Por Bruno Calixto, para o Blog do Planeta, do site da revista Época.
Em junho, o presidente Michel Temer foi a Noruega para assegurar acordos comerciais e mostrar que o Brasil é um parceiro confiável na diplomacia ambiental. A viagem, como sabemos, foi um fiasco. Não só o governo foi criticado por seus parceiros noruegueses, como o país anunciou que reduziria a parcela de recursos destinados ao Fundo Amazônia, já que o desmatamento voltou a subir.
A redução das doações pode, em tese, colocar as operações brasileiras de fiscalização em dificuldade. Isso porque nos últimos três anos o governo aumentou o uso dos recursos noruegueses voltados para órgãos de comando e controle, como o Ibama e a Força Nacional de Segurança, de acordo com um estudo publicado pelas organizações Idesam e Forest Trends. O estudo Mapeando os fluxos financeiros para Redd+ e uso da terra no Brasil levantou o uso de recursos de doação internacional para proteção das florestas no Brasil entre 2009 e 2016. Ao todo, foram mais de US$ 2,2 bilhões recebidos, sendo que US$ 1 bilhão foi doado pelo governo norueguês.
O relatório mostra que, até 2014, a maior parte dos recursos do Fundo Amazônia era distribuída para os estados. Em segundo lugar, ficavam as ONGs. Apenas em terceiro ficava os órgãos de fiscalização federal. Esse cenário mudou. No ano passado, a maior fatia do dinheiro da Noruega foi para os órgãos federais: 46%. Os estados ficaram em segundo, e as ONGs em terceiro. Esse cenário deve se repetir em 2017. O Ministério do Meio Ambiente (MMA) fechou em dezembro de 2016 um repasse de R$ 56 milhões do Fundo Amazônia para ser destinado às operações de controle e combate ao desmatamento do Ibama durante todo o ano de 2017. O valor é quase a metade do que o Fundo Amazônia desembolsou em 2016.
O aumento da captação de recursos internacionais seria positivo não fosse um problema. Ele coincide com a queda no orçamento do Ministério do Meio Ambiente no mesmo período. “A recente captação de recursos pelo Ibama junto ao Fundo Amazônia marca um cenário de retração dos investimentos públicos federais para o combate ao desmatamento na região amazônica. No ano de 2016 o setor de fiscalização do governo sofreu com uma retração de 30% em seu orçamento em relação ao ano de 2013”, diz o estudo. Para um dos autores do texto, Mariano Cenamo, do Idesam, isso sugere que é o recurso de doação internacional que está salvando a política ambiental brasileira. “Nós estamos vendo as estruturas ambientais ser fragilizadas em todos os níveis no Brasil. Nesse contexto, ainda bem que temos o dinheiro do Fundo Amazônia. Se não fosse o recurso de doação internacional, a situação estaria ainda pior.”
O dinheiro da Noruega, evidentemente, é bem-vindo. O temor de quem acompanha as políticas para a Amazônia, no entanto, é a possibilidade de que ele seja usado para cobrir buracos deixados pelos cortes de recursos do governo. Isso deixaria toda a política ambiental brasileira mais vulnerável. Afinal, se amanhã os norugueses decidirem parar com as doações, não haverá mais dinheiro para fazer uma função crucial de combate ao desmatamento.
Em março deste ano, o governo Temer anunciou o contingenciamento de R$ 42 bilhões no orçamento público. O corte também atingiu o Ministério do Meio Ambiente, que perdeu quase a metade dos recursos para as despesas descricionárias – o dinheiro utilizado em programas e projetos do ministério, sem contemplar gastos fixos como salários e pensões. Uma análise feita pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) mostra que, mesmo antes do contingenciamento, o orçamento do ministério já estava em baixa. “O orçamento do Ministério do Meio Ambiente vem caindo ano a ano, desde 2013. Com o contingenciamento, passou a ser o menor desde 2007”, diz Matheus Magalhães, pesquisador do Inesc.
Uma reportagem do jornal Folha de S.Paulo mostra que a preocupação com os recursos para a fiscalização é grande dentro do ministério. Segundo o jornal, o ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho, enviou carta ao Ministério do Planejamento dizendo que a falta de dinheiro para fiscalização agravou o desmate na Amazônia. Sarney Filho pede que o orçamento do Ibama seja aumentado em R$ 104 milhões em 2018.
ÉPOCA entrou em contato com o Ministério do Meio Ambiente para tentar entender a situação. Segundo o ministério, o contingenciamento no orçamento e o aumento da captação do dinheiro de doação internacional para fiscalização não estão relacionados. Em nota, o ministério explica que não repassou o contingenciamento para as operações de fiscalização e diz que o ministro Sarney Filho conseguiu um compromisso político da Presidência de que o contingenciamento será revertido ainda no segundo semestre de 2017.
O ministério diz ainda que o dinheiro da Noruega não está sendo usado para substituir o orçamento. “No que tange aos recursos do Fundo Amazônia, estes apoiam atividades do Ibama desde 2014, como fonte adicional, recursos de doação. São valores complementares ao orçamento da Autarquia e estão sendo utilizados para apoiar atividades adicionais de combate a incêndios e queimadas e de fiscalização. Não há substituição de orçamento”, diz a nota.
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