (moderação).

Carmela trouxe a dimensão orçamentária na área dos direitos humanos e alguns dados sobre desigualdade racial no Brasil. Mestre em economia pela Universidade Federal Fluminense, Felipe abordou as consequências negativas da austeridade fiscal na vida de pessoas negras.

Como mulher, educadora, periférica e militante, Dyarley apontou como o teto de gastos influencia as pessoas negras, principalmente, as mulheres. “Essa disputa entre economia e vida não é nova no Brasil. Nosso país tem muita dificuldade de reconhecer humanidades”, frisou Dyarley. Confira a íntegra do debate:

Em cinco dias de eventos, mais de 1.500 pessoas assistiram as lives da Semana de Orçamento e Direitos. Os vídeos seguem disponíveis no canal do Inesc no Youtube.

A live De que lado a corda arrebenta? Os recursos da mineração e a desigualdade em tempos de pandemia marcada para o dia 18 de agosto não aconteceu na data prevista por problemas técnicos. Ela será transmitida no dia 1º de setembro, às 17h, no canal do Inesc no Youtube.

41 anos em defesa dos direitos humanos

No dia 20 de agosto, o Instituto de Estudos Socioeconômicos completou 41 anos de luta pelos direitos humanos e pela democracia no Brasil e no mundo. Fundado por Maria José Jaime, a Bizeh (1941- 2007), o Inesc esteve presente em vários momentos históricos do país, entre eles: nas demandas de movimentos sociais para a Constituição Federal (década de 1980); na criação do Estatuto da Criança e do Adolescente (1990); e na organização de um seminário inédito (2003) sobre o Plano Plurianual da União, que influenciou a realização de diversas audiências públicas em todo Brasil para falar de orçamento público – o principal tema de trabalho da instituição até hoje.

Em 2019, o Festival “Mais direitos, mais democracia” celebrou as quatro décadas do Instituto com shows, feira de artesanato e Banquinha dos Direitos Humanos, em que funcionárias e funcionários do Inesc explicaram de forma lúdica os principais temas da instituição: direitos humanos, democracia e orçamento público.

Mesmo com pandemia, governo gastou menos com saúde indígena em comparação a igual período de 2019

A chegada da pandemia nos territórios indígenas encontrou a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas já deteriorada, após os cortes sucessivos em nome do cumprimento do teto de gastos públicos estabelecido pelo governo. O que ninguém esperava é que, mesmo em situação precária, o governo federal gastasse menos verba neste primeiro semestre para proteger os índios do coronavírus, em comparação a igual período de 2019.

Considerando o valor autorizado da ação “Promoção, Proteção e Recuperação da Saúde Indígena”, houve uma queda de 9% (R$ 1,54 bilhão para R$ 1,39 bi), entre 2019 e 2020. Em todo o período da gestão Bolsonaro, a redução chega a 14% entre 2018 e 2020, conforme o gráfico abaixo:

Os números pertencem a uma nota técnica elaborada pelo Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) e a pedido do Conselho Nacional de Direitos Humanos, com o intuito de sensibilizar os senadores a rever os vetos feitos pelo presidente Jair Bolsonaro ao PL 1142/2020. Originado na Câmara, o Projeto de Lei havia proposto medidas de proteção social para prevenção do contágio e da disseminação da Covid-19 entre os povos indígenas, as comunidades quilombolas e demais comunidades tradicionais.

Contudo, quando o documento chegou ao Poder Executivo, diversos pontos de apoio a essas populações foram vetados como, por exemplo, a obrigatoriedade do fornecimento de acesso à água potável, a distribuição gratuita de materiais de higiene, limpeza e de desinfecção para as aldeias indígenas, a liberação de verba emergencial para a saúde indígena e a instalação de internet naquelas regiões.

“Apesar da chegada do novo coronavírus, não houve recomposição orçamentária nem mesmo por créditos extraordinários, o que seria tanto justificado pela vulnerabilidade indígena diante da pandemia como autorizado pelo regime fiscal especial decorrente da emergência sanitária”, explica Leila Saraiva, assessora política do Inesc.

Segundo ela, os investimentos em Saúde Indígena ainda continuam em queda neste ano. “É um contrassenso diante dos efeitos devastadores na pandemia entre povos indígenas”, lamenta a assessora.

A pesquisa do Inesc também apontou que, nos meses em que a pandemia já estava instaurada nos territórios indígenas, os valores liquidados foram significativamente menores que os liquidados em igual período de 2019. Em abril e maio, a queda chega à casa dos R$ 100 milhões. Somente em junho esse quadro se reverte, o que indica a demora para a efetivação de uma atuação robusta para conter o vírus.

Como exemplo da redução dos gastos, o Inesc trouxe o caso de dois Distritos Sanitários Especiais Indígenas mais afetados pela pandemia: DSEI Leste-RR e DSEI- Rio Tapajós. Constatou-se que não houve aumento significativo de gastos em itens essenciais para o enfrentamento do novo coronavírus nos meses em que a pandemia já estava instaurada nas comunidades. Os gastos com táxi-aéreo, utilizados para transporte de paciente no âmbito do DSEI -Rio Tapajós, foram mais altos no começo do ano do que quando a pandemia já estava instaurada.

A justificativa dada pelo secretário de Saúde Indígena, Robson Santos da Silva, diante dos números apresentados pelo Inesc em reunião da Comissão Externa do Coronavírus da Câmara dos Deputados, não condiz com os dados orçamentários. Silva afirmou que a queda dos valores liquidados se explicava pela paralisação das obras.

No entanto, a Nota Técnica demonstra que o Plano Orçamentário referente às obras é pouco relevante nos gastos da Sesai e a queda orçamentária se deu mesmo nas atividades que dizem respeito ao atendimento à população indígena.

Leia a íntegra da Nota Técnica “Execução orçamentária da Saúde Indígena diante da pandemia do novo coronavírus”

Governo federal dá ao Ministério da Defesa 84% de parte dos recursos recuperados pela Lava Jato

O governo federal entregou ao Ministério da Defesa 84% de parte dos recursos recuperados pela Lava Jato, que tinham como destino financiar ações na Amazônia Legal voltadas à prevenção, fiscalização e combate aos incêndios florestais. Esse percentual equivale a um montante de R$ 530 milhões para os militares de um total de R$ 630 milhões recebidos pela União, segundo informações do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).

Para entender o caso, é preciso voltar a setembro de 2019, quando foi homologado o acordo anticorrupção vinculado à operação Lava Jato (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF 568[i]) no qual coube à Petrobrás o pagamento de R$ 2,6 bilhões.

Na repartição do recurso coube à Amazônia Legal o valor de R$ 1,06 bilhão[ii] com base no entendimento consensual do Supremo Tribunal Federal acerca da relevância de despesas decorrentes de situações extraordinárias e urgentes que exigem ações imediatas do Estado brasileiro na Amazônia. O acordo previa a distribuição do recurso destinado à Amazônia Legal em duas partes:

A primeira parte, um total de R$ 430 milhões, foi enviada aos estados da Amazônia Legal, com a distribuição calculada levando em consideração vários critérios: área do estado, focos de queimada, área desmatada, população, PIB per capita. A princípio, a cifra seria inteiramente distribuída aos órgãos ligados ao meio ambiente, tais como Ibama (R$ 230 milhões), MAPA (R$ 60 milhões) e Incra (R$ 140 milhões). Contudo, a pandemia vinda em 2020 fez com que boa parte da quantia fosse redirecionada ao combate ao Covid na região, com autorização judicial.

a segunda parcela da verba, de R$ 630 milhões, teve como principal destinatário o Ministério da Defesa, que abocanhou R$ 530 milhões, ou 84% do total, conforme tabela abaixo:

Orçamento para a Garantia da Lei e da Ordem (GLO)

Na avaliação das assessoras políticas responsáveis pelo estudo no Inesc, o que também chama atenção é o fato de os recursos estarem sendo remanejados para a Defesa por meio de uma operação conhecida como GLO (Garantia da Lei e da Ordem (GLO). As GLOs foram criadas pela Lei Complementar Nª 97 de 1990, para uso de caráter episódico e ser realizada em área previamente estabelecida e por tempo limitado. Além disto, uma operação desse porte somente deveria ser acionada após esgotados os instrumentos destinados à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, relacionados no art. 144 da Constituição Federal.

O ano de 2018 foi o primeiro em que operações de GLO receberam dotação explícita no Orçamento Público da União, na forma de uma ação orçamentária, que supõe permanência e existência do instrumento como parte de uma Política Pública. Na ocasião, foram decretadas cinco operações de GLO, quatro sucessivas para o estado de Roraima (crise migratória venezuelana) e uma em função da greve dos caminhoneiros.

Já em 2019 surgiram mais operações de GLO. No primeiro semestre, houve 01 para segurança da XI Cúpula do BRICS, 02 para segurança de penitenciárias federais, em Porto Velho e no Rio Grande do Norte. Em agosto, veio a terceira operação, desta vez, na Amazônia. Implantada em 24 de agosto, por meio do Decreto Nº 9.985/2019, o decreto teve seu prazo de validade ampliado, e hoje essa GLO perdura até o próximo dia 06 de novembro.

Em síntese, o texto dos decretos estabelece autorização para o emprego das Forças Armadas na GLO e em ações subsidiárias[i], na faixa de fronteira, nas terras indígenas, nas unidades federais de conservação ambiental e em outras áreas federais nos Estados da Amazônia Legal em caso de requerimento do Governador do respectivo Estado ao Presidente da República.

As ações previstas neste escopo incluem “ações preventivas e repressivas contra delitos ambientais, direcionada ao desmatamento ilegal; e o combate a focos de incêndio”, a serem executadas sob a coordenação dos comandos designados pelo Ministério da Defesa. Adicionalmente, os Decretos deixam explícito que as iniciativas dos órgãos e as entidades públicas federais de proteção ambiental deverão ser submetidas à coordenação dos Comandos.

Hoje, a coordenação das operações de GLO na Amazônia está sob a responsabilidade do Vice-Presidência da República, que também passou a presidir o Conselho da Amazônia, recriado pelo Decreto Nª 10.239 em fevereiro de 2020 com a competência de coordenar e acompanhar a implementação das políticas públicas relacionadas à Amazônia Legal.

Orçamento favorece militarização na Amazônia

A análise orçamentária do Inesc conclui que a destinação de elevados montantes de recursos públicos se dá em detrimento à melhor estruturação dos órgãos e das políticas já existentes que sempre se mostraram eficientes para combater o desmatamento. Ao recorrer às operações de GLO, o governo federal quer fortalecer a militarização na Amazônia, simulando uma situação inverídica de “esgotamento dos instrumentos destinados à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio”, como preconiza uma GLO.

Além do seu caráter “espetacular”, essas operações têm sido equivocadas para resolver o problema do desmatamento, assim como constata-se a inação das forças armadas para deter o garimpo ilegal em Terras Indígenas que atenta frontalmente contra a ordem pública, a incolumidade das pessoas indígenas e o patrimônio da própria União.

“A escolha pela não destinação de recursos da Lava Jato para a Funai para ação de fiscalização das Terras Indígenas, reforça, ainda mais o desmonte do órgão e o aparelhamento do Estado para uma estratégia de abertura das Terras indígenas a todas as formas de exploração econômica – garimpo, hidrelétricas, mineração e todas suas infraestruturas”, afirma o relatório do Inesc.

Este contraste evidencia a política em voga para a região, para quem os povos indígenas e comunidades tradicionais representam um atraso ao desenvolvimento econômico do país e que vê na atuação militar o motor para povoar o que eles chamam de “deserto verde”.

Teses dessa natureza mantêm um profundo enraizamento nas forças armadas, sendo reiteradamente afirmadas nos sucessivos Planos Nacionais de Defesa (PND) e Estratégia Nacional de Defesa (END). Nos últimos dois anos, sob a égide do Governo Bolsonaro, a visão de mundo e da Amazônia dos militares voltou a adquirir contornos mais explícitos na atuação do Estado[ii]. A revisão do Plano e da Estratégia da Defesa submetida à apreciação do Congresso Nacional em 22 de julho de 2020[iii] revela exatamente esse propósito:

A defesa da região amazônica será encarada, na atual fase da História, como o foco de concentração das diretrizes resumidas sob o rótulo dos imperativos de monitoramento/controle e de mobilidade. Não exige qualquer exceção a tais diretrizes e reforça as razões para segui-las. As adaptações necessárias serão as requeridas pela natureza daquela região em conflito: a intensificação das tecnologias e dos dispositivos de monitoramento a partir do espaço, do ar e da terra; a primazia da transformação da brigada em uma força com atributos tecnológicos e operacionais; os meios logísticos e aéreos para apoiar unidades de fronteira isoladas em áreas remotas, exigentes e vulneráveis; e a formação de um combatente detentor de qualificação e de rusticidade necessárias à proficiência de um combatente de selva. O desenvolvimento sustentável da região amazônica passará a ser visto, também, como instrumento da defesa nacional: só ele pode consolidar as condições para assegurar a soberania nacional sobre aquela região. Dentro dos planos para o desenvolvimento sustentável da Amazônia, caberá papel primordial à regularização fundiária. Para defender a Amazônia, será preciso ampliar a segurança jurídica e reduzir os conflitos decorrentes dos problemas fundiários ainda existentes”. (PND-END,2020,p.81 e 82)

Por fim, o documento do Inesc aponta uma intenção do governo federal de sinalizar aos doadores internacionais para uma retomada do Fundo Amazônia. Isso porque, com o fim dos recursos da Lava Jato, as doações do Fundo Amazônia poderiam dar continuidade à mesma estratégia militar. “E a que preço?”, questiona o estudo.

>>> Leia também a reportagem do Estadão sobre o estudo do Inesc.

[i] Como será melhor pontuado adiante, as ações subsidiárias previstas no decreto encontram suporte financeiro dentro da ação orçamentária 21BT.

[ii] Vale lembrar que logo no início do atual governo houve a tentativa de emplacar, por decreto, o “Projeto Barão do Rio Branco” com o objetivo de implementar grandes empreendimentos na região conhecida por “Calha Norte” e atrair forças econômicas para a região, além de escoar a produção agrícola.

[iii]https://www.gov.br/defesa/pt-br/assuntos/copy_of_estado-e-defesa/estrategia-nacional-de-defesa

[i] http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/adpf568homolog.pdf

[ii] À educação foram destinados R$ 1.601.941.554,97 sendo: R$ 1.001.941.554,97 para educação infantil; R$ 250.000.000,00 para o Programa “Criança Feliz”; R$ 250.000.000,00 para o MCTI – SÍRIUS; R$ 100.000.000,00 para Ministério Família (ações socioeducativas).

 

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